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<p>I S I M P Ó S I O D I V E R S I D A D E E R E S I S T Ê N C I A</p><p>“PESQUISA E PRODUÇÃO CIENTÍFICA: LUTA,</p><p>RESISTÊNCIA E MATERNAGEM”</p><p>A N A I S D O</p><p>ASSOCIAÇÃO MÃES DA RESISTÊNCIA</p><p>Núcleo de Projetos</p><p>Núcleo de Direitos Humanos</p><p>GT de Educação</p><p>I CONGRESSO NACIONAL DAS MÃES DA RESISTÊNCIA</p><p>Anais do I Simpósio Diversidade e Resistência</p><p>“PESQUISA E PRODUÇÃO CIENTÍFICA:</p><p>LUTA, RESISTÊNCIA E MATERNAGEM”</p><p>É permitida a reprodução total ou parcial desta obra, desde que citada e fonte e para fins não comerciais.</p><p>As ideias contidas nos trabalhos, bem como sua elaboração e revisão textual, são de inteira responsabili-</p><p>dade dos autores. O conteúdo dos trabalhos não expressa, necessariamente, a opinião dos organizadores</p><p>do evento.</p><p>Supervisão e projeto gráfico: Melyssa Fonseca de Miranda Chaves | Plataforma 4 EAD.</p><p>23-182598 CDD-301</p><p>Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)</p><p>(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)</p><p>Simpósio Diversidade e Resistência (1. : 02-04 dez</p><p>2023 : Brasília, DF)</p><p>Anais do 1º Simpósio Diversidade e Resistência</p><p>[livro eletrônico] : pesquisa e produção científica:</p><p>luta, resistência e maternagem / organização</p><p>Plataforma 4 EAD. -- Brasília, DF : Plataforma 4 EAD</p><p>: Associação Mães da Resistência, 2023.</p><p>-- (Coleção mães da Resistência ; v. 2)</p><p>PDF</p><p>Vários autores.</p><p>Bibliografia.</p><p>ISBN 978-65-982052-0-1</p><p>1. Ativismo 2. Diversidade 3. Inclusão social</p><p>4. LGBTQIAPN+ - Siglas 5. Maternidade 6. Participação</p><p>política 7. Sociologia I. Título. II. Série.</p><p>Índices para catálogo sistemático:</p><p>1. Sociologia 301</p><p>Eliane de Freitas Leite - Bibliotecária - CRB 8/8415</p><p>Brasília/DF</p><p>02, 03 e 04 de dezembro de 2023.</p><p>I Simpósio Diversidade e Resistência</p><p>“PESQUISA E PRODUÇÃO CIENTÍFICA: LUTA, RESISTÊNCIA E MATERNAGEM”</p><p>02, 03 e 04 de dezembro de 2023</p><p>Local:</p><p>Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania</p><p>Secretaria Nacional dos Direitos das Pessoas LGBTQIA+</p><p>SCS B, Quadra 9, Lote C, Ed. Parque Cidade Corporate, Torre “A”, 10ºandar, sala 1000.</p><p>CEP: 70308-200, Brasília/DF</p><p>Realização:</p><p>ASSOCIAÇÃO MÃES DA RESISTÊNCIA</p><p>Núcleo de Projetos</p><p>Núcleo de Direitos Humanos</p><p>GT de Edução</p><p>Apoio:</p><p>Unaids Brasil</p><p>Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania</p><p>Ministério das Mulheres</p><p>Ministério da Saúde</p><p>Comissão Científica:</p><p>Adriana Valle Mota</p><p>Claudia Denis Alves da Paz</p><p>Douglas Campos de Souza</p><p>Joana D’Arc Fernandes Ferraz</p><p>Leila D’Arc de Souza</p><p>Leonardo Café</p><p>Lígia Dabul</p><p>Lisane Marques Lima</p><p>Nadia de Jesus Santos</p><p>Patricia Ramiro</p><p>Paula Land Curi</p><p>Suzy dos Santos</p><p>Organização:</p><p>Plataforma 4 EAD</p><p>APRESENTAÇÃO</p><p>O 1º Simpósio Diversidade e Resistência, teve como tema “PESQUI-</p><p>SA E PRODUÇÃO CIENTÍFICA: LUTA, RESISTÊNCIA E MATERNAGEM”, aconte-</p><p>ceu de forma presencial nos dias 02, 03 e 04 de dezembro de 2023, em Brasília/DF.</p><p>O evento integrou o programa do 1º Congresso Brasileiro das Mães da Resistência, com o obje-</p><p>tivo de proporcionar reflexões sobre os impactos sociais do ativismo de mães e filhos (as, es) e</p><p>produção acadêmica em diversos níveis e espaços educacionais em todo o território nacional.</p><p>Assim, em seus Anais, o Simpósio Diversidade e Resistência registra o olhar ampliado e aguça-</p><p>do para uma forma diferente de ativismo, que integra mães e filhos (as, es), extrapola seus</p><p>lares, as ruas, a internet e a prórpia academia, conectando pesquisa, extensão e relatos de</p><p>experiências cujos limites, tal como acontece no amor, não poderão ser estabelecidos.</p><p>Boa leitura, boa inspiração, foco, força e fé. E vamos juntos, juntas e juntes, construir uma</p><p>nova, mais justa, tolerante, segura e feliz sociedade.</p><p>ARTIGOS</p><p>O COTIDIANO ESCOLAR E OS IMPACTOS DA TEORIA QUEER FACE À PEDAGOGIA HETEROS-</p><p>SEXISTA</p><p>Autoria: Célio Silva Meira*, Lucas Aguiar Tomaz Ferreira; Bruno Souza Pacheco.</p><p>GRUPO SUZY DA CRUZ: TRANSCENDENDO O SUAS NO CENTRO DE REFERÊNCIA ESPECIAL-</p><p>IZADO DE ASSISTÊNCIA SOCIAL DO MUNICÍPIO DE SÃO BERNARDO DO CAMPO – SP</p><p>Autoria: Daniela Alves de Lima Barbosa*; Rosimeire Nogueira Barbosa; Aldrey Lee Jacobs Vieira de Souza</p><p>Fernandes; Alexandra Menezes; Márcia Aparecida da Silva.</p><p>NARRATIVAS, GÊNERO, CORPOS, SEXO E SEXUALIDADE DAS MULHERES TRANSEXUAIS E</p><p>TRAVESTIS COM DEFICIÊNCIA</p><p>Autoria: Daniela Alves de Lima Barbosa.</p><p>O RECONHECIMENTO DOS DIREITOS DAS PESSOAS LGBTQIA+ NOS SISTEMAS INTERNACIO-</p><p>NAIS DE DIREITOS HUMANOS</p><p>Autoria: Gabriel Borba e Aline Albuquerque.</p><p>GÊNERO E DIVERSIDADE NA ESCOLA: AÇÕES DO NÚCLEO DE ESTUDOS DE GÊNERO E DIVERSI-</p><p>DADE SEXUAL (NUGEDIS) DO IFB - CAMPUS CEILÂNDIA</p><p>Autoria: Janailton Silva*; Micheli Suellen Neves Gonçalves; Jéssica Silva Lima; Caio Marcello Mota Polito;</p><p>Letícia Coroa do Couto; Vitor Paz.</p><p>DO MOVIMENTO SOCIAL A MEMÓRIA, DA MEMÓRIA Á CONSCIÊNCIA: UM PANORAMA DA</p><p>LUTA DAS FAMÍLIAS DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA EM DUQUE DE CAXIAS</p><p>Autoria: Kezia Graziela de Queiroz e Ediclea Mascarenhas Fernandes</p><p>PESSOAS TRANS E A NEGATIVA AOS ESPAÇOS DE PODER E DECISÃO</p><p>Autoria: Leonna Moriale Natale</p><p>A FORMAÇÃO DA(O) PROFESSORA (O) E O RESPEITO ÀS IDENTIDADES DE GÊNERO NA EDU-</p><p>CAÇÃO INFANTIL NA PERSPECTIVA DE UMA ESCOLA DAS INFÂNCIAS</p><p>Autoria: Marcia Sousa de Abreu</p><p>O PAJUBÁ ME ACUENDOU DA ESCOLA” – REFLEXÕES SOBRE A EXCLUSÃO ESCOLAR E ÊXITO</p><p>DE ESTUDANTES TRANS E TRAVESTIS</p><p>Autoria: Marcus Maciel</p><p>O TRABALHO COM QUESTÕES RELACIONADAS À DIVERSIDADE SEXUAL E DE GÊNERO NA</p><p>EDUCAÇÃO BÀSICA PROPOSTO PELO CURSO DE EXTENSÃO GÊNERO E SEXUALIDADE NO</p><p>ENSINO</p><p>Autoria: Maria Clara D’El Rey dos Reis</p><p>CORPOS DISSIDENTES EM UM SENTIDO EXTRAMORAL</p><p>Autoria: Martha Perrusi</p><p>UMA JORNADA PESSOAL NO CAMINHO DA JUSTIÇA E IGUALDADE</p><p>Autoria: Meanny Nayara Magalhães de Oliveira</p><p>FORMAÇÃO CONTINUADA PARA ATIVISTAS SOCIAIS:</p><p>MOVIMENTOS SOCIAIS – DA AFETIVIDADE À EFETIVIDADE</p><p>Autoria: Melyssa Fonseca de Miranda Chaves</p><p>O PAPEL DO PROJETO MARIA NO FORTALECIMENTO DAS IDENTIDADES DE PESSOAS</p><p>LGBTQIAPN+ E NO COMBATE À LGBTQIAPN+FOBIA</p><p>Autoria: Murivaldo Neves Andrade Filho* e Luciana Vieira Mariano</p><p>DIVERSIDADE, EQUIDADE E INCLUSÃO NAS ORGANIZAÇÕES: A VALORIZAÇÃO DOS GRUPOS</p><p>MINORIZADOS É UM BOM NEGÓCIO</p><p>Autoria: Neuma Silva Coelho Carvalho</p><p>GARANTIA E PERMANÊNCIA: CONSIDERAÇÕES SOBRE A EVASÃO ESCOLAR DA POPULAÇÃO</p><p>LGBTQIA+ NO DISTRITO FEDERAL</p><p>Autoria: Pedro Gustavo Fernandes Matias Pereira</p><p>SER-NO-MUNDO DE MÃES DE FILHES LGBTQIA+ E SUAS VIVÊNCIAS DENTRO DO GRUPO</p><p>“MÃES DA RESISTÊNCIA”: UMA PERSPECTIVA FENOMENOLÓGICA-EXISTENCIAL</p><p>Autoria: Pedro Pereira Tocantins de Mendonça</p><p>B R A S Í L I A / D F 2 0 2 3</p><p>I S I M P Ó S I O D I V E R S I D A D E E R E S I S T Ê N C I A</p><p>Doutor em planejamento territorial e Desenvolvimento Social.</p><p>( UCSal). Pesquisador de gêneros e sexualidades na educação.</p><p>Presidente do Coletivo Nós da Diversidade, professor da Educação</p><p>Básica - SEC e SMEP - Poções/BA</p><p>CÉLIO SILVA MEIRA</p><p>e T A L</p><p>O COTIDIANO</p><p>ESCOLAR E OS</p><p>IMPACTOS DA TEORIA</p><p>QUEER FACE À</p><p>PEDAGOGIA</p><p>HETEROSSEXISTA</p><p>I S I M P Ó S I O D I V E R S I D A D E E R E S I S T Ê N C I A</p><p>B R A S Í L I A / D F 2 0 2 3</p><p>O COTIDIANO ESCOLAR E OS IMPACTOS DA TEORIA QUEER</p><p>FACE À PEDAGOGIA HETEROSSEXISTA</p><p>Autoria:</p><p>Celio Silva Meira</p><p>Lucas Aguiar Tomaz Ferreira</p><p>Bruno Pacheco</p><p>GÊNERO E DIVERSIDADE NA ESCOLA.</p><p>RESUMO</p><p>O presente texto tem como finalidade fazer uma</p><p>crítica a pedagogia heterossexista que persiste está</p><p>entre as práticas de diversos docentes. Mediante a</p><p>isso, tendo como base a teoria queer e o seu hori-</p><p>zonte de uma escola mais pluralista e, de uma cri-</p><p>ança, um futuro adulto mais tolerante. Neste senti-</p><p>do, é possível se repensar o espaço significativo por</p><p>meio de reflexão filosófica para que componentes</p><p>de fundo moral, sexual, ético e político possam</p><p>realmente se integrar na práxis das escolas. A teo-</p><p>ria queer, por sua vez, se consolida como corrente</p><p>intelectual, tendo como uma das fontes filosóficas</p><p>sobre as sexualidades principais as contribuições</p><p>de Foucault, Butler, Sedwick, Preciado dentre out-</p><p>ros. Nessa direção, a teoria queer desenvolveu</p><p>uma crítica contundente contra as premissas nat-</p><p>uralizantes usadas pelo conservadorismo para jus-</p><p>tificar e legitimar a discriminação e a heteronorma-</p><p>a in-</p><p>vestigar sobre este universo, uma vez que até mesmo</p><p>a própria comunidade LGBTQIAPN+ tem dificuldades</p><p>em acolher pessoas com deficiência. Olhando para</p><p>todos esses desafios num contexto de exclusão e in-</p><p>visibilidade para esta parcela da população, acredi-</p><p>ta-se ser de extrema importância que esse tema seja</p><p>movimentado em nossa sociedade, em especial com</p><p>pesquisas que se debrucem em abordar a temática. A</p><p>sociedade precisa ser provocada a refletir sobre essa</p><p>interseccionalidade, a fim de compreender que os</p><p>seres humanos não se fazem apenas de uma só ma-</p><p>neira, pois existem elementos que se interseccionam</p><p>e compõe a constituição de cada indivíduo, o que faz</p><p>de cada um de nós uma existência única no mundo.</p><p>Em relação às mulheres, estas carregam consigo mar-</p><p>cas de uma sociedade patriarcal, misógina e sexista,</p><p>pois historicamente a mulher, na sociedade brasileira,</p><p>tem sido relegada à condição de inferioridade. Para</p><p>mulheres transexuais e pessoas travestis, as práticas</p><p>opressoras são muito mais acentuadas, dado a im-</p><p>plicação social de seus corpos dissidentes, pois além</p><p>de sofrerem discriminações por serem mulheres ou</p><p>se identificarem com o gênero feminino e ousarem</p><p>divergir dos padrões hegemônicos, seus corpos são</p><p>marcados para morrer. Portanto, a opressão expe-</p><p>rienciada contra as mulheres é histórica, na qual os</p><p>corpos das mulheres transexuais e pessoas travestis</p><p>com deficiência são triplamente oprimidos, pois seus</p><p>corpos dissidentes não se encaixam no ideário nor-</p><p>mativo da sociedade cisheteronormativa e capacit-</p><p>ista. É preciso visibilizar narrativas LGBTQIAPN+ com</p><p>deficiência e seus corpos dissidentes, buscando a de-</p><p>sconstrução de padrões hegemônicos, e situando a</p><p>pessoa LGBTQIAPN+ com deficiência em um campo</p><p>tenso e ao mesmo tempo enquanto possibilidade e</p><p>direito de ser e estar no mundo.</p><p>PALAVRAS-CHAVE: Capacitismo. Corpo. Deficiên-</p><p>cia. Sexualidade. Transexualidade.</p><p>ABSTRACT</p><p>This work constitutes an excerpt from the research</p><p>of the doctoral thesis, still in progress, linked to the</p><p>Postgraduate Program in Humanities, Rights and</p><p>Other Legitimacies at the University of São Pau-</p><p>lo-USP, and which aims to understand how narra-</p><p>tives of transsexual women and transvestites with</p><p>disabilities on their social media can contribute to</p><p>the deconstruction of hegemonic standards based</p><p>on cisheteronormativity, necropolitics and structur-</p><p>al ableism. We will use Oral History as a research</p><p>method, in order to amplify the voices of these</p><p>people and their life stories. To this end, we seek to</p><p>analyze the intersectionality of narratives, sex, sexu-</p><p>ality, body, gender, necropolitics, biopower, ableism</p><p>and disability. Such intersectionality is intentional-</p><p>ly ignored in our society by the oppressive culture</p><p>that is ableist and cisheteronormative, laying bare</p><p>the necropopolitics and biopower upon which</p><p>these dissident bodies are exposed. This situation</p><p>reveals the necropolitics of the State, as these bod-</p><p>ies, as stated by Achille Mbembe (2018), are sub-</p><p>ject to a policy of death, manifested by biopower</p><p>(Foucault, 2012) in the direction of the discipline of</p><p>bodies. Thus, taking into account that this intersec-</p><p>tion is invisible and, despite this, at the same time</p><p>it interferes with LGBTphobic and ableist structures,</p><p>very little is discussed about this intersectional ap-</p><p>proach. There is no official data on this intersec-</p><p>tion, there are no specific government policies or</p><p>actions for the LGBTQIAPN+ community with dis-</p><p>abilities, and there are few academic studies that</p><p>focus on investigating this universe, since even the</p><p>LGBTQIAPN+ community itself has difficulties in</p><p>welcoming disabled people. Looking at all these</p><p>challenges in a context of exclusion and invisibility</p><p>for this part of the population, it is believed that it</p><p>is extremely important that this topic is discussed</p><p>in our society, especially with research that focuses</p><p>on addressing the issue. Society needs to be pro-</p><p>voked to reflect on this intersectionality, in order to</p><p>understand that human beings are not created in</p><p>just one way, as there are elements that intersect</p><p>and make up the constitution of each individual,</p><p>what makes each of us a unique existence in the</p><p>world. In relation to women, they carry with them</p><p>the marks of a patriarchal, misogynistic and sexist</p><p>society, as historically women, in Brazilian society,</p><p>have been relegated to a condition of inferiority.</p><p>For transsexual women and transvestites, oppres-</p><p>sive practices are much more pronounced, given</p><p>the social implication of their dissident bodies, as</p><p>in addition to suffering discrimination for being</p><p>women or identifying with the female gender and</p><p>daring to diverge from hegemonic standards, their</p><p>bodies are marked to die. Therefore, the oppression</p><p>experienced against women is historical, in which</p><p>the bodies of transsexual women and transvestite</p><p>people with disabilities are triply oppressed, as</p><p>their dissident bodies do not fit into the normative</p><p>ideas of cisheteronormative and ableist society. It is</p><p>necessary to make LGBTQIAPN+ narratives with dis-</p><p>abilities and their dissident bodies visible, seeking</p><p>to deconstruct hegemonic standards, and placing</p><p>the LGBTQIAPN+ person with disabilities in a tense</p><p>field and at the same time as a possibility and right</p><p>to be in the world.</p><p>KEYWORDS: Ableism. Body. Deficiency. Sexuality.</p><p>Transsexuality.</p><p>INTRODUÇÃO</p><p>Na atualidade observa-se que a discussão sobre</p><p>identidade de gênero e orientação sexual é com-</p><p>plexa e atravessa outras categoriais de análise que</p><p>não podem ser neutras como o debate sobre cor-</p><p>po e sexualidade. Outros marcadores sociais como</p><p>a deficiência e transgeneridade, quando trata-se</p><p>sobre identidade de gênero e orientação sexual,</p><p>merecem um recorte epistêmico e analítico, uma</p><p>vez que é um assunto muito pouco debatido ainda</p><p>na sociedade.</p><p>De tal modo, este artigo é um recorte da pesquisa</p><p>em andamento, em nível de doutorado, pela Uni-</p><p>versidade de São Paulo, cujo tema versa sobre as</p><p>narrativas de mulheres transexuais e pessoas trav-</p><p>estis com deficiência, no sentido de descortinar</p><p>seus corpos dissidentes. A problemática da pesqui-</p><p>sa questiona: Como as narrativas de mulheres tran-</p><p>sexuais com deficiência em suas mídias sociais po-</p><p>dem contribuir para a desconstrução de padrões</p><p>hegemônicos baseados na cisheteronormatividade</p><p>e no capacitismo?</p><p>I S I M P Ó S I O D I V E R S I D A D E E R E S I S T Ê N C I A</p><p>B R A S Í L I A / D F 2 0 2 3</p><p>Desta maneira, foi traçado como objetivo geral</p><p>compreender como as narrativas de mulheres tran-</p><p>sexuais com deficiência em suas mídias sociais po-</p><p>dem contribuir para a desconstrução de padrões</p><p>hegemônicos baseados na cisheteronormatividade</p><p>e no capacitismo.</p><p>Ao longo da história, o culto ao “belo” atravessou</p><p>a maneira como as pessoas com deficiência eram</p><p>percebidas. Um corpo diferente ao padrão estabe-</p><p>lecido sustentou, durante séculos, práticas exclusiv-</p><p>as e morosidade na formulação de políticas públicas</p><p>favoráveis a esses sujeitos.</p><p>Sublinha-se que tais práticas centravam-se em mod-</p><p>elos assistencialistas, apartados da plena inclusão</p><p>social, e correspondiam ao modelo biomédico da</p><p>deficiência, apoiando-se na integração de normal-</p><p>ização desse grupo em detrimento aos padrões de</p><p>normalidade e perfeição vigentes.</p><p>A deficiência é um marcador social que acompanha a</p><p>minha vida desde o nascimento, pois sou filha de uma</p><p>pessoa com deficiência visual e, nesse sentido, fui at-</p><p>ravessada por todas as opressões ocasionadas pelo o</p><p>que chamamos hoje de capacitismo estrutural.</p><p>Ser filha de uma pessoa com deficiência visual me</p><p>permitiu, apesar das opressões vivenciadas, refle-</p><p>tir sobre o lugar da pessoa com deficiência na so-</p><p>ciedade, e um dos caminhos que trilhei foi buscar</p><p>respostas na academia: primeiro fui cursar Pedago-</p><p>gia e depois Serviço Social, sempre abordando nos</p><p>trabalhos de conclusão de curso temáticas voltadas</p><p>para a diversidade. Nos cursos de especialização,</p><p>passando pelo mestrado, e agora</p><p>no doutorado,</p><p>continuei a investigar a relação da diversidade/defi-</p><p>ciência e a opressão sobre esses corpos.</p><p>Nesse contexto, analisando alguns dados oficiais,</p><p>cabe destacar que, segundo a Organização Inter-</p><p>nacional do Trabalho - OIT, 52% das mulheres que</p><p>estão no mercado de trabalho formal já sofreram</p><p>assédio sexual e ganham 20% a menos que os</p><p>homens, desnudando práticas opressoras e ampla</p><p>desigualdade de gênero.</p><p>Sobre a mulher com deficiência no mercado de tra-</p><p>balho, a Organização Mundial da Saúde apontou</p><p>que pessoas com deficiência, em média, recebe</p><p>menores salários do que pessoas sem deficiência</p><p>e as taxas de empregabilidade são menores em</p><p>comparação às pessoas sem deficiência. Dados do</p><p>Instituto Brasileiro de Geografia Estatística de 2010</p><p>mostram que mulheres com deficiência possuem</p><p>menor acesso ao emprego (38%) do que as mul-</p><p>heres sem deficiência (46%).</p><p>De acordo com dados da Ficha Individual de Agra-</p><p>vos e Notificações do governo federal, instrumento</p><p>este que registra casos de doenças e agravos que</p><p>constam da lista nacional de doenças de notificação</p><p>compulsória, no ano de 2020, 86% das pessoas que</p><p>sofreram violência sexual eram mulheres.</p><p>Dados da Organização das Nações Unidas evidencia-</p><p>ram que uma a cada cinco mulheres em nível global</p><p>são pessoas com deficiência e que, apesar da violên-</p><p>cia acometer mulheres sem deficiência, as mulheres</p><p>e meninas com deficiência correm um risco despro-</p><p>porcional de violência devido a fatores relacionados</p><p>à discriminação e ao estigma, pois, em sua grande</p><p>maioria, são afetadas pela descredibilidade de seus</p><p>corpos dissidentes e de sua sexualidade e apresen-</p><p>tam um nível maior de vulnerabilidade.</p><p>Em relação às mulheres transexuais, estas carre-</p><p>gam consigo marcas de uma sociedade patriarcal e</p><p>sexista, pois historicamente a mulher, na sociedade</p><p>brasileira, tem sido relegada à condição de inferiori-</p><p>dade. Para essas mulheres, as práticas opressoras</p><p>são muito mais acentuadas. Além de sofrerem dis-</p><p>criminações por ser mulher e por ousarem divergir</p><p>dos padrões hegemônicos, são acometidas com a</p><p>rejeição de sua expressão ou identidade de gênero</p><p>e com a sua orientação sexual.</p><p>A Associação Nacional de Travestis e Transexuais -</p><p>ANTRA, elaborou um dossiê no ano de 2023, com</p><p>dados de 2022 sobre assassinatos no Brasil de pes-</p><p>soas travestis e transexuais. Neste mesmo dossiê foi</p><p>divulgada uma pesquisa da Associação Internacion-</p><p>al de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Trans e Intersexuais</p><p>- ILGA que situou o Brasil como segundo país que</p><p>mais tem evoluído em conquistas de direitos para a</p><p>população LGBTQIAPN+.</p><p>Todavia, na contramão desta informação, a nação</p><p>desponta como o país que mais assassina pessoas</p><p>transexuais no mundo (pelo 15º ano consecutivo)</p><p>e, a cada 10 pessoas assassinadas em nível global,</p><p>quatro desses crimes decorreram no Brasil (Tran-</p><p>srespect versus Transphobia World Wilde - TvT),</p><p>ou seja, sozinho, o país acumula 38,2% de todas</p><p>as mortes de pessoas trans do mundo. Tais dados</p><p>revelam a necropolítica de Estado, pois as pessoas</p><p>transexuais e travestis e consequentemente seus</p><p>corpos, como afirma Achille Mbembe (2018) estão</p><p>submetidos a uma política de morte, manifestada</p><p>pelo biopoder (Foucault, 2012) na direção da disci-</p><p>plina dos corpos.</p><p>A OPRESSÃO E O CAPACITISMO ESTRUTURAL CONTRA AS PESSOAS COM</p><p>DEFICIÊNCIA</p><p>Antônio Gramsci, em sua obra Cadernos do Cárcere,</p><p>salienta que “os grupos subalternos sofrem sempre</p><p>a iniciativa dos grupos dominantes, mesmo quan-</p><p>do se rebelam e insurgem: só a vitória permanen-</p><p>te rompe, e não imediatamente, a subordinação”</p><p>(GRAMSCI, 2002, p.135).</p><p>Segundo o autor, os grupos subalternos, mesmo</p><p>quando parecem encontrar-se vitoriosos, estão em</p><p>um estado de mecanismo de defesa. Ao falar em</p><p>luta histórica das pessoas com deficiência e sua ple-</p><p>na participação política, os postulados de Gramsci</p><p>delineiam seis pontos de estudo na relação subal-</p><p>ternidade e Estado, destacando que:</p><p>As classes subalternas, por definição, não são unificadas</p><p>e não podem se unificar enquanto não puderem se tornar</p><p>Estado: sua história, portanto, está entrelaçada à socie-</p><p>dade civil, é uma função desagregada e descontinua da</p><p>sociedade civil e, por este caminho, da história dos Esta-</p><p>dos ou grupo de Estados (GRAMSCI, 2002, p, 139).</p><p>Só foi a partir de meados do século XX que passaram</p><p>a existir, massivamente, pessoas ativistas com</p><p>ideários políticos as quais, inclinadas a dar visibili-</p><p>dade às pessoas com deficiência, se organizaram na</p><p>militância pela garantia de direitos.</p><p>Em amplitude internacional, podemos destacar</p><p>algum marcos regulatórios significativos como a</p><p>Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948),</p><p>a Convenção Interamericana para eliminação de</p><p>todas as formas de preconceito contra as pessoas</p><p>portadoras de deficiência (1999), a Declaração de</p><p>Madri (2002) e a Convenção da ONU sobre os dire-</p><p>itos das pessoas com Deficiência (2006).</p><p>Em âmbito nacional, muitas legislações marcam</p><p>os direitos das pessoas com deficiência, a saber, a</p><p>Constituição Federativa do Brasil de 1988, Lei de</p><p>Benefícios da Previdência Social e Cotas para Pes-</p><p>soas com Deficiência (1991) e Lei Brasileira de In-</p><p>clusão da Pessoa com Deficiência - LBI (2015).</p><p>Cabe considerar que, com o gradativo progresso</p><p>do ativismo das pessoas com deficiência, principal-</p><p>mente depois que o Brasil se tornou signatário de</p><p>alguns acordos internacionais que garantiram dire-</p><p>itos humanos desse grupo social, sobretudo a par-</p><p>tir da CF de 1988, diferentes espaços foram sendo</p><p>ocupados pelas PCD.</p><p>Nas últimas décadas nota-se que o Brasil vem pro-</p><p>duzindo políticas públicas em temas que versam</p><p>desde os direitos humanos, questões de gênero</p><p>e direitos das pessoas com deficiência, o que faz</p><p>pensar, principalmente a partir da CF de 1988, que</p><p>alguns direitos foram projetados no cenário social</p><p>brasileiro.</p><p>Falar em visibilidade e direito social das PCD é anal-</p><p>isar a desconstrução social da deficiência pautada</p><p>no modelo médico:</p><p>O modelo social partiu de uma dura crítica à hegemo-</p><p>nia dos saberes biomédicos em explicar a deficiência. O</p><p>objetivo não era o de desconsiderar, por exemplo, a im-</p><p>portância de avanços na área da medicina para a saúde</p><p>das pessoas com deficiência. Era principalmente o de</p><p>desconstruir a ideia da deficiência como anormalidade.</p><p>Isto é, desmedicalizar a compreensão da deficiência e,</p><p>sobretudo, deslocar as reinvindicações das pessoas com</p><p>deficiência de um campo meramente de acesso a tec-</p><p>nologias de saúde para outro de mudanças estruturais</p><p>na sociedade para equiparação de oportunidades e pro-</p><p>moção da justiça (SANTOS, 2016, p.4).</p><p>I S I M P Ó S I O D I V E R S I D A D E E R E S I S T Ê N C I A</p><p>B R A S Í L I A / D F 2 0 2 3</p><p>Consequentemente o modelo social da deficiên-</p><p>cia apresenta a ideia de que esta não é mais vista</p><p>como barreira do corpo e outorga para a sociedade</p><p>o compromisso de promover a igualdade entre as</p><p>pessoas com e sem deficiência.</p><p>Em 2001 a Organização Mundial de Saúde consti-</p><p>tuiu a Classificação Internacional de Funcionalidade</p><p>- CIF, estabelecendo que a deficiência não constitua</p><p>somente uma manifestação nas estruturas funcio-</p><p>nais do corpo, mas deriva também de fatores am-</p><p>bientais, sobretudo naqueles que impedem a plena</p><p>participação social dos indivíduos.</p><p>A INTERSEÇÃO TRANSEXUALIDADE, DEFICIÊNCIA E CAPACITISMO</p><p>Como apontado anteriormente, em minha tra-</p><p>jetória acadêmica, venho abordando como objeto</p><p>de estudo a deficiência e o contexto de opressão.</p><p>Em 2015 eu atuei como professora de Educação</p><p>Especial em uma rede de ensino de um município</p><p>da região do ABC Paulista. EM 2018 assumi o cargo</p><p>de assistente social em um CREAS no mesmo mu-</p><p>nicípio. No ano de 2022, no CREAS, passei a desen-</p><p>volver, juntamente com mais quatro técnicas, um</p><p>grupo socioeducativo com adolescentes trans e</p><p>suas famílias.</p><p>Tais experiências levantaram alguns question-</p><p>amentos: onde estariam as meninas/mulheres</p><p>trans com deficiência? Nesta direção fui buscar</p><p>pistas no Programa de Pós-Graduação Humani-</p><p>dades, Direitos e Outras Legitimidades da Uni-</p><p>versidade de São Paulo, pois tal programa é de</p><p>caráter interdisciplinar e se ocupa da investigação</p><p>de questões pertinentes à diversidade cultural e</p><p>suas implicações, com vistas à superação do es-</p><p>tado de emergência permanente que determina</p><p>lugares sociais aprisionados nos binarismos di-</p><p>cotômicos da modernidade.</p><p>A linha de pesquisa escolhida Corporalidades, Al-</p><p>teridades, Territórios e Modos de Existência ba-</p><p>seia-se nas ferramentas teórico-metodológicas</p><p>da perspectiva interseccional, dos marcadores</p><p>sociais da diferença e da teoria crítica para com-</p><p>preender, analisar e intervir nos discursos e nas</p><p>práticas classistas, racistas, sexistas e capacitistas</p><p>que atravessam estruturalmente as sociedades</p><p>contemporâneas, e ao longo da história, e que</p><p>discriminam e exterminam pessoas negras, indíge-</p><p>nas, migrantes, em situação de refúgio, apátridas,</p><p>LGBTQIAPN+, com deficiência e neurodivergentes.</p><p>Nesse sentido, fui buscar algumas respostas na</p><p>literatura para iniciar o processo de construção</p><p>teórica da pesquisa, ainda em andamento. De-</p><p>parei-me com autores como Nascimento (2019),</p><p>Bento (2017), Diniz (2007), Mbembe (2018), hooks</p><p>(2018), Butler (2003) e Foucault (1998) os quais</p><p>problematizam temas como biopoder, corpo, sexo,</p><p>sexualidade e questões de gênero.</p><p>Nesse sentido, ao longo das primeiras leituras,</p><p>alguns indicativos apontaram para corpos e suas</p><p>marcas na construção de identidade de gênero</p><p>e suas deficiências. Desse modo, esta pesquisa</p><p>procurará elucidar, dentre outros, como as mul-</p><p>heres transexuais com deficiência, são classifi-</p><p>cadas, hostilizadas e valorizadas (metricamente)</p><p>por seus corpos a partir de padrões e referências</p><p>opressoras e cisheteronormativas e como utilizam</p><p>suas mídias sociais para desconstruir padrões he-</p><p>gemônicos baseados na cisheteronormatividade e</p><p>no capacitismo.</p><p>A identidade de gênero transexual pode ser defini-</p><p>da como “uma transposição na correlação do sexo</p><p>anatômico e psicológico, ou seja, a pessoa tem a</p><p>convicção de pertencer a um sexo e possuir gen-</p><p>itais opostos ao sexo a que pertence psicologica-</p><p>mente” (SILVA, 2018, p.21). Cabe destacar que</p><p>dentro do recorte de identidade de gênero ex-</p><p>istem os não binários que são “todos aqueles que</p><p>não se enquadram no gênero masculino ou femi-</p><p>nino, independente da orientação sexual” (SILVA,</p><p>2018, p.20).</p><p>As mais diversas experiências que as pessoas trans</p><p>com deficiência vivenciam constituem-se mais</p><p>complexas e desafiadoras quando atreladas a out-</p><p>ros marcadores sociais da diferença como raça,</p><p>classe, dentre estes o capacitismo.</p><p>Capacitismo, segundo a Secretaria Nacional de</p><p>Assistência Social (2021) é o preconceito e a dis-</p><p>criminação que a pessoa com deficiência vive</p><p>na sociedade por ter sua existência relacionada</p><p>à incapacidade e inferioridade. Dessa forma, o</p><p>capacitismo não vislumbra a pluralidade do su-</p><p>jeito, pois este não se encaixa nos padrões ditos</p><p>normais da sociedade. Assim, levando em con-</p><p>sideração que a interseção entre pessoas trans</p><p>e deficiência é um tema relativamente pouco</p><p>explorado, esta pesquisa em andamento pre-</p><p>tende ouvir a narrativas de duas mulheres tran-</p><p>sexuais com deficiência, utilizando como método</p><p>a História Oral, pois tal método permite que as</p><p>pessoas reflitam sobre suas histórias, apontando</p><p>para um futuro construído por elas mesmas. A</p><p>História Oral possibilita, muitas vezes, apreender</p><p>dados não registrados em documentos, o que só</p><p>pode ser contado através do narrador.</p><p>CONSIDERAÇÕES FINAIS</p><p>Ao longo dos primeiros contatos com o referencial</p><p>teórico, alguns indicativos apontaram para corpos</p><p>e suas marcas de opressão na construção de iden-</p><p>tidade de gênero, Tais atributos aos corpos são,</p><p>na verdade, marcas do poder, pois “estruturadas</p><p>socialmente oprimem o deficiente, em especial os</p><p>deficientes mais vulneráveis” (DINIZ, 2012, p.60).</p><p>Será realizada a escuta sensível com algumas</p><p>mulheres transexuais com deficiência que desen-</p><p>volvem conteúdos em redes sociais sobre o uni-</p><p>verso da pessoa com deficiência e identidade de</p><p>gênero transexual feminina.</p><p>É necessário o aprofundamento do tema a fim</p><p>de compreender a opressão da mulher transex-</p><p>ual com deficiência em uma sociedade pautada</p><p>pela cisheternormatividade, identificando pistas,</p><p>traçando rotas conceituais e acenando para múlti-</p><p>plas dimensões de práticas sociais coletivas inclusi-</p><p>vas, buscando refletir sobre padrões hegemônicos</p><p>para a compreensão o corpo da mulher transexual</p><p>com deficiência como espaço de insurgência e co-</p><p>municação com o mundo.</p><p>REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS</p><p>BRASIL, Lei nº 13.146, de 06 de julho de 2015. Institui a Lei</p><p>Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da</p><p>Pessoa com Deficiência). Disponível em: http://www.planalto.</p><p>gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13146.htm. Aces-</p><p>so em 27 out. 2023.</p><p>BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federa-</p><p>tiva do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988.</p><p>BRASIL. Capacitismo. Secretaria Nacional de Assistência Social, 2021.</p><p>BUTLER, J. Problemas de gênero: feminismo e subversão da</p><p>identidade. Tradução de Renato Aguiar. Rio de janeiro: Civili-</p><p>zação Brasileira, 2003.</p><p>DINIZ, Débora. O que é deficiência. São Paulo: Brasiliense: 2012.</p><p>FOUCAULT, Michel. História da sexualidade: a vontade de sa-</p><p>ber; tradução de Maria Thereza da Costa e J. A. Guilhon Albu-</p><p>querque. 22. ed. Rio de Janeiro: Graal, 2012.</p><p>GRAMSCI, Antônio. Cadernos do Cárcere, volume 5: O Risorg-</p><p>imento. Notas sobre a história da Itália. Rio de Janeiro: Civili-</p><p>zação Brasileira, 2002. 461 p.</p><p>HOOKS, bell. O feminismo é para todo mundo: políticas arre-</p><p>batadoras. 1 ed. Rio de Janeiro: Rosa dos Tempos, 2018. E-book.</p><p>SANTOS, Wederson. Deficiência como restrição de partici-</p><p>pação social: desafios para avaliação a partir da Lei Brasilei-</p><p>ra de Inclusão. Disponível em: https://www.scielo.br/j/csc/a/</p><p>fWKh6cB9KCYHTKxJfGdgF7m/abstract/?lang=pt. Acesso em</p><p>06 de set.2023.</p><p>SILVA, Inajara Piedade. A transexualidade sob a ótica dos di-</p><p>reitos humanos: a redesignação do sexo na sociedade global-</p><p>izada. Porto Alegre, Sulinas. 2018.</p><p>MBEMBE, Achille. Necropolítica. São Paulo: N-1 Edições,</p><p>2018.</p><p>MEIHY, José. Carlos. Sebe. Manual de história oral. São Pau-</p><p>lo: Loyola, 2002.</p><p>Pós-graduado em Direito Penal e Processo Penal pela Faculdade</p><p>Metropolitana São Carlos (FAMESC /CNI). Pós-graduado em Direitos</p><p>Humanos pelo Complexo de Ensino Renato Saraiva CERS/CEI.</p><p>Advogado e Consultor Jurídico. Procurador de Direitos Humanos</p><p>da OAB/DF. Coordenador Jurídico do Distrito Drag. Coordenador de</p><p>Advocacy no Senado Federal da Aliança Nacional LGBTI+.</p><p>GABRIEL BORBA</p><p>O RECONHECIMENTO</p><p>DOS DIREITOS DAS</p><p>PESSOAS LGBTQIA+</p><p>NOS SISTEMAS</p><p>INTERNACIONAIS DE</p><p>DIREITOS HUMANOS</p><p>ET AL</p><p>I S I M P Ó S I O D I V E R S I D A D E E R E S I S T Ê N C I A</p><p>B R A S Í L I A / D F 2 0 2 3</p><p>O RECONHECIMENTO DOS DIREITOS DAS PESSOAS LGBTQIA+</p><p>NOS SISTEMAS INTERNACIONAIS DE DIREITOS HUMANOS</p><p>Autoria:</p><p>Gabriel Borba</p><p>Aline Albuquerque</p><p>RESUMO</p><p>Este artigo objetiva apresentar os mecanismos de</p><p>monitoramento do Sistema ONU de Direitos Hu-</p><p>manos e do Sistema Interamericano de Direitos Hu-</p><p>manos que versam sobre pessoas LGBTQIA+, bem</p><p>como estudar a forma que a Corte Interamericana</p><p>de Direitos Humanos aplica os direitos humanos nos</p><p>casos que têm como vítima uma pessoa LGBTQIA+.</p><p>Trata-se de pesquisa de cunho teórico-documental,</p><p>baseada em livros e artigos sobre direitos humanos,</p><p>notadamente a obra de Albuquerque e Barroso, em</p><p>documentos e relatórios oficiais produzidos por am-</p><p>bos os sistemas de direitos humanos. Conclui-se que</p><p>o Sistema Interamericano de Direitos Humanos e o</p><p>Sistema ONU de Direitos Humanos reconhecem as</p><p>pessoas LGBTQIA+ como sujeitos de direito e, por-</p><p>tanto, como uma categoria de proteção dos direitos</p><p>humanos. Nesse sentido, é papel do Estado adotar</p><p>todas as medidas não somente para proteger e ga-</p><p>rantir os direitos humanos das pessoas LGBTQIA+,</p><p>mas também assumir uma postura ativa na</p><p>elimi-</p><p>nação do preconceito baseado na orientação sexual</p><p>ou identidade de gênero fornecendo, por exemplo,</p><p>capacitação para agentes estatais, extinção de leis</p><p>discriminatórias, adoção de medidas de conscien-</p><p>tização sobre estas formas de discriminação.</p><p>PALAVRAS-CHAVE: direitos humanos; pessoas</p><p>LGBTQIA+; sistema ONU de direitos humanos; siste-</p><p>ma interamericano de direitos humanos.</p><p>ABSTRACT</p><p>This article aims to define the concept of human</p><p>rights and the composition of a human rights system.</p><p>It also aims to analyze the monitoring mechanisms</p><p>of the UN Human Rights System and the Inter-Amer-</p><p>ican Human Rights System on LGBTQIA people, as</p><p>well as analyzing three sentences handed down by</p><p>the Inter-American Court of Human Rights in cases</p><p>of human rights violations against LGBTQIA+ people.</p><p>This is a theoretical-documentary research, based on</p><p>books and articles on human rights, notably the work</p><p>of Albuquerque and Barroso, on official documents</p><p>and reports produced by both human rights systems.</p><p>It is concluded that the Inter-American Human Rights</p><p>System and the UN Human Rights System recognize</p><p>LGBTQIA+ people as subjects of rights and, therefore,</p><p>as a category of human rights protection.</p><p>Keywords: Human Rights; LGBTQIA+ people; UN Hu-</p><p>man Rights System; Inter-American Human Rights</p><p>System.</p><p>A PESQUISA E A EXTENSÃO OU RELATOS DE EXPERIÊNCIA COMO AÇÕES DE COMBATE</p><p>À LGBTFOBIA E/OU DE FORTALECIMENTO DA IDENTIDADE DE PESSOAS LGBTQIAPN+.</p><p>INTRODUÇÃO</p><p>Segundo o documento “Homofobia de Estado” da</p><p>Associação Internacional de Lésbicas, Gays, Bissex-</p><p>uais, Trans e Intersexuais (ILGA WORLD, 2020), em</p><p>aproximadamente 69 países as relações privadas e</p><p>consensuais entre pessoas do mesmo sexo são crim-</p><p>inalizadas por meio de leis discriminatórias, sendo</p><p>que 34 países punem ativamente pessoas Lésbicas,</p><p>Gays, Bissexuais, Transexuais, Queer, Intersexo, As-</p><p>sexual (LGBTQIA+). O mesmo documento aponta que,</p><p>além das penas desses países variarem entre prisão</p><p>e pena de morte, 42 países limitam a liberdade de</p><p>expressão sobre orientação sexual e identidade de</p><p>gênero. Nesse sentido, a proteção internacional de</p><p>pessoas LGBTQIA+ se torna importante objeto de es-</p><p>tudo pois, em que pese estas pessoas já tenham sido</p><p>reconhecidas como um grupo vulnerável e, portan-</p><p>to, cabe aos Estados proteger e garantir o exercício</p><p>de seus direitos humanos, nota-se a partir dos dados</p><p>alarmantes que a realidade diverge do que propõem</p><p>os sistemas global e regionais de direitos humanos.</p><p>O presente artigo visa desenvolver uma pesquisa</p><p>teórico-documental dividida em três partes. Na pri-</p><p>meira, tem-se como objeto o alcance e a atuação dos</p><p>Sistemas Internacionais de Direitos Humanos, mais</p><p>especificamente o Sistema de Direitos Humanos da</p><p>Organização das Nações Unidas (Sistema ONU) e</p><p>Sistema Interamericano de Direitos Humanos (SIDH),</p><p>escolhidos em razão da vinculação do Estado Brasile-</p><p>iro a esses Sistemas, sem embargos de fazer menção</p><p>a outros sistemas regionais como o Sistema Europeu</p><p>de Direitos Humanos e o Sistema Africano de Direitos</p><p>Humanos.</p><p>Em seguida, é feito um estudo sobre os mecanismos</p><p>de monitoramento dos direitos humanos na temáti-</p><p>ca de proteção de pessoas LGBTQIA+, mais uma vez</p><p>com ênfase no Sistema ONU e no SIDH. Por fim, a</p><p>última parte objetiva analisar as sentenças de três</p><p>casos julgados pela Corte Interamericana de Direitos</p><p>Humanos (Corte IDH), órgão judicial do SIDH, que ti-</p><p>veram como matéria a violação de direitos humanos</p><p>de pessoas LGBTQIA+, são eles: Caso Atala Riffo Vs.</p><p>Chile, Caso Duque Vs. Colômbia e Caso Flor Freire Vs.</p><p>Equador.</p><p>SISTEMAS INTERNACIONAIS DE DIREITOS HUMANOS</p><p>Define-se direitos humanos como as normas inter-</p><p>nacionais que objetivam proteger o ser humano. Em</p><p>outras palavras, todo ser humano é titular desses di-</p><p>reitos em razão do seu pertencimento à espécie hu-</p><p>mana. O Direito Internacional dos Direitos Humanos</p><p>(DIDH) encontra-se consagrado em pactos, cartas,</p><p>convenções e jurisprudência internacional, como por</p><p>exemplo o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e</p><p>Políticos (PIDCP), Pacto Internacional sobre Direitos</p><p>Econômicos, Sociais e Culturais (PIDESC), Declaração</p><p>Universal dos Direitos Humanos (DUDH) e a Con-</p><p>venção Americana sobre Direitos Humanos (CADH).</p><p>Constituem características dos direitos humanos, se-</p><p>gundo o parágrafo 5º da Declaração e Programa de</p><p>Ação de Viena (OEA, 1993), adotada na II Conferência</p><p>Internacional de Direitos Humanos em 1993, a uni-</p><p>versalidade, a indivisibilidade e a interdependência.</p><p>Apesar de haver divergências na teoria internacional</p><p>de direitos humanos acerca da universalidade, diz-se</p><p>que esses direitos são universais ao passo que to-</p><p>dos os indivíduos são titulares independentemente</p><p>de nacionalidade, raça, gênero, etnia, religião, ou</p><p>qualquer outra característica, e, portanto, os direitos</p><p>humanos “são uma linguagem compartilhada mes-</p><p>mo por Estados com culturas ou sistemas políticos</p><p>divergentes” (ALBUQUERQUE; BARROSO, 2018, p.</p><p>59). Além disso, são indivisíveis e interdependentes</p><p>uma vez que não existe uma relação de hierarquia e</p><p>de relevância entre eles, todos são igualmente con-</p><p>siderados para se buscar padrões de vida digna.</p><p>Em decorrência do caráter universal dos direitos</p><p>humanos, e por se tratar de uma relação entre o in-</p><p>divíduo e o Estado, cabe a este último garantir a apli-</p><p>cação e o exercício destes direitos, de modo a limitar</p><p>“abusos de poder do próprio Estado e de suas auto-</p><p>ridades constituídas” (MORAES, 2011). Contudo, os</p><p>Estados eventualmente descumprem com os trat-</p><p>ados em razão de particularidades como aspectos</p><p>econômicos, sociais, culturais e religiosos, resultando</p><p>em violações de direitos humanos. É nesse contexto,</p><p>com o intuito de monitorar a atuação dos Estados e</p><p>fazer cumprir as normas de direitos humanos, que</p><p>surgiram em âmbito internacional os Sistemas Inter-</p><p>nacionais de Direitos Humanos.</p><p>Os Sistemas Internacionais de Direitos Humanos</p><p>(Sistema ONU de Direitos Humanos, Sistema Inter-</p><p>americano de Direitos Humanos, Sistema Africano</p><p>de Direitos Humanos e Sistema Europeu de Direitos</p><p>Humanos) são dotados necessariamente de três el-</p><p>ementos constitutivos, quais sejam: normas, órgãos</p><p>e mecanismos (ALBUQUERQUE; BARROSO, 2018, p.</p><p>177). Como exposto, os direitos humanos são dire-</p><p>itos que se encontram positivados em diversos doc-</p><p>umentos normativos internacionais, sendo estas as</p><p>normas que constituem um Sistema de DH. É por</p><p>meio das normas de direitos humanos que um Es-</p><p>tado pode basear sua atuação perante os seus ju-</p><p>risdicionados com o objetivo de evitar violações de</p><p>direitos humanos, além de ser o referencial positivo</p><p>em que os órgãos de direitos humanos irão basear as</p><p>suas decisões e recomendações. Ademais, os órgãos</p><p>de direitos humanos podem ser políticos, quase ju-</p><p>diciais ou judiciais, tendo cada um suas particulari-</p><p>dades e atribuições.</p><p>Os órgãos políticos são aqueles que adotam como</p><p>mecanismos de monitoramento a elaboração de</p><p>relatórios. Após analisar graves e generalizadas situ-</p><p>ações de direitos humanos, cabe aos órgãos políticos</p><p>a emissão de uma recomendação ao Estado violador</p><p>com o objetivo de se reparar ou cessar os danos. Já os</p><p>órgãos quase-judiciais podem emitir recomendações</p><p>sobre comunicações ou petições relativas a casos</p><p>singulares de violação de direitos humanos, adotan-</p><p>do como mecanismos os relatórios, as visitas in loco,</p><p>os inquéritos e as decisões sobre as denúncias indi-</p><p>viduais. Por fim, compete aos órgãos judiciais, como</p><p>a Corte Interamericana de Direitos Humanos, apre-</p><p>ciar as comunicações e petições de casos individuais</p><p>e emitir sentenças.</p><p>Sistema ONU De Direitos Humanos</p><p>Como Sistema de Direitos Humanos na esfera glob-</p><p>al há o Sistema ONU. Após o término da 2ª Guerra</p><p>Mundial, os países expressaram a necessidade de</p><p>uma carta de direitos que garantisse a todos os seres</p><p>humanos a proteção de seus direitos. Para tanto, 50</p><p>países se reuniram na Conferência das Nações Uni-</p><p>das sobre Organização Internacional, ocorrida em 26</p><p>de junho</p><p>de 1945, e elaboraram a Carta das Nações</p><p>Unidas. Apesar disso, a Organização das Nações</p><p>Unidas (ONU) só foi consolidada em 24 de outubro</p><p>1945, após a ratificação da Carta das Nações Unidas</p><p>por mais países. Atualmente, a ONU conta com 193</p><p>Estados-membros que ratificaram a Carta, e tem</p><p>como “principais objetivos: (i) manutenção da paz e</p><p>da segurança internacionais; (ii) promoção dos dire-</p><p>itos humanos no âmbito internacional; (iii) cooper-</p><p>ação internacional nas esferas social e econômica”.</p><p>Apesar da Carta das Nações Unidas constituir um</p><p>grande avanço no reconhecimento da importância</p><p>de promover e proteger os direitos humanos, tal</p><p>documento era insuficiente para causar efeitos práti-</p><p>cos, uma vez que não definia quais seriam esses di-</p><p>reitos. Por isso, em 1948, foi adotada a Declaração</p><p>Universal dos Direitos Humanos (DUDH). A DUDH</p><p>juntamente com o Pacto Internacional sobre Direitos</p><p>Civis e Políticos e o Pacto Internacional sobre Dire-</p><p>itos Econômicos, Culturais e Sociais formam a Car-</p><p>ta Internacional de Direitos Humanos, sendo este o</p><p>conjunto de normativas de direitos humanos mais</p><p>importante do Sistema ONU.</p><p>O Sistema ONU de Direitos Humanos tem como órgão</p><p>o Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas</p><p>(CDH), substituindo a extinta Comissão de Direitos</p><p>Humanos das Nações Unidas. Criado na Assembleia</p><p>Geral em 2006 e composto por 47 Estados-mem-</p><p>bros (órgão intergovernamental), compete ao CDH</p><p>emitir recomendações sobre as violações de direit-</p><p>os humanos ao redor do globo e discuti-las ao longo</p><p>do ano, além de incentivar a promoção e proteção</p><p>dos direitos humanos. São mecanismos do CDH a</p><p>Revisão Periódica Universal, o Comitê Consultivo, o</p><p>Procedimento de Reclamação e os Procedimentos</p><p>Especiais, sendo que cada um deles será estudado</p><p>mais à frente.</p><p>Sistemas Regionais de Direitos Humanos</p><p>Além do Sistema ONU de DH, tem-se ainda os Siste-</p><p>mas Regionais de Direitos Humanos que são dividi-</p><p>dos por continentes, são eles: Europa (Sistema Euro-</p><p>peu de Direitos Humanos), África (Sistema Africano</p><p>de Direitos Humanos) e América (Sistema Interam-</p><p>ericano de Direitos Humanos). Não existe relação</p><p>de hierarquia entre o Sistema Global e os Sistemas</p><p>Regionais, ao contrário, todos os Sistemas de DH at-</p><p>uam de forma complementar no monitoramento e</p><p>proteção dos direitos humanos. Contudo, existem</p><p>algumas particularidades nos Sistemas Regionais de</p><p>DH que os tornam mais eficazes, como por exemplo,</p><p>o idioma, a similitude dos aspectos culturais, políti-</p><p>cos e o ordenamento jurídico de seus membros,</p><p>I S I M P Ó S I O D I V E R S I D A D E E R E S I S T Ê N C I A</p><p>B R A S Í L I A / D F 2 0 2 3</p><p>além do poder de “constrangimento e persuasão</p><p>jurídica” (ALBUQUERQUE; BARROSO, 2018, p. 179)</p><p>que as Cortes de Direitos Humanos – existentes so-</p><p>mente nos Sistemas Regionais – possuem.</p><p>Em outubro de 1889, a convite do Governo dos Esta-</p><p>dos Unidos, realizou-se a 1ª Conferência Internacion-</p><p>al Americana com o objetivo de se implementar um</p><p>sistema normativo e institucional comum entre os</p><p>Estados Americanos. Tal reunião resultou na criação</p><p>da União Internacional das Repúblicas Americanas</p><p>que, em 1949, já em ocasião da 9ª Conferência In-</p><p>ternacional Americana sediada em Bogotá, Colôm-</p><p>bia, passaria a ser conhecida como Organização</p><p>dos Estados Americanos (OEA) com a ratificação da</p><p>Carta da OEA por 35 Estados. Segundo o artigo 1º</p><p>da referida Carta, são objetivos da OEA estabelecer</p><p>“uma ordem de paz e de justiça, para promover sua</p><p>solidariedade, intensificar sua colaboração e defend-</p><p>er sua soberania, sua integridade territorial e sua in-</p><p>dependência” (OEA, 1990). A Carta da Organização</p><p>dos Estados Americanos sofreu algumas emendas ao</p><p>longo de sua história, sendo a primeira em 1967 com</p><p>a assinatura do Protocolo de Buenos Aires, seguida</p><p>pela assinatura do Protocolo de Cartagena das Índi-</p><p>as em 1985, assinatura do Protocolo de Washington</p><p>em 1992 e, por último, assinatura do Protocolo de</p><p>Manágua em 1993 (OEA, 2021).</p><p>Dentre as alterações feitas pelo Protocolo de Buenos</p><p>Aires, tem-se a criação da Comissão Interamericana</p><p>de Direitos Humanos (CIDH) em 1959, objetivan-</p><p>do a promoção e defesa dos direitos humanos nos</p><p>Estados Americanos. O órgão consultivo da OEA é</p><p>composto por sete comissários – também chamados</p><p>de comissionados ou membros – eleitos para man-</p><p>datos de quatro anos, renovável por igual período.</p><p>Os comissionados são eleitos pela Assembleia Ger-</p><p>al da OEA, a partir de suas características pessoais,</p><p>como a “alta autoridade moral e de reconhecido sa-</p><p>ber em matéria de direitos humanos” (OEA, 2021),</p><p>e não mantém vínculo com os seus Estados de ori-</p><p>gem, muito embora eles sejam escolhidos dentre os</p><p>Estados-membros da OEA. A atuação da CIDH (Artigo</p><p>41 da Convenção Americana) é pautada no recebi-</p><p>mento de petições individuais de violações de dire-</p><p>itos humanos constantes na própria Convenção ou</p><p>em tratados interamericanos de direitos humanos.</p><p>Os mecanismos de monitoramento adotados pelo</p><p>Sistema Interamericano e seus respectivos órgãos</p><p>serão analisados mais a frente neste artigo, mas de</p><p>antemão ressalta-se que a CIDH faz uso das visitas in</p><p>loco, relatórios de país, relatórios temáticos, comuni-</p><p>cações interestatais e as relatorias temáticas.</p><p>Além da CIDH, o Sistema Interamericano de DH tam-</p><p>bém é composto por um órgão jurisdicional, a Corte</p><p>Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH).</p><p>Composta por sete membros (juízes) eleitos à títu-</p><p>lo pessoal para mandatos de seis anos (renovável</p><p>por igual período), a atuação da Corte pode ser</p><p>jurídico-contenciosa (artigos 61, 62 e 63 da CADH),</p><p>ou consultiva (artigo 64 da CADH). A ratificação da</p><p>Convenção Americana sobre Direitos Humanos sig-</p><p>nifica que aquele Estado é parte do SIDH, mas para</p><p>reconhecer a competência contenciosa da Corte IDH</p><p>é necessário ainda que aquele Estado, no ato ou não</p><p>da ratificação da CADH, deposite um documento es-</p><p>pecífico e expresso. Atualmente, 24 Estados-mem-</p><p>bros reconheceram a competência contenciosa do</p><p>órgão, são eles: “Argentina, Barbados, Bolívia, Brasil,</p><p>Chile, Colômbia, Costa Rica, Equador, El Salvador,</p><p>Guatemala, Haiti, Honduras, México, Nicarágua, Pan-</p><p>amá, Paraguai, Peru, República Dominicana, Surina-</p><p>me, Trinidad e Tobago, Uruguai e Venezuela” (CIDH,</p><p>2021). Não é necessário documento anuindo à com-</p><p>petência consultiva da Corte IDH.</p><p>Para que a Corte IDH aprecie um caso, ela precisa</p><p>ser instigada, e para isso é necessário que um Esta-</p><p>do-membro ou a CIDH decida submeter um caso,</p><p>sendo vedada a iniciativa por parte dos jurisdicio-</p><p>nados dos Estados. Em decorrência do princípio da</p><p>igualdade jurídica dos Estados (ALBUQUERQUE;</p><p>BARROSO, 2018, p. 245), caso um juiz da Corte IDH</p><p>seja cidadão do Estado envolvido no caso em apreço,</p><p>outro Estado terá a possibilidade de nomear um juiz</p><p>ad hoc para compor aquela Corte. Após a análise e o</p><p>devido processamento da denúncia, caberá à Corte</p><p>IDH proferir uma sentença de força vinculante con-</p><p>tendo: a) introdução da causa e objeto de controvér-</p><p>sia; b) o relatório do procedimento perante a Corte</p><p>IDH; c) sua competência para processar o feito; d) as</p><p>exceções preliminares; e) as provas levantadas e os</p><p>meios de obtenção; f) os fatos provados; g) análise</p><p>do mérito e os direitos violados; h) as reparações</p><p>cabíveis e; i) os pontos resolutivos.</p><p>O Artigo 61.1 da CADH confere à Corte IDH a com-</p><p>petência para determinar as medidas suficientes</p><p>para assegurar e reestabelecer ao prejudicado o</p><p>“gozo do seu direito ou liberdade violados”, além de</p><p>determinar que sejam reparadas as consequências</p><p>da violação daquele direito humano. Isto posto, im-</p><p>porta analisar quais são as reparações passiveis de</p><p>serem estabelecidas: restituição; garantias de não</p><p>repetição; indenização compensatória; reabilitação;</p><p>satisfação. As medidas de restituição, em razão do</p><p>princípio restituio in integrum, pretendem a repa-</p><p>I S I M P Ó S I O D I V E R S I D A D E E R E S I S T Ê N C I A</p><p>B R A S Í L I A / D F 2 0 2 3</p><p>ração total por parte do Estado, observando reesta-</p><p>belecer a situação anterior. Caso não seja passível de</p><p>se obter a restituição integral, a Corte determinará</p><p>medidas para garantir os direitos violados e reparar</p><p>as consequências oriundas das infrações. A medida</p><p>compensatória é a tentativa de cobrir todos os pre-</p><p>juízos decorrentes do sofrimento (LOPES; AMADO;</p><p>GONZÁLEZ; RÉBORA, 2018) e perdas passíveis de es-</p><p>tipulação financeira, como os danos materiais e ima-</p><p>teriais, além das custas necessárias com medicamen-</p><p>tos, serviços médicos, suporte e orientação jurídica</p><p>etc. Configura-se como garantias de não repetição, as</p><p>ações estatais visando evitar que situações similares</p><p>aconteçam novamente, como por exemplo a edição</p><p>de uma norma, a investigação dos fatos e estabelec-</p><p>imento de responsabilidade penal dos autores, ou</p><p>as melhorias de um instituto jurídico ou instituição</p><p>existente. A reabilitação é a obrigação que o Estado</p><p>violador dos direitos reconhecidos na sentença tem</p><p>de garantir às vítimas assistência médica e psicológi-</p><p>ca, acesso a medicamentos de forma gratuita e trat-</p><p>amentos adequados. Por fim, são consideradas me-</p><p>didas de satisfação todas aquelas que envolvem ação</p><p>simbólica que visa restabelecer a dignidade da vítima</p><p>(em alguns casos, de seus familiares) por meio de</p><p>atos simbólicos, como cerimônias oficiais para mani-</p><p>festação de desculpa e arrependimento, publicização</p><p>da verdade etc.</p><p>MECANISMOS DE MONITORAMENTO DOS DIREITOS HUMANOS DE PESSOAS</p><p>LGBTQIA+ NO ÂMBITO DO SISTEMA ONU DE DIREITOS E DO SISTEMA INTERAMER-</p><p>ICANO DE DIREITOS HUMANOS</p><p>Os mecanismos de monitoramento são as ferramen-</p><p>tas que um sistema internacional de direitos hu-</p><p>manos dispõe para fiscalizar a aplicação das normas</p><p>de direitos humanos nos Estados membros. Cada</p><p>Sistema Internacional de Direitos Humanos tem os</p><p>seus próprios mecanismos de monitoramento, sen-</p><p>do que os mais importantes entre eles são as pe-</p><p>tições (ou comunicações) individuais e os relatórios.</p><p>As petições individuais são as peças jurídicas elabora-</p><p>das por uma pessoa ou grupo de pessoas, ainda que</p><p>em nome de outrem, desde que conste a expressa</p><p>autorização da vítima, denunciando uma violação</p><p>de direitos humanos. As petições individuais pas-</p><p>sam por um juízo de admissibilidade exercido pelo</p><p>órgão competente para receber estas denúncias, no</p><p>caso do SIDH o órgão competente é a CIDH. Dentre</p><p>os requisitos para admissão das petições individuais</p><p>estão (ALBUQUERQUE; BARROSO, 2018, p. 229): ver-</p><p>ificação se o Estado denunciado é parte do tratado</p><p>violado; esgotamento das vias internas; identificação</p><p>das partes (impossibilidade de denúncia anônima);</p><p>anterioridade da violação em relação à vinculação</p><p>dos Estado ao tratado; não se tratar de matéria apre-</p><p>ciada por outro órgão de direitos humanos. A títu-</p><p>lo exemplificativo, citam-se como exemplos de re-</p><p>sponsabilização internacional decorrente do sistema</p><p>de comunicações individuais o Caso Alyne Pimentel,</p><p>no Sistema ONU de Direitos Humanos, e o Caso Her-</p><p>zog e Outros vs. Brasil, no SIDH.</p><p>Segundo Philip Alston (ALSTON, 1991, p. 13), o siste-</p><p>ma de relatórios é o mecanismo de monitoramento</p><p>mais tradicional dos sistemas de direitos humanos,</p><p>tendo sua origem ainda quando existia a Liga das</p><p>Nações. Por meio destes relatórios que seguem uma</p><p>periodicidade de 4 a 5 anos, é possível que os Esta-</p><p>dos vinculados a um tratado de direitos humanos</p><p>apresentem quais medidas judiciais, legislativas e ad-</p><p>ministrativas têm adotado para promover a proteção</p><p>daqueles direitos. Com efeito, os relatórios são im-</p><p>portantes mecanismos para monitorar as dificul-</p><p>dades enfrentadas pelos Estados e planejar políticas</p><p>e estratégias adequadas a garantir a aplicação e ob-</p><p>servância dos direitos humanos. Conforme Schutter</p><p>(SCHUTTER, 2010), os relatórios constituem a opor-</p><p>tunidade de um Estado reavaliar um dispositivo do</p><p>tratado que tenha apresentado reservas quando da</p><p>sua vinculação.</p><p>A Revisão Periódica Universal (doravante RPU) é um</p><p>mecanismo de monitoramento do Sistema ONU de</p><p>Direitos Humanos e consiste na elaboração de um</p><p>relatório a cada ciclo de quatro anos no qual serão</p><p>avaliados o cumprimento dos tratados ratificados pe-</p><p>los Estados, além da observância dos princípios con-</p><p>stantes na Carta da ONU e da DUDH (MATIAS, 2014).</p><p>A fim de conferir tratamento igualitário (NADER,</p><p>2007, p. 8), a RPU é composta por sessões orais com</p><p>duração aproximada de três horas, onde os Estados</p><p>têm a oportunidade de demonstrar o que tem sido</p><p>feito em âmbito interno para garantir a aplicação</p><p>daqueles tratados, sendo que ao final serão avalia-</p><p>dos e questionados por outros Estados (peer view) e</p><p>membros do Conselho acerca da documentação en-</p><p>viada ao Alto Comissariado das Nações Unidas para</p><p>os Direitos Humanos (ACNUDH).</p><p>Além dos relatórios, petições individuais e a RPU,</p><p>existem ainda os seguintes mecanismos: as comuni-</p><p>cações interestatais, isto é, um Estado signatário de</p><p>um tratado denuncia outro Estado por uma violação</p><p>de direitos humanos; os inquéritos, quando ocorre</p><p>denúncia por uma fonte confiável de que houve uma</p><p>violação maciça, grave e sistemática de violação de</p><p>direitos humanos; e os procedimentos especiais,</p><p>quando uma pessoa (relator especial ou especialista</p><p>independente) ou um grupo de trabalho (constituído</p><p>por cinco membros, cada um oriundo de um conti-</p><p>nente) está no exercício de mandato para elaborar</p><p>relatórios e orientações, de natureza temática ou so-</p><p>bre um Estado específico, sendo que em nenhuma</p><p>hipótese os Estados podem se furtar de colaborar</p><p>com o procedimento.</p><p>Sem prejuízo para este artigo, será dado foco prin-</p><p>cipal ao SIDH e ao Sistema ONU de DH e aos seus</p><p>mecanismos de monitoramento que versam sobre</p><p>direitos relacionados à orientação sexual e à iden-</p><p>tidade de gênero. No Sistema ONU de DH há dois</p><p>mecanismos importantes acerca da temática: a Re-</p><p>visão Periódica Universal – Ciclo III, e o Especialista</p><p>Independente em Orientação Sexual e Identidade de</p><p>Gênero. Na esfera do SIDH existem três documentos</p><p>produzidos pela CIDH, quais sejam: Relatório sobre</p><p>Violência contra Pessoas LGBTI de 2015; Relatório so-</p><p>bre Reconhecimento dos Direitos das Pessoas LGBTI</p><p>de 2019; Relatório sobre Pessoas Trans e de Gênero</p><p>Diverso e seus Direitos Econômicos, Sociais, Culturais</p><p>e Ambientais de 2020;</p><p>Mecanismos do Sistema ONU Sobre Pessoas</p><p>LGBTQIA+</p><p>No terceiro ciclo da RPU, período compreendido</p><p>entre os anos de 2017 e 2019, foi inserido um tópi-</p><p>co no relatório sobre a proteção e promoção dos</p><p>direitos das pessoas LGBTQIA+ no Brasil. Entre as</p><p>recomendações propostas na RPU pode-se destacar:</p><p>a) recomendação nº 39 da Suécia, para criminalizar</p><p>as condutas homo-transfóbicas e estabelecer siste-</p><p>ma para registrar estes crimes; b) recomendação nº</p><p>66 de Israel, para implementação de políticas públi-</p><p>cas com o intuito de garantir os direitos das pessoas</p><p>LGBTQIA+; c) recomendação nº 67 do Canadá, para</p><p>a inserção de um componente curricular sobre edu-</p><p>cação em direitos humanos para as escolas, com vista</p><p>a reduzir o ódio; e d) recomendação nº 90 da Irlanda,</p><p>para proporcionar a formação em direitos humanos</p><p>para os funcionários dos sistema jurídico e judicial,</p><p>bem como assegurar condições adequadas nos cen-</p><p>tros de detenção principalmente ao que se refere a</p><p>apenados vulneráveis como pessoas LGBTQIA+, mul-</p><p>heres grávidas e crianças. As demais recomendações,</p><p>quais sejam as de nº 40 (Argentina), 41 (Chile), 43</p><p>(Finlândia), 44 (Honduras) e 196 (México), vão no</p><p>mesmo sentido de recomendar a aprovação de leg-</p><p>islação específica e criação de políticas públicas em</p><p>nível federal, estadual e municipal, com o objetivo</p><p>de sancionar a discriminação e incitação à violência</p><p>com fundamento na orientação sexual e identidade</p><p>de gênero, além de investigar os crimes cometi-</p><p>dos contra estas pessoas. Ressalta-se que todas as</p><p>recomendações supracitadas são classificadas como</p><p>severamente não cumpridas (recomendações nº 66</p><p>e 90), não cumpridas (recomendações nº 42, 41 e</p><p>44), parcialmente cumpridas (recomendações nº 39,</p><p>40, 43, 45, 196) ou sem avaliação</p><p>(recomendação nº</p><p>67).</p><p>O Estado Brasileiro se manifestou sobre a RPU por</p><p>meio do Relatório Preliminar de Meio Período do III</p><p>Ciclo elaborado pelo Ministério da Mulher, da Família</p><p>e dos Direitos Humanos (MMFDH, 2019). O órgão</p><p>alegou estar trabalhando, junto a Secretaria Nacio-</p><p>nal de Segurança Pública do Ministério da Justiça e</p><p>Segurança Pública, na criação de ferramentas aptas</p><p>a apurar informações sobre ocorrência criminais</p><p>que tenham como vítimas pessoas LGBTQIA+. A fi-</p><p>nalidade destas ferramentas seria qualificar os dados</p><p>coletados e a partir disso tornar possível a orientação</p><p>de novas políticas públicas para proteção dessas</p><p>pessoas. Alegou também a equiparação dos crimes</p><p>de homofobia e transfobia à lei do racismo pelo Su-</p><p>premo Tribunal Federal, e que estão sendo acom-</p><p>panhados os trâmites legislativos de projetos de lei</p><p>que tratam sobre este tema. Além disso, o MMFDH</p><p>afirmou que foi criado em 2018 o Pacto Nacional de</p><p>Enfrentamento à Violência LGBTfóbica, tendo sido</p><p>ratificado por dezoito Estados da federação, e que</p><p>tem sido realizado um diagnóstico sobre a situação</p><p>de pessoas LGBTQIA+ no sistema prisional. Por fim,</p><p>o Ministério alega a inclusão de um “módulo LGBT”</p><p>no Programa Nacional de Educação Continuada em</p><p>Direitos Humanos.</p><p>Outro mecanismo do Sistema ONU de Direitos Hu-</p><p>manos é o Especialista Independente em Orientação</p><p>Sexual e Identidade de Gênero (IESOGI), criado no</p><p>ano de 2016 pela Resolução nº 32/2 do Conselho de</p><p>I S I M P Ó S I O D I V E R S I D A D E E R E S I S T Ê N C I A</p><p>B R A S Í L I A / D F 2 0 2 3</p><p>Direitos Humanos das Nações Unidas e renovado o</p><p>mandato pela Resolução nº 41/18 de 2019. Consid-</p><p>erando o disposto no artigo 1º da DUDH e as con-</p><p>stantes violações que as pessoas LGBTQIA+ sofrem</p><p>ao redor do mundo, surgiu a necessidade da criação</p><p>do mandato (atualmente exercido por Victor Madri-</p><p>gal-Borloz) do IESOGI, competindo a ele analisar tais</p><p>violações e elaborar recomendações, além de produ-</p><p>zir relatórios temáticos sobre pessoas LGBTQIA+.</p><p>A atuação do IESOGI é detalhada no plano de tra-</p><p>balho (IESOGI, 2021) para os anos de 2021, 2022 e</p><p>2023. Ao reconhecer a situação de grande vulnerabi-</p><p>lidade das pessoas LGBTQIA+ e as diversas violações</p><p>de direitos humanos praticadas em razão da discrim-</p><p>inação baseada na orientação sexual e identidade de</p><p>gênero, o plano de trabalho objetiva contribuir para</p><p>o fim da violência motivada por orientação sexual e</p><p>identidade de gênero, adotando, para tanto, obser-</p><p>vações e sugestões sobre o tema.</p><p>Almejando dois resultados claros: conceder maior</p><p>visibilidade à violência e à discriminação sofridas</p><p>pelas pessoas LGBQIA+ e apoiar medidas de com-</p><p>bate a estes problemas, o plano de trabalho adota</p><p>como abordagem o diálogo e a interseccionalidade,</p><p>e como métodos os mecanismos de visita in loco, as</p><p>comunicações individuais e as pesquisas para elabo-</p><p>ração de relatórios e afirmações, com divulgação de</p><p>seus resultados.</p><p>O IESOGI elaborou até então seis documentos chaves</p><p>sobre as pessoas LGBTQIA+ e a proteção contra a</p><p>violência e a discriminação fundada na identidade</p><p>de gênero e na orientação sexual. O primeiro foi o</p><p>relatório sobre identidade de gênero de 2018, que</p><p>considera que a “noção de que existe uma norma de</p><p>gênero, a partir da qual certas identidades de gênero</p><p>“variam” ou “partem” de uma série de preconceitos</p><p>que devem ser desafiados se toda a humanidade</p><p>deseja gozar dos direitos humanos” (IESOGI, 2018).</p><p>Além disso, este relatório demonstra que a identi-</p><p>dade de gênero não é mais um tema desconhecido</p><p>no mundo, sendo que diversos países reconhecem</p><p>legal e culturalmente a existência de outras formas</p><p>de expressão de gênero além do padrão binário,</p><p>como por exemplo o Brasil e a Argentina com o ter-</p><p>mo “travesti”, Bangladesh, Índia e Paquistão com o</p><p>termo “hijra”, e os povos tradicionais da América do</p><p>Norte com o termo “dois-espíritos”, dentre outros.</p><p>São expostos, ainda, pelo relatório, os avanços do di-</p><p>reito à saúde das pessoas trans e de gênero diverso.</p><p>Em 2019, a Organização Mundial da Saúde retirou do</p><p>rol de “desordens mentais” as pessoas trans, e criou</p><p>uma categoria de “incongruência de gênero de jovens</p><p>e adultos”, de modo a facilitar o tratamento de afir-</p><p>mação de gênero das pessoas. O relatório cuida de</p><p>determinar a responsabilidade dos Estados no recon-</p><p>hecimento das diversas identidades de gênero, com o</p><p>objetivo de facilitar que as pessoas trans e de gênero</p><p>diverso, inclusive crianças, tenham acesso de maneira</p><p>consistente ao direito à saúde, direito à liberdade de</p><p>locomoção e de estabelecer moradia, direito à segu-</p><p>rança social e de não ser discriminado, entre outros.</p><p>Por fim, o relatório ratifica as recomendações feitas</p><p>pelo Alto Comissariado das Nações Unidas para os</p><p>Direitos Humanos em 2015 para que o processo le-</p><p>gal para reconhecimento e respeito da identidade de</p><p>gênero deva ser, sempre que possível, simples, gra-</p><p>tuito, sem requisitos abusivos de ordem médica ou</p><p>legal (ter passado por procedimentos cirúrgicos, por</p><p>exemplo), reconhecer outras identidades de gênero</p><p>fora do padrão binário “masculino” e feminino, e ga-</p><p>rantir o reconhecimento da identidade de gênero de</p><p>jovens e crianças.</p><p>Depois, em 2019, o IESOGI elaborou o Relatório so-</p><p>bre Inclusão Sociocultural e Econômica de pessoas</p><p>LGBTQIA+ partindo do pressuposto de que é essen-</p><p>cial para a existência de uma sociedade inclusiva que</p><p>todas as pessoas desfrutem de proteção contra a vi-</p><p>olência e discriminação, e possam gozar de todos os</p><p>seus direitos. O relatório atravessa tópicos de vários</p><p>direitos humanos como educação, trabalho, saúde,</p><p>liberdade de locomoção e expressão, e ao final elab-</p><p>ora uma série de recomendações aos Estados-mem-</p><p>bros com o intuito de garantir a promoção e proteção</p><p>desses direitos das pessoas LGBTQIA+, e extinguir a</p><p>violência e preconceito motivados por orientação</p><p>sexual e identidade de gênero.</p><p>As recomendações propostas pelo Especialista guar-</p><p>dam certa similaridade com as recomendações da</p><p>RPU e o relatório de 2018, mas destaca a necessidade</p><p>de proporcionar um aumento de pessoas LGBTQIA+</p><p>nos espaços políticos e de tomada de decisão, so-</p><p>bretudo nas matérias que a eles concernem.</p><p>Outro documento importante é o Relatório sobre</p><p>Terapias de Conversão (IESOGI, 2020) feito em 2020.</p><p>É sabido que as terapias de conversão, definidas</p><p>pelo IESOGI como “ um termo utilizado como guar-</p><p>da-chuva para descrever intervenções de natureza</p><p>abrangente, que se baseiam na ideia de que a orien-</p><p>tação sexual ou a identidade de gênero de uma pes-</p><p>soa pode e deve ser alterada”, é uma grave forma de</p><p>violação dos direitos humanos das pessoas LGBTQIA+</p><p>no mundo e tem como agressores médicos públicos</p><p>e privados de diversas especialidades, psicólogos, in-</p><p>stituições religiosas, agentes estatais e até mesmo os</p><p>próprios familiares.</p><p>As terapias de conversão encontram fundamentos no</p><p>discurso equivocado, superado pela OMS em 2019,</p><p>de que orientação sexual e identidade de gênero</p><p>são patologias. Neste mesmo sentido a Organização</p><p>Pan-Americana de Saúdes (OPAS) e a Associação Mun-</p><p>dial de Psiquiatria, abordadas pelo IESOGI, determina-</p><p>ram que as terapias de conversão não possuem nen-</p><p>huma justificativa médica e tampouco indícios de que</p><p>a orientação sexual possa ser alterada, representando</p><p>tão somente grave ameaça à saúde e aos direitos hu-</p><p>manos das pessoas submetidas a este tratamento.</p><p>A principal recomendação deste relatório é que to-</p><p>dos os Estados adotem mecanismos de reparação</p><p>às vítimas submetidas às terapias de conversão,</p><p>mas também que adotem medidas proibitivas para</p><p>tal conduta, bem como estabeleçam definições</p><p>claras sobre quais práticas são proibidas, esta-</p><p>beleçam punições para os autores, garantam que</p><p>fundos públicos não serão usados de modo a finan-</p><p>ciar tais práticas, e que facilitem o acesso a serviços</p><p>públicos, possibilitando “o livre desenvolvimento</p><p>ou afirmação da orientação sexual e/ou identidade</p><p>de gênero” de crianças, jovens e adultos.</p><p>Por ocasião da pandemia</p><p>da COVID-19, o Especialista</p><p>Independente das Nações Unidas em proteção contra</p><p>a violência e discriminação, com base na orientação</p><p>sexual e identidade de gênero, elaborou o relatório O</p><p>Impacto da Pandemia de COVID-19 nos Direitos Hu-</p><p>manos das Pessoas LGBTQIA+ (IESOGI, 2020) sobre</p><p>as situações de vulnerabilidade em que as pessoas</p><p>LGBTQIA+ se encontram durante a crise sanitária</p><p>mundial, e propôs recomendações para os Estados.</p><p>Entre os pontos destacados no relatório, chama</p><p>atenção o aumento da violência física e psicológica</p><p>sofridas por pessoas LGBTQIA+ ao seguir as dire-</p><p>trizes de isolamento e permanência em suas casas.</p><p>Apesar de efetiva no combate à disseminação do</p><p>coronavírus, tal medida aumenta o contato de pes-</p><p>soas LGBTQIA+, em especial jovens e idosos, com</p><p>membros preconceituosos e violentos que têm estes</p><p>comportamentos ainda mais agravados em decor-</p><p>rência do estresse gerado pelo isolamento. Outros</p><p>tópicos constantes no relatório são sobre a criminal-</p><p>ização, a demonização e a patologização das pessoas</p><p>LGBTQIA+. A pandemia do COVID-19 e o cumprimen-</p><p>to das medidas de isolamento tiveram como produ-</p><p>to também o aumento de detenções arbitrárias nos</p><p>países que criminalizam as relações homoafetivas.</p><p>Além disso, pessoas LGBTQIA+ foram responsabiliza-</p><p>das por estarem disseminando, além do coronavírus,</p><p>outras doenças, e, em alguns lugares do mundo, a</p><p>pandemia foi usada como pretexto para regredir a</p><p>legislação e as políticas públicas de proteção dessas</p><p>pessoas. Para ilustrar essas questões, o relator afirma</p><p>que há declarações partindo de entidades religiosas,</p><p>grupos sociais, agentes estatais e familiares que têm</p><p>atribuído o surgimento do COVID-19 à existência de</p><p>pessoas LGBTQIA+. Como exemplo, o especialista in-</p><p>dicou 12 países de que recebeu estas declarações,</p><p>dentre eles Ucrânia, Geórgia, Turquia, Iraque, Gana,</p><p>Libéria, Zimbábue e os Estados Unidos.</p><p>As recomendações neste relatório foram as seguintes:</p><p>a) desconstruir o estigma e proteger as pessoas LGBT</p><p>da violência e da discriminação; b) projetar planos</p><p>governamentais de enfrentamento à pandemia com</p><p>base em evidências e com o envolvimento de organi-</p><p>zações LGBT; c) dar visibilidade às pessoas LGBTQIA+</p><p>nas políticas públicas; d) adotar medidas de não-dis-</p><p>criminação, empoderamento e participação de pes-</p><p>soas LGBTQIA+ como resposta à pandemia a partir</p><p>da abordagem de direitos humanos.</p><p>Ainda sobre a pandemia do COVID-19, o IESOGI</p><p>elaborou as diretrizes ASPIRE (IESOGI, 2020) “para</p><p>uma resposta à COVID-19 livre de violência e discrim-</p><p>inação com base na orientação sexual e identidade</p><p>de gênero”. São 6 pilares que sustentam as diretriz-</p><p>es ASPIRE, são eles: a) aceitação de que a população</p><p>LGBTQIA+ existe e está sendo amplamente prejudi-</p><p>cada pela pandemia do COVID-19; b) prestar suporte</p><p>aos trabalhos sobre pessoas LGBTQIA+ da sociedade</p><p>civil e dos defensores dos direitos humanos, e apren-</p><p>der com os seus resultados; c) proteger as pessoas</p><p>LGBTQIA+ e punir seus agressores, sobretudo em</p><p>violências ocorridas no contexto da pandemia; d) in-</p><p>centivar a criação de políticas públicas que combat-</p><p>am e reconheçam a discriminação indireta – oriunda</p><p>do preconceito histórico e estrutural – de que sofrem</p><p>as pessoas LGBTQIA+; e) incentivar a participação de</p><p>pessoas LGBTQIA+ nos processos de tomada de de-</p><p>cisão sobre criação, avaliação e implementação de</p><p>diretrizes que combatam a pandemia do COVID-19;</p><p>I S I M P Ó S I O D I V E R S I D A D E E R E S I S T Ê N C I A</p><p>B R A S Í L I A / D F 2 0 2 3</p><p>f) coletar evidências, processar dados e disponibilizar</p><p>acesso a remediação e reparação dos impactos da pan-</p><p>demia do COVID-19 nas vidas de pessoas LGBTQIA+.</p><p>Mecanismos do SIDH Sobre Pessoas LGBTQIA+</p><p>No âmbito do SIDH, há três principais relatórios</p><p>temáticos produzidos pela CIDH sobre direitos das</p><p>pessoas LGBTQIA+, sendo um deles o Relatório sobre</p><p>Violência Contra Pessoas LGBTI (CIDH, 2015). Foi de-</p><p>stacado no relatório a predominância de “princípios</p><p>de heteronormatividade, cisnormatividade e os</p><p>binários de sexo e gênero” (IESOGI, 2020, p. 297) nas</p><p>Américas, que ocasionam a intolerância, discrimi-</p><p>nação e preconceito, gerando as diversas agressões e</p><p>violências perpetradas contra pessoas LGBTQIA+ e a</p><p>impunidade de seus autores. Além disso, o relatório</p><p>reconheceu a responsabilidade dos Estados pelo fra-</p><p>casso na elaboração de legislação e políticas públicas</p><p>que objetivam a proteção de pessoas LGBTQIA+ ou</p><p>que assim se percebem, ou pela vigência de leis que</p><p>incentivam e criminalizam a existência deste grupo.</p><p>Consta no relatório um capítulo específico sobre as</p><p>tendências gerais identificadas pela CIDH, como a</p><p>ausência de dados e estatísticas oficiais sobre denún-</p><p>cias de violação aos direitos das pessoas LGBTQIA+,</p><p>a violência generalizada recorrente e a invisibilidade</p><p>deste problema, que resulta na banalização e na</p><p>aceitação dessas circunstâncias como sendo parte</p><p>da “vida cotidiana” destas pessoas (CIDH, 2015, p.</p><p>84). Com efeito, a sigla LGBTQIA+ engloba muitos</p><p>sujeitos e comumente alguns recebem mais visibili-</p><p>dade que outros, este fator reforça também a invisi-</p><p>bilidade das agressões sofridas por pessoas bissexu-</p><p>ais, homens trans e pessoas intersexo. Ainda sobre</p><p>a violência, ocasionada por diversos motivos, dentre</p><p>eles a demonstração pública de afeto de pessoas de</p><p>mesmo sexo, outro ponto chamou atenção da CIDH</p><p>quando da elaboração daquele relatório: a crueldade</p><p>usada nas agressões. Os crimes em que são vítimas</p><p>pessoas LGBTQIA+, em geral, são praticados com el-</p><p>evado grau de crueldade (inclui-se apedrejamento,</p><p>decapitações, queimadas e empalamentos), fato</p><p>comprovado pela Relatora Especial da ONU sobre</p><p>Violência contra a Mulher do Conselho de Direitos</p><p>Humanos – CDH (CDH, 2012) ao demonstrar que os</p><p>crimes motivados por razões de identidade de gênero</p><p>e orientação sexual guardam níveis de crueldade su-</p><p>periores aos demais crimes de ódio. Tais informações</p><p>foram reforçadas pela CIDH (CIDH, 2014), ACNUDH</p><p>(ACNUDH, 2015) e organizações da sociedade civil.</p><p>Em ocasião do relatório, a CIDH elaborou diversas</p><p>recomendações nas mais variadas frentes para os</p><p>Estados. Vale destacar como recomendações: adotar</p><p>políticas públicas e medidas para condenar os atos</p><p>de preconceito, garantir que os agentes públicos res-</p><p>peitem as pessoas LGBTQIA+ e seus direitos, impedir</p><p>que discursos sobre “moral pública” e “bons costumes”</p><p>constituam óbices para a aplicação e proteção destes</p><p>direitos, criar legislações específicas de proteção de</p><p>pessoas LGBTQIA+ e revogar disposições legais que</p><p>criminalizam as relações sexuais entre pessoas do</p><p>mesmo sexo, criar leis que garantam às pessoas tran-</p><p>sexuais o direito de retificar seu nome e o componen-</p><p>te sexo nas certidões de nascimento, documentos</p><p>de identidades e demais documentos legais, entre</p><p>outras. Além disso foram feitas recomendações tam-</p><p>bém para garantir às pessoas LGBTQIA+ a liberdade de</p><p>expressão, o acesso à justiça e aos serviços de saúde</p><p>sem serem discriminadas (destaca-se a proibição de</p><p>intervenção cirúrgica desnecessária em crianças inter-</p><p>sexo e a capacitação dos profissionais de saúde para</p><p>lidar com este público). Na educação, foram feitas</p><p>recomendações para adoção de disciplinas sobre ed-</p><p>ucação sexual e medidas que mitiguem o preconceito</p><p>contra alunos e professores LGBTQIA+, e para a segu-</p><p>rança pública foi recomendado que o Estado respeite</p><p>e extinga condutas discriminatórias – como revistas</p><p>seletivas e detenções arbitrária – contra transexuais,</p><p>gays, lésbicas, bissexuais e intersexo, bem como a ca-</p><p>pacitação dos agentes de segurança pública para lidar</p><p>com estas pessoas.</p><p>Após quatro anos daquele primeiro relatório, em</p><p>2018, a CIDH elaborou o relatório temático “Avanços</p><p>e Desafios do Reconhecimento de Direitos das Pes-</p><p>soas LGBTI nas Américas” (CIDH, 2018), com o intuito</p><p>de observar os avanços ocorridos nas Américas ao</p><p>que se refere a proteção de pessoas LGBTQIA+, mas</p><p>também as dificuldades enfrentadas pelas pessoas</p><p>com orientações</p><p>sexuais, identidade de gênero e ex-</p><p>pressões sexuais dissidentes. A exemplo das questões</p><p>avaliadas neste relatório, podem ser citados o acesso</p><p>à justiça, ao emprego e à saúde, reconhecendo que a</p><p>violência, a intolerância e os estereótipos que sofrem</p><p>estas pessoas no continente americano impedem o</p><p>exercício pleno de seus direitos humanos tanto de</p><p>primeira, quanto de segunda dimensão.</p><p>Assim, a CIDH cuidou de elaborar o relatório com</p><p>vista a “analisar o reconhecimento dado aos direitos</p><p>dessas pessoas à luz das ações legislativas, decisões</p><p>judiciais, políticas e programáticas adotadas pelos</p><p>Estados da região para reconhecer, respeitar e ga-</p><p>rantir seus direitos humanos até o momento” (CIDH,</p><p>2018), utilizando para tanto a seguintes perspectivas:</p><p>indivisibilidades dos direitos humanos civis, políticos,</p><p>econômicos, sociais e culturais, explicado na primei-</p><p>ra parte deste artigo; princípio da segurança humana</p><p>avançada, consistindo no “direito das pessoas de viv-</p><p>erem em liberdade e com dignidade, livres da pobre-</p><p>za e do desespero [... reconhecendo] que todas as</p><p>pessoas, especialmente aquelas que são vulneráveis,</p><p>têm o direito de viver livres do medo e da miséria, de</p><p>ter acesso a oportunidades iguais para desfrutar to-</p><p>dos os seus direitos e para desenvolver plenamente</p><p>seu potencial humano” (UN, 2005).</p><p>No capítulo segundo deste relatório, a CIDH reforça os</p><p>princípios constantes nos tratados internacionais de di-</p><p>reitos humanos e considerados pilares de proteção dos</p><p>direitos de pessoas LGBTQIA+ no continente america-</p><p>no, como o princípio a não discriminação, a igualdade</p><p>perante a lei, o direito à vida e à integridade pessoal, se</p><p>referindo a eles como “deveres revestidos de especial</p><p>importância para as pessoas lésbicas, gays, bissexuais,</p><p>transexuais e intersexo nas Américas” (CIDH, 2018).</p><p>A CIDH reconheceu que as atuais circunstâncias em</p><p>que se encontram as pessoas LGBTQIA+ nas Américas</p><p>decorre de um processo histórico e estrutural de per-</p><p>petuação dos preconceitos e estigmas contra essas</p><p>pessoas, mas que, por outro lado, os avanços alca-</p><p>nçados no que se refere à proteção e promoção dos</p><p>direitos deste grupo decorre de sua luta e do apoio</p><p>de organizações da sociedade civil. Não obstante, es-</p><p>tes avanços encontram-se ameaçados de regressão</p><p>e retrocesso com o advento de discursos “anti-dire-</p><p>itos LGBTQIA+ que vem crescido e proliferando nas</p><p>sociedades das Américas, até o ponto de influenciar</p><p>órgãos e instâncias governamentais” (CIDH, 2018).</p><p>Ante este cenário, a CIDH elaborou recomendações</p><p>reforçando as constantes no relatório de 2015, mas</p><p>principalmente no sentido de incentivar cada vez</p><p>mais a criação de leis e adoção de políticas públicas</p><p>– inclusive no âmbito da saúde, educação, cultura e</p><p>segurança pública – protetivas às pessoas gays, lésbi-</p><p>cas, bissexuais, transexuais e intersexo, considerando</p><p>que os avanços alcançados são importantes, mas dis-</p><p>tantes do ideal pretendido.</p><p>Por fim, a CIDH em 2020 elaborou um último relatório</p><p>temático com o tema “Relatório sobre Pessoas Trans</p><p>e de Gêneros Diversos e seus direitos econômicos,</p><p>sociais, culturais e ambientais”. O objetivo deste é</p><p>apresentar quais medidas têm sido adotadas pelos</p><p>Estados Americanos para mitigar a violência, o pre-</p><p>conceito e a exclusão estrutural que sofrem as pes-</p><p>soas trans e de gêneros diversos ao expressar sua</p><p>identidade de gênero, além de demonstrar como es-</p><p>tas pessoas têm gozado de seus direitos econômicos,</p><p>sociais, culturais e ambientais (adiante chamados de</p><p>DESCA), além de expor as dificuldades e os impedi-</p><p>mentos no exercício destes direitos.</p><p>Este último relatório apresentou diferenças e semel-</p><p>hanças em relação aos outros dois que merecem des-</p><p>taque neste artigo, sendo que a primeira e a principal</p><p>diferença é a concentração nos direitos das pessoas</p><p>trans (mulheres trans, homens trans, travestis, tran-</p><p>sexuais e transgêneros) e com identidade de gênero</p><p>diverso (pessoas não-binárias e de identidade ances-</p><p>tral), ao invés de estudo geral sobre todos os sujeitos</p><p>que compõem a sigla LGBTQIA+. Outra importante</p><p>diferença, que será vista mais à frente, é que este</p><p>relatório cuidou de dedicar um tópico somente sobre</p><p>os efeitos da pandemia da COVID-19 (causada pelo</p><p>vírus SarsCOV-2) na vida destas pessoas. Ademais, o</p><p>relatório apresentou tal como os outros, tópicos so-</p><p>bre direito a educação e cultura, saúde, segurança,</p><p>trabalho e condições dignas de trabalho etc.</p><p>Como visto, as pessoas trans e com gêneros diver-</p><p>sos se encontram em um nível diferente de vulner-</p><p>abilidade em relação aos demais sujeitos abarcados</p><p>pela sigla. Fatores como os altos índices de violência</p><p>e discriminação, a baixa expectativa de vida e o fato</p><p>de que muitas vezes estes estigmas são perpetrados</p><p>pelos próprios agentes dos Estados, reafirmando</p><p>a conclusão alcançada pela CIDH quando elaborou</p><p>o “Relatório sobre pobreza e direitos humanos nas</p><p>Américas” (CIDH, 2017, p. 187): “pessoas trans e</p><p>de gênero diverso são aquelas que estão expostas a</p><p>níveis mais elevados de vulnerabilidade e tendem a</p><p>sofrer níveis mais elevados de exclusão social, estig-</p><p>ma e preconceito” (CIDH, 2020, p. 12). Diante deste</p><p>cenário de vulnerabilidade e de diversas barreiras</p><p>enfrentadas pelas pessoas trans e de gênero diver-</p><p>so desde a mais tenra idade, quando surgem os pri-</p><p>meiros indícios da expressão de gênero, praticadas</p><p>pelo núcleo familiar, agentes do Estados e a socie-</p><p>dade como um todo influíram na elaboração deste</p><p>relatório temático.</p><p>Sobre a pandemia do COVID-19, foi reconhecido que</p><p>as pessoas LGBTQIA+ foram particularmente atingi-</p><p>das em razão das “condições preexistentes de dis-</p><p>I S I M P Ó S I O D I V E R S I D A D E E R E S I S T Ê N C I A</p><p>B R A S Í L I A / D F 2 0 2 3</p><p>criminação, além do fato de que, segundo a CIDH,</p><p>as pessoas trans e de gênero diverso estão invisíveis</p><p>ante “a formulação de políticas para responder a</p><p>emergências nacionais e globais, incluindo planos</p><p>de assistência humanitária e reativação econômi-</p><p>ca”. Nesse sentido, as recomendações elaboradas</p><p>pela CIDH vão desde a inclusão deste grupo em</p><p>programas de reinserção econômica, promoção de</p><p>políticas públicas que garantam a continuidade de</p><p>serviços médicos e o respeito à identidade de gêne-</p><p>ro das pessoas trans e de gênero diversos no âm-</p><p>bito hospitalar, e adoção de protocolos de atenção</p><p>à saúde e denúncias por violência doméstica, com</p><p>vista a conferir segurança a este grupo.</p><p>Noutro giro, as demais recomendações propostas</p><p>pela CIDH são semelhantes às dos demais relatórios</p><p>estudados, a exemplo: adoção de medidas legislati-</p><p>vas, judiciais e administrativas de modo a garantir o</p><p>exercício do direito ao nome social e identidade de</p><p>gênero; adoção de ações afirmativas para garantir o</p><p>exercício e gozo dos DESCA, de modo a romper bar-</p><p>reiras históricas e estruturais de preconceito; garan-</p><p>tir a capacitação e educação de pessoas trans e de</p><p>gênero diverso, não se limitando à educação básica</p><p>e atingindo a rede pública, privada e público-privada</p><p>de ensino; inserção de componente curricular nas</p><p>escolas sobre educação em direitos; capacitação de</p><p>funcionários públicos sobre identidade de gênero;</p><p>proibição do uso de “exceções de consciência” por</p><p>parte dos agentes públicos e professionais de modo</p><p>a discriminar as pessoas trans e de gênero diverso.</p><p>CASOS DA CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS</p><p>A última parte deste artigo tem como objeto o es-</p><p>tudo de três decisões da Corte IDH que se relacio-</p><p>nam com direitos de pessoas LGBTQIA+, quais sejam:</p><p>Caso Flor Freire Vs. Ecuador, Caso Atala Riffo e Filhas</p><p>Vs. Chile, e Caso Duque Vs. Colômbia. Será dado foco</p><p>nos direitos humanos que foram reconhecidos pela</p><p>Corte IDH e nas medidas de reparação determinadas</p><p>aos Estados.</p><p>Caso Atala Riffo e Filhas Vs. Chile</p><p>O Caso Atala Riffo e Crianças Vs. Colômbia foi rece-</p><p>bido pela Corte IDH no dia 17 de setembro de 2010</p><p>(CORTE IDH, 2012), alegando o não cumprimento</p><p>pela Colômbia (Estado) das recomendações constan-</p><p>te no Relatório de Mérito elaborado</p><p>pela CIDH.</p><p>Karen Atala (vítima), juíza (CORTE IDH, 2012, p. 15)</p><p>e lésbica, se divorciou de López Allandes em março</p><p>de 2002 e consensualmente, ficou com a guarda das</p><p>três filhas. Em novembro de 2002, Emma de Ramón,</p><p>companheira de Karen, se mudou para a casa da víti-</p><p>ma e passou a conviver com a companheira e as fil-</p><p>has. Ao tomar ciência da relação de Karen e Emma,</p><p>e da convivência que o casal tinha com as filhas,</p><p>López Allandes ingressou em janeiro de 2003 com</p><p>um processo requerendo a guarda das filhas (CORTE</p><p>IDH, 2012, p. 14). Dentre as alegações do autor con-</p><p>stava que a convivência das crianças com um casal</p><p>homossexual colocaria em risco o seu desenvolvi-</p><p>mento físico e emocional por não ser uma convivên-</p><p>cia sadia, justa e normal, além de desnaturalizar o</p><p>sentido do “casal humano” (homem-mulher), violar</p><p>os princípios fundamentais de família e colocar as</p><p>crianças sob o risco de sofrerem discriminação em</p><p>função da sexualidade da mãe. Naquela época o caso</p><p>tomou grande repercussão nacional vinculando a im-</p><p>agem da Sra. Atala ao uso indevido de recursos do</p><p>Tribunal Penal de Villarica, onde exercia a jurisdição</p><p>(CORTE IDH, 2012, p. 15).</p><p>Na primeira instância, o Juizado de Menores de Villa-</p><p>rica concedeu ao pai a guarda provisória das crianças</p><p>(CORTE IDH, 2012, p. 17). Mesmo reconhecendo que</p><p>nos autos não existiam elementos suficientes para</p><p>presumir a incapacidade da Sra. Atala, o magistrado,</p><p>que depois foi afastado como suspeito (CORTE IDH,</p><p>2012, p. 18), fundamentou sua decisão alegando que</p><p>a demandada sobrepôs seus interesses pessoais em</p><p>relação ao seu papel materno e que aquela convivên-</p><p>cia das crianças com um casal homossexual teria al-</p><p>terado a normalidade da rotina familiar. Ainda na pri-</p><p>meira instância, com o impedimento por suspeição</p><p>do primeiro magistrado, uma outra juíza assumiu o</p><p>caso e proferiu a sentença de primeiro grau.</p><p>Em sentença, a juíza expos que “a orientação sexu-</p><p>al da demandada não representava impedimento</p><p>para o desenvolvimento de uma maternidade re-</p><p>sponsável” (CORTE IDH, 2012, p. 18) e não foram</p><p>apresentados indícios concretos do risco que estar-</p><p>iam expostas as crianças. Defendendo que a homos-</p><p>sexualidade não se trata de patologia, a magistrada</p><p>fundamentou sua decisão, além das provas dos au-</p><p>tos, em diversos relatórios produzidos pela Organi-</p><p>zação Pan-Americana de Saúde, Departamento de</p><p>Psicologia da Universidade do Chile e Faculdade de</p><p>Educação da Pontifícia Universidade Católica do Chile</p><p>(CORTE IDH, 2012, p. 18).</p><p>Inconformado com a decisão de primeiro grau, o pai</p><p>das crianças apresentou apelação (CORTE IDH, 2012,</p><p>p. 20) perante o Tribunal de Recursos de Temuco</p><p>requerendo mandado de segurança provisório para</p><p>manter a guarda das filhas, o que inicialmente foi</p><p>concedido (CORTE IDH, 2012, p. 20), mas depois o</p><p>mesmo Tribunal não reformou a sentença de pri-</p><p>meiro grau e a acolheu plenamente (CORTE IDH,</p><p>2012, p. 20). Novamente inconformado, em abril de</p><p>2004 o pai das crianças ingressou perante a Corte Su-</p><p>prema do Chile com o recurso de queixa (CORTE IDH,</p><p>2012, p. 14), que foi acolhido e deferido o pedido</p><p>de guarda definitiva para o recorrente (CORTE IDH,</p><p>2012, p. 21) alegando, dentre outras coisas, o inter-</p><p>esse superior das crianças (CORTE IDH, 2012, p. 21).</p><p>Ante os fatos, a Corte IDH, ressaltando que não se</p><p>trata de uma quarta instância (CORTE IDH, 2012, p.</p><p>24), não avaliou no presente caso qual dos pais te-</p><p>ria melhores condições de proporcionar as filhas o</p><p>melhor lar. A Corte IDH se limitou a avaliar a conduta</p><p>dos tribunais (CORTE IDH, 2012, p. 24), especifica-</p><p>mente da Suprema Corte do Chile e do Juizado de</p><p>Menores de Villarica (em função da decisão de guar-</p><p>da provisória), que teria sido discriminatória e viola-</p><p>dora dos direitos humanos constantes na Convenção</p><p>Americana sobre Direitos Humanos.</p><p>A Corte IDH reconheceu que foi violado o direito da</p><p>Sra. Karen Atala em obter do Estado prestação juris-</p><p>dicional sem qualquer discriminação, fundamentan-</p><p>do nos artigos 1.1 e 24 da Convenção Americana so-</p><p>bre Direitos Humanos (CORTE IDH, 2012, p. 14). Em</p><p>que pese a alegação do Estado (CORTE IDH, 2012,</p><p>p. 27) de que carecia, em plano internacional, es-</p><p>pecificamente na OEA, consenso sobre a categoria</p><p>“orientação sexual” como protegida no artigo 1.1 da</p><p>Convenção, a Corte IDH manifestou que a expressão</p><p>“sem discriminação alguma” deixa claro que aquele</p><p>não é um rol exaustivo, cabendo sempre ser inter-</p><p>pretado como a “opção mais favorável à pessoa e</p><p>da evolução dos direitos fundamentais no Direito In-</p><p>ternacional Contemporâneo”. Ademais, a Corte IDH</p><p>cuidou de demonstrar que em plano internacional já</p><p>existem diversas normas e órgãos que entenderam a</p><p>vedação à discriminação de qualquer natureza como</p><p>a Convenção Internacional sobre a Eliminação de To-</p><p>das as Formas de Discriminação Racial, Convenção</p><p>sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discrimi-</p><p>nação contra a Mulher, Comitê de Direitos Humanos</p><p>do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políti-</p><p>cos (CORTE IDH, 2012, p. 28), Comitê de Direitos</p><p>Econômicos, Sociais e Culturais (CORTE IDH, 2012, p.</p><p>30), Declaração sobre Direitos Humanos, Orientação</p><p>Sexual e Identidade de Gênero (CORTE IDH, 2012, p.</p><p>32), dentre outros.</p><p>Foi reconhecido que “o Estado violou o direito à ig-</p><p>ualdade, consagrado no artigo 24, em relação ao ar-</p><p>tigo 1.1. da Convenção Americana, em detrimento</p><p>de Karen Atala Riffo” (CORTE IDH, 2012, p. 49), isto</p><p>porque, embora tenha havido alegação do interes-</p><p>se superior da criança, o Estado não demonstrou de</p><p>forma clara e objetiva (CORTE IDH, 2012, p. 36) quais</p><p>seriam os prováveis riscos a que estariam expostas as</p><p>crianças, fundamentando suas decisões em especu-</p><p>lações e percepção estereotipada sobre orientação</p><p>sexual (CORTE IDH, 2012, p. 49). Ainda, constatando</p><p>que as crianças foram afetadas com a discriminação</p><p>perpetrada contra sua mãe e pela separação arbi-</p><p>trária (CORTE IDH, 2012, p. 56), a Corte IDH deter-</p><p>minou que o Estado violou o artigo 24 c/c artigos 1.1</p><p>e 19, todos da Convenção (CORTE IDH, 2012, p. 51),</p><p>bem como o artigo 17.1 da mesma Convenção por</p><p>não terem tido a sua família gozado da proteção do</p><p>Estado (CORTE IDH, 2012, p. 56).</p><p>A Corte IDH reconheceu que as ingerências arbi-</p><p>trárias do Estado e a discriminação usada como fun-</p><p>damentação nas decisões judiciais constitui violação</p><p>ao artigo 11.2 em relação ao artigo 1.1 (direito à vida</p><p>privada), ambos da Convenção (CORTE IDH, 2012, p.</p><p>53). Noutro giro, consta nos autos do processo que as</p><p>crianças foram ouvidas apenas uma vez no primeiro</p><p>grau, como exercício do direito previsto no artigo 8.1</p><p>da Convenção. Foram usadas as opiniões quando da</p><p>sentença primária, mas nas instâncias recursais não</p><p>foram levadas em consideração, já que elas manife-</p><p>staram interesse em continuar morando com a mãe</p><p>a decisão foi em sentido contrário, demonstrando</p><p>assim ausência de parcialidade na análise do mérito</p><p>(CORTE IDH, 2012, p. 72). Desse modo, a Corte con-</p><p>sidera como violados os direitos previstos nos artigos</p><p>8.1, 19 e 1.1, todos da Convenção (CORTE IDH, 2012,</p><p>p. 65).</p><p>I S I M P Ó S I O D I V E R S I D A D E E R E S I S T Ê N C I A</p><p>B R A S Í L I A / D F 2 0 2 3</p><p>Como reparações, a Corte IDH determinou a</p><p>obrigação do Estado de fornecer atendimento</p><p>médico e psicológico por até quatro anos (CORTE</p><p>IDH, 2012, p. 75), publicação do resumo oficial da</p><p>sentença uma só vez no Diário Oficial e em algum</p><p>jornal de grande circulação nacional, publicação da</p><p>sentença na integra pelo prazo de um ano em página</p><p>eletrônica oficial (CORTE IDH, 2012, p. 76). Ao Esta-</p><p>do foi determinado a realização de um ato público</p><p>fazendo referência às violações de direitos humanos</p><p>reconhecidas pela Corte IDH, assegurando a partici-</p><p>pação das vítimas, do Poder Judiciário e de pessoas</p><p>de “alta hierarquia”, a ser definido pela Estado.</p><p>As garantias de não repetição foram no sentido de</p><p>o Estado fornecer programas, cursos e capacitações</p><p>(CORTE IDH, 2012, p. 78) dirigidos a funcionários pú-</p><p>blicos – regionais</p><p>tividade. Vale assinalar que se resume a uma luta</p><p>ligada à sexualidade; ela se volta também para um</p><p>combate contra falsos valores que são usados como</p><p>justificativas para a discriminação. Trata-se de uma</p><p>luta que envolve não apenas LGBTs, e sim, todos</p><p>os que são vistos como impossibilitados de fazer-</p><p>em parte da escala da normalidade. As escolas ex-</p><p>ercem grande influência na constituição moral dos</p><p>indivíduos, repassando aos alunos os valores vigen-</p><p>tes. Praticamente todas as instituições funcionam</p><p>sob o clima ideológico do heterossexismo. A escola,</p><p>é muitas das vezes, o local onde, muito antes até</p><p>de saber sobre sexo, a criança aprende o que deve</p><p>ser o feminino e o masculino. Dito de outro modo,</p><p>a diferença é uma das primeiras marcas que apren-</p><p>demos no processo escolar, quando, na verdade, as</p><p>crianças deveriam aprender que antes de sermos</p><p>meninas ou meninos somos seres humanos. Em</p><p>contraposição, o que novas propostas pedagógicas</p><p>evidenciam é que novas práticas escolares sejam</p><p>propostas para que a variedade de desejos e de</p><p>comportamentos sexuais seja incluída num mesmo</p><p>currículo, evitando assim, a abjeção tão comum nas</p><p>escolas atuais. Em suma, a teoria queer apresen-</p><p>ta-se como essa proposta, como uma ferramenta</p><p>teórica e política de emancipação efetiva dos “anor-</p><p>mais” da sociedade da heteronormatividade. No</p><p>caso da pedagogia em específico, ela pode ajudar</p><p>a moldar racionalidades e sensibilidades mais toler-</p><p>antes e mais inclinadas para a empatia. Nesse sen-</p><p>tido, a reflexão filosófica inserida nos currículos das</p><p>escolas poderia contribuir na aquisição de maior</p><p>autonomia para compreender e criticar sentidos,</p><p>conceitos e valores que possam sulear a prática das</p><p>vivências singularizadas no mundo.</p><p>PALAVRAS-CHAVE: Pedagogia transgressora;</p><p>Gêneros; Sexualidades; Teoria Queer; Prática Esco-</p><p>lar; Violências.</p><p>ABSTRACT</p><p>The present text aims to critique the heterosex-</p><p>ist pedagogy that persists among the practices of</p><p>various educators. In light of this and drawing on</p><p>queer theory and its vision of a more pluralistic</p><p>school and a more tolerant future adult, it is pos-</p><p>sible to rethink the significant space through phil-</p><p>osophical reflection so that moral, sexual, ethical,</p><p>and political components can truly integrate into</p><p>the pedagogy of schools. Queer theory, in turn, has</p><p>solidified as an intellectual current, with some of its</p><p>main philosophical sources being the contributions</p><p>of Foucault, Butler, and Sedwick on sexualities. In</p><p>this direction, queer theory has developed a strong</p><p>critique against the naturalizing premises used by</p><p>conservatism to justify and legitimize discrimina-</p><p>tion and heteronormativity. It’s worth noting that</p><p>this struggle is not limited to sexuality; it also in-</p><p>volves a fight against false values that are used as</p><p>justifications for discrimination. It’s a battle that en-</p><p>compasses not only gays but all those who are seen</p><p>as unable to fit into the scale of normalcy. Schools</p><p>have a significant influence on the moral develop-</p><p>ment of individuals, imparting the prevailing values</p><p>to students. Virtually all schools operate under the</p><p>ideological climate of heterosexism. School, often,</p><p>is the place where, long before children even know</p><p>about sex, they learn what should be feminine and</p><p>masculine. In other words, difference is one of the</p><p>first distinctions we learn in the educational process</p><p>when, in reality, children should learn that before</p><p>being girls or boys, they are human beings. In con-</p><p>trast, what new pedagogical proposals highlight is</p><p>that new school practices should be suggested so</p><p>that a variety of desires and sexual behaviors are</p><p>included in the same curriculum, thus avoiding the</p><p>common abjection in today’s schools. In summary,</p><p>queer theory presents itself as this proposal, as a</p><p>theoretical and political tool for the effective eman-</p><p>cipation of those deemed “abnormal” by the norms</p><p>of heteronormativity. In the case of pedagogy in</p><p>particular, it can help shape rationalities and sensi-</p><p>bilities that are more tolerant and inclined toward</p><p>empathy. In this regard, philosophical reflection in-</p><p>tegrated into school curricula could contribute to</p><p>greater autonomy in understanding and critiquing</p><p>the meanings, concepts, and values that may guide</p><p>the practices of unique experiences in the world.</p><p>KEYWORDS: Transgressive Pedagogy; Gender; Sex-</p><p>uality; Queer Theory; School Practice; Violence.</p><p>INTRODUÇÃO</p><p>Ao começarmos a escrever este presente texto par-</p><p>timos de uma indagação do porque o ambiente es-</p><p>colar não trata dos assuntos ligados às questões de</p><p>gênero e sexualidades? Ou entende-se que o diálo-</p><p>go nas escolas não acontece porque os professores</p><p>não tiveram uma formação ou, simplesmente, não</p><p>interessam fazê-lo? São com essas perguntas su-</p><p>leadoras1 que propomo-nos dialogar, levantar uma</p><p>discussão sobre gêneros, sexualidades e a esco-</p><p>la, mas de uma forma mais focada ao expressar o</p><p>cotidiano escolar e os impactos da teoria queer face</p><p>à pedagogia heterossexista.</p><p>Sobre as nossas indagações, comumente escutamos</p><p>que a maior parte da docência não teve formação</p><p>acadêmica sobre os temas supracitados. Contudo,</p><p>mesmo não havendo esse debate nos cursos de</p><p>licenciaturas, destacamos aqui estudiosas e estu-</p><p>diosos dessa temática, por exemplo as produções</p><p>de Deborah Britzman (1996), Guacira Louro (1997,</p><p>2003),Luma Nogueira de Andrade (2015), Richard</p><p>Miskolci (2012) e Tomaz Tadeu Silva (1999), além de</p><p>uma produção a nível de Bahia, de Amanaiara Con-</p><p>ceição de Santana Miranda (2014), Carla Freitas dos</p><p>Reis (2017), Denise Bastos de Araújo (2017), Elisete</p><p>Santana da Cruz França (2011), Izaura Santiago da</p><p>Cruz (2017) e Douglas Kellner ( 1995).</p><p>Percebe-se que há muita produção acerca da</p><p>temática, o que torna viável estudos e debates so-</p><p>1. A palavra “suleadora” tem como objetivo, neste texto, o propósito de decolonizar a ideia de “norte”, no qual por uma questão</p><p>histórica é utilizado como o caminho, ou melhor, direcionamento. Por sua vez, o Sul é tido como margens tanto na exploração</p><p>do capital quanto na produção de conhecimentos. Sendo assim, utiliza-se ora aqui o neologismo “sulear” com intuito de romper</p><p>paradigmas transcendental da produção do conhecimento advindo do norte global. (THÜRLER, 2019, p. 12)</p><p>bre a mesma no campo educacional. Neste sentido,</p><p>resta aos educadores debruçarem-se sobre leituras</p><p>e informações acerca do tema. Louro (2008) aponta</p><p>que na educação, as práticas de ignorâncias sempre</p><p>foram datadas pela falta de conhecimento e repudia</p><p>debates dissidentes no campo escolar. A implicação</p><p>do sujeito nas suas ações pedagógicas se constitui</p><p>em outra dificuldade de abordagem dos conteúdos</p><p>de gênero e sexualidade. “[...] no campo da edu-</p><p>cação, a ignorância sempre foi concebida como o</p><p>outro do conhecimento e, então, repudiada. Agora,</p><p>a ideia é compreendê-la como implicada no conhe-</p><p>cimento, o que, surpreendentemente, leva a con-</p><p>siderá-la valiosa” (LOURO, 2009, p.68).</p><p>A implicação do sujeito nas suas ações pedagógicas</p><p>se constitui em outra dificuldade de abordagem dos</p><p>conteúdos de gêneros e sexualidades. É a implicação</p><p>da autoria do discurso, do seu lugar de fala e de seus</p><p>interesses políticos. Portanto, qualquer docente, em</p><p>sala de aula, é um sujeito implicado porque vai se ex-</p><p>pressar a partir de seu ponto de vista. Nesse sentido,</p><p>uma das questões mais presentes, na atualidade, é</p><p>o discurso religioso fundamentalista, como dito an-</p><p>teriormente. Mesmo com a Constituição Federal de</p><p>1988 proclamando o Estado brasileiro como laico.</p><p>Ainda, emerge a dificuldade discursiva da docência,</p><p>quando as suas próprias crenças impossibilitam o</p><p>mergulho na diversidade.</p><p>Uma outra razão para não tratar do tema diversi-</p><p>dade sexual e de gênero seria a proteção das cri-</p><p>anças. Nesse sentido, vale frisar as considerações</p><p>de Foucault (2009) quando trata da sexualidade e</p><p>as crianças. Assim, nos possibilita pensar a escola</p><p>como uma fábrica de construção de corpos dóceis.</p><p>O filósofo diz que as crianças nascem</p><p>e nacionais, com ênfase no Poder</p><p>Judiciário, com os seguintes temas: direitos humanos,</p><p>orientação sexual e não discriminação; proteção e</p><p>respeito dos direitos de pessoas LGBTQIA+; discrimi-</p><p>nação e superação dos estereótipos de gênero con-</p><p>tra pessoas LGBTQIA+. Noutro giro, foram pleiteadas</p><p>a reforma e a adequação das leis de direito interno,</p><p>pedido julgado improcedente pela Corte IDH (CORTE</p><p>IDH, 2012, p. 80), contudo, com base no controle de</p><p>convencionalidade, foi determinado que os tribunais</p><p>e órgãos administrativos fundamentassem as suas de-</p><p>cisões e atuações conforme jurisprudência da Corte</p><p>IDH no caso em comento (CORTE IDH, 2012, p. 81).</p><p>Nas indenizações compensatórias, a Corte IDH consid-</p><p>erou as despesas em função do tratamento médico e</p><p>psicológico e determinou ao Estado o pagamento de</p><p>US$10.000,00 (dez mil dólares americanos dos Estados</p><p>Unidos da América) a título de danos materiais (CORTE</p><p>IDH, 2012, p. 83). Já nos danos imateriais, a Corte IDH</p><p>reconheceu os danos causados à Sra. Karen Atala e suas</p><p>filhas, determinando o pagamento pelo Estado do valor</p><p>de US$20.000,00 (vinte mil dólares americanos dos Es-</p><p>tados Unidos da América) à Sra. Atala e US$10.000,00</p><p>(dez mil dólares americanos dos Estados Unidos da</p><p>América) para cada uma das três crianças.</p><p>O Caso Atala Riffo e Crianças Vs. Chile retrata como</p><p>a discriminação em razão da orientação sexual não</p><p>se restringe à posição social das pessoas. Pelo fato</p><p>de Karen Atala Riffo ser juíza de direito no Chile e</p><p>ainda assim ter sofrido uma série de interferências</p><p>do Estado em sua vida privada e ter sido vítima de</p><p>discriminação no decorrer do processo, inclusive nas</p><p>sentenças, reforça que o estigma existente ao redor</p><p>de pessoas LGBTQIA+ é grande ao ponto de não im-</p><p>portar o lugar social que a pessoa ocupa.</p><p>Por outro lado, a vítima parece ter sido punida por sua</p><p>orientação sexual mesmo em um processo de guarda</p><p>pois, com todos os indícios de que a casa da vítima</p><p>era um ambiente propício ao desenvolvimento das</p><p>crianças, sequer foi levada em consideração a mani-</p><p>festação de vontade das crianças quando da tomada</p><p>de decisão dos julgadores. Assim, a Corte IDH adotou</p><p>todas as medidas de reparação possíveis para trazer à</p><p>Sra. Atala e suas filhas a dignidade perdida em razão</p><p>do processo discriminatório adotado pelo Estado.</p><p>Caso Duque Vs. Colômbia</p><p>O caso Duque Vs. Colômbia foi submetido à Corte IDH</p><p>em 21 de outubro de 2014 (CORTE IDH, 2016, p. 4) pela</p><p>CIDH após o não cumprimento das recomendações</p><p>propostas no Relatório de Mérito. Narra a sentença</p><p>que Ángel Alberto Duque conviveu com J.O.J.G como</p><p>casal até 15 de setembro de 2001, e quando seu</p><p>companheiro faleceu, em decorrência da Síndrome</p><p>de Imunodeficiência Adquirida, Duque entrou em</p><p>contato com a Companhia Colombiana de Pensões e</p><p>Previdência (COLFONDOS S.A.) solicitando quais docu-</p><p>mentos e diligências deveriam ser realizadas para ad-</p><p>quirir a pensão de sobrevivência de seu companheiro</p><p>(CORTE IDH, 2016, p. 29). A COLFONDOS informou ao</p><p>Sr. Duque que ele não ostentava a qualidade de ben-</p><p>eficiário, isto porque a lei colombiana sobre seguri-</p><p>dade social determinava como único beneficiário da</p><p>pensão por morte do companheiro o cônjuge sobrevi-</p><p>vente, desde que de uma relação heterossexual.</p><p>Ante a negativa e considerando que não possuía em-</p><p>prego (fonte de renda) e vivia com HIV C3, Duque in-</p><p>gressou em 2002 com pedido de tutela antecipada</p><p>(CORTE IDH, 2016, p. 23) para receber a pensão já</p><p>que precisava do dinheiro para dar continuidade ao</p><p>tratamento, enquanto não se ingressava com a ação</p><p>judicial propriamente dita. O pedido foi negado pelo</p><p>Décimo Tribunal Civil Municipal de Bogotá (CORTE</p><p>IDH, 2016, p. 24) e, em sede de impugnação, a sen-</p><p>tença foi mantida pelo Décimo Segundo Tribunal</p><p>Civil do Circuito de Bogotá. Posteriormente, a Corte</p><p>Constitucional da Colômbia (CORTE IDH, 2016, p. 25)</p><p>passou a conceder a pensão de sobrevivência tam-</p><p>bém aos casais homossexuais.</p><p>Com base nos fatos acima expostos, a Corte IDH anal-</p><p>isou em sua sentença a resposta dada pela COLFON-</p><p>DOS ao Sr. Duque quando do pedido de pensão, e as</p><p>sentenças proferidas pelos juízos do Décimo Tribunal</p><p>Civil Municipal de Bogotá e Décimo Segundo Tribu-</p><p>nal Civil do Circuito de Bogotá (CORTE IDH, 2016, p.</p><p>36). Bem como nos casos anteriormente analisados,</p><p>a Corte IDH cuidou de determinar em sua sentença</p><p>que a orientação sexual e a identidade de gênero são</p><p>categorias protegidas pela Convenção Americana so-</p><p>bre Direitos Humanos (CORTE IDH, 2016, p. 31) e por</p><p>diversos outros tratados internacionais (CORTE IDH,</p><p>2016, p. 28), além de julgados de órgãos internacio-</p><p>nais de direitos humanos, sendo, portanto, vedada a</p><p>discriminação de pessoa por qualquer característica.</p><p>Os direitos reconhecidos como violados se referem</p><p>ao direito à igualdade e ao direito a não discrimi-</p><p>nação, notadamente elencados nos artigos 1.1 e</p><p>24, ambos da Convenção Americana sobre Direitos</p><p>Humanos (CORTE IDH, 2016, p. 39). A Corte IDH,</p><p>em conformidade com o relatório da CIDH e as ale-</p><p>gações dos representantes da vítima (CORTE IDH,</p><p>2016, p. 29), ressaltou que as violações em comento</p><p>se deram por dois motivos: o primeiro é a existência</p><p>de lei interna discriminatória, uma vez que as pes-</p><p>soas homossexuais, isto é, que se relacionam com</p><p>pessoas do mesmo sexo, estariam excluídas do re-</p><p>gime de pensão da Colômbia; o segundo se refere</p><p>à atuação discriminatória das autoridades internas.</p><p>Neste último ponto, a Corte IDH se manteve em con-</p><p>cordância com o julgado da Corte Constitucional da</p><p>Colômbia, que explicitava a diferença de tratamento</p><p>entre casais homossexuais e casais heterossexuais</p><p>para aquisição de pensão, e definiu como discrimi-</p><p>natórios diversos dispositivos da legislação interna</p><p>sobre seguridade social (CORTE IDH, 2016, p. 31).</p><p>Por fim, a Corte IDH definiu algumas reparações a</p><p>serem realizadas ao Estado responsabilizado pelos</p><p>fatos e violações expostas, isto é, obrigações para</p><p>a Colômbia. Primeiramente, foi determinada uma</p><p>medida de restituição (CORTE IDH, 2016, p. 54). Se-</p><p>gundo a Corte IDH, a COLFONDOS deverá conceder</p><p>tramitação prioritária em novo processo de recon-</p><p>hecimento de pensão devida ao Sr. Duque, não po-</p><p>dendo demorar mais que 3 meses para ser resolvido,</p><p>inclusive o pagamento dos juros. Como medida de</p><p>satisfação (CORTE IDH, 2016, p. 55), foi determina-</p><p>da a publicação das partes mais relevantes da sen-</p><p>tença em análise no Diário Oficial, e em um jornal</p><p>de grande circulação deverá ser publicado o resumo</p><p>oficial da sentença, ambas as publicações deveriam</p><p>ocorrer em prazo não superior a 6 meses da notifi-</p><p>cação sobre esta sentença.</p><p>Não foram deferidos os pedidos sobre outras me-</p><p>didas de reparação solicitadas pelos representantes</p><p>(CORTE IDH, 2016, p. 57) ou medidas de reabilitação.</p><p>Em que pese o dano material, a Corte IDH deixou</p><p>de reconhecer como devida tal medida em razão</p><p>do “dano incerto ou eventual, além disso, a perda</p><p>de receita que poderia ser declarada internamente</p><p>seria compensada com o reconhecimento retroativo</p><p>da pensão”. Noutro giro, em razão do sofrimento do</p><p>Sr. Duque todas as vezes que não lhe foi concedida a</p><p>pensão por sobrevivência, a Corte IDH determinou</p><p>que o Estado pagasse o montante de US$10.000,00</p><p>(dez mil dólares dos Estados Unidos da América)</p><p>como danos imateriais (CORTE IDH, 2016, p. 59).</p><p>No Caso Duque Vs. Colômbia, são irrefutáveis os fa-</p><p>tos e os prejuízos sofridos pelo Sr. Duque que deram</p><p>origem a este processo. Contudo, mesmo sabendo</p><p>que a vítima vivia com HIV e, portanto, precisava</p><p>do dinheiro para dar continuidade ao tratamento, a</p><p>Corte IDH se furtou de reconhecer como violados os</p><p>direitos referentes à vida e à dignidade, se limitando</p><p>a reconhecer a violação do direito à proteção judicial.</p><p>Merece atenção o fato de que o primeiro pedido de</p><p>pensão ocorreu em 2002, e o processo só foi decidi-</p><p>do em 2015, ou seja, foram 13 anos que o Sr. Duque</p><p>viveu e se manteve sem a pensão que era de seu</p><p>direito. Nesse sentido, considerando os</p><p>fatos con-</p><p>stantes na própria sentença de que o Sr. Duque não</p><p>trabalhava, faltou a Corte IDH fazer uma análise dos</p><p>impactos mediatos na vida da vítima e não se limitar</p><p>a reconhecer como violação a discriminação sofrida</p><p>no decorrer do processo.</p><p>Caso Flor Freire Vs. Equador</p><p>No presente caso, a Corte IDH não chegou a um con-</p><p>senso sobre os fatos ocorridos no dia 19 de novem-</p><p>bro de 2000, isto porque foram apresentadas duas</p><p>versões distintas e nenhuma delas foi capaz de apre-</p><p>sentar elementos probatórios suficientes para confir-</p><p>mar uma e descaracterizar a outra (CORTE IDH, 2016,</p><p>p. 17), assim, a Corte IDH adotou as duas versões</p><p>como base do julgamento. Na primeira versão, apre-</p><p>sentada por funcionários das forças militares equa-</p><p>torianas, o Sr. Homero Flor Freire (tenente) teria</p><p>sido surpreendido dentro de sua habitação militar</p><p>praticando “atos de homossexualismo” com outro</p><p>soldado, isto é, sexo oral (CORTE IDH, 2016, p. 25).</p><p>Tais fatos foram assumidos como verdadeiros em oc-</p><p>asião da decisão do Juízo de Direito da 4º Zona Mili-</p><p>tar Equatoriana, em procedimento interno de 17 de</p><p>janeiro de 2001.</p><p>I S I M P Ó S I O D I V E R S I D A D E E R E S I S T Ê N C I A</p><p>B R A S Í L I A / D F 2 0 2 3</p><p>Já a segunda versão, apresentada pela vítima recon-</p><p>hecida pela Corte IDH e CIDH (CORTE IDH, 2016, p.</p><p>11), data dos fatos o Sr. Flor Freire teria encontrado</p><p>este soldado, por volta das 05:20 da manhã, total-</p><p>mente embriagado e causando confusão no Col-</p><p>iseu Maior da cidade de Shell Mera, momento em</p><p>que decidiu conduzir ao Forte Amazonas, uma vez</p><p>que fazia parte do seu trabalho “zelar pelo bem dos</p><p>membros das forças armadas” conforme declaração</p><p>dada na audiência. Contudo, o soldado saiu das in-</p><p>stalações e retornou para o Coliseu Maior, momento</p><p>que o Sr. Flor Freire optou por levar o soldado para a</p><p>sua própria instalação, onde existia uma cama extra.</p><p>Pouco tempo depois de adentrar seu quarto (CORTE</p><p>IDH, 2016, p. 18), foi surpreendido com a entrada ar-</p><p>bitrária de um Major informando que Flor Freire “se</p><p>encontrava com problemas”.</p><p>Ante os fatos, o Sr. Flor Freire foi dispensado dos</p><p>serviços das forças armadas equatorianas com base</p><p>no art. 117 do Regulamento de Disciplina Militar do</p><p>Equador de 1998 (doravante, regulamento). Tal dis-</p><p>positivo punia os atos de homossexualidade, uso e</p><p>tráfico de drogas com a remoção do agente das forças</p><p>armadas nos termos do art. 87 do mesmo regulamen-</p><p>to. A dispensa da vítima se deu após procedimento</p><p>administrativo-judicial eivado de vícios e, deste modo,</p><p>o presente caso se refere à direitos processuais que</p><p>foram violados em razão da discriminação.</p><p>O primeiro direito reconhecido como violado pela</p><p>Corte IDH foi o “direito à igualdade perante a lei e</p><p>proibição da discriminação em relação à obrigação</p><p>de respeitar e garantir os direitos e ao dever de ad-</p><p>otar disposições de direito interno”. Inicialmente, a</p><p>Corte IDH cuida de relacionar a orientação sexual</p><p>com o conceito de liberdade e possibilidade de toda</p><p>pessoa se autodeterminar (CORTE IDH, 2016, p. 31).</p><p>Ademais, neste momento a Corte IDH também difer-</p><p>enciou a orientação sexual diversa “real” e “percebi-</p><p>da” ou “presumida” e determina que a forma como</p><p>o Sr. Homero se define é o único fato relevante para</p><p>definir sua orientação sexual. No Relatório de Fundo,</p><p>elaborado pela CIDH, consta que o caso em comento</p><p>se relaciona com a orientação sexual percebida, isto</p><p>é, aquela que outras pessoas presumiram ser a ori-</p><p>entação da vítima (CORTE IDH, 2016, p. 32).</p><p>Quanto ao direito de igualdade perante a lei (CORTE</p><p>IDH, 2016, p. 35), a Corte IDH definiu como discrim-</p><p>inatório o dispositivo que pune os atos de homos-</p><p>sexualidade (art. 117 do regulamento) com baixa das</p><p>forças armadas enquanto o art. 67 do mesmo regu-</p><p>lamento pune os “atos sexuais ilegítimos no interior</p><p>de repartições militares” com suspensão de no máx-</p><p>imo 30 dias. Ressalta-se que a orientação sexual das</p><p>pessoas é categoria protegida pelo artigo 1.1 da Con-</p><p>venção Americana sobre Direitos Humanos (CORTE</p><p>IDH, 2016, p. 36), logo, incube ao Estado (CORTE IDH,</p><p>2016, p. 39) apresentar as razões objetivas e razoáveis</p><p>pelas quais justifica o tratamento diferenciado entre</p><p>atos de homossexualidade e atos “sexuais ilegítimos”,</p><p>o que não ocorreu nas diversas ocasiões oportuniza-</p><p>das ao Estado do Equador (CORTE IDH, 2016, p. 43).</p><p>Com efeito, a sentença apresenta que a discrimi-</p><p>nação em razão de orientação sexual nas forças ar-</p><p>madas tem sido combatida em diversos instrumen-</p><p>tos internacionais, assim como “pelos órgãos de</p><p>direitos humanos” (CORTE IDH, 2016, p. 39), sendo</p><p>que o Estado deve apresentar razões aptas a justifi-</p><p>car a política que priva pessoas LGBTQIA+ de fazerem</p><p>parte das forças armadas. Neste sentido, a Corte ex-</p><p>emplifica (CORTE IDH, 2016, p. 40) esta questão com</p><p>decisão do Tribunal Europeu de Direitos Humanos,</p><p>a revogação da lei que punia membros do exército</p><p>pela prática de atos homossexuais, a extinção por</p><p>parte do Estado do Chile da prática recorrente de</p><p>justificar o não ingresso de pessoas no exército com</p><p>laudo psiquiátrico determinando homossexualismo</p><p>e lesbianismo, e os Estados Unidos da América que</p><p>aboliu a política “don’t ask, don’t tell”, que não per-</p><p>mitia aos membros do exército conversar e expressar</p><p>a sua orientação sexual.</p><p>Assim, a Corte IDH determinou (CORTE IDH, 2016,</p><p>p. 43) que o Equador foi responsável pela violação</p><p>ao artigo 24 da Convenção Americana sobre Direitos</p><p>Humanos, que assegura a todas as pessoas o trat-</p><p>amento igualitário perante a lei e o direito a igual</p><p>proteção da lei, em razão do discriminatório disposi-</p><p>tivo 117 do regulamento e a orientação sexual perce-</p><p>bida do Sr. Flor Freire.</p><p>Outro direito reconhecido como violado pela Corte</p><p>IDH (CORTE IDH, 2016, p. 48) se refere ao artigo 11.1</p><p>da Convenção, uma vez que o Estado adotou um</p><p>processo discriminatório contra o Sr. Flor Freire já</p><p>que este não foi punido somente com base em uma</p><p>norma regulamentar, mas sim com aplicação do art.</p><p>117 do Regulamento de Disciplina Militar c/c arts. 76</p><p>e 87 da Lei Específica das Forças Armadas (CORTE</p><p>IDH, 2016, p. 46). Deste modo, foi reconhecido que</p><p>o Equador atingiu (CORTE IDH, 2016, p. 47) direta-</p><p>mente a honra (estima própria) e a dignidade (per-</p><p>cepção de terceiros sobre uma pessoa).</p><p>A vítima e seus representantes pleitearam também</p><p>o reconhecimento da responsabilidade internacion-</p><p>al do Estado por ter violado o direito que todas as</p><p>pessoas têm de serem julgadas por juízes imparciais.</p><p>O processo equatoriano para se apurar as faltas e</p><p>contravenções de militares é separado em três fases</p><p>(CORTE IDH, 2016, p. 50): a primeira é chamada de</p><p>Informação Sumária, que consistia em um juiz penal</p><p>militar apurar todos os fatos e produzir as provas</p><p>necessárias para instrução do feito; na segunda fase,</p><p>onde o Fiscal Militar elaborava um ditame, incluindo</p><p>a sugestão de resolução do conflito do juiz penal mil-</p><p>itar. Na terceira e última fase, o Comandante (superi-</p><p>or hierárquico do militar infrator) atuava como “juiz</p><p>de direito” e decidia o mérito da causa e aplicava as</p><p>sanções previstas, não tendo qualquer obrigação de</p><p>se vincular o relatório produzido na fase anterior.</p><p>Seguindo o pedido dos representantes da vítima, a</p><p>Corte IDH reconheceu que o Equador violou o artigo</p><p>8.1 da Convenção que se refere às garantias judiciais,</p><p>fundamentando que o Comandante “não reunia os el-</p><p>ementos objetivos e subjetivos de imparcialidade para</p><p>decidir o mérito da causa” (CORTE IDH, 2016, p. 54). A</p><p>Corte IDH considerou que o problema não se deu pelo</p><p>fato de que o superior hierárquico do Sr. Flor Freire era</p><p>também o juiz de direito, a questão residia no fato de</p><p>que o Comandante tomou decisões em razão do seu</p><p>poder de mando antes de se iniciar o procedimento</p><p>disciplinar e, portanto, ele julgou o feito nos mesmos</p><p>termos daquelas decisões pré-estabelecidas.</p><p>Por fim, no último tópico da sentença, a Corte IDH</p><p>elaborou recomendações ao Estado para reparar</p><p>os danos causados (separação das forças terrestres</p><p>equatorianas)</p><p>ao Sr. Flor Freire frente às violações de</p><p>direitos humanos reconhecidas, quais sejam: direito</p><p>a igualdade perante a lei, proibição de discriminação</p><p>e garantia a imparcialidade do julgador (CORTE IDH,</p><p>2016, p. 65). Como medida de reparação integral, os</p><p>representantes da vítima requerem a reincorporação</p><p>dos Sr. Flor Freire no serviço ativo das forças arma-</p><p>das, mas, em razão da defesa do Estado e dos pare-</p><p>ceres técnicos acostados, a Corte IDH entendeu que</p><p>este pedido era materialmente impossível, determi-</p><p>nando, contudo, que o Equador concedesse à vítima</p><p>patente equivalente à que os colegas de promoção</p><p>teriam na data daquela sentença (CORTE IDH, 2016,</p><p>p. 67), concedesse também todos os benefícios soci-</p><p>ais, prestacionais e previdenciário compatíveis com</p><p>a patente, além de enquadrar a saída da vítima das</p><p>Forças Armadas Equatorianas como saída voluntária.</p><p>Como medida de satisfação (CORTE IDH, 2016, p. 68),</p><p>a Corte IDH determinou: a publicação uma só vez do</p><p>resumo elaborado pela Corte IDH no diário oficial;</p><p>a publicação uma só vez do resumo elaborado pela</p><p>Corte IDH em um jornal de grande circulação; a pub-</p><p>licação integral da sentença pelo período de um ano</p><p>em algum sítio oficial do Estado. Já nas garantias de</p><p>não repetição, a Corte IDH reconheceu os esforços</p><p>que já estavam sendo exercidos pelo Estado ao for-</p><p>necer cursos de capacitação sobre direitos humanos</p><p>em geral e direito internacional humanitário, mas que</p><p>estes cursos têm alcançado um pequeno número de</p><p>pessoas. Assim, a Corte IDH recomendou ao Estado</p><p>que fornecesse uma espécie de capacitação (CORTE</p><p>IDH, 2016, p. 69) para membro das forças armadas</p><p>abordando o tema de proibição de discriminação por</p><p>orientação sexual, com vistas a evitar reincidência de</p><p>casos como o presente.</p><p>Em que pese as indenizações compensatórias (CORTE</p><p>IDH, 2016, p. 71), a Corte IDH determinou à título de</p><p>danos materiais (CORTE IDH, 2016, p. 72) que o Es-</p><p>tado pagasse os valores que o Sr. Flor Freire deixou</p><p>de receber em razão de dispensa das Forças Arma-</p><p>das a partir daquela data, totalizando o valor de US$</p><p>385.000,00 (trezentos e oitenta e cinco mil dólares</p><p>dos Estados Unidos da América). Já a título de danos</p><p>imateriais, a Corte definiu a quantia de US$5.000,00</p><p>(cinco mil dólares dos Estados Unidos da Americana)</p><p>a serem pagos pelo Estado ao Sr. Flor Freire como</p><p>forma de cobrir os gastos internos; US$10.000,00</p><p>(dez mil dólares do Estados Unidos da América) a ser-</p><p>em pagos pelo Estado aos representantes da vítima,</p><p>em razão dos gastos e custas por acionar o Sistema</p><p>Interamericano de Direitos Humanos.</p><p>No Caso Flor Freire Vs. Equador, a Corte IDH apresen-</p><p>tou um importante conceito para ser tomado como</p><p>ponto de partida da análise da violação de direitos</p><p>de pessoas LGBTQIA+: a autopercepção da pessoa</p><p>sobre sua orientação sexual e identidade de gênero.</p><p>Com efeito, as condutas discriminatórias não podem</p><p>ser analisadas sob a ótica de terceiros. Ao contrário,</p><p>este tipo de preconceito deve ser avaliado a partir da</p><p>autoidentificação da pessoa e, em seguida, buscar os</p><p>direitos que podem ter sido violados e os impactos</p><p>na vida da vítima.</p><p>Ademais, os fatos que deram origem aos processos</p><p>disciplinares em desfavor do Sr. Flor Freire foram</p><p>ambientados nas forças armadas, local onde co-</p><p>mumente ocorrem discriminação contra pessoas</p><p>LGBTQIA+. Como bem exposto pela Corte IDH, di-</p><p>versos Estados já julgaram em cortes constitucionais</p><p>normas discriminatórias adotadas pelas forças arma-</p><p>das para punir pessoas de orientação sexual e identi-</p><p>dade de gênero dissidentes.</p><p>A seguir se encontra um quadro comparativo dos</p><p>direitos humanos reconhecidos como violados e as</p><p>medidas de reparação determinadas pela Corte IDH</p><p>em cada um dos casos acima apresentados, com o</p><p>objetivo de tornar mais didática a análise.</p><p>I S I M P Ó S I O D I V E R S I D A D E E R E S I S T Ê N C I A</p><p>B R A S Í L I A / D F 2 0 2 3</p><p>Quadro 1 –</p><p>CONSIDERAÇÕES FINAIS</p><p>Os direitos humanos são direitos que existem no</p><p>plano internacional e são garantidos a todas as pes-</p><p>soas simplesmente em razão do seu pertencimento</p><p>à espécie humana, sendo essa a sua principal carac-</p><p>terística: a universalidade. A outra característica dos</p><p>direitos humanos é a interdependência, o que signifi-</p><p>ca dizer que o rol dos direitos humanos não mantém</p><p>entre si uma relação de sobreposição ou dependên-</p><p>cia, e sim uma relação de complementariedade, sen-</p><p>do correto afirmar que cada direito humano deve</p><p>ser interpretado de modo a possibilitar o exercício</p><p>e a garantia de outros direitos humanos. A partir</p><p>da leitura acerca do caráter internacional dos dire-</p><p>itos humanos, existem os Sistemas Internacionais de</p><p>Direitos Humanos, responsáveis por fiscalizar a atu-</p><p>ação dos Estados e o cumprimento das obrigações</p><p>pré-constituídas em função da ratificação de um</p><p>tratado, convenção ou outra espécie normativa in-</p><p>ternacional, além de decidir sobre o mérito de uma</p><p>possível violação dos direitos humanos. Os Sistemas</p><p>Internacionais de Direitos Humanos podem se dividir</p><p>em sistemas regionais como o Sistema Interamerica-</p><p>no de Direitos Humanos, isto é, um sistema que atua</p><p>especificamente em uma região do globo, ou sistema</p><p>global como o Sistema ONU de Direitos Humanos,</p><p>responsável pela fiscalização em todas as regiões.</p><p>O artigo 1 da Convenção Americana sobre Direitos</p><p>Humanos dispõe que “os Estados-Partes nesta Con-</p><p>venção se comprometem a respeitar os direitos e as</p><p>liberdades nela reconhecidos e a garantir seu livre</p><p>e pleno exercício a toda pessoa que esteja sujeita à</p><p>sua jurisdição, sem discriminação alguma por motivo</p><p>de raça, cor, sexo, idioma, religião, opiniões políticas</p><p>ou de qualquer outra natureza, origem nacional ou</p><p>social, posição econômica, nascimento ou qualquer</p><p>outra condição social”. Do mesmo modo, os artigos</p><p>1 e 2.1 da Declaração Universal dos Direitos apresen-</p><p>tam a igualdade de que gozam todas as pessoas e</p><p>seus direitos de serem protegidas pelos Estados sem</p><p>discriminação de qualquer tipo. Estes são apenas dois</p><p>exemplos dentre vários outros que apresentam a ig-</p><p>ualdade como direito humano e como característica</p><p>deste campo do conhecimento jurídico. No caso do</p><p>Sistema Interamericano de Direitos Humanos, a CIDH</p><p>e a Corte IDH cuidaram de realizar em diversos casos</p><p>uma interpretação do artigo primeiro da Convenção</p><p>de modo a determinar a população LGBTQIA+ como</p><p>sujeitos de direitos, devendo ser protegidos pelos Es-</p><p>tados e terem seus direitos preservados.</p><p>Fato é que diversos Estados ainda insistem em violar os</p><p>direitos mais básicos da população LGBTQIA+ como di-</p><p>reito à saúde, liberdade, segurança e, em alguns casos,</p><p>a expressão da identidade de gênero e orientação sex-</p><p>ual são puníveis com penas privativas de liberdade e</p><p>até pena de morte. Outros Estados, embora não apre-</p><p>sentem leis expressamente discriminatórias contra as</p><p>pessoas LGBTQIA+, demonstram certa incapacidade</p><p>do seu legislativo de produzir normas que garantam</p><p>direitos paras estas pessoas, sendo muito comum que</p><p>o judiciário intervenha produzindo jurisprudência no</p><p>sentido de equiparar direitos, como ocorreu no Brasil</p><p>com a criminalização da LGBTQIA+ fobia pela Suprema</p><p>Corte e o reconhecimento do casamento civil entre</p><p>casais do mesmo sexo.</p><p>Não restam dúvidas de que a normativa internacional</p><p>de direitos humanos, bem como a forma de instruir um</p><p>processo, se encontra à frente da atuação interna dos</p><p>Estados quando o assunto é proteção de pessoas LG-</p><p>BQIA+ e seus direitos fundamentais e humanos, sendo</p><p>necessário que em diversos casos os Sistemas Interna-</p><p>cionais de Direitos Humanos intervenham e decidam</p><p>acerca da responsabilidade internacional de um Estado</p><p>pela violação de determinados direitos destas pessoas.</p><p>Neste diapasão, a Corte Interamericana de Di-</p><p>reitos Humanos, após o não cumprimento das</p><p>recomendações elaboradas pela Comissão Interam-</p><p>ericana de Direitos Humanos em seu relatório de</p><p>fundo, decidiu sobre três casos de violação de direit-</p><p>os humanos de pessoas LGBTQIA+. No primeiro, Caso</p><p>Atala</p><p>Riffo Vs. Chile, a senhora Karen Atala, lésbica e</p><p>magistrada, teve seus direitos violados no decurso</p><p>de um processo de guarda das suas três filhas meno-</p><p>res de idade naquela época, sobretudo o direito a ig-</p><p>ualdade perante a lei. No Caso Duque Vs. Colômbia,</p><p>o senhor Angel Duque, gay e portador de HIV, teve o</p><p>seu pedido de pensão por sobrevivência negado pelo</p><p>órgão previdenciário da Colômbia, COLFONDOS, sem</p><p>ter recebido uma justificativa adequada para tal neg-</p><p>ativa, mesmo afirmando que precisava do dinheiro</p><p>para dar continuidade ao tratamento. A Corte IDH</p><p>reconheceu neste caso a violação do direito humano</p><p>à igualdade perante a justiça e órgãos do Estado. Já</p><p>no Caso Flor Freire Vs. Equador, o Sr. Flor Freire foi</p><p>dispensado arbitrariamente das forças armadas do</p><p>Equador por ter supostamente praticado sexo oral</p><p>com outro membro das forças armadas dentro de</p><p>uma dependência militar. Mesmo afirmando não ser</p><p>homossexual e o Estado não ter anexado prova dos</p><p>fatos nos processos da jurisdição interna, a dispensa</p><p>arbitrária ocorreu e por isso a Corte IDH reconheceu</p><p>que Flor Freire foi vítima de discriminação perante o</p><p>sistema judicial, não contou com o recurso adequa-</p><p>do para recorrer das sentenças e foi julgado por um</p><p>magistrado parcial.</p><p>Com a análise dos três casos é possível perceber que</p><p>a discriminação contra pessoas LGBTQIA+ ultrapassa</p><p>as limitações territoriais de um Estado e características</p><p>como gênero e classe social. Assim, urge a importân-</p><p>cia do estudo da jurisprudência das cortes de direitos</p><p>humanos em casos que envolvam pessoas LGBTQIA+,</p><p>pois é possível importar para o ordenamento jurídi-</p><p>co interno um referencial para a proteção dessas</p><p>pessoas. Evidentemente, este objetivo se torna ain-</p><p>da mais palpável quando usamos jurisprudência dos</p><p>órgãos jurídicos dos Sistemas Internacionais de Dire-</p><p>itos Humanos aos quais o Estado se vincula, em razão</p><p>da possível sanção que pode ser aplicada quando da</p><p>violação de direitos em casos similares.</p><p>Por fim, o direito como um todo não é uma área</p><p>estática, significa dizer que o avanço da sociedade</p><p>resulta também no surgimento de novos direitos e</p><p>novas interpretações, notadamente os direitos hu-</p><p>manos, que comumente se encontram em maior</p><p>consonância com as alterações sociais. Com efeito,</p><p>o estudo dos direitos humanos aplicados às pessoas</p><p>LGBTQIA+, por ser um tema que ainda apresenta</p><p>muitas possibilidades de avanço, abre espaço para</p><p>o desenvolvimento de novas pesquisas, como por</p><p>exemplo sobre a segurança ou saúde da população</p><p>LGBTQIA+ e a inclusão de pessoas LGBTQIA+ em es-</p><p>paços de tomada de decisão. Ainda, o “+” da sigla</p><p>deixa espaço para o surgimento de novas categorias</p><p>na identidade de gênero e orientação sexual, trazen-</p><p>do para o direito o dever de se adequar e proteger</p><p>estes novos sujeitos.</p><p>REFERÊNCIAS</p><p>ALBUQUERQUE, Aline; BARROSO, Alessia. Curso de Direitos Humanos.</p><p>Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2018.</p><p>ALSTON, Philip. The Purposes of Reporting. In: ONU. Manual on Hu-</p><p>man Rights Reporting. New York: ONU, 1991.</p><p>BRASIL. Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. As-</p><p>sessoria Especial de Assuntos Internacionais. RPU: Relatório Preliminar</p><p>de Meio Período do III Ciclo. 2019. Disponível em: https://www.gov.br/</p><p>mdh/pt-br/navegue-por-temas/atuacao-internacional/relatorios-inter-</p><p>nacionais-1/copy_of_RPUMeioPerodo26.08.2019.docx_.pdf. Acesso</p><p>em: 30 jun. 2021.</p><p>CIDH. Comunicado para a Imprensa No. 153A/14: um panorama da</p><p>violência contra as pessoas LGBTI na América: um registro que docu-</p><p>menta atos de violência entre 1º de janeiro de 2013 e 31 de março</p><p>de 2014, Anexo ao Comunicado para a Imprensa No. 153/14. 17 de</p><p>dezembro de 2014.</p><p>I S I M P Ó S I O D I V E R S I D A D E E R E S I S T Ê N C I A</p><p>B R A S Í L I A / D F 2 0 2 3</p><p>CIDH. Relatório Avanços e Desafios do Reconhecimento de Direitos</p><p>das Pessoas LGBTI nas Américas, 2018. P. 133. Disponível em: https://</p><p>www.oas.org/es/cidh/informes/pdfs/LGBTI-ReconocimientoDere-</p><p>chos2019.pdf. Acesso em: 30 jun. 2021.</p><p>CIDH. Relatório sobre pessoas trans e de gênero diversos e seus direitos</p><p>econômicos, sociais, culturais e ambientais. 7 de agosto de 2020, p. 12.</p><p>CIDH. Relatório sobre pessoas trans e de gênero diversos e seus</p><p>direitos econômicos, sociais, culturais e ambientais. 2020, p. 12.</p><p>Disponível em: http://www.oas.org/en/iachr/reports/pdfs/TransDES-</p><p>CA-en.pdf. Acesso em: 23 set. 2021.</p><p>CIDH. Relatório sobre pobreza e direitos humanos nas Américas, 2017.</p><p>p. 187. Disponível em: https://www.oas.org/es/cidh/informes/pdfs/Po-</p><p>brezaDDHH2017.pdf. Acesso em: 23 set. 2021.</p><p>CIDH. Relatório sobre pobreza e direitos humanos nas Américas. 7</p><p>de setembro de 2017, p. 187.</p><p>COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. OEA. Relatório</p><p>sobre Violência Contra Pessoas LGBTI. 2015. Disponível em: https://</p><p>www.oas.org/pt/cidh/docs/pdf/ViolenciaPessoasLGBTI.pdf. Acessado</p><p>em: 30 jun. 2021.</p><p>COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. 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Cambridge: Cam-</p><p>bridge, 2010.</p><p>JANAILTON SILVA</p><p>e T A L</p><p>GÊNERO E DIVERSIDADE</p><p>NA ESCOLA: AÇÕES DO</p><p>NÚCLEO DE ESTUDOS DE</p><p>GÊNERO E DIVERSIDADE</p><p>SEXUAL (NUGEDIS) DO IFB</p><p>- CAMPUS CEILÂNDIA</p><p>Professor EBTT de Letras (língua inglesa) no IFB - campus Ceilândia.</p><p>Atua no Núcleo de Gênero e Diversidade Sexual (NUGEDIS) desde</p><p>2021.</p><p>I S I M P Ó S I O D I V E R S I D A D E E R E S I S T Ê N C I A</p><p>B R A S Í L I A / D F 2 0 2 3</p><p>GÊNERO E DIVERSIDADE NA ESCOLA: AÇÕES DO NÚCLEO DE ES-</p><p>TUDOS DE GÊNERO E DIVERSIDADE SEXUAL (NUGEDIS) DO IFB -</p><p>CAMPUS CEILÂNDIA</p><p>Autoria:</p><p>Janailton Silva</p><p>Rayane Bueno</p><p>Micheli Gonçalves</p><p>Jéssica Lima</p><p>Caio Polito</p><p>Vítor Paz</p><p>Letícia Couto</p><p>A PESQUISA E A EXTENSÃO OU RELATOS DE EXPERIÊNCIA COMO AÇÕES DE FORTA-</p><p>LECIMENTO DAS RELAÇÕES FAMILIARES E/OU MATERNAGEM, EM NÚCLEOS QUE IN-</p><p>CLUEM PESSOAS LGBTQIAPN+;</p><p>RESUMO</p><p>A Resolução N. 1 do Conselho Nacional da Edu-</p><p>cação (CNE/CP) (BRASIL, 2012) estabelece diretriz-</p><p>es nacionais para a educação em direitos humanos,</p><p>fundamentando-se, dentre vários princípios, na</p><p>dignidade humana, na igualdade de direitos e no</p><p>reconhecimento e valorização das diferenças e das</p><p>diversidades. Dentre essas múltiplas diversidades,</p><p>figuram-se as de gênero e sexualidade, foco do Nú-</p><p>cleo de Gênero e Diversidade Sexual (NUGEDIS), do</p><p>Instituto Federal de Brasília (IFB) - Campus Ceilândia.</p><p>Nesse sentido, o presente trabalho busca relatar as</p><p>ações institucionais desenvolvidas pelo NUGEDIS ao</p><p>longo dos últimos dois anos. Os trabalhos do núcleo</p><p>fazem-se extremamente prementes dentro de uma</p><p>estrutura patriarcal que, por muito tempo, tem</p><p>privilegiado a figura masculina sobre a feminina e</p><p>fomentado relações de opressão social (BUTLER,</p><p>2018). Essas condições favorecem a criação e ma-</p><p>nutenção de preconceitos, discriminações, violên-</p><p>cia e mortes que atingem grupos minoritários, in-</p><p>cluindo mulheres e pessoas LGBTQIA+ (JESUS, 2012;</p><p>BENEVIDES, 2023). Nesse contexto, como comissão</p><p>permanente, o NUGEDIS possui várias atribuições,</p><p>tendo executado as seguintes atividades: assesso-</p><p>ramento do cumprimento da Resolução CNE/CP</p><p>1/2012 (BRASIL, 2012); realização de atividades de</p><p>ensino, pesquisa e extensão, incluindo palestras,</p><p>rodas de conversa, concursos e outras atividades</p><p>artístico-culturais referentes às temáticas de gênero</p><p>e sexualidade; organização de encontros de reflex-</p><p>ão e estudo para o conhecimento e a valorização</p><p>das temáticas do núcleo; promoção de ações artic-</p><p>uladas com outros núcleos e setores do campus.</p><p>Sendo assim, tem-se desenvolvido ações e políticas</p><p>focadas na educação em direitos humanos, com-</p><p>batendo-se as variadas formas de preconceito e</p><p>discriminação motivadas por gênero e sexualidade,</p><p>sendo igualmente possível pensar em uma unidade</p><p>de ação política que confronte as dificuldades en-</p><p>frentadas por mulheres e pessoas LGBTQIA+ em sua</p><p>generalidade, sem, contudo, apagar as diferentes</p><p>experiências subjetivas vividas e enfrentadas por</p><p>esses sujeitos distintos.</p><p>PALAVRAS-CHAVE: Gênero. Sexualidade. Mulheres.</p><p>LGBTQIA+. Feminismo.</p><p>INTRODUÇÃO</p><p>Neste artigo, relatamos ações sobre as temáticas de</p><p>gênero e sexualidade desenvolvidas pelo Núcleo de</p><p>Gênero e Diversidade Sexual (NUGEDIS), no Institu-</p><p>to Federal de Brasília (IFB) - Campus Ceilândia, de</p><p>2021 a 2023. Ao longo dos últimos anos, muitas têm</p><p>sido as contribuições à comunidade interna e ex-</p><p>terna ao campus feitas por diferentes membras/os</p><p>do núcleo e outras pessoas convidadas, como, por</p><p>exemplo, a publicação do folhetim NEWSGEDIS, a</p><p>realização de rodas de conversa e palestras, as cele-</p><p>brações do Dia Internacional Do Orgulho LGBTQIA+,</p><p>a realização de campanhas e ações sociais.</p><p>Os trabalhos do NUGEDIS se mostram bastante</p><p>urgentes dentro de uma sociedade cuja estrutura</p><p>patriarcal tem, há muito, privilegiado a figura mas-</p><p>culina sobre a feminina e fomentado relações de</p><p>opressão social (BUTLER, 2018). Esse retrato de-</p><p>sumano tem largamente produzido condições que</p><p>favorecem a criação e manutenção de múltiplas</p><p>formas de preconceitos, discriminações, violências</p><p>e mortes que atingem sobremaneira grupos mi-</p><p>noritários, incluindo mulheres e pessoas LGBTQIA+</p><p>(JESUS, 2012; BENEVIDES, 2023). Para ilustrar, em</p><p>2022, o Brasil teve “pelo menos 151 pessoas trans</p><p>mortas, sendo 131 casos de assassinatos e 20 pes-</p><p>soas trans suicidadas” (BENEVIDES, 2023, p. 6), con-</p><p>forme Bruna Benevides, da Associação Nacional de</p><p>Travestis e Transexuais, no Dossiê “assassinatos e</p><p>violências contra travestis e transexuais brasileiras</p><p>em 2022”. Vergonhosamente, o país permanece,</p><p>pelo 14º ano consecutivo, nessa lista sangrenta.</p><p>Faz-se, então, urgente a instauração de projetos</p><p>que busquem</p><p>a valorização e promoção dos direitos humanos me-</p><p>diante temas relativos a gênero, identidade de gêne-</p><p>ro, raça e etnia, religião, orientação sexual, pessoas</p><p>com deficiência, entre outros, bem como práticas que</p><p>contribuam para a igualdade e para o enfrentamen-</p><p>to de todas as formas de preconceito, discriminação e</p><p>violência sob todas as formas (BRASIL, 2013, p. 200).</p><p>GÊNERO E DIVERSIDADE NA ESCOLA: AMPAROS TEÓRICOS E METODOLÓGICOS</p><p>O trabalho com as temáticas de gênero e diversi-</p><p>dade sexual é fomentado em vários regulamentos</p><p>jurídicos e institucionais. Inicialmente, a Constitu-</p><p>ição Federal, em seu Art. 3º, estabelece, dentre os</p><p>objetivos fundamentais da República Federativa do</p><p>Brasil, a promoção do “bem de todos, sem precon-</p><p>ceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer</p><p>outras formas de discriminação” (BRASIL, 1988,</p><p>n/p). Menos de 10 anos depois, foi promulgada a</p><p>Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), definin-</p><p>do, no Art. 3º, que o</p><p>ensino deverá ser ministrado</p><p>com base em vários princípios, incluindo no “res-</p><p>peito à liberdade e apreço à tolerância” (BRASIL,</p><p>1996, n/p).</p><p>Nesse contexto, tem-se a necessidade de uma ed-</p><p>ucação que paute pela formação para a vida e para</p><p>a convivência com diferentes formas de ser e exist-</p><p>ir, sem preconceitos, fundamentadas no respeito</p><p>às diferenças e dentro de uma Educação em Di-</p><p>reitos Humanos. Adiante em 2012, foi aprovada a</p><p>Resolução N. 1 do Conselho Nacional da Educação</p><p>(CNE/CP), estabelecendo diretrizes nacionais para</p><p>a educação em direitos humanos, fundamentan-</p><p>do-se, dentre vários princípios, “na dignidade hu-</p><p>mana, na igualdade de direitos e no reconhecimen-</p><p>to e valorização das diferenças e das diversidades”</p><p>(BRASIL, 2012, n/p). Essa proposta também vai ao</p><p>encontro do que está estabelecido no Art. 2º do</p><p>Plano Nacional de Educação (vigência 2014-2024),</p><p>em que se estimula a “promoção dos princípios do</p><p>respeito aos direitos humanos, à diversidade” (BRA-</p><p>SIL, 2014, n/p).</p><p>Apesar de documentos legais que amparam</p><p>o trabalho com a tolerância e respeito às diferenças,</p><p>ao longo da história têm se observado entraves</p><p>quando projetos com temáticas de gênero e diver-</p><p>sidade sexual chegam às escolas. Nesse sentido,</p><p>Henriques et al. (2007, p. 26) afirmam que</p><p>a escola brasileira foi historicamente concebida e orga-</p><p>nizada segundo os padrões da heteronormatividade,</p><p>valorizando e edificando como padrão um único compo-</p><p>nente: o adulto, masculino, branco, heterossexual. [...]</p><p>Pressupondo-se que apenas a existência de</p><p>corpos masculinos, brancos e heterossexuais seja a</p><p>única possibilidade correta, qualquer variação fora</p><p>dessa regra, observada em sujeitos destoantes da</p><p>binariedade de gênero e da heteronormatividade,</p><p>acaba produzindo machismo e LGBTfobia. Sobre</p><p>I S I M P Ó S I O D I V E R S I D A D E E R E S I S T Ê N C I A</p><p>B R A S Í L I A / D F 2 0 2 3</p><p>esse aspecto, Louro (2004 apud HENRIQUES et al.,</p><p>2007, p. 26) afirma:</p><p>[...] na escola (e também fora dela), os processos de</p><p>constituição de sujeitos e de produção de identidades</p><p>heterossexuais produzem e alimentam a homofobia e</p><p>o sexismo, especialmente entre os jovens estudantes</p><p>masculinos. Para estes, o outro passa a ser, principal-</p><p>mente, as mulheres e os gays e, para merecerem suas</p><p>identidades masculinas e heterossexuais, deverão dar</p><p>mostras contínuas de terem exorcizado de si mesmos a</p><p>feminilidade e a homossexualidade.</p><p>Em meio a esses entraves educacionais e</p><p>sociais, tem sido possível, todavia, executar ativi-</p><p>dades sobre as temáticas de gênero e diversidade</p><p>sexual no contexto do IFB-Campus Ceilândia. Con-</p><p>forme observado no Projeto Político Pedagógico</p><p>(2018-2023), prevê-se a existência do Núcleo de</p><p>Gênero e Diversidade Sexual (NUGEDIS) como par-</p><p>te das Ações de Permanência, Êxito e Inclusão de</p><p>Estudantes, ancoradas em políticas articuladoras e</p><p>fundamentadoras das atividades do campus:</p><p>[...] aderimos a uma abordagem que tem como foco</p><p>práticas que privilegiam a transformação de ati-</p><p>tudes, comportamentos, dinâmicas institucionais. Os</p><p>principais desafios são: fazer com que as temáticas</p><p>relacionadas a gênero e diversidade sexual sejam in-</p><p>cluídas em projetos institucionais; desconstruir visões</p><p>equivocadas do senso comum acerca dessas questões;</p><p>construir ambientes educativos que respeitem e pro-</p><p>movam essas temáticas no que se refere à formação</p><p>docente. (CEILÂNDIA, 2018, p. 36).</p><p>Nesse contexto, como comissão permanente, o</p><p>NUGEDIS do IFB-Campus Ceilândia possui várias</p><p>atribuições, a saber: assessoramento do cum-</p><p>primento da Resolução CNE/CP 1/2012 (BRASIL,</p><p>2012); realização de atividades de ensino, pesqui-</p><p>sa e extensão, como palestras, rodas de conversa,</p><p>concursos e outras atividades artístico-culturais ref-</p><p>erentes às temáticas de gênero e sexualidade; or-</p><p>ganização de encontros de reflexão e estudo para</p><p>o conhecimento e a valorização das temáticas do</p><p>núcleo; promoção de ações articuladas com outros</p><p>núcleos e setores do campus. Por meio da execução</p><p>dessas atividades, tem-se buscado contribuir para</p><p>uma formação cidadã, comprometida com a digni-</p><p>dade humana e a justiça social, ofertada pelo in-</p><p>stituto no âmbito da educação profissional e tec-</p><p>nológica, conforme igualmente proposto no Plano</p><p>de Desenvolvimento Institucional (2019-2023) do</p><p>IFB (BRASÍLIA, 2021). A seguir, relatamos algumas</p><p>experiências desenvolvidas por muitas mãos.</p><p>GÊNERO E DIVERSIDADE NA ESCOLA: RELATOS DE EXPERIÊNCIA DO NUGEDIS</p><p>Nesta seção, apresentamos um resumo das várias</p><p>ações que o Nugedis tem desenvolvido desde 2021</p><p>até 2023. Ao longo dos dois últimos anos, foram</p><p>muitas as contribuições à comunidade acadêmica</p><p>do IFB-Campus Ceilândia feitas por diferentes mem-</p><p>bras/os do núcleo e pessoas externas convidadas.</p><p>Desse modo, relatamos abaixo sobre o folhetim</p><p>NEWSGEDIS, rodas de conversa e palestras, cele-</p><p>brações do Dia Internacional Do Orgulho LGBTQIA+,</p><p>campanhas e ações sociais.</p><p>NEWSGEDIS</p><p>O NEWSGEDIS é um folhetim desenvolvido com</p><p>o objetivo de popularizar, em linguagem mais</p><p>acessível, pedagógica e didática, conhecimentos</p><p>acerca de gênero e sexualidade dentro da comuni-</p><p>dade acadêmica do IFB. Foi criado pelo núcleo em</p><p>2021, tendo o primeiro número sido publicado em</p><p>agosto daquele ano. Cada número conta com múl-</p><p>tiplas autorias, incluindo membras/os do núcleo e</p><p>autoras/es externas/os convidadas/os.</p><p>As primeiras edições do NEWSGEDIS, por exemplo,</p><p>buscaram “definir” cada um dos elementos da sigla</p><p>LGBTQIA+, abarcando datas comemorativas (como</p><p>o dia 28 de junho, em que se comemora o Dia In-</p><p>ternacional do Orgulho), filmes que retratam sobre</p><p>a temática, personalidades (como autoras/es, atriz-</p><p>es/atores, cantoras/es) que se destacam na área,</p><p>projetos desenvolvidos sobre o tema em âmbito</p><p>institucional, local e nacional. Os demais números</p><p>versaram sobre variados assuntos, incluindo o “1º</p><p>Concurso Artístico do Nugedis”, relatos maternos,</p><p>legislação a respeito do uso do nome social, entre</p><p>outros temas.</p><p>RODAS DE CONVERSA E PALESTRAS</p><p>Temos organizado algumas rodas de conversa e pal-</p><p>estras (online e presencialmente), sempre lideradas</p><p>por profissionais (como psicólogas/os, delegadas/os,</p><p>professoras/es, filósofas/os, entre outras/os) que têm</p><p>trabalhado com as temáticas de gênero e diversidade.</p><p>CELEBRAÇÕES DO DIA INTERNACIONAL DO</p><p>ORGULHO LGBTQIA+</p><p>Temos organizado vários eventos socioculturais para cel-</p><p>ebrar o Dia Internacional do Orgulho LGBTQIA+, como a</p><p>Ação nos Espelhos dos Banheiros, a Barraca do Orgulho,</p><p>o 1º Concurso Artístico do Nugedis, entre outros.</p><p>Em 2022, fizemos a instalação nos espelhos dos ban-</p><p>heiros do campus no Dia Internacional do Orgulho</p><p>LGBTQIA+ (28 de junho): um grupo de alunos/as en-</p><p>feitou um espelho de cada banheiro (6 banheiros, ou</p><p>seja, 6 espelhos) com as cores da bandeira LGBTQIA+,</p><p>além de mencionarem a data, o perfil do Nugedis no</p><p>Instagram e frases como “orgulho de ser quem eu sou”.</p><p>Durante as comemorações de São João em 2023,</p><p>montamos a Barraca do Orgulho, em que distribuí-</p><p>mos doces, como paçocas e marshmallows, com</p><p>frases motivacionais sobre ter orgulho de quem se</p><p>é. A imagem 01 mostra a ambientação montada:</p><p>Imagem 01. Ambientação da Barraca do Orgulho</p><p>Também mobilizamos a comunidade acadêmica</p><p>para participar do 1º Concurso Artístico do Nuge-</p><p>dis, que foi realizado ao longo dos meses de Junho</p><p>e Julho de 2023. Tratou-se de uma seleção interna</p><p>de poemas com a seguinte temática: “Respeito às</p><p>variadas formas de ser e amar: Dia Internacional do</p><p>Orgulho LGBTQIA+”. Foram escolhidos 03 poemas</p><p>vencedores dentre o rol de textos submetidos pela</p><p>comunidade acadêmica do campus. Segue abaixo o</p><p>pôster de divulgação na imagem 02:</p><p>Imagem 02. Pôster de divulgação do 1º Concurso Artístico</p><p>do Nugedis.</p><p>Fonte: Dos autores.</p><p>CAMPANHAS E AÇÕES SOCIAIS</p><p>Desde 2021, temos mobilizado a comunidade</p><p>acadêmica sobre a prevenção contra o câncer</p><p>de mama (Outubro Rosa) e de próstata (Novem-</p><p>bro Azul). Para tal, temos publicado cartilhas e in-</p><p>struções de conscientização para prevenção. Além</p><p>disso, também participamos, junto ao Fundo de</p><p>População das Nações Unidas (UNFPA), no Cine</p><p>Brasília, da Mostra de Cinema “Luz, Câmera, Men-</p><p>struAÇÃO”. Foi realizada nos dias 8 e 9 de novem-</p><p>bro de 2022. Mais de 450 pessoas participaram do</p><p>evento e, dentre o público, cerca de 300 eram alu-</p><p>nas e alunos de vários campi do IFB.</p><p>Ao longo de setembro a outubro de 2023, junto</p><p>ao Grupo Estruturação, realizamos a Campanha da</p><p>Dignidade Menstrual. Foram arrecadados 28 pa-</p><p>cotes de absorventes descartáveis, totalizando cer-Fonte: Dos autores</p><p>ca de 620 unidades, que foram doados a pessoas</p><p>em vulnerabilidade social e a alunas do campus.</p><p>Importante frisar que a Lei Federal n. 14.214, san-</p><p>cionada em 2021, institui o Programa de Proteção</p><p>e Promoção da Saúde Menstrual, no intuito de as-</p><p>segurar a oferta gratuita de absorventes higiênicos</p><p>femininos e outros cuidados básicos de saúde men-</p><p>strual. Segue foto da arrecadação:</p><p>Imagem 03. Alguns absorventes arrecadados na Campanha</p><p>da Dignidade Menstrual</p><p>Fonte: Dos autores.</p><p>I S I M P Ó S I O D I V E R S I D A D E E R E S I S T Ê N C I A</p><p>B R A S Í L I A / D F 2 0 2 3</p><p>CONSIDERAÇÕES FINAIS</p><p>Neste artigo, buscamos apresentar um breve resumo</p><p>das várias ações que o NUGEDIS tem desenvolvido</p><p>ao longo de dois anos e meio, 2021 até 2023. Con-</p><p>tribuímos com a comunidade interna e externa ao</p><p>IFB-Campus Ceilândia por meio do compartilhamen-</p><p>to de conhecimentos sobre gênero e diversidade via</p><p>folhetins NEWSGEDIS, rodas de conversa, palestras,</p><p>eventos socioculturais, entre outras atividades.</p><p>Por meio dessas ações, temos contribuído, ampara-</p><p>ndo-nos em variados regulamentos jurídicos e in-</p><p>stitucionais, com o combate às variadas formas de</p><p>preconceito e discriminação motivadas por gênero</p><p>e sexualidade, confrontando as dificuldades enfren-</p><p>tadas por mulheres e pessoas LGBTQIA+ em sua</p><p>generalidade, sem, contudo, apagar as diferentes</p><p>experiências subjetivas vividas e enfrentadas por</p><p>esses sujeitos distintos. Como nos lembraram um</p><p>dia Freire e Shor (2010), não podemos deixar que</p><p>medos e entraves paralisem nossas ações, de modo</p><p>que o amor seja um ato político e que múltiplas ex-</p><p>pressões e formas de ser, existir e amar sejam con-</p><p>sideradas justas e aceitas em nossa sociedade.</p><p>REFERÊNCIAS</p><p>BENEVIDES, B. G. Dossiê: assassinatos e violências contra traves-</p><p>tis e transexuais brasileiras em 2022. Brasília: Distrito Drag; ANTRA</p><p>(Associação Nacional de Travestis e Transexuais), 2023. Disponível</p><p>em: https://brazil.unfpa.org/sites/default/files/pub-pdf/dossie_</p><p>antra-2023.pdf Acesso em: 25 abr. 2023.</p><p>BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.</p><p>Brasília: Presidência da República, 1988. Disponível em: https://www.</p><p>planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm Acesso em:</p><p>09 nov. 2023.</p><p>BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Brasília:</p><p>Presidência da República, 1996. Disponível em: https://www.plan-</p><p>alto.gov.br/ccivil_03/leis/l9394.htm Acesso em: 09 nov. 2023.</p><p>BRASIL. Resolução nº 1, de 30 de maio de 2012. Estabelece Di-</p><p>retrizes Nacionais para a Educação em Direitos Humanos. Brasília:</p><p>MEC, 2012. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/dmdocu-</p><p>ments/rcp001_12.pdf Acesso em: 09 nov. 2023.</p><p>BRASIL. Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais da Educação Básica.</p><p>Brasília: MEC, SEB, DICEI, 2013. Disponível em: http://portal.mec.gov.</p><p>br/index.php?option=com_docman&view=download&alias=13448-di-</p><p>retrizes-curiculares-nacionais-2013-pdf&Itemid=30192 Acesso em: 09</p><p>nov. 2023.</p><p>BRASIL. Plano Nacional de Educação. Brasília: Presidência da Repúbli-</p><p>ca, 2014. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_</p><p>ato2011-2014/2014/lei/l13005.htm Acesso em: 09 nov. 2023.</p><p>BRASÍLIA. Plano de Desenvolvimento Institucional (2019-2023).</p><p>Brasília: IFB, 2021. Disponível em: https://diretorios.ifb.edu.br/</p><p>diretorios/1724/arquivos/download/PDI_2019_2023_-_Revisa-</p><p>do_P%C3%B3s_CS-Completo.pdf Acesso em: 09 nov. 2023.</p><p>BUTLER, J. Problemas de gênero: feminismo e a subversão da</p><p>identidade. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2018.</p><p>CEILÂNDIA. Projeto Político Pedagógico (PPP) 2018-2023: uma</p><p>construção coletiva e integrada no Campus Ceilândia. Ceilândia:</p><p>IFB-Campus Ceilândia, 2018. Disponível em: https://www.ifb.edu.</p><p>br/attachments/article/19085/PPP_FORMATADO_TIMBRADO%20</p><p>21_10.pdf Acesso em: 09 nov. 2023.</p><p>FREIRE, P; SHOR, I. Medo e ousadia: o cotidiano do professor.</p><p>10.ed. Rio de Janeiro: Editora Paz e Terra, 2010.</p><p>HENRIQUES, R.; BRANDT, M. E. A.; JUNQUEIRA, R. D; CHAMUSCA,</p><p>A. Gênero e diversidade sexual na escola: reconhecer diferenças</p><p>e superar preconceitos. Brasília: Secad/MEC, 2007.</p><p>JESUS, J. G. Orientações sobre a população transgênero: conceitos</p><p>e termos. Brasília: Autor, 2012. Disponível em: https://files.cer-</p><p>comp.ufg.br/weby/up/16/o/ORIENTA%C3%87%C3%95ES_POPU-</p><p>LA%C3%87%C3%83O_TRANS.pdf?1334065989 Acesso em: 09 nov.</p><p>2023.</p><p>LOURO, G. L. Gênero, sexualidade e educação. 7. ed. Petrópolis: Vozes,</p><p>2004.</p><p>Mãe da Luísa, autista nível 3 de suporte, Mestranda em</p><p>Educação FEBF/UERJ; Pesquisadora, Bolsista FAPERJ; Pedagoga;</p><p>Psicopedagoga; Pós graduada em Liderança Qualificação em</p><p>Cannabis Medicinal e ABA; Integrante do Núcleo de Estudos e</p><p>Pesquisas em Educação Especial e Inclusiva - NEEI/UERJ; Fundadora</p><p>e Presidente da Comunidade Autismo em Xerém; Membro do Lions</p><p>Clube Cibernético Acessibilidade e Inclusão Social.</p><p>KEZIA GRAZIELA DE</p><p>QUEIROZ</p><p>DO MOVIMENTO SOCIAL A</p><p>MEMÓRIA, DA MEMÓRIA</p><p>Á CONSCIÊNCIA:</p><p>UM PANORAMA DA LUTA</p><p>DAS FAMÍLIAS DA</p><p>PESSOA COM DEFICIÊNCIA</p><p>EM DUQUE DE CAXIAS</p><p>I S I M P Ó S I O D I V E R S I D A D E E R E S I S T Ê N C I A</p><p>B R A S Í L I A / D F 2 0 2 3</p><p>DO MOVIMENTO SOCIAL A MEMÓRIA, DA MEMÓRIA Á CON-</p><p>SCIÊNCIA: UM PANORAMA DA LUTA DAS FAMÍLIAS DA</p><p>PESSOA COM DEFICIÊNCIA EM DUQUE DE CAXIAS</p><p>Autoria:</p><p>Kezia Graziela de Queiroz</p><p>Ediclea Mascarenhas Fernandes</p><p>GÊNERO E DIVERSIDADE E INTERSECCIONALIDADE(S) (RAÇA-ETNIA E LUTA ANTIR-</p><p>RACISTA, PESSOA COM DEFICIÊNCIA E LUTA ANTICAPACITISTA;</p><p>RESUMO</p><p>Esse trabalho visa reconstruir a memória dos mov-</p><p>imentos sociais da pessoa com deficiência no mu-</p><p>nicípio periférico de Duque de Caxias, situado na</p><p>Baixada Fluminense, e os movimentos contemporâ-</p><p>neos de mães e pais das pessoas com deficiências.</p><p>Relacionando a sua identidade histórica, territorial e</p><p>a consciência do direito a existência de seus filhos.</p><p>As interferências no rumo das politicais públicas do</p><p>município, como a lei que estabelece o Conselho</p><p>de Direitos da Pessoa com Deficiência, as primeiras</p><p>instituições de ensino para alunos com deficiências</p><p>no município, e o recente movimento originado de</p><p>mulheres que são mães de crianças, jovens e adultos</p><p>autistas residentes de Duque de Caxias. Busca-se um</p><p>dialogo entre o sentido da periferia e a identidade</p><p>da luta desse segmento populacional. O presente es-</p><p>tudo se apoia no método qualitativo e revisão bib-</p><p>liográfica. Para Minayo (2014) o método qualitativo</p><p>pressupõe a disposição em observar, compreender,</p><p>e a flexibilidade dos fenômenos sociais existentes,</p><p>pelos quais os elementos da pesquisa se tornam</p><p>interligados. O autor D’Andrea (2020) entende o su-</p><p>jeito periférico como produtor do seu próprio meio,</p><p>impactando diretamente na resinificação não apenas</p><p>de um termo mas do sentido existencial da periferia</p><p>como território de identidades. E falar sobre identi-</p><p>dade é também abordar as marcas, compreenden-</p><p>do como as identificações, agravadas pelas mazelas</p><p>sociais, contribuem para a construção de um senti-</p><p>do coletivo e existencial do direito a vida. E para um</p><p>mãe, qual é o direito que o filho com deficiência tem</p><p>de existir no mundo?. Observamos que a identidade</p><p>e território, baixada fluminense e o sentido social</p><p>da deficiência, em que seus sujeitos orgânicos in-</p><p>terferem na história ao longo do tempo a partir dos</p><p>fenômenos inerentes as suas realidades. Transfor-</p><p>mando a percepção sobre os aspectos de suas vidas</p><p>e vivências. Corroborando para que essa nova con-</p><p>sciência interaja significativamente a modificar os ru-</p><p>mos</p><p>das políticas públicas e compreensões sociais da</p><p>condição dos direitos humanos da pessoa com defi-</p><p>ciência, em que pese ter apoios que promovam sua</p><p>dignidade, direitos, inclusão e funcionalidade.</p><p>PALAVRAS-CHAVE: Duque de Caxias. Periferia. Pes-</p><p>soa com Deficiência.</p><p>INTRODUÇÃO:</p><p>Essa pesquisa se constitui no recorte geográfico do</p><p>Município de Duque de Caxias, situado na Baixada</p><p>Fluminense do Estado do Rio de Janeiro. Que atual-</p><p>mente se aproxima dos quase um milhão de habi-</p><p>tantes em seus 465 km². Duque de Caxias um dos</p><p>mais expressivos municípios da Baixada Fluminense</p><p>tem divisas com os municípios de Miguel Pereira,</p><p>Petrópolis, Magé, Rio de Janeiro, São João de Mer-</p><p>iti e Nova Iguaçu. Suas quatro bacias hidrográficas,</p><p>são: Iguaçu, Meriti, Sarapuí e Estrela. Sendo divido</p><p>em quatro distritos 1º- Duque de Caxias, 2º- Cam-</p><p>pos Elíseos, 3º- Imbariê, 4º- Xerém.</p><p>Até os anos de 1940 Duque de Caxias, São João</p><p>de Meriti e Nilópolis juntos com Nova Iguaçu era</p><p>apenas um único local territorial e geográfico. O</p><p>município destacado tinha por nome Merity, e na</p><p>década de 1940 tinha uma população estimada em</p><p>100.000 habitantes, após a sua emancipação no dia</p><p>31 de dezembro do ano de 1943 mediante o decre-</p><p>to de Lei nº 1.055 foi criado o município que passou</p><p>a se chamar Duque de Caxias em homenagem ao</p><p>militar Luiz Alves de Lima e Silva que recebeu o títu-</p><p>lo nobiliárquico de Barão de Caxias em 1841. Luiz</p><p>Alves de Lima e Silva nasceu na Capitania do Rio de</p><p>Janeiro na fazenda de São Paulo, atualmente é onde</p><p>se encontra o Parque Histórico Duque de Caxias, no</p><p>município de Duque de Caxias.</p><p>Algumas décadas depois a Lei Orgânica do Mu-</p><p>nicípio de Duque de Caxias foi criada, em 5 de abril</p><p>de 1990. Que dispõe de diretrizes para a organi-</p><p>zação dos setores públicos e políticos do município</p><p>alinhadas a Constituição Federal e a Constituição</p><p>do Estado do Rio de Janeiro. Contendo 196 artigos</p><p>e mais 44 artigos de disposições transitórias, que</p><p>regimentam a vida pública da cidade. No artigo 1º</p><p>parágrafo único descreve as ações municipais como</p><p>o desenvolvimento em todo o território geográfi-</p><p>co, sem privilegiar nenhum dos distritos ou bairros,</p><p>busca-se reduzir as desigualdades sociais e region-</p><p>ais, bem como promover o bem-estar de todos os</p><p>cidadãos munícipes de Duque de Caxias, sem dis-</p><p>tinção de raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras</p><p>formas de discriminação.</p><p>Figura 1 – Mapa geográfico Município de Duque de Caxias</p><p>Fonte: RODRIGUES, A. B. 2020</p><p>Segundo dados do Censo de 2022 do IBGE o mu-</p><p>nicípio de Duque de Caxias possui um total de</p><p>808.152 pessoas e densidade demográfica de</p><p>1.729,34 de habitante por quilômetro quadrado. A</p><p>unidade territorial do município é de 467.319 km².</p><p>(IBGE, 2022)</p><p>Objetiva-se reconstruir a memória dos movimen-</p><p>tos sociais da pessoa com deficiência no município</p><p>periférico de Duque de Caxias, situado na Baixada</p><p>Fluminense, e os movimentos contemporâneos</p><p>de mães e pais das pessoas com deficiências. Rel-</p><p>acionando a sua identidade histórica, territorial e</p><p>a consciência do direito a existência de seus filhos.</p><p>As interferências no rumo das politicais públicas do</p><p>município, como a lei que estabelece o Conselho</p><p>de Direitos da Pessoa com Deficiência, as primeiras</p><p>instituições de ensino para alunos com deficiên-</p><p>cias no município, e o recente movimento origina-</p><p>I S I M P Ó S I O D I V E R S I D A D E E R E S I S T Ê N C I A</p><p>B R A S Í L I A / D F 2 0 2 3</p><p>do de mulheres que são mães de crianças, jovens</p><p>e adultos autistas residentes de Duque de Caxias.</p><p>Busca-se um dialogo entre o sentido da periferia e</p><p>a identidade da luta desse segmento populacional.</p><p>A memória, cultura e o patrimônio são um bem ima-</p><p>terial na sociedade, ou seja, o valor e a importância</p><p>que o fenômeno possui para a comunidade local.</p><p>Memória também é pertencimento, é identidade e</p><p>resistência. Se constituindo como o resgate de vivên-</p><p>cias passadas intrínsecas as suas condições de vida</p><p>atuais. Para Bezerra as memórias sociais são empod-</p><p>eramentos de luta e resistência, o autor destaca que:</p><p>As memórias coletivas se formam a partir da relação</p><p>com o outro. Já dizia Maurice Halbwachs que toda a</p><p>memória é coletiva. Mesmo as memórias individuais</p><p>se constituem de quadros elaborados nas relações</p><p>entre diferentes indivíduos de uma sociedade. Esses</p><p>seriam os “quadros sociais da memória”, que servem</p><p>como referências para a construção das lembranças</p><p>de cada pessoas. São esses quadros que determinam o</p><p>que se deveria lembrar, esquecer, silenciar ou comem-</p><p>orar pelas comunidades e indivíduos, considerando um</p><p>contexto de quando e onde os episódios, acontecimen-</p><p>tos e trajetórias se deseja rememorar. (Bezerra, 2021)</p><p>Assim sendo se torna possível pensar que pessoas</p><p>são como museus, a partir da subjetividade que se</p><p>conecta e constrói ou intervém em novas memórias.</p><p>Em cada história de vida temos a oportunidade de</p><p>visitar o templo sagrado das memórias.</p><p>Bezerra e Barros apontam um conceito de perife-</p><p>ria sendo aquele que “remete a uma posição pelo</p><p>que é considerado centro, sendo um território ou</p><p>uma situação, havendo atribuição de maior val-</p><p>or ao que é central e atribuição de certo estigma</p><p>ao que é periférico e marginal” (2020). Revisitar</p><p>a partir da memória coletiva do sujeito periférico</p><p>com deficiência, cujo território geográfico lhe traz</p><p>distanciamentos de direitos, concepções, culturas,</p><p>educação, saúde, lazer, dignidade humana e a sua</p><p>própria vida. É propiciar uma plataforma de eman-</p><p>cipação da consciência, desconstruindo conceitos</p><p>impostos de subalternização ante as práticas de dis-</p><p>criminação e exclusão. É, também, empoderamen-</p><p>to coletivo, fortalecimento e unificação pela dignifi-</p><p>cação da vida das pessoas com deficiência.</p><p>FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA E METODOLÓGICA</p><p>Esse estudo se apoia no método qualitativo e de re-</p><p>visão bibliográfica. Sendo possível revisitar fontes e</p><p>dados históricos, bem como acervos pessoais, para</p><p>descrever o panorama da pessoa com deficiência</p><p>em Duque de Caxias, nos anos de 1980 a 2023.</p><p>Para Minayo (2014) o método qualitativo pressupõe</p><p>a disposição em observar, compreender, a flexibili-</p><p>dade dos fenômenos sociais existentes, pelos quais</p><p>os elementos da pesquisa se tornam interligados.</p><p>O autor D’Andrea (2020) entende o sujeito periféri-</p><p>co como produtor do seu próprio meio, impactan-</p><p>do diretamente na resinificação não apenas de um</p><p>termo mas do sentido existencial da periferia como</p><p>território de identidades. E falar sobre identidade é</p><p>também abordar as marcas, compreendendo como</p><p>as identificações, agravadas pelas mazelas sociais,</p><p>contribuem para a construção de um sentido cole-</p><p>tivo e existencial do direito a vida. E para um mãe,</p><p>qual é o direito que o filho com deficiência tem de</p><p>existir no mundo?.</p><p>A língua é patrimônio, a linguagem é patrimônio e a</p><p>palavra também é patrimônio. A palavra patrimônio</p><p>arquiva camadas e camadas de sentido e conserva em</p><p>cada uma de suas camadas múltiplas linhas de con-</p><p>exão. Seria possível investigá-la em perspectiva trans-</p><p>versal, seria possível pesquisar os seus movimentos no</p><p>tempo e no espaço, mas não é esse o caminho que será</p><p>trilhado. A empreitada que se delineia é menos ambi-</p><p>ciosa, mas não menos desafiante. A palavra patrimô-</p><p>nio é patrimônio, não é necessário muito esforço para</p><p>alcançar este entendimento; assim também não é pre-</p><p>ciso nenhuma capacidade especial para compreender</p><p>que a palavra patrimônio é um substantivo abstrato</p><p>que se aplica aos bens materiais e imateriais, móveis e</p><p>imóveis. (CHAGAS, 2016.)</p><p>Para Chagas a língua é patrimônio, a comunicação,</p><p>a expressão, o abstrato e o imaterial. Nessa mesma</p><p>lógica, os movimentos sociais também são movi-</p><p>mentos corporais. O deslocamento a um órgão pú-</p><p>blico para denunciar as desigualdades sociais, os</p><p>caminhos, as corridas, as caminhadas aos fóruns</p><p>de organizações para contestar o agravamento da</p><p>gestão pública ineficaz. O corpo que fala ou que é</p><p>silêncio, o corpo que se esconde do grito e o corpo</p><p>que grita, se encontram nas ruas,</p><p>na cidade, sem</p><p>acessibilidade física, estrutural, e sensorial. A lín-</p><p>gua, como comunicação, sendo patrimônio, atribui</p><p>aos corpos a imaterialidade. A memória como pat-</p><p>rimônio de línguas, corpos, culturas e movimentos,</p><p>une tempos e vivências que se passam e perpassam</p><p>em épocas distintas. A seguir são apresentados os</p><p>marcos históricos da memória dos movimentos so-</p><p>ciais de pessoas com Deficiência em Duque de Cax-</p><p>ias, em sua maioria, extraídos da Tese de Doutora-</p><p>do “Estudo descritivo da aplicação do paradigma da</p><p>Associação Americana de Retardo Mental na comu-</p><p>nidade de Barro Branco” (Fernandes, 2000).</p><p>MOVIMENTOS SOCIAIS EM DUQUE DE CAXIAS</p><p>(1980 á 2023).</p><p>• Associação Pestalozzi de Duque de Caxias</p><p>foi fundada em 18/03/1982, é uma instituição ded-</p><p>icada aos cuidados e promoção do atendimento</p><p>especializado do desenvolvimento de pessoas com</p><p>deficiências integrando áreas como a educação,</p><p>saúde, autocuidado, esporte e lazer.</p><p>• APEX ( Associação de Pais de Excepcionais)</p><p>organizada dos anos de 1980. Associação de Pais e</p><p>Amigos dos Excepcionais funcionava no 1º distrito de</p><p>Duque de Caxias, mantendo serviços de fonoaudio-</p><p>logia, serviço social, Teste do Pezinho, pedagogia.</p><p>• Em 1989 a criação da Divisão de Educação</p><p>Especial da Secretaria Municipal de Educação. Im-</p><p>plantação de fóruns sociais que colaboraram na</p><p>instauração da comissão de estudos e propostas</p><p>para a Lei Orgânica do Conselho Municipal de Di-</p><p>reitos da Pessoa Portadora de Deficiência.</p><p>• A Associação de Pais e Amigos dos Excepcio-</p><p>nais de Duque De Caxias foi fundada em 31/08/1990.</p><p>Dispondo de serviços prestados pela APAE como:</p><p>Atendimento educacional especializado, Atendimen-</p><p>to social, Atendimento em saúde Atendimento es-</p><p>portivo e cultural, Atendimento jurídico.</p><p>• Associação de Pessoas Portadoras de Defi-</p><p>ciência Visual ( APPDEV ) - que reúne pessoas por-</p><p>tadoras de deficiência visual, e especialistas na luta</p><p>pela garantia de direitos dos portadores de defi-</p><p>ciência visual, principalmente no que concerne a</p><p>abertura do mercado de trabalho.</p><p>• Em 1991 a inauguração da Divisão de Aten-</p><p>dimento aos Portadores de Necessidades Especiais</p><p>da Secretaria de Ação Social.</p><p>• O Seminário de Educação (1994) para Todos</p><p>promovido pela AFE Associação Fluminense de Ed-</p><p>ucação, destinada a pais e profissionais unidos pela</p><p>educação das pessoas com deficiências.</p><p>• Centro de Atenção a Pessoa Portadora de</p><p>Deficiência criado em 1997, com os primeiros pro-</p><p>jetos de reabilitação em parceria com o Serviço de</p><p>Organização em Ação Popular/SEOP.</p><p>• O Conselho de Direitos da Pessoa com Defi-</p><p>ciência de Duque de Caxias, foi criado no dia 7 de</p><p>junho do ano de 2000, pela Lei de nº 1.526/2000,</p><p>por decorrência de um histórico movimento social</p><p>das famílias dos excepcionais e dos profissionais</p><p>ligados a esse campo.</p><p>• Inauguração do Centro de Convivência para</p><p>Pessoas com Deficiências da instituição Lions Clube</p><p>do Brasil, em 2017.</p><p>• A associação de pais Comunidade Autismo</p><p>em Xerém surge a partir de um movimento social</p><p>de mães e pais de pessoas com autismo e outras</p><p>deficiências, buscando o cumprimento dos direitos</p><p>referentes ao acesso à educação e a saúde. E no ano</p><p>de 2022 e 2023 o movimento toma forma protago-</p><p>nizando algumas ações pioneiras no município, tais</p><p>como: o 1º Piquenique Inclusivo de Duque de Cax-</p><p>ias, a 1ª Caminha de Conscientização sobre o Autis-</p><p>mo em Xerém, a 1ª Corrida dos Autistas e Inclusiva</p><p>da Baixada Fluminense, que aconteceu no dia 18 de</p><p>junho dia Mundia do Orgulho Autista, a 1ª Festa da</p><p>Roça Atípica e Inclusiva de Duque de Caxias realiza-</p><p>da no mês de julho do ano de 2023, Dias das Cri-</p><p>anças Atípicas e Inclusiva, inauguração da série de</p><p>Lives Deficiência & Periferia cujo objetivo é difundir</p><p>o conhecimento e informações as famílias. Dentre</p><p>outras ações de promoção a cultura e ao lazer as</p><p>pessoas com deficiências.</p><p>Desde 1980 o município de Duque de Caxias vem</p><p>construindo e ações de luta das pessoas com defi-</p><p>ciências para terem direitos assegurados e cumpri-</p><p>dos. Como vimos, dentre eles, a escolarização, a</p><p>saúde, o esporte, cultura, lazer, e mercado de tra-</p><p>balho. Nessa pesquisa foi possível constatar que a</p><p>cidade possui quase 50 anos de história e memórias</p><p>de mães resistentes, famílias, e pessoas com defi-</p><p>ciência.</p><p>Diante disso nota-se um protagonismo e identidade,</p><p>no campo do enfrentamento por condições básicas</p><p>de vida, entre os movimentos sociais das pessoas</p><p>com deficiência na cidade de Duque de Caxias. Que</p><p>interferiram nos fóruns de educação, na criação do</p><p>conselho municipal de direitos da pessoa com defi-</p><p>ciência, na popularização de suas realidades vide os</p><p>meios de comunicação digital, bem como seus posi-</p><p>cionamentos políticos de consciência ao revindi-</p><p>carem direitos e acesso aos direitos humanos para</p><p>seus filhos e filhas, para suas próprias condições em</p><p>caso de pessoa com deficiência.</p><p>I S I M P Ó S I O D I V E R S I D A D E E R E S I S T Ê N C I A</p><p>B R A S Í L I A / D F 2 0 2 3</p><p>CONCLUSÃO</p><p>Observa-se que a identidade e território, baixada</p><p>fluminense e o sentido social da deficiência, em que</p><p>seus sujeitos orgânicos interferem na história ao</p><p>longo do tempo a partir dos fenômenos inerentes</p><p>as suas realidades. Transformando a percepção so-</p><p>bre os aspectos de suas vidas e vivências. Corrobo-</p><p>rando para que essa nova consciência interaja sig-</p><p>nificativamente a modificar os rumos das políticas</p><p>públicas e compreensões sociais da condição dos</p><p>direitos humanos da pessoa com deficiência, em</p><p>que pese ter apoios que promovam sua dignidade,</p><p>direitos, inclusão e funcionalidade.</p><p>REFERÊNCIAS:</p><p>Barros, S. A. P. de ., & Bezerra, A. C. D. da R.. (2020). Não</p><p>brancos(as) e periféricos(as): histórias da docência no Brasil .</p><p>Revista Brasileira De Educação, 25(Rev. Bras. Educ., 2020 25),</p><p>e250042. https://doi.org/10.1590/S1413-24782020250042</p><p>CHAGAS, Mario. Patrimônio é o caminho das formigas. In:</p><p>Anais do Museu Histórico Nacional , 2016.</p><p>BEZERRA, N. (2021). MEMÓRIAS CENTENÁRIAS: Joãozinho da</p><p>Gomeia e o Museu Vivo do São Bento. Periferia, 12(3), 154–</p><p>174. https://doi.org/10.12957/periferia.2020.54883</p><p>D’ANDREA, T.. (2020). Contribuições para a definição dos</p><p>conceitos periferia e sujeitas e sujeitos periféricos. Novos Es-</p><p>tudos CEBRAP, 39(Novos estud. CEBRAP, 2020 39(1)), 19–36.</p><p>FERNANDES, Mascarenhas Ediclea. Estudo descritivo da apli-</p><p>cação do paradigma da Associação Americana de Retardo</p><p>Mental na comunidade de Barro Branco. 2000. 218 f. Tese</p><p>(Doutorado em Ciências) – Fundação Oswaldo Cruz- Instituto</p><p>Fernandes Figueira, Rio de Janeiro, 2000.</p><p>Lei Orgânica do Município de Duque de Caxias. Câmara</p><p>Municipal de Duque de Caxias, 2023. Disponível em: https://</p><p>www.cmdc.rj.gov.br/?page_id=1155 . Acesso em: 23/08/2023</p><p>MINAYO, Maria Cecília de Souza. O desafio do conhecimento:</p><p>pesquisa qualitativa em saúde. 14a edição. São Paulo: Hucitec</p><p>Editora, 2014. 407 p.</p><p>PANORAMA CIDADE DUQUE DE CAXIAS, IBGE, 2010. Dis-</p><p>ponível em: https://cidades.ibge.gov.br/brasil/rj/duque-de-</p><p>caxias/pesquisa/23/23612?tipo=ranking&indicador=23997,</p><p>acesso em: 23/08/2023</p><p>QUEIROZ, K. G. de, & FERNANDES, E. M. (2021). Encontro dos</p><p>conselhos de direitos da pessoa com deficiência no estado</p><p>do Rio de Janeiro/ Meeting of the councils for the rights of the</p><p>person with disabilities in Rio de Janeiro. Brazilian Journal of</p><p>Development,7(2), 20226–20234. https://doi.org/10.34117/</p><p>bjdv7n2-593</p><p>RODRIGUES, Angélica de Sá de Oliveira Bauer. A educação</p><p>pública nas Atas da Câmara Municipal de Duque de Cax-</p><p>ias (1947-1958). 2020. 189 f. Dissertação (Mestrado em Ed-</p><p>ucação, Cultura e Comunicação) - Faculdade de Educação da</p><p>Baixada Fluminense, Universidade do Estado do Rio de Janei-</p><p>ro, Duque de Caxias, 2020.</p><p>Reside em Maringá desde 2007. Artista independente a seis anos</p><p>interpreta a Drag Queen Charllot Katarina. É formada em vestuário</p><p>com especialização na vestibilidade trans. Ativista Social e da luta</p><p>das mulheres, é pesquisadora e militante; Primeira mulher trans</p><p>a ocupar um cargo de chefia dentro de uma gestão municipal no</p><p>estado do</p><p>Paraná, é Gerente de Pesquisa, Ação Formativa e Eventos</p><p>na secretaria de políticas públicas para mulheres. Leonna é Vice-</p><p>presidente do PDT Diversidade no estado do Paraná.</p><p>LEONNA MORIALE</p><p>NATALE</p><p>PESSOAS TRANS E</p><p>A NEGATIVA AOS</p><p>ESPAÇOS DE PODER E</p><p>DECISÃO</p><p>I S I M P Ó S I O D I V E R S I D A D E E R E S I S T Ê N C I A</p><p>B R A S Í L I A / D F 2 0 2 3</p><p>PESSOAS TRANS E A NEGATIVA AOS ESPAÇOS DE</p><p>PODER E DECISÃO</p><p>Autoria:</p><p>Leonna Moriale Natale</p><p>A PESQUISA E A EXTENSÃO OU RELATOS DE EXPERIÊNCIA COMO AÇÕES DE COMBATE</p><p>À LGBTFOBIA E/OU DE FORTALECIMENTO DA IDENTIDADE DE PESSOAS LGBTQIAPN+.</p><p>RESUMO</p><p>O Brasil ocupa, há quatorze anos consecutivos, o</p><p>primeiro lugar no ranking de países que mais ma-</p><p>tam a diversidade no mundo. No país, não há leis</p><p>que proíbam as manifestações de Gênero e Sexual-</p><p>idade que divergem da Cis Hétero normatividade,</p><p>nem punições como tortura ou pena de morte, mas</p><p>ainda assim estão presentes os altos índices de as-</p><p>sassinato e suicídio de pessoas LGBTQIA+. A popu-</p><p>lação que tem, em média, 35 anos de idade como</p><p>expectativa de vida, sofre com a exposição de seus</p><p>corpos apontados como piada, doença e pecado;</p><p>são pessoas expulsas de casa, discriminadas nas es-</p><p>colas e excluídas do mercado de trabalho. Mais de</p><p>40% das pessoas trans já tentaram tirar a própria</p><p>vida. A violência cometida por crime de ódio, em</p><p>razão da identidade de gênero ou sexualidade do</p><p>indivíduo, segue um plano de afastá-los dos grandes</p><p>centros e discussões, jogando o véu da invisibili-</p><p>dade e levando a diversidade, negritude, movimen-</p><p>to de mulheres e outras minorias para as periferias,</p><p>para o trabalho informal, para as instituições de</p><p>ensino defasadas, para locais com baixas condições</p><p>de saneamento e segurança, além da insegurança</p><p>alimentar e de saúde precária. Uma denúncia séria</p><p>que, desde o ano de 1969, por Marsha P. Jhonson</p><p>e Sylvia Rivera, segue sendo o grito de luta de uma</p><p>comunidade, através de sindicatos, comissões,</p><p>conselhos, observatórios, manifestações, paradas</p><p>e pesquisas. O movimento organizado de pessoas</p><p>LGBTQIA+, os coletivos e militâncias vem se organi-</p><p>zando para a criação de políticas públicas e sociais</p><p>que garantam a inserção e permanência nos es-</p><p>paços garantidos por direito, como a moradia, tra-</p><p>balho, saúde e lazer, entre outros. Buscam, através</p><p>do Legislativo, a criação de leis que possibilitem a</p><p>equidade na prática, pois, além da constituição fed-</p><p>eral que tipifica e condena, ainda há leis que pre-</p><p>cisam de atualizações, de modificações pensando</p><p>em uma sociedade para todos. Ações afirmativas</p><p>fazem parte da identidade de uma pessoa, como</p><p>indivíduo, ser pensante, com CPF e RG, pagando</p><p>os seus impostos e contribuindo na construção da</p><p>sociedade e sua história. O enfrentamento à violên-</p><p>cia intrafamiliar, no espaço acadêmico, do trabalho</p><p>e das práticas religiosas, é papel do poder público,</p><p>através de gestores comprometidos com as pautas</p><p>não só por interesse eleitoral, mas com consciên-</p><p>cia, estudo de causa, mapeamento, plano de ação</p><p>e atendimento humanizado, desenvolvendo, por</p><p>exemplo, capacitações, campanhas midiáticas e</p><p>publicitárias, ofertando cursos profissionalizantes,</p><p>desenvolvendo organismos como secretarias, dire-</p><p>torias, gerências voltadas a atender a diversidade,</p><p>a enfrentar a LGBTIfobia, fazendo um trabalho que</p><p>atinja diretamente a comunidade, mas que tam-</p><p>bém pense nos autores das mais diversas formas</p><p>de violência. A presença de pessoas LGBTQIA+ em</p><p>espaços de poder e decisão se faz urgente para que</p><p>participem ativamente das discussões e da elabo-</p><p>ração de estratégias, pensando e atuando seja no</p><p>Legislativo, Executivo ou Judiciário, no poder públi-</p><p>co, privado ou em ONGs e associações, não apenas</p><p>reivindicando, mas também atuando e fiscalizan-</p><p>do. Os espaços, as posições, os estereótipos, con-</p><p>struções sociais e destinos cruéis e excludentes que</p><p>foram escolhidos para as corpas dissidentes não os</p><p>servem mais.</p><p>PALAVRAS-CHAVE: Identidade. Gênero. Sexuali-</p><p>dade. Ação Afirmativa.</p><p>O Brasil ocupa, há quatorze anos consecutivos, o</p><p>primeiro lugar no ranking de países que mais ma-</p><p>tam a diversidade no mundo. No país, não há leis</p><p>que proíbam as manifestações de Gênero e Sexual-</p><p>idade que divergem da Cis Hétero normatividade,</p><p>nem punições como tortura ou pena de morte, mas</p><p>ainda assim estão presentes os altos índices de as-</p><p>sassinato e suicídio de pessoas LGBTQIA+. Pessoas</p><p>que, quando não são assassinadas como vítimas</p><p>dos crimes de ódio, são acometidas pela depressão</p><p>e na maioria das vezes tentam o suicídio; mais de</p><p>40% da população Trans já tentou suicídio, entre</p><p>a faixa etária de 15 e 29 anos os índices são ainda</p><p>maiores (ALEJANDRO, 2022, BENEVIDES, 2018).</p><p>Esses indicadores são o reflexo de uma sociedade</p><p>que não foi educada para o respeito ao diferente</p><p>e reconhecimento dos padrões limitantes que são</p><p>impostos nas mais diversas áreas, como os padrões</p><p>de altura, peso, cor, raça, religião, padrões estéticos</p><p>e de comportamento social, identidade de gênero e</p><p>orientação sexual.</p><p>Rita Von Hunty, Drag queen interpretada pelo pro-</p><p>fessor Guilherme Terreri, nos apresenta em seu</p><p>discuso que todos nós nascemos crianças Queer e</p><p>que com passar do tempo, essa identidade livre nos</p><p>é arrancada (HUNTY, 2021). Experiência vivida de</p><p>maneira muito mais violenta com crianças LGBTI+,</p><p>mesmo que ainda não se reconheçam pertencentes</p><p>à comunidade, frases como “Menino não chora”,</p><p>“Isso é coisa de mulherzinha”, “Fala como homem”,</p><p>“Não se sente assim”, reverberam os padrões e es-</p><p>tereótipos do que é ser homem na nossa sociedade</p><p>atual, um padrão importado da Europa. São ordens,</p><p>comentários e expressões como estas que atuam</p><p>na formação da identidade masculina que futura-</p><p>mente será o autor de violências de gênero e que</p><p>criam limitações empostas às pessoas LGBTI+.</p><p>O crime de ódio é o crime praticado em razão do</p><p>sentimento de ódio que o indivíduo autor do crime</p><p>sente, em razão de um ou mais recortes identitári-</p><p>os da vítima, como sua identidade de gênero, ori-</p><p>entação sexual, cor, raça, etnia, religião, entre out-</p><p>ros. Não se trata de um crime motivado por fator</p><p>econômico, por desavenças particulares ou acerto</p><p>de contas, não é uma morte por briga de trânsito ou</p><p>um assassinato que foi antecedido por furto.</p><p>A particularidade do crime de ódio são os requintes</p><p>de crueldade, a intensa força empregada com obje-</p><p>tivo de desumanizar indivíduos denominados diver-</p><p>gentes da norma vigente, por isso nos noticiários,</p><p>certidões de óbito, reportagens, fontes de notícias</p><p>encontramos casos assombrosos de pessoas que-</p><p>imadas, esquartejadas, esfaqueadas com muitos</p><p>golpes ou assassinadas com diversos tiros (DEFEN-</p><p>SORIA PÚBLICA CE, 2019). Desconfigurar o rosto</p><p>de uma pessoa, violentar sexualmente um corpo,</p><p>raspar seus cabelos, arrancar sua cabeça e mutilar</p><p>seus órgãos genitais é destruir a identidade humana</p><p>e retirar dela qualquer resquício de indivíduo com</p><p>direitos. Tornando-a estatística, uma vida ceifada,</p><p>uma história interrompida (KLUSKA, 2015).</p><p>Na tentativa desesperada de resgate e justiça,</p><p>apelamos para que se dê um nome para essa es-</p><p>tatística, que mostre seu rosto para a sociedade,</p><p>contando a sua história, que muitas vezes ainda</p><p>é posta como justificativa ou fator determinante</p><p>para o crime conforme. Facilmente, o jornalismo</p><p>sensacionalista e descomprometido usa do nome</p><p>de registro não retificado para se referir a pessoas</p><p>trans, associando ao uso de drogas, a prostituição</p><p>e o recorte de pessoa em situação de rua, para in-</p><p>visibilizar o caráter de perversão, ódio e aversão à</p><p>comunidade LGBTQIAPN+, sim, com todas as letras,</p><p>especificidades e recortes. Isso ocorre porque inter-</p><p>essa ao noticiador (e à sociedade em geral) imputar</p><p>a culpa em alguém, e, nesse caso, na própria vítima,</p><p>sem dar fim às violências, apenas dando continui-</p><p>dade no discurso discriminatório que dá sentença</p><p>de morte a um corpo com marca de alvo. Porque foi</p><p>ensinado assim, porque o certo é a cis heteronor-</p><p>matividade, porque o diferente é errado, é estra-</p><p>sem a di-</p><p>mensão das questões que envolve o gênero e a sex-</p><p>ualidade, “razão para proibi-las de falarem dele[s],</p><p>razão para fecharem os olhos e tapar os ouvidos</p><p>onde quer que venham a manifestá-lo, razão para</p><p>impor um silêncio geral e aplicado” (FOUCAULT,</p><p>2009, p. 10), segundo o autor isso é uma forma</p><p>de repressão e neste sentindo, distingue das inter-</p><p>dições mantidas pela simples lei penal ao dizer que</p><p>“a repressão funciona, de certo como condenação</p><p>ao desaparecimento, mas também como injunção</p><p>ao silêncio, afirmação de inexistência e, consequen-</p><p>temente, constatação de que, em tudo isso, não</p><p>há nada para dizer, nem para ver, nem para saber”</p><p>(FOUCAULT, 2009, p. 10).</p><p>Neste cerne, a escola, de um modo geral, está or-</p><p>ganizada de forma seriada, seus conhecimentos</p><p>são passados na medida em que vão sendo com-</p><p>plexificados a cada série avançada, acompanhado</p><p>da suposta ideia de que existe uma idade para cada</p><p>conhecimento, que todas as crianças aprendem da</p><p>mesma maneira e no mesmo ritmo.</p><p>O que ocorre é o entendimento de que falar de sex-</p><p>ualidade é explorar os conteúdos curriculares de</p><p>reprodução humana, métodos anticoncepcionais e</p><p>doenças sexualmente transmissíveis. Desta forma,</p><p>o conceito biologizantes da ciência moderna nega</p><p>suas implicações socioculturais e das outras áreas</p><p>do conhecimento tais como das Ciências Socais. A</p><p>docência pode se posicionar de variadas formas.</p><p>Pode se calar e ser cúmplice das injúrias e demais</p><p>violências que acontece na escola, mas também,</p><p>se posicionar e ajudar a dissolver essa temática na</p><p>pratica docente como solucionar o problema do</p><p>estudante afeminada (MISKOLCI, 2012) entretan-</p><p>to, pode introduzir um diálogo e aproveitar as in-</p><p>úmeras situações que surgem no cotidiano escolar</p><p>para lidar com as questões da temática.</p><p>Nesse sentido, calar-se está longe de uma postura</p><p>de neutralidade; ao contrário, significa cumplici-</p><p>dade com o preconceito, consequência da ignorân-</p><p>cia sobre o assunto. Calar-se é também contribuir</p><p>com as estatísticas de exclusões e de mortes oriun-</p><p>das do processo social da homolesbotransfobia.</p><p>I S I M P Ó S I O D I V E R S I D A D E E R E S I S T Ê N C I A</p><p>B R A S Í L I A / D F 2 0 2 3</p><p>REFLEXÕES DE UMA PEDAGOGIA TRANSGRESSORA COMO ABORDAGEM</p><p>A pedagogia tradicional é hegemonicamente heter-</p><p>ossexista. Com isso, a vivência escolar nos fornece</p><p>inúmeros e lamentáveis exemplos dessa realidade</p><p>ideológica encarnada na figura do “abjeto”. Este</p><p>texto tem como finalidade fazer uma crítica a essa</p><p>pedagogia, heterossexista tendo como base a teoria</p><p>queer, seu horizonte de uma escola mais pluralista e</p><p>de uma criança – um futuro adulto mais tolerante. É</p><p>possível repensar o espaço significativo de reflexão</p><p>filosófica para que componentes de fundo moral,</p><p>sexual, ético e político, possam realmente se inte-</p><p>grar na pedagogia das escolas? De uma perspectiva</p><p>histórica, é interessante voltar aos anos 90 e então</p><p>verificar como variantes teóricas vão se ajustando</p><p>socialmente. A teoria queer, por exemplo, se con-</p><p>solida como corrente intelectual, tendo como uma</p><p>das fontes filosóficas principais as reflexões de Mi-</p><p>chel Foucault sobre a sexualidade. Outras de suas</p><p>fontes importantes foram os trabalhos sobre gêne-</p><p>ro de Judith Butler e as pesquisas de Eve Sedgwick,</p><p>pensadoras que interpretam a homossexualidade e</p><p>a heterossexualidade como construções históricas</p><p>e sociais, logo, como noções que podem e devem</p><p>ser repensadas e modificadas. Nesse sentido, a te-</p><p>oria queer desenvolveu uma crítica contundente</p><p>contra as premissas naturalizantes usadas pelo con-</p><p>servadorismo para justificar e legitimar a discrimi-</p><p>nação e a heteronormatividade. Vale assinalar que</p><p>a teoria queer não se resume a uma luta ligada à</p><p>sexualidade; ela se volta também para um combate</p><p>contra falsos valores que são usados como justifi-</p><p>cativas para a discriminação. Trata-se de uma luta</p><p>que envolve não apenas gays e sim todos os que</p><p>são vistos como impossibilitados de fazerem parte</p><p>da escala da normalidade.</p><p>Essa teoria teve também impacto nas formas ped-</p><p>agógicas e nas críticas ao sistema de formação nas</p><p>escolas. Não basta mais que a criança ou o adoles-</p><p>cente possa ter o domínio de um acervo de infor-</p><p>mações e ser também levado a construir preciosas</p><p>habilidades lógicas. É preciso, antes de tudo, auxil-</p><p>iar e mesmo promover formas de vivência da indi-</p><p>vidualidade e da sociabilidade, para que bases mo-</p><p>rais e éticas possam ser repensadas e constituídas</p><p>por meio de uma experiência vivida condizente com</p><p>as expectativas da dignidade humana de cada um.</p><p>Para melhor entender essa teoria, temos que recor-</p><p>rer à história, mais exatamente à segunda metade</p><p>do século XX, época em que ocorre o nascimento</p><p>de novos movimentos sociais, como o movimento</p><p>pelos direitos civis dos negros do Sul dos Estados</p><p>Unidos, a segunda onda do movimento feminista e</p><p>o movimento homossexual.</p><p>Esses movimentos reivindicavam fundamental-</p><p>mente dignidade e respeito da sociedade. Com</p><p>isso, revelaram que a sociedade burguesa era muito</p><p>mais ampla e complexa do que a velha distinção so-</p><p>ciológica e marxista entre burgueses e proletários.</p><p>Em outras palavras, esses movimentos mostraram</p><p>que a desigualdade ia muito além das injustiças</p><p>econômicas e de classes. Os “abjetos” surgem como</p><p>novos personagens sociais em meio a esse proces-</p><p>so. Explica Richard Miskolci que o termo “abjeção”</p><p>refere-se “ao espaço que a coletividade costuma</p><p>relegar a aqueles e aquelas que consideram uma</p><p>ameaça ao seu bom funcionamento, à ordem social</p><p>e política” (MISKOLCI, 2012, p.24).</p><p>A Rebelião de Stonewall, ocorrida em junho de</p><p>1969, foi o ponto de partida das lutas dos movimen-</p><p>tos homossexuais, às quais foram ganhando força e</p><p>espaço com o passar dos anos. Contudo, o objetivo</p><p>central do movimento que surgiu com essa rebe-</p><p>lião foi lutar pelo direito e pelo reconhecimento de</p><p>homossexuais brancos, alfabetizados e religiosos,</p><p>deixando de lado os não-brancos, analfabetos e</p><p>sem religiosidade. Mas tal movimento surgido em</p><p>Stonewall foi também reprodutor dos valores e pre-</p><p>conceitos da classe dominante.</p><p>Como reação não só ao conservadorismo sexual</p><p>tradicional, mas também ao movimento homos-</p><p>sexual até então hegemônico, surge nos Estados</p><p>Unidos a “Queer Nation”, cuja tradução literal é</p><p>algo próximo de “nação anormal”, “nação esquisi-</p><p>ta” (MISKOLCI, 2012, p.24). A intenção desse novo</p><p>movimento era mostrar que não existia apenas uma</p><p>minoria que lutava contra a “abjeção” e sim toda</p><p>uma nação que é deixada de lado e criticada pela so-</p><p>ciedade orientada, por exemplo, pela higienização,</p><p>quando os homossexuais e pessoas que viviam de</p><p>forma dissidente eram vistos como indivíduos sujos</p><p>e contaminados, inspiradores, portanto, de medo e</p><p>nojo. A propósito afirma Richard Miskolci:</p><p>Vale lembrar que queer é um xingamento, é</p><p>um palavrão em inglês. Em português, dá à im-</p><p>pressão de algo inteiramente respeitável, mas é</p><p>importante compreender que realmente é um pa-</p><p>lavrão, um xingamento, uma injuria. A ideia por</p><p>trás do Queer Nation era a de que parte da nação</p><p>foi rejeitada, foi humilhada, considerada abjeta,</p><p>motivo de desprezo e nojo, medo da contami-</p><p>nação. É assim que surge o queer, como reação</p><p>e resistência a um novo momento biopolítico in-</p><p>staurado pela AIDS. (MISKOLCI, 2012, p.24)</p><p>O movimento homossexual tradicional lutava por</p><p>aceitação e incorporação social de uma minoria vi-</p><p>olentamente discriminada. O movimento queer mo-</p><p>biliza-se então por essa aceitação e incorporação,</p><p>porém, criticando os padrões e os ditames de com-</p><p>portamentos que impediam os homossexuais de</p><p>fazerem parte dessa sociedade de maneira efetiva.</p><p>Historicamente, a expressão “teoria queer” foi usa-</p><p>da pela primeira vez por Teresa Lauretis, em 1991.</p><p>Ela empregou tal expressão na tentativa de juntar as</p><p>muitas pesquisas sobre a questão homossexual que</p><p>se encontravam dispersas. Assim, aquilo que surge</p><p>primeiramente como um movimento de luta políti-</p><p>ca, o “movimento queer”, transforma-se também</p><p>numa corrente teórica,</p><p>nho, é isso e aquilo. Não é alguém, com vontade,</p><p>gosto, sonho, expectativa, dignidade.</p><p>A população que tem, em média, 35 anos de idade</p><p>como expectativa de vida, ainda sofre com a ex-</p><p>posição de seus corpos apontados como piada,</p><p>doença e pecado (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2022);</p><p>são pessoas expulsas de casa, discriminadas nas</p><p>escolas e excluídas do mercado de trabalho (lima,</p><p>2023).</p><p>Não é difícil encontrarmos caricaturas e estereóti-</p><p>pos associados às identidades LGBTI+. Como</p><p>referências brasileiras encontramos, por exemplo, o</p><p>senhor Peru, na Escolinha do Professor Raimundo,</p><p>uma figura extremamente feminina, debochada e</p><p>com grande apelo sexual. A Vera Verão, que brincava</p><p>com as figuras de gênero tanto em sua imagem pes-</p><p>I S I M P Ó S I O D I V E R S I D A D E E R E S I S T Ê N C I A</p><p>B R A S Í L I A / D F 2 0 2 3</p><p>soal, referenciais de homem e mulher, uma person-</p><p>agem barraqueira, nervosa, sensual e escandalosa.</p><p>O mordomo Crô, Crodoaldo Valério, da novela Fina</p><p>Estampa, figura de um homem gay como servo de</p><p>uma mulher, extremamente obediente, referência</p><p>para escolhas de roupa e sapato. Ainda que existam</p><p>essas “figuras” dentro da comunidade e que essas</p><p>personagens tenham contribuído com a natural-</p><p>ização de pessoas LGBTI+, contribuíram também</p><p>com o reforço de estereótipos, na máxima posição</p><p>de uma figura alegre, engraçada, superficial. Sem</p><p>problematizar essas características, mas questionar</p><p>o motivo por trás de generalizar e evidenciar par-</p><p>ticularidades de cada indivíduo como de um todo,</p><p>além de não permitir que o que difere disso seja,</p><p>também, uma norma, ou que tenha a mesma vis-</p><p>ibilidade.</p><p>Se faz necessária, portanto, a avaliação de que essas</p><p>características que nos colocam dentro do aspecto</p><p>de piada são as mesmas utilizadas na intenção de</p><p>sentenciar uma identidade, até então entendida</p><p>como masculina, a algo frágil, fútil, sentimental…</p><p>Não por acaso, fazendo relação com a figura da</p><p>mulher, aqui utilizando do seu maior estereótipo no</p><p>que se diz “feminino”, não cientificamente falando,</p><p>mas no papel social desenvolvido pela mesma (RO-</p><p>CHA, 2018). Essa prática recorrente, está ligada ao</p><p>machismo estrutural, que volta na questão de en-</p><p>tendimento do homem como figura representante</p><p>e detentora de poder, conhecimento, força e sabe-</p><p>doria. Já a mulher como o oposto, na falta de to-</p><p>das essas virtudes, sobrando para ela a delicadeza e</p><p>sensibilidade, virtudes que a colocam em desvanta-</p><p>gem, segundo o discurso machista, porque não são</p><p>capazes de produzir grandes feitos, além de impedir</p><p>que as mesmas sejam detentoras de sensibilidade e</p><p>poder simultaneamente (ROCHA, 2018).</p><p>Sendo assim, conforme conhecimento difundido na</p><p>sociedade atual, de acordo com a autora, a mulher</p><p>ainda deve cuidar da casa, do marido e dos filhos,</p><p>e tudo mais que envolve a manutenção de limpeza,</p><p>comida e cuidados com a beleza e estética seguindo</p><p>o padrão de feminilidade atual: maquiagem, cabe-</p><p>lo, roupas, bolsas e sapatos, tudo sem exagero, mas</p><p>mantendo-se em alinhamento com o padrão (RO-</p><p>CHA, 2018; RANGEL, 2022).</p><p>Por outro lado, existe também a crença de que o</p><p>homem que se aproxima disso é um traidor, porque</p><p>renunciou à sua masculinidade ensinada. É uma</p><p>“florzinha”, “bichinha”, “mulherzinha”, é figura fem-</p><p>inina visual, e não socialmente falando, porque se-</p><p>guindo a biologia e ciência produzidas pelos homens</p><p>senhores das leis, do conhecimento e da academia,</p><p>esse indivíduo ainda é um homem, pois o seu órgão</p><p>genital definiu isso (RANGEL, 2022). Esse indivíduo,</p><p>que não é homem nem mulher, que é os dois sem</p><p>poder ser nenhum, é uma piada, motivo de riso e</p><p>escárnio.</p><p>Pessoas trans, homens, mulheres, travestis e não</p><p>binárias, enfrentam estes e outros questionamen-</p><p>tos sobre seus corpos, como a hipersexualidade,</p><p>ligada à prostituição não como profissão e meio de</p><p>sobrevivência, mas como escolha. A anulação de</p><p>vontade e desejo sexual destes corpos, destinan-</p><p>do a elas o rótulo de objeto sexual, de prestadores</p><p>de serviço (remunerado ou não, devido aos relatos</p><p>de estupro praticados contra pessoas trans) (HYPE-</p><p>NESS, 2017). Paralelo a isso, o estigma de doença</p><p>acompanha a comunidade, seja a doença mental,</p><p>física ou sexual (BATISTA, 2022).</p><p>Durante as décadas de 70, 80 e 90, a AIDS ficou</p><p>conhecida como a doença dos gays, uma doença</p><p>silenciosa que segundo o credo da época, era trans-</p><p>mitida pelo contato com o grupo GLS (sigla que era</p><p>usada para identificar a comunidade de Gays, Lés-</p><p>bicas e Simpatizantes, que hoje entendemos como</p><p>LGBTQIAPN+) (CAMPANA, 2019). A falta de infor-</p><p>mação, pesquisa e debate sobre o tema, perpetu-</p><p>ou a ideia de que a comunidade é a causadora e</p><p>disseminadora do vírus HIV que causa a AIDS, con-</p><p>forme afirma Campana (2019).</p><p>Além disso, se faz necessário reconhecer o apag-</p><p>amento histórico do período da ditadura que pro-</p><p>moveu uma perseguição em massa de travestis e</p><p>transexuais, torturando-as e assassinando-as, utili-</p><p>zando de consultórios médicos e clínicas psiquiátri-</p><p>cas para a promoção da cura de algo que não é</p><p>doença. Pessoas foram submetidas a tratamentos</p><p>de choque, exposição à pornografia heterossexual,</p><p>o uso de camisa de força e remédios controlados</p><p>para a terapia de conversão sexual (IESOGI, 2020).</p><p>Somente em 17 de maio de 1990, a Organização</p><p>Mundial da Saúde (OMS) retirou a homossexuali-</p><p>dade da classificação de Estatística Internacional de</p><p>Doenças e Problemas Relacionados a Saúde. Ainda</p><p>em um contexto onde termos como “Homossexu-</p><p>alismo” e “Traveco” eram pouco problematizados.</p><p>Entidades religiosas foram protagonistas em di-</p><p>versos momentos da história das discussões sobre</p><p>gênero e sexualidade. Comunicando a milhares de</p><p>pessoas que quem estivesse fora do sistema binário</p><p>(Homem e Mulher), quem não desenvolvesse o</p><p>papel socialmente atribuído ao gênero que lhe foi</p><p>imposto em seu nascimento, estaria indo contra os</p><p>princípios de uma força maior denominada Deus</p><p>e que, se assim o fizesse, teria como motivação a</p><p>força contrária a Deus, o que chamam de Demônio.</p><p>A associação de nossas sexualidades e identidades</p><p>como algo do mau, errado e perverso, por meio da</p><p>igreja, contribuiu de maneira eficaz para a solidifi-</p><p>cação da sociedade baseada na moral e nos bons</p><p>costumes, porque pertencia a igreja um poder in-</p><p>contestável, onde não se pode discutir os desígnios</p><p>divinos e não se pode dialogar sobre o que diverge</p><p>disso, afinal, é uma definição que provém de uma</p><p>sabedoria maior, que foi a origem de todas as cois-</p><p>as, por isso as fez para serem e estarem como são e</p><p>estão (BRANDALISE, 2020).</p><p>O nosso objetivo, no entanto, não é contestar e</p><p>modificar nada, não é propor uma nova regra ou</p><p>inversão de valores tradicionais, é sim propor a</p><p>discussão científica e histórica de que é necessária</p><p>a devida interpretação do discurso religioso, com</p><p>a consciência dos valores da época que foi ensina-</p><p>do, escrito, passado. O que se faz importante é a</p><p>análise de tempo e espaço enquanto sociedade</p><p>que muda e evolui os seus conhecimentos, vivên-</p><p>cias e saberes. Logo, a definição de ser homem</p><p>no século passado já não se aplica ao que é ser</p><p>homem hoje, devido ao avanço tecnológico, às</p><p>inovações da ciência, as mudanças climáticas, as</p><p>revoluções artísticas e culturais, que para muitas</p><p>crenças, inclusive, fazem parte da evolução espiri-</p><p>tual dos indivíduos.</p><p>Da mesma forma, os avanços afetam a vida das</p><p>mulheres, Cis ou Trans, que conquistaram direitos,</p><p>espaços e voz, com muito o que mudar e conquis-</p><p>tar ainda, simultaneamente lutando para não ter</p><p>nenhum dos seus direitos conquistados retirados,</p><p>conforme afirma Andrade (2021). Direitos estes</p><p>que, muitas vezes, já estariam garantidos através da</p><p>constituição federal, mas que, por serem aplicados</p><p>sobre uma mulher, são contestados, revalidados,</p><p>distorcidos muitas vezes mais. Afinal, não são todos</p><p>iguais perante a lei? Com o direito de ir e vir? Ten-</p><p>do liberdade de expressão, crença, manifestação da</p><p>arte e da ciência? Por vezes, muitos destes própri-</p><p>os direitos são utilizados para a defesa do</p><p>discur-</p><p>so de ódio (ANDRADE, 2021). Este que cotidiana-</p><p>mente é ouvido em piadas, nas rodas de conversas,</p><p>como numa mesa de bar e durante muito tempo</p><p>da história no discurso dos nossos representantes</p><p>políticos, que são eleitos representantes de um</p><p>povo, e por isso refletem as vontades de um grupo</p><p>organizado, que formam opinião e dão carta branca</p><p>para a prática da violência, através de seu discur-</p><p>so, posicionamento, defesa de projetos de leis, das</p><p>políticas públicas e destinação orçamentária (SILVA</p><p>et al, 2021).</p><p>A política, seja ela partidária ou não, carrega con-</p><p>sigo a responsabilidade da garantia de direitos;</p><p>através dos poderes estabelecidos hoje no nosso</p><p>país, Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário,</p><p>nossa sociedade se organiza para o cumprimento</p><p>da cidadania plena e absoluta de todos os cidadãos.</p><p>Cria-se leis e políticas públicas, executa-se os pro-</p><p>cessos e há desenvolvimento de projetos nos quais</p><p>aplicam-se as normas, as leis e, quando necessário,</p><p>o julgamento e condenação. A condenação deve,</p><p>sim, ser pautada, porém, não como caminho único,</p><p>afinal as penas são aplicadas quando um crime já foi</p><p>cometido e é em razão disso que há a importância</p><p>da prevenção, do combate e enfrentamento às vari-</p><p>adas formas de violência. Além da punição, existem</p><p>inúmeras ações que podem ser aplicadas como me-</p><p>canismo de segurança pública e pessoal, para que</p><p>haja a certeza de que ao sair de casa, todas, todes e</p><p>todos possam voltar com vida.</p><p>Bianca Manicongo, mais conhecida como Bixarte,</p><p>é uma travesti paraibana, poetisa, atriz, escritora</p><p>e rapper, através de sua arte vem denunciando as</p><p>violências produzidas pela sociedade contra os cor-</p><p>pos trans.</p><p>MALDITA GENI (BIXARTE)</p><p>Juro que em cada esquina</p><p>Tenho medo de entrar</p><p>Pois na última que entrei</p><p>Eles tentaram me matar</p><p>Disse que não me amava</p><p>Não me via na tv que eu era muito trava e só queria</p><p>me comer</p><p>Levantou a mão bateu</p><p>O ferro logo puxou</p><p>Dois tiros foi disparado</p><p>Mais uma trava que ele matou</p><p>A polícia inocenta quem arranca coração</p><p>Travesti não tá segura nem na igreja nem no busão</p><p>E por isso que eu falo</p><p>Só enxergo a maldade</p><p>Nasça com seu corpo cis</p><p>E conheça a liberdade</p><p>Homem branco colonizador</p><p>É visto como herói da pátria até quando uma preta</p><p>no altar abandou</p><p>E eu falo isso porque tô cansada de ver Mainha</p><p>sempre sendo as outras e branca rica bem casa</p><p>Inclusive economicamente sossegada</p><p>E eu me pergunto</p><p>Até onde a pobreza vai ser a falta de consciência</p><p>que eles tem</p><p>Você sabe burguesia safada</p><p>Que da hipocrisia vocês são tudo refém</p><p>Eu lembro na noite passada</p><p>Ele chegava perto de mim</p><p>Ele passava a mão no meu corpo</p><p>E eu dizia Deus que ele leve meu celular que eu não</p><p>chegue em casa um corpo morto</p><p>Eu não quero ser o motivou de ver minha mãe chorar</p><p>Não quero chegar em casa com uma vela nos peitos</p><p>braço cruzado e nunca mais a minha voz ela escutar</p><p>Mainha eu te prometo que eu vou ser muito feliz</p><p>Meu nome é bixarte</p><p>Não sou prostituta sou poeta atriz</p><p>E mais você não encontrar meu corpo preso em</p><p>uma viatura</p><p>Se você me queria fazendo programa</p><p>Prazer eu sou a própria literatura.</p><p>A violência que Bianca denuncia faz parte e segue</p><p>um plano de afastamento dos grandes centros e dis-</p><p>cussões, jogando o véu da invisibilidade e levando a</p><p>diversidade, negritude, movimento de mulheres e</p><p>outras minorias para as periferias, para o trabalho</p><p>informal, para as instituições de ensino defasadas,</p><p>para locais com baixas condições de saneamento</p><p>e segurança, além da insegurança alimentar e de</p><p>saúde precária.</p><p>Quando tratamos sobre essas violências, precisa-</p><p>mos pensar nas bases estruturais dadas desde o in-</p><p>ício para a sobrevivência, formação e atuação futura</p><p>da comunidade: lar, escola e mercado de trabalho.</p><p>Segundo uma pesquisa realizada na cidade de São</p><p>Paulo, pela Secretaria de Assistência e Desenvolvi-</p><p>mento Social (SMADS), entre 5,3% e 8,9% do total</p><p>da população em situação de rua na capital per-</p><p>tence à comunidade LGBTI+.</p><p>Além disso, 63% dos jovens de 18 a 25 anos dizem</p><p>se sentir rejeitados total ou parcialmente pelos fa-</p><p>miliares após assumirem sua identidade de gênero</p><p>ou orientação sexual, e apenas 59% revelam sua</p><p>orientação sexual para a família. Mesmo com tais</p><p>dados, ainda vivemos com a incógnita de qual o real</p><p>número de crianças, jovens e adolescentes expul-</p><p>sos de casa em razão da sua identidade de gênero</p><p>e orientação sexual. Nem todos vão para as ruas,</p><p>em alguns casos são acolhidos por outros famili-</p><p>ares, amigos, vizinhos, desenvolvendo um laço de</p><p>família sem haver vínculo consanguíneo. Outros se</p><p>organizam em repúblicas, são acolhidos em abrigos,</p><p>favelas e periferias, tendo que lidar com a rejeição</p><p>e o abandono familiar que se apresenta como um</p><p>fator dificultador para a saúde mental.</p><p>Muitas vezes, a decisão de sair de casa parte da</p><p>própria pessoa que prefere não conviver com a vi-</p><p>olência dentro de casa, mas também existe os que</p><p>se submetem a convivência com os ataques famili-</p><p>ares como forma de sobrevivência. A dependência</p><p>econômica e apego familiar são fatores que con-</p><p>tribuem para essa permanência, mesmo quando</p><p>estão sofrendo com violência psicológica e física</p><p>(TOLEDO et al., 2013).</p><p>I S I M P Ó S I O D I V E R S I D A D E E R E S I S T Ê N C I A</p><p>B R A S Í L I A / D F 2 0 2 3</p><p>Nas escolas, o convívio coletivo torna-se desafio, de</p><p>acordo com Lima (2021), quando o assunto gêne-</p><p>ro e sexualidade estão em pauta, grande parte da</p><p>equipe pedagógica não está preparada para tra-</p><p>tar sobre os temas com profissionalismo e conhe-</p><p>cimento, sem julgamento feito devido a valores e</p><p>crenças particulares. Além da equipe pedagógica,</p><p>direção e demais funcionários, o convívio com out-</p><p>ras crianças e adolescentes pode ser fator de evasão</p><p>escolar, uma vez que o bullying e o preconceito</p><p>também se manifestam entre os colegas que estão</p><p>em fase de formação e reproduzem os valores que</p><p>lhes são ensinados em casa, na igreja e nas mídias</p><p>(LIMA, 2021). Piadas, brigas, separação por gênero</p><p>em filas, assentos e atividades curriculares diversas,</p><p>proibição do uso de banheiro e uniforme de acordo</p><p>com a identidade de gênero e o não uso do nome</p><p>social são algumas das situações tipificadas como</p><p>vexatórias, que motivam o abandono dos estudos</p><p>(LIMA, 2021; TOLEDO; FILHO, 2013).</p><p>No mercado de trabalho, o preconceito é manifes-</p><p>tado independente da hierarquia dentro do espaço</p><p>profissional, seja pelos colegas de trabalho, chefia,</p><p>fornecedores ou clientes e consumidores. Neste</p><p>caso, quando estamos falando de uma pessoa que</p><p>já está empregada, que mantém a sua identidade</p><p>LGBTI+ em segredo, ou que a manifesta e passa pelo</p><p>processo de exclusão, punição diferenciação ou até</p><p>mesmo demissão (TOLEDO; FILHO, 2013). Quando</p><p>pensamos em uma pessoa trans na procura de um</p><p>emprego, é necessário considerar se essa pessoa</p><p>teve a garantia de moradia que lhe deu condições</p><p>a dignidade básica.</p><p>Em seguida, podemos refletir sobre a formação</p><p>acadêmica, se existiram fatores de garantia da sua</p><p>permanência no espaço acadêmico, em rede de en-</p><p>sino fundamental, médio, técnico e superior, (aval-</p><p>ia-se também se a instituição é pública ou privada),</p><p>depois destas avaliações, considerando os dificulta-</p><p>dores a partir da perspectiva de uma pessoa trans,</p><p>sendo essa pessoa qualificada para o cargo, ainda</p><p>será questionado, mesmo que não verbalmente, so-</p><p>bre sua capacidade devido à identidade de gênero</p><p>e sobre futuros e possíveis “constrangimentos”, não</p><p>da própria pessoa, mas da equipe em dividir ban-</p><p>heiros e vestiários, do nome que será colocado no</p><p>crachá, da opinião dos clientes, do medo ao assédio</p><p>moral e sexual, além de se questionar honestidade</p><p>e caráter, como valores morais. Quem empregaria</p><p>uma travesti? (ALMEIDA; VASCONCELLOS, 2018).</p><p>Estas são denúncias sérias que, desde o ano de</p><p>1969, por Marsha P. Jhonson e Sylvia Rivera, seguem</p><p>sendo o grito de luta de uma comunidade, através</p><p>de sindicatos, comissões, conselhos, observatórios,</p><p>manifestações, paradas e pesquisas. A produção de</p><p>materiais que contém a história do movimento, que</p><p>registrem</p><p>as suas lutas, conquistas de direitos e as</p><p>violências sofridas, contribui para o não apagamen-</p><p>to e invisibilidade da história. É material de estudo e</p><p>pesquisa para a educação de toda a sociedade acer-</p><p>ca de temas poucos discutidos, por ainda estarem</p><p>dentro da definição de tabu.</p><p>Muitos dos registros que temos hoje se deram at-</p><p>ravés de documentários produzidos pela própria</p><p>comunidade, relatando suas vivências, outra parte</p><p>trata-se dos históricos policiais, onde há o registro</p><p>de prisões por bruxaria, inversão de gênero, vadi-</p><p>agem e prostituição, “crimes” registrados desde a</p><p>colonização do Brasil nos Tribunais do Santo Ofício,</p><p>que nos dá a oportunidade de conhecer a história</p><p>de Xica Manicongo, primeira Travesti escravizada a</p><p>vir para o Brasil, até os relatos contemporâneos de</p><p>Marcinha do Corinto, travesti e transformista que</p><p>faz sucesso na noite paulistana, e relata que duran-</p><p>te a década de 80 as profissionais de casa noturnas</p><p>carregavam consigo a carteirinha de artista para</p><p>não serem presas. (JESUS, 2019).</p><p>Junho é considerado o mês do orgulho LGBTQIAPN+,</p><p>devido a revolta de Stonewall, que começou em 28</p><p>de junho de 1969. As diversas manifestações em re-</p><p>sposta às batidas policiais, deram origem ao que te-</p><p>mos conhecido hoje como parada do orgulho LGBT,</p><p>o movimento de ampliar a visibilidade acerca do</p><p>combate à violência contra a comunidade e encora-</p><p>jar e engajar a comunidade na luta dos seus direit-</p><p>os, lembrando que não há motivo para vergonha.</p><p>No ano de 1970, após um ano das manifestações</p><p>que aconteceram no bairro Greenwich Village, em</p><p>Lower Manhattan, as primeiras paradas LGBT (que</p><p>ainda eram conhecidas como Parada do Orgulho</p><p>Gay), aconteceram em Chicago, Los Angeles, Nova</p><p>York e são Francisco. Com a articulação, a nível</p><p>mundial, em 1979 aconteceu o primeiro encontro</p><p>brasileiro de homossexuais, em 1983 a luta pela</p><p>visibilidade lésbica ganhou notoriedade, no ano de</p><p>1985 aconteceu a despatologização da homossexu-</p><p>alidade e luta contra a AIDS, através do GAPA (Gru-</p><p>po de Apoio à Prevenção da Aids), em 1999 a proi-</p><p>bição da “Cura Gay”. Já no ano de 2002 o processo</p><p>I S I M P Ó S I O D I V E R S I D A D E E R E S I S T Ê N C I A</p><p>B R A S Í L I A / D F 2 0 2 3</p><p>de Redesignação Sexual foi legalmente permitido</p><p>pelo Conselho Federal de Medicina do Brasil, em</p><p>2011 a união estável entre pessoas do mesmo sexo</p><p>foi aprovada pelo STF; somente no ano de 2018 que</p><p>pessoas trans puderam alterar o seu registro civil</p><p>(nome e gênero), direto no cartório, sem necessi-</p><p>dade de processo judiciário.</p><p>Em 2019, a homofobia foi criminalizada e equipara-</p><p>da ao crime de racismo e injúria racial e, em 2020,</p><p>houve a liberação para a doação de sangue por pes-</p><p>soas da comunidade, que antes eram impedidas</p><p>pelo estigma da AIDS, tida como a “Peste Gay”. No</p><p>Brasil, em 1995, a 17° Conferência Internacional de</p><p>Gays e Lésbicas (IGLA) aconteceu no Rio de Janeiro</p><p>e foi encerrada com a marcha pela Cidadania. Em</p><p>1997 aconteceu na Avenida Paulista, em São Paulo,</p><p>a 1° Parada do Orgulho LGBT do Brasil. Ações im-</p><p>portantes, que garantem direitos e reafirmam a hu-</p><p>manidade do ser LGBT (DOR CONSULTORIA, 2022).</p><p>Muitos destes avanços foram conquistados pela</p><p>pressão social coletiva, através de manifestações e</p><p>atos, o que demonstra de maneira muito específica</p><p>e assertiva, quais os efeitos da militância e ativismo</p><p>na conquista e garantia de condições melhores para</p><p>suas existências e de seus iguais (D’OR CONSULTO-</p><p>RIA, 2022).</p><p>Os coletivos e militâncias de pessoas LGBTQIA+ vêm</p><p>se organizando para a criação de políticas públicas</p><p>e sociais que garantam a inserção e permanência</p><p>nos espaços garantidos por direito, como moradia,</p><p>trabalho, saúde e lazer, entre outros (abglt, 2023)</p><p>. Buscam, através do Legislativo, a criação de leis</p><p>que possibilitem a equidade na prática, pois, além</p><p>da Constituição Federal que tipifica e condena, ain-</p><p>da há leis que precisam de atualizações, de modi-</p><p>ficações pensando em uma sociedade para todas,</p><p>todes e todos, sem distinção de qualquer natureza</p><p>(ABGLT, 2023; BRASIL, 1988).</p><p>Ações afirmativas fazem parte da construção de</p><p>identidade de uma pessoa, como indivíduo, ser</p><p>pensante, com CPF e RG, pagando os seus impos-</p><p>tos e contribuindo na construção da sociedade e</p><p>sua história (JESUS, 2019) . A afirmação de suas es-</p><p>pecificidades vai indicar quais são suas condições</p><p>e necessidades, seus privilégios e acessos. Este</p><p>é inclusive um dos fatores para o crescimento da</p><p>sigla LGBTQIAPN+, que não tem como objetivo a</p><p>segregação, mas o entendimento das diferenças</p><p>entre expressão de gênero, sexualidade e demais</p><p>marcadores para a elaboração de estratégias de</p><p>sobrevivência, o desenvolvimento de pesquisas,</p><p>projetos e ações voltadas aos grupos certos, com</p><p>êxito, adesão e resultado, de maneira eficaz (JESUS,</p><p>2019). A representatividade e visibilidade são resul-</p><p>tados da estratégia inteligente e consciente de pro-</p><p>porcionar acesso equitativo a oportunidades que</p><p>levam ao destaque e protagonismo.</p><p>A escolha deliberada do termo “Oportunizar” en-</p><p>fatiza que a oportunidade não é simplesmente um</p><p>gesto de caridade ou favor, mas sim uma porta de</p><p>entrada que é ressignificada. Esta perspectiva re-</p><p>configura a oportunidade como algo buscado e con-</p><p>quistado, atribuindo poder àqueles que podem e</p><p>devem assumir papéis protagonistas, em contraste</p><p>com a visão passiva de quem espera, depende e</p><p>necessita. Muitas oportunidades são negadas a</p><p>pessoas LGBTI+: desde o ambiente familiar acolhe-</p><p>dor até a chance de expressar livremente sua fé,</p><p>passando pela oportunidade de acessar educação</p><p>e qualificação, e a oportunidade de obter um em-</p><p>prego digno e honesto.</p><p>O acesso a essas oportunidades é frequentemente</p><p>percebido como resultado do acaso, atribuído à</p><p>sorte e ao privilégio de alguns. Este privilégio, uma</p><p>vez reconhecido, deveria ser encarado como uma</p><p>ferramenta para criar caminhos e conexões que, de</p><p>outra forma, seriam inacessíveis para aqueles de-</p><p>sprovidos dessas vantagens.</p><p>Na sociedade contemporânea, indivíduos que se</p><p>enquadram nos padrões de homem, cisgênero,</p><p>branco, pertencente às classes B ou C, e com fácil</p><p>acesso aos direitos básicos são considerados priv-</p><p>ilegiados, independentemente de possuírem um</p><p>ou todos esses privilégios mencionados (. Esse</p><p>homem possui a responsabilidade e a capacidade</p><p>de contribuir ativamente para a construção de uma</p><p>sociedade livre de LGBTfobia. Esse papel inclui a</p><p>disseminação de discursos antidiscriminatórios</p><p>nos espaços cotidianos, como em casa, na escola,</p><p>na universidade, no trabalho e no lazer. Esses são</p><p>ambientes socialmente percebidos como de difícil</p><p>acesso para membros da comunidade LGBTI+ devi-</p><p>do à negação de seus direitos básicos. Essa negação</p><p>não apenas limita suas possibilidades e oportuni-</p><p>dades, mas também restringe sua visibilidade e o</p><p>que é considerado sucesso.</p><p>O distanciamento da comunidade trans em relação</p><p>ao acesso a recursos financeiros, cargos de lid-</p><p>erança, visibilidade e reconhecimento contribui</p><p>para a criação de narrativas melancólicas e, por</p><p>vezes, equivocadas. Essas narrativas, frequente-</p><p>mente marcadas por tentativas errôneas de co-</p><p>mover, sensibilizar e vitimizar, muitas vezes excluem</p><p>as pessoas trans da oportunidade de contar suas</p><p>próprias histórias, representar papéis que reflitam</p><p>suas identidades e produzir conteúdo que expresse</p><p>suas óticas e perspectivas. Esse processo resulta em</p><p>uma nova forma de violência ao retirar a voz e a</p><p>expressão da comunidade trans, entregando a nar-</p><p>rativa a terceiros que muitas vezes deturpam a re-</p><p>alidade e têm a intenção de moldar a posição social</p><p>que as figuras trans ocupam.</p><p>Esse fenômeno levanta a questão crucial: quem</p><p>detém o poder de decisão sobre esses corpos e as</p><p>narrativas que os envolvem? Essa escolha, quando</p><p>realizada, representa uma decisão significativa, e</p><p>é fundamental questionar quem está no controle</p><p>dessas decisões. A resistência a essa marginalização</p><p>se desenvolve em paralelo com as novas perspec-</p><p>tivas de vida, vivência e</p><p>sobrevivência. Apesar do</p><p>cenário frequentemente desanimador, o movimen-</p><p>to LGBTQI+ tem alcançado notáveis feitos e efeitos.</p><p>Lideranças e referências surgiram de pessoas que</p><p>resistiram às tentativas de apagamento, consoli-</p><p>dando-se como representantes ativos em diversas</p><p>áreas, incluindo cultura, educação, saúde, espaços</p><p>religiosos e políticos.</p><p>Keila Simpson, em seu discurso no 9° Encontro Bra-</p><p>sileiro de Ciências Sociais e Humanas de Saúde da</p><p>ABRASCO, nos instiga a refletir sobre a importância</p><p>dessas representações, independentemente de sua</p><p>formação acadêmica. Ela destaca que o conheci-</p><p>mento universitário é crucial, mas as experiências</p><p>cotidianas das pessoas trans também devem ser val-</p><p>idadas, integrando-se à formação política e social.</p><p>Essa abordagem busca reivindicar as contribuições</p><p>diárias de forma ampla, pedagógica e variada, en-</p><p>fatizando a produção de conhecimento durante a</p><p>jornada de cada indivíduo como ser humano, po-</p><p>tente e travestilizado. Este movimento reivindica o</p><p>direito básico e natural que alguns segmentos da</p><p>população afirmam não possuir, sendo essencial</p><p>conquistá-lo através da ocupação de espaços de</p><p>discussão e decisão, com voz e vez para aqueles que</p><p>historicamente foram marginalizados.</p><p>Exemplos ilustram a ocupação significativa de pes-</p><p>soas trans em espaços de poder e decisão, de-</p><p>sempenhando funções que impactam não apenas</p><p>a comunidade LGBTQIAPN+ como um todo, mas</p><p>também engajando-se em pautas paralelas, como</p><p>sustentabilidade, combate ao racismo, questões</p><p>econômicas, segurança e obras públicas. Estas fig-</p><p>uras representam uma voz ativa na execução da</p><p>TRANSformação social:</p><p>Leonora Mendes de Lima (Teófilo Otoni, 6 de se-</p><p>tembro de 1970), mais conhecida como Leo Áquilla,</p><p>é uma jornalista, youtuber, cantora e política bra-</p><p>sileira. Na televisão ficou conhecida por sua partici-</p><p>pação em programas, como Noite Afora, A Fazenda</p><p>5 e A Tarde É Sua. Foi ainda candidata a deputado</p><p>estadual em três eleições (2006, 2010 e 2014), não</p><p>tendo obtido o número suficiente de votos para ser</p><p>eleita. Em 2020, Áquilla deixou a televisão, para ser</p><p>coordenadora de gabinete do vereador Thammy</p><p>Miranda. Atualmente, Leonora é cordenadora mu-</p><p>nicipal da diversidade na prefeitura de São Paulo.</p><p>Erika Santos Silva, mais conhecida como Erika Hil-</p><p>ton (Franco da Rocha, 9 de dezembro de 1992), é</p><p>uma política, ativista e modelo brasileira. Identifi-</p><p>cando-se como travesti, Hilton é filiada ao Partido</p><p>Socialismo e Liberdade (PSOL) e atua nas causas</p><p>voltadas aos direitos das pessoas negras e LGBTI.</p><p>Duda Salabert Rosa é uma professora de liter-</p><p>atura, ambientalista, e ativista filiada ao Partido</p><p>Democrático Trabalhista. Em 2018 se notabilizou</p><p>ao ter se tornado a primeira pessoa transgênero a</p><p>se candidatar ao cargo de Senadora da República.</p><p>Duda Salabert é deputada Federal pelo PDT.</p><p>Linda Brasil Azevedo Santos, nasceu em Santa Rosa</p><p>de Lima, Sergipe, em 13 de abril de 1973.É gradua-</p><p>da em Letras Português-Francês pela Universidade</p><p>Federal de Sergipe. A parlamentar é educadora e</p><p>ativista pelas causas LGBTQIA+.Nas eleições munic-</p><p>ipais de 2020, foi a vereador mais votada por Ara-</p><p>caju, tornando-se a primeira mulher Trans a ocupar</p><p>uma cadeira na Câmara Municipal de Aracaju.</p><p>O enfrentamento à violência intrafamiliar, no âm-</p><p>bito acadêmico, profissional e religioso, é uma re-</p><p>sponsabilidade do poder público, exigindo gestores</p><p>comprometidos não apenas por interesses eleito-</p><p>rais, mas também com consciência, estudo aprofun-</p><p>dado, mapeamento, planejamento e atendimen-</p><p>to humanizado. Isso envolve a implementação de</p><p>ações como capacitações, campanhas midiáticas,</p><p>oferta de cursos profissionalizantes e o estabeleci-</p><p>mento de organismos, como secretarias, diretorias</p><p>e gerências, voltados para atender a diversidade e</p><p>combater a LGBTfobia.</p><p>Cada cidade, estado e país deve incluir em suas</p><p>pesquisas e censos informações sobre orientação</p><p>sexual e identidade de gênero, assim como o índice</p><p>de violência motivada pela LGBTfobia. Esses dados</p><p>são essenciais para quantificar a presença desses</p><p>cidadãos em seus territórios e entender as formas</p><p>de violência às quais estão expostos. É crucial traçar</p><p>planos de ação para combater práticas criminosas,</p><p>como campanhas em redes sociais, espaços públi-</p><p>cos e transporte coletivo, bem como a capacitação</p><p>de servidores e empresas terceirizadas que prestam</p><p>serviços e estão em contato com essa população.</p><p>É imprescindível garantir uma rede de atendimento</p><p>com infraestrutura e capacitação adequadas, con-</p><p>siderando o atendimento a pessoas não retificadas.</p><p>Isso inclui definir condutas apropriadas diante de</p><p>situações de discriminação, evitar certas perguntas,</p><p>usar termos adequados e esclarecer as competên-</p><p>cias de cada órgão, promovendo uma abordagem</p><p>integrada e transversal.</p><p>A presença de pessoas LGBTQIA+ em espaços de</p><p>poder e decisão torna-se urgente para que partic-</p><p>ipem ativamente das discussões e da elaboração</p><p>de estratégias, seja no Legislativo, Executivo ou</p><p>Judiciário, no setor público, privado, ou em orga-</p><p>nizações não governamentais e associações. Isso</p><p>vai além da reivindicação, envolvendo também a</p><p>atuação e fiscalização. É essencial preservar seus</p><p>I S I M P Ó S I O D I V E R S I D A D E E R E S I S T Ê N C I A</p><p>B R A S Í L I A / D F 2 0 2 3</p><p>direitos, respeitar suas identidades de gênero e ori-</p><p>entação sexual, legitimar suas identidades e recon-</p><p>hecer seus esforços.</p><p>Este esforço coletivo visa transformar o Brasil, ces-</p><p>sando sua posição como o país que mais mata mul-</p><p>heres trans e travestis no mundo. Almejamos um</p><p>ambiente em que sair de casa não seja motivo de</p><p>temor, permitindo viver livre dos padrões estéticos</p><p>e de gênero, onde não seja necessário explicar a</p><p>cada vez que desejam utilizar banheiros de acordo</p><p>com sua identidade. Este é um passo significativo na</p><p>busca por uma sociedade mais inclusiva e justa. Em</p><p>março de 2017, Angela Davis nos convoca à reflex-</p><p>ão: “Nós precisamos questionar a quem nos refer-</p><p>imos quando dizemos ‘mulher’, pois parece que só</p><p>faremos algum progresso quando as mulheres que</p><p>sempre foram marginalizadas da categoria ‘mulher’,</p><p>aquelas que tiveram que lutar para se tornarem</p><p>símbolos dessa categoria, que sempre diz respeito</p><p>a mulheres brancas, cisgêneras, de classe média. E</p><p>se, por exemplo, uma mulher trans negra, lutadora</p><p>contra a violência e o sistema prisional, ocupasse o</p><p>lugar simbólico da categoria ‘mulher’? Parece que</p><p>sempre aceitamos como norma pessoas que já pos-</p><p>suem privilégios. Por que não podemos aceitar que</p><p>aquelas que tiveram que lutar por reconhecimento,</p><p>por sobrevivência, por liberdade, se tornem a nor-</p><p>ma, o símbolo ao qual devemos aspirar? Dandara</p><p>presente!”</p><p>Os espaços, posições, estereótipos, construções</p><p>sociais e destinos cruéis e excludentes que foram</p><p>atribuídos aos corpos dissidentes já não os servem</p><p>mais.</p><p>REFERËNCIAS</p><p>ABGLT. Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais,</p><p>Travestis, Transexuais e Intersexos. Disponível em: https://</p><p>www.abglt.org/ Acesso em: 18 nov. 2023.</p><p>ALEJANDRO, Diego. Tentativa de suicídio representa 66%</p><p>das hospitalizações de jovens trans. 2022. Disponível em:</p><p>https://veja.abril.com.br/saude/tentativa-de-suicidio-repre-</p><p>senta-66-das-hospitalizacoes-de-jovens-trans/mobile. Acesso</p><p>em: 15 nov. 2023.</p><p>ALMEIDA, Cecília Barreto de; VASCONCELLOS, Victor Augusto.</p><p>Transexuais: transpondo barreiras no mercado de trabalho</p><p>em São Paulo? Revista Direito Gv, SÃO PAULO, v. 14, n. 2, pp.</p><p>302-333, MAIO-AGO, 2018. Disponível em: https://www.sci-</p><p>elo.br/j/rdgv/a/HpFvXPZ8WRd63Gbz4CfSRQC/?format=pdf.</p><p>Acesso em: 18 nov. 2023.</p><p>ANDRADE, André Gustavo Corrêa de. Liberdade de Expressão</p><p>e Discurso de Ódio. R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 23, n. 1, p.</p><p>9-34, Jan.-Mar. Disponível em: 2021https://www.emerj.tjrj.</p><p>jus.br/revistaemerj_online/edicoes/revista_v23_n1/revista_</p><p>v23_n1_9.pdf. Acesso em: 15 nov. 2023.</p><p>BATISTA, Adriana Beatriz. Vamos falar sobre a hiperssex-</p><p>ualização de corpos trans?. 2022. Disponível em: https://</p><p>www.geledes.org.br/vamos-falar-sobre-a-hiperssexual-</p><p>izacao-de-corpos-trans/. Acesso em: 15 nov. 2023.</p><p>BENEVIDES, Bruna. Precisamos falar sobre o suicídio das</p><p>pessoas trans! 2018. Disponível em: https://antrabrasil.</p><p>org/2018/06/29/precisamos-falar-sobre-o-suicidio-das-pes-</p><p>soas-trans/. Acesso em: 15 nov. 2023.</p><p>BRANDALISE, Vitor Hugo. Os padres gays silenciados pela</p><p>igreja no Brasil. 2020. Disponível em: https://www.bbc.com/</p><p>portuguese/brasil-51554441. Acesso em: 15 nov. 2023.</p><p>BRASIL, CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO</p><p>BRASIL. Disponível em: https://www2.senado.leg.br/bdsf/bit-</p><p>stream/handle/id/518231/CF88_Livro_EC91_2016.pdf. Aces-</p><p>so em: 18 nov. 2023.</p><p>CAMPANA, Pedro. Por que a AIDS predomina entre jovens,</p><p>gays, negros e pardos? 2019. Disponível em: https://www.</p><p>cartacapital.com.br/blogs/saudelgbt/por-que-a-aids-predo-</p><p>mina-entre-jovens-gays-negros-e-pardos/ Acesso em: 16 nov.</p><p>2023.</p><p>D’OR CONSULTORIA. Conquistas do Movimento LGBT</p><p>no Brasil. 2019. Disponível em: https://dorconsul-</p><p>tor ia.com.br/2022/05/20/conquistas-do-movimen-</p><p>to-lgbt-no-brasil/#:~:text=Foi%20em%20junho%20de%20</p><p>1997,de%20pessoas%20todos%20os%20anos. Acesso em: 18</p><p>nov. 2023.</p><p>DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO CEARÁ. Entenda o que</p><p>são crimes de ódio e como denunciar práticas na defen-</p><p>soria. 2022. Disponível em: https://www.defensoria.ce.def.</p><p>br/noticia/entenda-o-que-sao-crimes-de-odio-e-como-de-</p><p>nunciar-praticas-na-defensoria-publica/#:~:text=%E2%80%-</p><p>9CO%20que%20caracteriza%20o%20crime,mas%20tamb%C-</p><p>3%A9m%20de%20viol%C3%AAncia%20psicol%C3%B3gica.</p><p>Acesso em: 14 nov. 2023.</p><p>HUNTY, Rita Von. Primeira pessoa com Rita Von Hunty. 2021.</p><p>Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=We1R-</p><p>InS1T0w. Acesso em: 14 nov. 2023.</p><p>HYPENESS. 6 relatos emocionantes sobre transição de gêne-</p><p>ro que você precisa ler hoje. 2017. Disponível em: https://</p><p>www.hypeness.com.br/2017/10/6-relatos-emocionantes-so-</p><p>bre-transicao-de-genero-que-voce-precisa-ler-hoje/. Acesso</p><p>em: 17 nov. 2023.</p><p>I S I M P Ó S I O D I V E R S I D A D E E R E S I S T Ê N C I A</p><p>B R A S Í L I A / D F 2 0 2 3</p><p>IESOGI. Relatório Sobre Terapias De Conversão. 2020. Di-</p><p>sponível em: https://www.ohchr.org/en/calls-for-input/re-</p><p>port-conversion-therapy Acesso em: 15 nov. 2023.</p><p>JESUS, Jaqueline Gomes de. XICA MANICONGO: A TRANS-</p><p>GENERIDADE TOMA A PALAVRA. Redoc – Revista Docên-</p><p>cia e Cibercultura. Rio de Janeiro, v. 3, n.1, p. 250, Jan/Abr.,</p><p>2019, e-ISSN 2594-9004 DOI: https://doi.org/10.12957/red-</p><p>oc.2019.41817</p><p>KLUSKA, Flávia Ortega O que são os crimes de ódio? 2015.</p><p>Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/noticias/o-que-</p><p>sao-os-crimes-de-odio/309394678. Acesso em: 14 nov. 2023.</p><p>LIMA, Wérica. Como o mercado de trabalho exclui as pes-</p><p>soas trans. 2023. Disponível em: https://envolverde.com.br/</p><p>como-o-mercado-de-trabalho-exclui-as-pessoas-trans/. Aces-</p><p>so em: 15 nov. 2023.</p><p>MINISTERIO DA SAÚDE, CONSELHO DA SAÚDE, “A trans-</p><p>fobia adoece e mata. Temos que nos comprometer com</p><p>a vida”, diz conselheiro de saúde no Dia Nacional da Visibi-</p><p>lidade Trans. 2022. Disponível em: https://conselho.saude.</p><p>gov.br/ultimas-noticias-cns/2312-a-transfobia-adoece-e-ma-</p><p>ta-temos-que-nos-comprometer-com-a-vida-diz-consel-</p><p>heiro-de-saude-no-dia-nacional-da-visibilidade-trans. Acesso</p><p>em: 14 nov. 2023.</p><p>RANGEL, Aline. Estereótipos de masculinidade afetam a</p><p>saúde mental de homens gays. 2022. Disponível em: https://</p><p>apsiquiatra.com.br/masculinidade-homens-gays/. Acesso em:</p><p>15 nov. 2023.</p><p>ROCHA, Elaine Maria. A (re)produção do estereótipo nas pia-</p><p>das: sobre os sentidos do humor. Discursividades, Vol 3, N. 2,</p><p>Out. 2018. ISSN 2594-6269.</p><p>SILVA, Luiz Rogério Lopes; BOTELHO, Rodrigo Eduardo; SAM-</p><p>PAIO, Francisco Rafael Cardoso. Discurso de ódio nas redes</p><p>sociais digitais: tipos e formas de intolerância na página oficial</p><p>de Jair Bolsonaro no Facebook. Galáxia, São Paulo, v. 46, 2021.</p><p>https://doi.org/10.1590/1982-2553202151831.</p><p>TOLEDO, Lívia Gonsalves; FILHO, Fernando Silva Teixeira. Ho-</p><p>mofobia familiar: abrindo o armário ‘entre quatro paredes’*</p><p>Arq. bras. psicol. vol.65 no.3 Rio de Janeiro 2013. Disponível</p><p>em:http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttex-</p><p>t&pid=S1809-52672013000300005. Acesso em: 18 nov. 2023.</p><p>Professora Adjunta do Departamento de Ciências Humanas –</p><p>Campus V da Universidade do Estado da Bahia e coordenadora do</p><p>Projeto Maria.</p><p>LUCIANA VIEIRA</p><p>MARIANO</p><p>O PAPEL DO PROJETO</p><p>MARIA NO</p><p>FORTALECIMENTO DAS</p><p>IDENTIDADES DE PESSOAS</p><p>LGBTQIAPN+ E NO</p><p>COMBATE À</p><p>LGBTQIAPN+FOBIA</p><p>ET AL</p><p>I S I M P Ó S I O D I V E R S I D A D E E R E S I S T Ê N C I A</p><p>B R A S Í L I A / D F 2 0 2 3</p><p>O PAPEL DO PROJETO MARIA NO FORTALECIMENTO DAS</p><p>IDENTIDADES DE PESSOAS LGBTQIAPN+ E NO COMBATE À</p><p>LGBTQIAPN+FOBIA</p><p>Autoria:</p><p>Luciana Vieira Mariano</p><p>Murivaldo Neves Andrade Filho</p><p>A PESQUISA E A EXTENSÃO OU RELATOS DE EXPERIÊNCIA COMO AÇÕES DE COMBATE</p><p>À LGBTFOBIA E/OU DE FORTALECIMENTO DA IDENTIDADE DE PESSOAS LGBTQIAPN+.</p><p>RESUMO</p><p>Esse texto se propõe a apresentar o relato de ex-</p><p>periência das atividades desenvolvidas no Projeto</p><p>Maria que é um projeto de extensão do Departa-</p><p>mento de Ciências Humanas – Campus V da Uni-</p><p>versidade do Estado da Bahia. Esse projeto surgiu</p><p>em 2019 a partir da necessidade de que discussões</p><p>relacionadas às vivências e resistências de pessoas</p><p>LGBTQIAPN+ fossem conhecidas, ouvidas e res-</p><p>peitadas nesse espaço acadêmico. A partir dessa</p><p>proposta foram construídas diferentes atividades</p><p>que deram voz e protagonismo a essas pessoas e</p><p>que tiveram como objetivo geral ampliar as dis-</p><p>cussões relacionadas à diversidade sexual e de</p><p>gênero e o combate à LGBTQIAPN+fobia e, como</p><p>objetivos específicos, a realização de palestras e</p><p>rodas de conversa com temáticas voltadas para o</p><p>letramento da diversidade sexual e de gênero e</p><p>questões que envolvessem as vivências de pessoas</p><p>LGBTQIAPN+; a promoção de atividades de combate</p><p>à LGBTQIAPN+fobia e desenvolvimento de ações</p><p>voltadas para a permanência de pessoas trans nas</p><p>escolas e universidades. Os resultados alcançados a</p><p>partir dessas diferentes atividades e ações demon-</p><p>straram que a escuta de relatos protagonizados por</p><p>pessoas LGBTQIAPN+ ampliam a compreensão de</p><p>suas vivências por parte de pessoas que não per-</p><p>tencem a essa comunidade, ampliando, dessa for-</p><p>ma, o trabalho de combate a LGBTQIAPN+fobia, o</p><p>que pode ser compreendido como um processo re-</p><p>sultante da quebra de estereótipos, compreensão</p><p>das experiências e reconhecimento de injustiças.</p><p>A partir desses resultados compreendemos que a</p><p>relevância desse projeto consiste no fortalecimento</p><p>das identidades de pessoas LGBTQIAPN+, na ampli-</p><p>ação do combate à LGBTQIAPN+fobia e na conse-</p><p>quente luta pela construção de uma sociedade mais</p><p>justa para todes.</p><p>PALAVRAS-CHAVE: Projeto de extensão. Comuni-</p><p>dade LGBTQIAPN+. Letramento em diversidade sex-</p><p>ual e de gênero. Combate à LGBTQIAPN+fobia.</p><p>QUANDO TUDO COMEÇOU</p><p>Voa</p><p>Enquanto tuas asas são jovens e fortes</p><p>Voa</p><p>Enquanto teu canto</p><p>Também é jovem e forte</p><p>E pode ser teu guia</p><p>Voa enquanto ainda tens um ninho</p><p>Para onde você pode regressar</p><p>(ainda que para um breve descanso)</p><p>Voa</p><p>Em nome de todas as pessoas que sonham em voar</p><p>Mas ainda não podem</p><p>Voa</p><p>Em nome de todas as pessoas que desejam voar</p><p>Mas já não podem</p><p>Voa</p><p>Porque voar é teu destino</p><p>E porque a liberdade de teu voo é inspiração</p><p>(Mariano, 2021)</p><p>O texto acima, dedicado à pessoa que inspirou</p><p>o Projeto Maria, escrito em 2019 e publicado em</p><p>2021, traz a ideia de que as pessoas nasceram para</p><p>ser livres e que uma pessoa LGBTQIAPN+ só pode</p><p>ser livre se puder assumir a sua sexualidade e/ou</p><p>a sua identidade de gênero. Mas do que isso, uma</p><p>pessoa dessa comunidade só pode se sentir livre se</p><p>ela tiver a possiblidade de ‘voar’ em uma sociedade</p><p>que respeite as diferenças. Dessa forma, ‘voar’ é</p><p>um ato de coragem e inspiração.</p><p>O objetivo desse trabalho é apresentar a história do</p><p>projeto de extensão intitulado Projeto Maria e o re-</p><p>sultado de suas ações. Buscamos aqui realizar uma</p><p>narração que hora se dará em primeira pessoa do</p><p>singular, onde eu, Luciana Mariano, relato a minha</p><p>vivência</p><p>enquanto coordenadora desse projeto e hora</p><p>se dará na primeira pessoa do plural, onde tomamos</p><p>como parte dessa narrativa as pessoas envolvidas com</p><p>a realização das atividades ao longo de quatro anos e</p><p>também convidamos as pessoas que estão fazendo/</p><p>farão essa leitura a se sentir parte dessa história.</p><p>Foi em 2019 que o contato com uma pessoa trans</p><p>permitiu que enxergássemos de forma mais obje-</p><p>tiva a necessidade de que discussões relacionadas</p><p>à comunidade LGBTQIAPN+ no Departamento de</p><p>Ciências Humanas – Campus V (DCH-V) da Univer-</p><p>sidade do Estado da Bahia, localizado em Santo An-</p><p>tonio de Jesus, um município do interior do estado.</p><p>Embora esse contato tenha ocorrido ao longo do</p><p>ano de 2019, a manifestação do desejo de realizar</p><p>a transição de gênero por parte dessa pessoa só foi</p><p>manifestado em outubro. A transição aconteceu</p><p>nesse período, mesmo momento em que o Projeto</p><p>Maria nasceu.</p><p>No início de dezembro de 2019 foram realizadas as</p><p>duas primeiras atividades do nosso projeto: uma re-</p><p>união como pessoas da comunidade LGBTQIAPN+</p><p>em cursos do DCH-V e uma reunião aberta para</p><p>familiares de pessoas LGBTQIAPN+ da comunidade</p><p>interna e externa.</p><p>A primeira atividade foi realizada e nela compartilha-</p><p>mos nossas histórias. Esse compartilhar de histórias,</p><p>realizado naquele momento, fortalecia as nossas</p><p>identidades. Naquele momento não sabíamos, mas</p><p>esse compartilhar de histórias seria, posteriormente,</p><p>uma das principais ações do Projeto Maria.</p><p>A segunda atividade não foi realizada porque nen-</p><p>hum familiar apareceu, contudo isso não desan-</p><p>imou. O Projeto Maria havia nascido e com ele a</p><p>certeza de que podíamos lutar por um mundo</p><p>mais justo para todas as pessoas da comunidade</p><p>LGBTQIAPN+.</p><p>Nas duas seções seguintes a essa Introdução, bus-</p><p>caremos apresentar as questões que respaldam o</p><p>nosso projeto, bem como seus objetivos, principais</p><p>ações realizadas entre os anos de 2020 e 2023 e o</p><p>resultados alcançados.</p><p>O PROJETO, SUAS PROPOSTAS E AÇÕES</p><p>Antes de iniciar a escrita dessa segunda seção, é</p><p>preciso mencionar que o DCH-V é um Departamen-</p><p>to que trabalha prioritariamente com a formação</p><p>de professores, ofertando 5 (cinco) cursos presenci-</p><p>ais de licenciatura (Letras, Língua Portuguesa e suas</p><p>Literaturas, Letras, Língua Inglesa e suas Literaturas,</p><p>Letras, Língua Espanhola e suas Literaturas, Geogra-</p><p>fia e História) e 1 (um) curso de bacharelado (Admin-</p><p>istração). Por essa razão as atividades desenvolvidas</p><p>pelo Projeto Maria têm como objetivo geral ampliar</p><p>as discussões relacionadas a diversidade sexual e de</p><p>gênero e LGBTQIAPN+fobia na Educação Básica e na</p><p>Universidade e como objetivos específicos realizar</p><p>palestras e rodas de conversa dando voz às pessoas</p><p>LGBTQIAPN+, promover atividades de combate à</p><p>LGBTQIAPN+fobia para alunos e professores da Ed-</p><p>ucação Básica e desenvolver uma cartilha de orien-</p><p>tação à inclusão e permanência de pessoas trans</p><p>em diferentes contextos educacionais.</p><p>Pessoas LGBTQIAPN+ têm sido vítimas de precon-</p><p>ceito e discriminação em diferentes espaços, inclu-</p><p>sive nos espaços educacionais o que, muitas vezes,</p><p>têm sido a causa de evasão. Como educadora e</p><p>professora formadora entendo que há a necessi-</p><p>dade de ampliar as discussões relacionadas à essa</p><p>temática e, como pontua Morin (2005), educar os</p><p>educadores em relação ao acolhimento de estu-</p><p>dantes que façam parte dessa população. Dessa</p><p>forma, o Projeto Maria surge com o objetivo geral</p><p>de ampliar as discussões relacionadas a diversidade</p><p>sexual e de gênero e LGBTQIAPN+fobia na Educação</p><p>Básica e na Universidade a partir da realização de</p><p>palestras e rodas de conversa dando voz às pessoas</p><p>LGBTQIAP+, da promoção de atividades de combate</p><p>à LGBTQIAPN+fobia para estudantes e docentes da</p><p>Educação Básica e do desenvolvimento de materiais</p><p>de orientação à inclusão e permanência de pessoas</p><p>dessa comunidade nas escolas.</p><p>Sabemos que pessoas LGBTQIAPN+ ainda têm sido</p><p>vítimas de preconceito e discriminação em difer-</p><p>entes espaços, inclusive nos espaços educacionais</p><p>o que, muitas vezes, têm sido a causa de evasão.</p><p>[...] Preconceito, exclusão, burocracia ao acesso esco-</p><p>lar, seja na Universidade ou nas Escolas de Educação</p><p>Básica, torna- se um desafio para alunos e alunas dissi-</p><p>dentes em suas sexualidades. O que é rito de passagem</p><p>para alunos heterossexuais, o acolhimento, o pertenci-</p><p>mento aos grupos; para os dissidentes é batalha a ser</p><p>travada dia após dia. Muitos desistem por não suportar</p><p>o sobrepor de opressões que se entrecruzam a partir da</p><p>intersecção de raça, classe social e não reconhecimento</p><p>dos muitos sinônimos legítimos que a sexualidade e o</p><p>prazer podem formar (Hilário, 2020, p. 03).</p><p>Uma pesquisa realizada entre jovens de todo o Bra-</p><p>sil, no ano de 2015 pela Associação Brasileira de</p><p>Lésbicas e Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais</p><p>(ABGLT), revelou que o abandono escolar passa</p><p>a ser uma alternativa em meio a toda essa prob-</p><p>lemática para muitos estudantes LGBT: 60,2% dos</p><p>entrevistados afirmaram se sentir inseguros/as na</p><p>instituição educacional por causa de sua orientação</p><p>sexual e 42,8% se sentiam inseguros/as por causa</p><p>da maneira como expressavam o gênero. Embora</p><p>essa pesquisa tenha sido realizada há 8 anos, sabe-</p><p>mos que o medo e a i segurança ainda são enfrenta-</p><p>dos em diferentes contextos educacionais por pes-</p><p>soas dessa comunidade.</p><p>Segundo Dark (2017) há seis situações que jovens</p><p>LGBTQIAPN+ enfrentam na escola: 1. Medo de rev-</p><p>elar a orientação sexual e identidade de gênero; 2.</p><p>Ouvir xingamentos e sofrer agressões; 3. Ser vítima</p><p>de assédio sexual; 4. Sentir-se desconfortável em</p><p>banheiros e nas aulas de Educação Física; 5. Passar</p><p>por assédio ou discriminação por parte dos pro-</p><p>fessores, coordenadores e diretores e 6. Receber</p><p>agressões verbais e ameaças na internet (cyber-</p><p>bullying). Essas e outras violências têm sido, muitas</p><p>vezes, vivenciadas por pessoas dessa comunidade</p><p>também em instituições de Ensino Superior e, para</p><p>além da sofrimento que tem causado às vítimas, es-</p><p>sas violências têm também sido, por vezes, a causa</p><p>da evasão de estudantes universitários.</p><p>Junqueira (2009) afirma que ao mesmo tempo em</p><p>que nós, profissionais da educação, estamos con-</p><p>scientes de que nosso trabalho se relaciona com</p><p>o quadro dos direitos humanos e pode contribuir</p><p>para ampliar os seus horizontes, precisamos tam-</p><p>bém considerar que estamos envolvidos na tessi-</p><p>tura de uma trama em que sexismo, homofobia e</p><p>racismo produzem efeitos e que, apesar de nossas</p><p>intenções, terminamos muitas vezes por promover</p><p>sua perpetuação.</p><p>Dessa forma entendemos que é imprescindível</p><p>conhecer as experiências de alunes e pessoas</p><p>LGBTQIAPN+ bem como educar os educadores em</p><p>relação ao acolhimento de estudantes que façam</p><p>parte dessa população e que essas atividades são</p><p>urgentes e necessárias para o fortalecimento das</p><p>identidades dessas pessoas e para o combate a</p><p>LGBTQIAPN+fobia.</p><p>I S I M P Ó S I O D I V E R S I D A D E E R E S I S T Ê N C I A</p><p>B R A S Í L I A / D F 2 0 2 3</p><p>O HISTÓRICO DE AÇÕES DO PROJETO MARIA</p><p>Conforme menção realizada na Introdução desse texto,</p><p>as atividades do Projeto Maria foram iniciadas em no-</p><p>vembro de 2019. No início de 2020 chegaram a ser real-</p><p>izadas 3 atividades presenciais, a primeira foi uma Roda</p><p>de Conversa realizada no DCH-V da UNEB no dia 29 de</p><p>janeiro – Dia da Visibilidade Trans – e intitulada Vida</p><p>trans x CIStema: resistências, desafios e conquistas. A</p><p>Roda de conversa foi protagonizada por um homem</p><p>trans e por uma mulher trans que trouxeram um relato</p><p>de sua experiência relacionado ao reconhecimento de</p><p>sua identidade de gênero e seu período de transição.</p><p>No mês de fevereiro foi realizada uma Roda de Conver-</p><p>sa sobre o curta Heterofobia: o mundo ao contrário,</p><p>que apresenta um cenário fictício onde o preconceito</p><p>e a discriminação são direcionados às pessoas que não</p><p>pertencem à comunidade LGBTQIAPN+.</p><p>No dia 04 de março, o Projeto Maria promoveu outra</p><p>Roda de Conversa, intitulada Armário: pra lá eu não vol-</p><p>to!. Essa atividade contou</p><p>com a presença de pessoas</p><p>estudantes de uma escola pública de nosso município</p><p>e foi impactante ouvir os relatos trazido por essas pes-</p><p>soas.</p><p>Com a pandemia, o Projeto Maria iniciou suas ativ-</p><p>idades online com o grupo de estudos sobre o livro</p><p>Psicologia, Gênero e Diversidade: saberes em diálogo.</p><p>Participaram desse grupo pessoas de diferentes par-</p><p>tes do país e dentre elas pessoas da área de psicologia</p><p>que posteriormente assumiram a coordenação de dois</p><p>grupos de apoio intitulados Vibe Colorida. Os grupos</p><p>funcionaram durante dois meses na modalidade re-</p><p>mota e eram destinados às pessoas LGBTQIAPN+. Nele</p><p>essas pessoas puderam tratar de dores e vivências e</p><p>sempre eram acolhidas pelos psicólogos/psicólogas re-</p><p>sponsáveis e por demais integrantes do grupo.</p><p>Nesse mesmo ano o projeto ganhou o apoio da profes-</p><p>sora Stelina Vasconcelos e esse apoio foi fundamental</p><p>para a realização das outras 17 atividades que foram</p><p>desenvolvidas: Pessoas não-binárias ou binarismo de</p><p>gênero, Subjetividades e percursos de mulheres lés-</p><p>bicas, O trabalho do intérprete de libras no contexto</p><p>LGBT+, Vivência lésbica no meio universitário, Visib-</p><p>ilidade lésbica e garantia de direitos, Vivências de do-</p><p>centes lésbicas na universidade pública, Conservadoris-</p><p>mo e ideologia de gênero, confusossexuais somos nós?,</p><p>Dilemas e enfrentamentos dos corpos bissexuais, desa-</p><p>fios da travestilidade nos espaços educativos, O evangel-</p><p>ho para pessoas LGBTIAP+, O candomblé para pessoas</p><p>LGBTQIAPN+, Saúde da população LGBTQIAPN+, O</p><p>espiritismo para pessoas LGBTQIAPN+, Gêneros e Sex-</p><p>ualidades: conceitos e ressignificações, Saúde da pop-</p><p>ulação intersexo, (Sobre)vivências de pessoas intersexo,</p><p>Uma sociedade inclusiva para autistas e pessoas trans,</p><p>A possibilidade de transformar a partir das atividades</p><p>de extensão: Relatos do Projeto Caminhos para uma Ed-</p><p>ucação Inclusiva e do Projeto Maria, Curso de extensão</p><p>para psicólogos em formação.</p><p>O ano de 2021 foi o ano onde o Projeto Maria desen-</p><p>volveu uma quantitativo menor de ações, mas conse-</p><p>guimos, nesse ano, desenvolver as seguintes atividades:</p><p>A trajetória de resistência de uma mulher lésbica, Mães</p><p>pela Diversidade: a maternidade de mulheres lésbicas</p><p>- enfrentamentos e resistências, A trajetória de resistên-</p><p>cia de um homem gay, Mães pela diversidade: a mater-</p><p>nidade de homens gays - enfrentamentos e resistências</p><p>e Mães pela diversidade: A maternidade de pessoas</p><p>bissexuais.</p><p>Em 2022, o Projeto Maria desenvolveu 12 atividades</p><p>e pode finalmente cumprir uma meta estabelecida</p><p>desde 2020: realizar atividades referentes a cada uma</p><p>das siglas LGBTIAPN+. Essas atividades, assim como as</p><p>palestras e rodas de conversa relacionadas às vivências</p><p>e resistências de pessoas dessa comunidade, foram</p><p>protagonizadas pelas pessoas que, por direto tem esse</p><p>lugar de fala. Lembramos que, segundo Ferreira Neto</p><p>(n.d.), o lugar de fala é um conceito que tem permeado</p><p>as discussões e debates atuais quando se refere a mi-</p><p>norias e experiências sociais. Essencialmente, refere-se</p><p>a autoridade que uma pessoa possui para falar sobre</p><p>a sua situação social enquanto pertencente a um gru-</p><p>po minoritário, seja étnico, de gênero, religioso, políti-</p><p>co etc. A ideia central no Lugar de Fala é entender que,</p><p>mesmo que diferentes pessoas possam compreender</p><p>situações sociais e teorizar sobre as mesmas, quem</p><p>possui argumentos de autoridade sobre essas situações</p><p>são os grupos que possuem experiências com essas re-</p><p>alidades.</p><p>As atividades desenvolvidas nesse ano foram: Os dire-</p><p>itos de estudantes trans nas escolas, Compreendendo</p><p>a transfobia na escola a partir do filme “Alice Júnior”,</p><p>como combater a transfobia na escola?, (Re)conhecen-</p><p>do a diversidade sexual e de gênero: A letra ‘L’ da sigla</p><p>LGBTQIAPN+, Roda de conversa: acolhides ou rejeita-</p><p>des? O olhar de estudantes LGBT acerca da afetividade</p><p>no espaço escolar, Roda de conversa: Diversidade Sex-</p><p>ual e de Gênero: Qual é o papel da família e da escola</p><p>I S I M P Ó S I O D I V E R S I D A D E E R E S I S T Ê N C I A</p><p>B R A S Í L I A / D F 2 0 2 3</p><p>diante de estudantes LGBTQIAPN+?, (Re)conhecendo</p><p>a diversidade sexual e de gênero: a letra ‘G’ da sigla</p><p>LGBTQIAPN+, (Re)conhecendo a diversidade sexual e de</p><p>gênero: a letra ‘B’ e a letra ‘P’ da sigla LGBTQIAPN+, (Re)</p><p>conhecendo a diversidade sexual e de gênero: a letra</p><p>‘T’ da sigla LGBTQIAPN+, (Re)conhecendo a diversidade</p><p>sexual e de gênero: A letra ‘Q’ da sigla LGBTQIAPN+, (Re)</p><p>conhecendo a diversidade sexual e de gênero: a letra</p><p>‘I’ da sigla LGBTQIAPN+, (Re)conhecendo a diversidade</p><p>sexual e de gênero: a letra ‘N’ da sigla LGBTQIAPN+ e</p><p>(Re)conhecendo a diversidade sexual e de gênero: a le-</p><p>tra ‘A’ da sigla LGBTQIAPN+.</p><p>Enfim, em 2023, o Projeto Maria realizou as atividades:</p><p>Sobre se reconhecer como uma pessoa LGBTQIAPN+</p><p>e se abraçar, Letramento de gênero para o curso de</p><p>Serviço Social, A necessidade de acolher filhos, filhas e</p><p>filhas independente de sua orientação sexual e identi-</p><p>dade de gênero, Reconhecendo a diversidade sexual e</p><p>de gênero, Questões que envolvem o suicídio de pes-</p><p>soas LGBTQIAPN+ e Roda de Conversa: (Sobre)vivência</p><p>de mulheres. Destacamos que as atividades A necessi-</p><p>dade de acolher filhos, filhas e filhas independente de</p><p>sua orientação sexual e identidade de gênero e Recon-</p><p>hecendo a diversidade sexual e de gênero foram desen-</p><p>volvidas em uma Associação sendo a primeira destina-</p><p>da para um grupo de pais e mães das crianças assistidas</p><p>por essa instituição e a segunda foi desenvolvida com</p><p>pré-adolescentes. Essa foi a primeira vez que falávamos</p><p>de gênero e diversidade para um grupo dessa idade.</p><p>UMA BREVE CONSIDERAÇÃO SOBRE OS RESULTADOS ALCANÇADOS</p><p>Um projeto de extensão, no contexto acadêmico,</p><p>refere-se a uma atividade que visa aplicar os con-</p><p>hecimentos produzidos na instituição de ensino em</p><p>benefício da comunidade externa. Essa prática está</p><p>relacionada à chamada “tríplice função da universi-</p><p>dade”, que inclui o ensino, a pesquisa e a extensão.</p><p>Ao contrário do ensino, que está focado na trans-</p><p>missão de conhecimento de pessoas estudantes e da</p><p>pesquisa, que busca a produção de novos conheci-</p><p>mentos, a extensão universitária tem como objetivo</p><p>principal a interação entre a academia e a sociedade.</p><p>A partir da inspiração trazida por um voo, o proje-</p><p>to de extensão intitulado Projeto Maria foi criado.</p><p>A metáfora do voo, trazida no texto que inicia esse</p><p>relato de experiência, também parece ser adequa-</p><p>do para a construção da conclusão desse texto</p><p>uma vez que voar é arriscar-se. Quando criamos</p><p>o Projeto Maria, foi necessário encarar o voo e to-</p><p>dos os riscos impostos em um ano bastante difícil</p><p>para todas as minorias em nosso país para tratar-</p><p>mos do fortalecimento das identidades de pessoas</p><p>LGBTQIAPN+ e para desenvolver as ações de com-</p><p>bate a LGBTQIAPN+fobia.</p><p>Durante as atividades, conhecemos pessoas cora-</p><p>josas e dispostas a compartilhar suas histórias.</p><p>Também conhecemos pessoas que posteriormente</p><p>relataram as contribuições das atividades para o</p><p>fortalecimento de suas identidades. Esses relatos</p><p>renovaram nosso desejo de não encerrar as ativi-</p><p>dades do Projeto Maria e nos deram a certeza de</p><p>que nosso voo era necessário.</p><p>REFERÊNCIAS</p><p>DARK, Larissa. 6 situações que todo jovem LGBT passa na es-</p><p>cola e como combatê-las. Disponível em: https://novaescola.</p><p>org.br/conteudo/4970/7-situacoes-que-todo-jovem-lgbt-pas-</p><p>sa-na-escola-e-como-combate-las. Acesso em 21 jan. 2019.</p><p>FOUCAULT, Michel. História da Sexualidade I: A vontade de</p><p>saber. Rio de Janeiro: Graal, 1988.</p><p>GAGLIOTTO, Giseli Monteiro. A Educação Sexual na Escola e</p><p>a Pedagogia da Infância: matrizes institucionais, disposições</p><p>culturais, potencialidades e perspectivas emancipatórias.</p><p>257 f. Tese (Doutorado em Educação) - Faculdade de Edu-</p><p>cação, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2009.</p><p>LOURO, Guacira Lopes. A construção escolar das diferenças.</p><p>Petrópolis: Vozes, 1997</p><p>LUZ, Nanci Stancki da; CARVALHO, Marilia Gomes de; CASA-</p><p>GRANDE, Lindamir Salete. (Org.). Construindo</p><p>a igualdade na di-</p><p>versidade: gênero e sexualidade na escola. Curitiba, UTFPR, 2009.</p><p>MORIN, Edgar; ALMEIDA, Maria da Conceição, CARVALHO,</p><p>Edgard de Assis (Orgs.). Educação e complexidade: os sete</p><p>saberes e outros ensaios. São Paulo: Cortez, 2002.</p><p>PARANÁ. Secretaria de Estado da Educação. Cadernos Temáti-</p><p>cos da Diversidade/Sexualidade. Departamento da Diversi-</p><p>dade. Núcleo de Gênero e Diversidade Sexual - PR, 2009.</p><p>Professora de educação básica da Secretaria de Estado de Educação</p><p>do DF; Pós-graduada em Educação Básica e Direitos Humanos na</p><p>Perspectiva Internacional. Militante dos e pelos direitos humanos</p><p>e por uma educação pública inclusiva, democrática, laica,</p><p>antirracista, anticapitalista, ANTILGBTFÓBICA, anticapacitista,</p><p>acolhedora e socialmente referenciada. É integrante da Associação</p><p>Mães da Resistência.</p><p>MARCIA SOUSA</p><p>DE ABREU</p><p>A FORMAÇÃO DA(O)</p><p>PROFESSORA (O) E O</p><p>RESPEITO ÀS IDENTIDADES</p><p>DE GÊNERO NA EDUCAÇÃO</p><p>INFANTIL NA PERSPECTIVA</p><p>DE UMA ESCOLA DAS</p><p>INFÂNCIAS</p><p>I S I M P Ó S I O D I V E R S I D A D E E R E S I S T Ê N C I A</p><p>B R A S Í L I A / D F 2 0 2 3</p><p>A FORMAÇÃO DA(O) PROFESSORA (O) E O RESPEITO ÀS</p><p>IDENTIDADES DE GÊNERO NA EDUCAÇÃO INFANTIL NA</p><p>PERSPECTIVA DE UMA ESCOLA DAS INFÂNCIAS</p><p>Autoria:</p><p>Marcia Sousa de Abreu</p><p>Orientadora:</p><p>Profa. Me. Angélica Acácia Ayres Angola de Lima</p><p>GÊNERO E DIVERSIDADE NA ESCOLA.</p><p>RESUMO</p><p>Este estudo se inscreve no campo da Educação em e</p><p>para os Direitos Humanos, com prioridade para a políti-</p><p>ca de formação inicial e continuada de professores (as)</p><p>e o acolhimento e respeito à pluralidade de corpos de</p><p>gênero. Nas últimas décadas, houve aumento significa-</p><p>tivo do número e pluralidade de corpos de pesquisas</p><p>relacionadas às temáticas de gênero, sexualidade, raça</p><p>e direitos humanos ligados à educação. Nessa perspec-</p><p>tiva, o objeto dessa investigação está voltado para a</p><p>política de formação continuada dos (das) professores</p><p>(as) continuada e o respeito às identidades de gêne-</p><p>ro na educação infantil, na perspectiva de uma escola</p><p>das Infâncias, no período de 2020 a 2023. Pretende-se</p><p>levantar a percepção das professoras e professores</p><p>sobre a pluralidade de corpos de gênero na educação</p><p>Infantil. Busca-se também compreender como consub-</p><p>stancia-se a formação continuada dos docentes para o</p><p>acolhimento das crianças desta etapa educacional, con-</p><p>siderando toda a pluralidade de corpos das crianças.</p><p>Palavras-chave: pluralidade de corpos; formação</p><p>docente; direitos humanos; educação infantil.</p><p>ABSTRACT</p><p>This study is part of the field of Education and Human</p><p>Rights, with priority given to the policy of initial and</p><p>continuing training of teachers and the reception and</p><p>respect for gender diversity. gender, sexuality, race</p><p>and human rights linked to education. In this perspec-</p><p>tive, the object of this investigation is focused on the</p><p>policy of continuing teacher training and respect for</p><p>gender identities in early childhood education from</p><p>the perspective of a childhood school, in the period</p><p>from 2020 to 2023. It is intended to raise the per-</p><p>ception of teachers about gender diversity in early</p><p>childhood education. It is also sought to understand</p><p>how the continuing education of teachers is consoli-</p><p>dated for the reception of children in this education-</p><p>al stage, considering all the diversity of children.</p><p>Keywords:Plurality of bodies, Teacher training, hu-</p><p>man rights, early childhood education.</p><p>INTRODUÇÃO</p><p>Este estudo se inscreve no campo da Educação em</p><p>e para os Direitos Humanos, com prioridade para a</p><p>política de formação continuada de professores(as)</p><p>para o acolhimento e respeito à pluralidade de cor-</p><p>pos de gênero. Nas últimas décadas, houve aumen-</p><p>to significativo do número e pluralidade de corpos</p><p>de pesquisas relacionadas às temáticas de gênero,</p><p>sexualidade, raça-etnia e direitos humanos liga-</p><p>dos à educação. Nessa perspectiva, o objeto des-</p><p>sa investigação está voltado a política de formação</p><p>continuada dos (as) professores(as) e o respeito às</p><p>identidades de gênero na educação infantil na per-</p><p>spectiva de uma escola das Infâncias, no período</p><p>de 2020 a 2023; pretende-se levantar a percepção</p><p>das professoras e professores sobre a pluralidade</p><p>de corpos de gênero na educação Infantil. Busca-se</p><p>também compreender como consubstancia-se a</p><p>formação continuada dos (das) docentes para o</p><p>acolhimento das crianças desta etapa educacional,</p><p>considerando a pluralidade de corpos das crianças.</p><p>Este trabalho tem origem no meu processo de re-</p><p>flexão profissional e pessoal, como professora da ed-</p><p>ucação infantil há mais de 20 anos e como mãe de</p><p>um adolescente trans de 13 anos que é estudante</p><p>da rede pública de ensino do DF. Venho lendo, ob-</p><p>servando e buscando cada vez mais informações so-</p><p>bre a pluralidade de corpos de gênero presente na</p><p>escola das infâncias, na sociedade em minha vida.</p><p>Apesar do aumento do número de pesquisas, con-</p><p>sidero que há a necessidade de mais estudo, pesqui-</p><p>sa e fomento para a educação em todas as etapas</p><p>e modalidades, pois minha experiência profissional,</p><p>pessoal e acadêmica até aqui, mostra uma socie-</p><p>dade ainda muito despreparada para acolher as pes-</p><p>soas que se identificam de forma diversa do padrão</p><p>de gênero cisgênero aprovado socialmente. Os (as)</p><p>agentes públicos, em geral, e os (as) profissionais da</p><p>educação que foram e não têm sido formados com</p><p>conhecimentos científicos para reconhecer, acolher</p><p>e promover as diferenças presentes na escola. A real-</p><p>idade da educação escolar no DF ainda é muito mar-</p><p>cada por violências institucionais, físicas, psicológicas</p><p>e morais contra a população estudantil LGBTI+.</p><p>Neste artigo, trataremos da realidade da educação es-</p><p>colar do DF a partir de dados, pesquisas e estudos de</p><p>organizações não governamentais e de minha própria</p><p>vivência como mãe de uma criança que não se enquadra</p><p>nos padrões de masculinidade vigentes e sua dura ex-</p><p>periência com os preconceitos e discriminações vividos</p><p>em sua infância e adolescência na rede pública de ensi-</p><p>no do Distrito Federal. Desde os 2 anos, no programa de</p><p>educação precoce, na educação infantil, passando pelo</p><p>ensino fundamental 1, e atualmente, no 9º ano do Ensi-</p><p>no Fundamental, eu e meu filho enfrentamos a violência</p><p>transfóbica escolar tão nociva ao desenvolvimento infan-</p><p>to juvenil e ao sucesso da aprendizagem.</p><p>Meu lugar de fala também é de uma militante de</p><p>um grupo de Mães da Resistência, organizado por</p><p>mães de pessoas LGBTQIAPN+ que convive cotidi-</p><p>anamente com outras mães de crianças e adoles-</p><p>centes transgêneros ou fora dos padrões binários</p><p>de masculinidade e feminilidade que vigoram em</p><p>nossa sociedade e na escola. Neste grupo de mãel-</p><p>itantes1 lutamos pelos direitos de nossos filhos,</p><p>filhas e filhes de existirem como são e de terem</p><p>acesso a uma educação escolar que reconheça,</p><p>acolha e promova a todos, todas e todes2 como</p><p>seres humanos diversos e complexos que são.</p><p>Entendo que desvelar as complexidades presentes</p><p>na pluralidade de corpos de gênero e em outras dif-</p><p>erenças constitutivas das identidades de pessoas in-</p><p>dividualmente ou de grupos sociais como de raça-et-</p><p>nia, sexualidade, das deficiências, de território e</p><p>classe social é fundamental para a construção de</p><p>uma educação verdadeiramente democrática, in-</p><p>clusiva e de qualidade socialmente referenciada.</p><p>Nesse sentido, abordar essa questão tão envolta</p><p>em tabus e preconceitos se faz necessário para a</p><p>proteção e garantia de direitos de todas as infân-</p><p>cias e adolescências, pois minha experiência como</p><p>mãe e professora, me diz que as crianças e adoles-</p><p>centes LGBTI+ não conseguem acessar seus direitos</p><p>a máxima proteção prevista pelo Artigo 227 da Con-</p><p>stituição Federal de 1988 e no Estatuto da Criança</p><p>e Adolescente Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990.</p><p>Para aprofundar minha observação sobre a reali-</p><p>dade escolar na educação infantil na rede pública</p><p>de ensino do Distrito Federal para estudantes LGB-</p><p>TI+3 o lócus da pesquisa será Centro de Educação</p><p>Infantil 01 do Paranoá, localizado na Quadra 16 área</p><p>especial,</p><p>Paranoá, Brasília Distrito Federal, região</p><p>periférica em turmas de primeiro e segundo perío-</p><p>dos da Educação Infantil. O instrumento de coleta</p><p>de dados será entrevisto semiestruturada para o</p><p>levantamento de percepções das professoras (es)</p><p>docentes sobre identidade gênero e a pluralidade</p><p>de corpos de gênero presente na escola e em sua</p><p>experiência profissional. A metodologia empregada</p><p>baseia-se na análise qualitativa dos dados. Foi uti-</p><p>lizada a entrevista como forma de geração de dados</p><p>1. Mãelitante é termo que usamos no movimento social de mãe de crianças, adolescentes e pessoas LGBTQIAPN+.Uma junção dos ter-</p><p>mos mãe e militante.</p><p>2. As palavras “todas, todos, Todes” serão empregadas em todo o texto</p><p>3. Reconhecemos e respeitamos todas as identidades presentes na sigla LGBTQIAPN+. Mas para fazer referência às crianças que não se</p><p>enquadram nos estereótipos de gênero vigentes optamos por usar apenas LGBTI+, pois no caso das infâncias estudos e pesquisas exis-</p><p>tentes não nos permitem afirmar que todas as identidades presentes na sigla completa encontrem correspondência com a realidade.</p><p>No nascimento, os bebês são designados masculi-</p><p>no ou feminino com base em características físicas.</p><p>Isso se refere ao “sexo” da criança. Quando as cri-</p><p>anças são capazes de se expressar, eles se declar-</p><p>aram um menino, uma menina ou não-binárie; esta</p><p>é a sua “identidade de gênero. Em geral, a maioria,</p><p>das identidades de gênero das crianças se alinham</p><p>com o seu sexo biológico, ou seja, estão de acordo</p><p>PLURALIDADE DE CORPOS DE GÊNERO NA EDUCAÇÃO INFANTIL</p><p>I S I M P Ó S I O D I V E R S I D A D E E R E S I S T Ê N C I A</p><p>B R A S Í L I A / D F 2 0 2 3</p><p>com o gênero atribuído pela sociedade à estas ao</p><p>nascer. No entanto, para algumas crianças, a combi-</p><p>nação entre sexo biológico e identidade de gênero</p><p>não expressa a correspondência entre corpo macho</p><p>e o masculino, ou corpo fêmea e o feminino.</p><p>De acordo com Louro (2003, p. 26), “[...] o modo</p><p>como as características sexuais são compreendidas</p><p>e representadas ou, então, como são trazidas para a</p><p>prática social e tornadas parte do processo históri-</p><p>co”. Assim, gênero é o modo como as características</p><p>femininas e masculinas são entendidas e construí-</p><p>das em uma cultura; são as formas como a socie-</p><p>dade determina maneiras distintas de viver para as</p><p>pessoas segundo seu sexo.</p><p>Minha experiência como mãe e professora me mos-</p><p>tra que crianças fora do padrão cisgênero são cada</p><p>vez mais presentes no contexto escolar. Embora o</p><p>estado, a sociedade, a escola e em muitos casos,</p><p>a própria famílias tente invisibilizar estas crianças,</p><p>vários estudos e pesquisas demonstram que as cri-</p><p>anças trans não só existem como em geral, são víti-</p><p>mas de sistemáticas e graves violências nas escolas</p><p>de educação infantil e, em grande parte dos casos,</p><p>essas violências são cometidas por profissionais</p><p>que deveriam lhes garantir acolhimento, proteção</p><p>e um ambiente seguro para seu desenvolvimento</p><p>educacional, sua aprendizagem e cidadania.</p><p>Um estudo longitudinal realizado entre 2013 e</p><p>2017 pela TransYouth, com 317 participantes dos</p><p>Estados Unidos e Canadá entre os 3 e 12 anos de</p><p>idade e publicado em 2022 no periódico científico</p><p>Pediatrics mostrou que, após esse período de quase</p><p>cinco anos, 94% das crianças analisadas continuam</p><p>se identificando como transexual binária (masculi-</p><p>no ou feminina), enquanto outras 3.5% passaram</p><p>a se afirmar como não-bináries. Apenas 2.5% vol-</p><p>taram a se entender como cisgênero, ou voltaram</p><p>a se identificar com gênero correspondente ao sexo</p><p>biológico, atribuído ao nascimento. A conclusão do</p><p>estudo é de que na maioria dos casos de crianças</p><p>que se identificam como transgêneras, não fazem</p><p>a destransição, o que confirma a ideia de que, em</p><p>geral, mesmo quando muito novas, as crianças já</p><p>sabem expressar suas identidades de gênero.</p><p>Em outro estudo, realizado com adultos transgêneros</p><p>do Reino Unido sobre suas memórias de infância aponta</p><p>que a idade média em que as pessoas trans se tornam</p><p>conscientes de que são transgênero é de aproxima-</p><p>damente 8 anos de idade, e mais de 80% das pessoas</p><p>transgênero se tornam conscientes de que são trans</p><p>antes de deixarem a escola primária (Kennedy, 2008). O</p><p>estudo também constata que as crianças transgêneros</p><p>têm sentimento de culpa e vergonha o que pode gerar</p><p>sérios problemas que se relacionam com fracassos na</p><p>educação e em outras áreas da vida social.</p><p>No Brasil, o Mapeamento das Pessoas Trans do Mu-</p><p>nicípio de São Paulo realizado pelo Centro de Estudos</p><p>de Cultura Contemporânea em 2021 mostrou que</p><p>24% das pessoas transgêneros deixaram de se iden-</p><p>tificar com o gênero atribuído ao nascerem quando</p><p>tinham até 10 anos de idade, outras 36% entre os 11</p><p>e 15 anos de idade e 19% entre os 16 e 20 anos.</p><p>A escola e os docentes contribuem com a construção</p><p>da identidade de gênero de crianças e adolescentes.</p><p>As relações de gênero entre as crianças a partir de</p><p>comportamentos na sala de aula e em todo contexto</p><p>escolar são perceptíveis pelos docentes que devem</p><p>desenvolver atividades que conduzam a descon-</p><p>strução de estereótipos de gênero. A “estilização de</p><p>atos repetitivos, no interior de uma estrutura regu-</p><p>ladora que se cristaliza no tempo” (Butler, 2018, p.</p><p>69) como a crenças de que a rapidez e agilidade são</p><p>características “naturais” dos meninos, assim como</p><p>capricho e delicadeza seriam expressões “naturais”</p><p>das meninas e o gosto e a escolha de pôr cores azul</p><p>para os meninos, rosa para as meninas, bem como</p><p>e desempenhos acadêmicos diferenciados, em</p><p>matemática entre meninos e meninas, são estereóti-</p><p>pos de gênero construídos social e culturalmente.</p><p>Analisando a escola do ponto de vista da pluralidade</p><p>de corpos sexual, Guacira Lopes Louro aponta que:</p><p>A escola é, sem dúvida, um dos espaços mais difíceis</p><p>para que alguém “assuma” sua condição de homos-</p><p>sexual ou bissexual. Com a suposição de que só pode</p><p>haver um tipo de desejo sexual e que esse tipo – ina-</p><p>to a todos – deve ter como alvo um indivíduo do sexo</p><p>oposto, a escola nega e ignora a homossexualidade</p><p>(provavelmente nega, porque ignora) e, desta forma,</p><p>oferece poucas oportunidades para que adolescentes</p><p>ou adultos assumam, sem culpa ou vergonha, seus</p><p>desejos. O lugar do conhecimento mantém-se, com</p><p>relação à sexualidade, o lugar do desconhecimento e</p><p>da ignorância. (Louro, 2000, p. 30).</p><p>Entendo que a formulação de Louro também cabe</p><p>para a análise sobre o gênero, pois o que vem pre-</p><p>dominando na realidade escolar em relação à plu-</p><p>ralidade de corpos de gênero, é o senso comum,</p><p>as crenças e os tabus religiosos, a ignorância que</p><p>afasta o conhecimento científico e retira a humani-</p><p>dade de quem diverge do padrão cis, hétero, bran-</p><p>co europeu e proprietário construído por séculos</p><p>de dominação colonial eurocêntrica, cristã e cap-</p><p>italista. Assim, no imaginário social que vigora no</p><p>ambiente educacional, crianças negras, indígenas,</p><p>com deficiência, trans, fora do padrão de gênero</p><p>e sexualidade colonial são destituídas de suas hu-</p><p>manidades e categorizadas como aberrações a ser-</p><p>em perseguidas e dizimadas.</p><p>A violência sofrida na escola provoca a chamada</p><p>evasão escolar, mas aqui entendemos que essas</p><p>crianças são expulsas pela ineficácia das políticas</p><p>públicas em promover um ambiente escolar pro-</p><p>tegido para o desenvolvimento educacional desse</p><p>público estudantil. Na educação brasileira, temos</p><p>três grandes problemas a serem pensados para a</p><p>promoção de educação inclusiva da pluralidade de</p><p>corpos de gênero e sexualidade: O primeiro é a aus-</p><p>ência de legislação educacional específica que seja</p><p>protetiva da pluralidade de corpos de gênero e sex-</p><p>ualidade na infância e adolescência. E o segundo</p><p>é a desconsideração da legislação existente pelos</p><p>sistemas de ensino como secretarias estaduais, mu-</p><p>nicipais, órgãos gestores e pela própria gestão es-</p><p>colar. E um terceiro e grande problema decorrente</p><p>dos dois primeiros- a não qualificação científica em</p><p>educação em e para os direitos humanos dos (as)</p><p>agentes públicos educacionais</p><p>para reconhecerem,</p><p>acolherem e promoverem a infância e a adolescên-</p><p>cia que não se enquadra no padrão binário de gêne-</p><p>ro aprovado socialmente.</p><p>Em relação a legislação vigente, na Lei de Diretriz-</p><p>es e Bases da Educação Nacional, em seu Artigo 26</p><p>parágrafo 9º está prevista a educação em e para os</p><p>direitos humanos, porém o texto segue a ideia de</p><p>direito universal, não especificando o grupo ou gru-</p><p>pos sociais afetados por violências específicas com</p><p>a violência lgbtfóbica. Segundo o texto em questão:</p><p>Conteúdos relativos aos direitos humanos e à pre-</p><p>venção de todas as formas de violência contra a cri-</p><p>ança, o adolescente e a mulher serão incluídos, como</p><p>temas transversais, nos currículos de que trata o caput</p><p>deste artigo, observadas as diretrizes da legislação</p><p>correspondente e a produção e 71040060 distribuição</p><p>de material didático adequado a cada nível de ensino.</p><p>(Redação dada pela Lei nº 14.164, de 2021)</p><p>Assim ficamos a depender da interpretação do gov-</p><p>erno vigente ou da gestão pública de plantão. Uma</p><p>vez que a legislação que se pretende universal não</p><p>reconhece grupos específicos.</p><p>As crianças trans poderiam ser entendidas como</p><p>crianças que sofrem violências na escola e na so-</p><p>ciedade, mas a escola, a sociedade e o Estado não</p><p>reconhecem a existência dessas crianças. Então</p><p>como proteger alguém que não existe? O mesmo</p><p>problema encontraremos ao analisar o Artigo 227</p><p>da Constituição Federal de 1988 que diz:</p><p>É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar</p><p>à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade,</p><p>o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação,</p><p>ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade,</p><p>ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e co-</p><p>munitária, além de colocá-los a salvo de toda forma</p><p>de negligência, discriminação, exploração, violência,</p><p>crueldade e opressão. (Brasil, 1988, art. 227)</p><p>Então a responsabilidade pela proteção da infância é</p><p>triangular entre família, Estado e sociedade. Porém</p><p>o Estado, a sociedade e a maioria das famílias não</p><p>reconhecem as infâncias ou a pluralidade de corpos</p><p>de marcadores sociais que caracterizam as diferentes</p><p>infâncias e adolescências que temos. E, em especial,</p><p>os marcadores de gênero e sexualidade. Então esse</p><p>direito universal não se consubstancia por não recon-</p><p>hecer as especificidades. A Portaria 33 do MEC, que</p><p>é específica para o público estudantil LGBTI+, garante</p><p>o nome social nos registros escolares e no tratamen-</p><p>to de estudantes trans quando solicitado por pessoa</p><p>maior de 18 anos ou por menor de 18 anos com au-</p><p>torização de mães, pais ou responsáveis. Ocorre que</p><p>na prática em geral, estas solicitações quando feita</p><p>para garantir o nome social de estudante menor</p><p>de idade, mesmo que seja feita pela mãe, pai ou</p><p>responsável têm sido negadas e desrespeitadas. A</p><p>mesma portaria diz em seu parágrafo primeiro que</p><p>a escola deve discutir e fazer constar de seu Projeto</p><p>Político Pedagógico o respeito à pluralidade de cor-</p><p>pos de gênero e sexualidade. No entanto, isso tam-</p><p>bém não condiz com a realidade que vemos na maio-</p><p>ria das escolas públicas do DF.</p><p>Nesse sentido, o estudo em tela levanta mais uma</p><p>problematização para a necessidade de equidade e</p><p>superação das desigualdades no caminho da con-</p><p>strução de uma educação infantil inclusiva de todas</p><p>as infâncias. A pretensa universalidade da legislação</p><p>protetiva das infâncias que não se efetiva pelo não</p><p>reconhecimentos das especificidades. E o não cum-</p><p>primento da legislação específica para a infância</p><p>e adolescência LGBT pelo não reconhecimento da</p><p>sociedade e do Estado da existência desta infância.</p><p>I S I M P Ó S I O D I V E R S I D A D E E R E S I S T Ê N C I A</p><p>B R A S Í L I A / D F 2 0 2 3</p><p>DIMENSÃO DO TRABALHO DOCENTE NA EDUCAÇÃO INFANTIL E O ACOLHIMENTO</p><p>E RESPEITO À PLURALIDADE DE CORPOS DE GÊNERO</p><p>Percebe-se a escola como um espaço necessário</p><p>de formação docente rotineira para que aconteça</p><p>a promoção de uma educação transformadora, ten-</p><p>do a equidade e a inclusão como estratégias para</p><p>reduzir as desigualdades e promover o respeito e o</p><p>acolhimento à pluralidade de corpos. Pode-se uti-</p><p>lizar os momentos de coordenação pedagógica em</p><p>nosso trabalho educativo para além dos “muros” da</p><p>escola, ultrapassar e atingir a sociedade como um</p><p>todo. E esse é o objetivo, transformar a realidade.</p><p>Desse modo, a escola tem se mostrado uma insti-</p><p>tuição importante na construção da identidade da</p><p>criança. Além disso, a relação professor (a) - criança</p><p>será fundamental, pois esta espelha suas crenças,</p><p>ações e concepções em figuras que lhes são impor-</p><p>tantes emocionalmente. Para Machado (2000), na</p><p>Educação Infantil, quando estas manifestações estão</p><p>presentes, o professor deve exercer um papel funda-</p><p>mental de mediar, incentivar e colaborar respeitosa-</p><p>mente com a socialização da criança. As categorias</p><p>sociais que aportam essas interações constitutivas</p><p>e criadoras, tais como gênero, etnia, religião, per-</p><p>tença econômica, entre outras, entrecruzadas e con-</p><p>stituem o sentido de si. Assim, devem ser trabalha-</p><p>das intencional e permanentemente pela escola e</p><p>pelo professor de modo em que a criança consiga</p><p>estabelecer novas formas, padrões, crenças e ideias</p><p>acerca de sua relação consigo mesma e com o outro.</p><p>A construção de si começa nas famílias, na comuni-</p><p>dade escolar como um todo a partir dos referenciais</p><p>sociais de convivência da criança. A identidade de</p><p>gênero é construída pela criança desde o seu na-</p><p>scimento, no seu contexto social e cultural. Sendo</p><p>assim, os profissionais da educação infantil devem</p><p>atentar-se para esta temática. De acordo com Sou-</p><p>za (2020): “Não podemos mais seguir ignorando a</p><p>existências das crianças e adolescentes LGBTI+ que</p><p>em tese também deveriam gozar das mesmas ga-</p><p>rantias legais determinadas na CF de 1988, em seu</p><p>Artigo 227 – ECA, Lei nº 8.069, de 13 de 1990”</p><p>Sendo assim, o acolhimento é um momento para a</p><p>Escola promover reflexões sobre o respeito à plural-</p><p>idade de corpos. A escola não pode ser apenas um</p><p>aparelho reprodutor de políticas excludentes do e</p><p>Estado. Conforme Farias (2015, p. 87), o acolhimen-</p><p>to na educação infantil e a relação família-escola</p><p>torna-se um dos pilares da relação família e escola:</p><p>O acolhimento na educação infantil é um dos pilares</p><p>para a construção de uma relação de parceria entre</p><p>família e escola, além de constituir-se como elemento</p><p>fundamental na rotina do trabalho pedagógico em dif-</p><p>erentes espaços e tempos na educação infantil (Farias,</p><p>2015, p. 87).</p><p>Crianças e adolescentes de todas as idades fazem</p><p>parte da população LGBTI+ é importante recon-</p><p>hecer que o que esses (as) sujeitos (as) necessitam</p><p>é de serem ouvidos, especialmente quando apre-</p><p>sentam sofrimento em relação ao corpo e às ex-</p><p>pectativas sociais, que, em muitos casos, se inicia</p><p>desde a educação infantil. É urgente que cresçam</p><p>com boas referências e que tenham oportunidade</p><p>para a formação de identidade, e que todos, todas</p><p>e todes se reconheçam nas práticas pedagógicas e</p><p>nas interações sociais que participam ao longo do</p><p>convívio escolar. Essa iniciativa deve ser uma de-</p><p>cisão coletiva da comunidade escolar e precisa es-</p><p>tar explícita no Projeto Político-Pedagógico (PPP),</p><p>conforme prevê resolução 01/2012 do Conselho</p><p>Nacional de Educação com a participação ativa e re-</p><p>flexiva de toda comunidade escolar, e indiscutivel-</p><p>mente dos docentes.</p><p>Desse modo, nesse sentido, Saito e Oliveira (2018)</p><p>afirmam que:</p><p>[...] há a necessidade de existir um compromisso do-</p><p>cente de refletir e se respaldar pedagogicamente nas</p><p>concepções críticas sobre o ‘ser’ criança, percebendo-a</p><p>como sujeito desejante, ativo, cognoscente, pertencen-</p><p>te a um grupo social e, portanto, um sujeito histórico.</p><p>[...] perceber a criança como um sujeito que tem suas</p><p>leituras de mundo, suas percepções de vida e que pre-</p><p>cisa ser mediada de forma coerente para que desen-</p><p>volva uma formação emancipada e autorreflexiva.</p><p>(Saito; Oliveira, 2018, p. 3)</p><p>Não há como construir e garantir esse compromisso</p><p>pedagógico</p><p>a “teoria queer”. Esta se de-</p><p>staca, sobretudo, por repensar as categorias de nor-</p><p>mal e de anormal, questionando sempre o modelo</p><p>heterossexista como o determinante das relações</p><p>humanas. Quanto maior o afastamento do padrão</p><p>tradicional de normalidade, maior será o preconceito</p><p>e a rejeição de alguém pela sociedade. O preconceito</p><p>contra os gays que destoam do padrão heterossexis-</p><p>ta ocorre também entre os próprios gays, que repro-</p><p>duzem em suas falas e condutas essas normas.</p><p>As escolas exercem grande influência na constitu-</p><p>ição moral dos indivíduos, repassando aos alunos</p><p>os valores vigentes. Praticamente todas as escolas</p><p>funcionam sob o clima ideológico do heterossexis-</p><p>mo. Constatamos tal realidade já nos conteúdos dos</p><p>materiais didáticos. A existência de casais fora do</p><p>padrão da heterossexualidade é praticamente ex-</p><p>cluída dos livros escolares, fomentando assim uma</p><p>valorização da heteronormatividade nas relações e</p><p>tornando o universo infantil afeito a tais determi-</p><p>nações (LOURO, 2000).</p><p>O ambiente hostil às diferenças sexuais força mui-</p><p>tos alunos tanto a esconderem seus afetos, quanto</p><p>a apontarem ou a negam em si mesmos o que lhes</p><p>é recusado pelos outros. Estar a salvo do implacável</p><p>riso alheio pode corresponder a consentir na dis-</p><p>criminação de outrem. Assim sendo, rir do outro</p><p>passa a ser também uma forma de defesa. O ambi-</p><p>ente educacional passa a ser então um ambiente de</p><p>medo, humilhação e coerção, onde as crianças re-</p><p>chaçam a anormalidade dos outros como forma de</p><p>disfarçar a sua própria anormalidade. Nesse caso,</p><p>o riso se faz uma arma, como escreve Bergson: “O</p><p>riso é, antes de tudo, um castigo. Feito para humil-</p><p>har, deve causar à vítima dele uma impressão peno-</p><p>sa” (BERGSON, 1983, p.92).</p><p>Ser viril é a exigência para que um garoto seja aceito e</p><p>respeitado no seu meio escolar. A escola torna-se um</p><p>palco onde ele expõe essa virilidade e assim ganha</p><p>admiração de todos. Em relação às meninas, as nor-</p><p>mas também são determinantes. Uma menina que</p><p>se comporta de forma a negar bonecas e a gostar de</p><p>futebol, por exemplo, logo é reprimida e estimulada</p><p>a se dedicar a brincadeiras tidas como femininas.</p><p>A escola é muitas vezes o local onde muito antes até</p><p>de saber sobre sexo a criança aprende o que deve</p><p>ser o feminino e o masculino. Meninos e meninas</p><p>são separados e, a partir daí, percebem o seu lugar</p><p>no mundo, com seu grupo e suas características. Ser</p><p>menino é algo diferente de ser menina. Dito de outro</p><p>modo, a diferença é uma das primeiras marcas que</p><p>aprendemos no processo escolar, quando, na ver-</p><p>dade, as crianças deveriam aprender que antes de</p><p>sermos meninas ou meninos somos seres humanos.</p><p>No discurso tradicional e homogeneizador a escola</p><p>deve garantir que suas crianças se tornem homens</p><p>e mulheres “verdadeiros”, ou seja, em conformi-</p><p>dade com as formas hegemônicas de masculini-</p><p>dade e de feminilidade (LOURO, 2000, p.49). Em</p><p>contraposição, o que novas propostas pedagógicas</p><p>evidenciam é que novas práticas escolares sejam</p><p>propostas para que a variedade de desejos e de</p><p>comportamentos sexuais seja incluída num mesmo</p><p>currículo, evitando assim a abjeção tão comum nas</p><p>escolas atuais. Em suma, a teoria queer apresen-</p><p>ta-se como essa proposta, como uma ferramenta</p><p>teórica e política de emancipação efetiva dos anor-</p><p>mais da sociedade da heteronormatividade.</p><p>No caso da pedagogia em específico, ela pode aju-</p><p>dar a moldar racionalidades e sensibilidades mais</p><p>tolerantes e mais inclinadas para a empatia. Nesse</p><p>sentido, a reflexão filosófica inserida nos currícu-</p><p>los das escolas poderia contribuir na aquisição de</p><p>maior autonomia para compreender e criticar sen-</p><p>tidos, conceitos e valores que possam sulear a práti-</p><p>ca das vivências singularizadas no mundo.</p><p>I S I M P Ó S I O D I V E R S I D A D E E R E S I S T Ê N C I A</p><p>B R A S Í L I A / D F 2 0 2 3</p><p>POR UMA TENTATIVA DE UMA PEDAGOGIA TRANSGRESSORA NA REALIDADE DO</p><p>COLEGIO ESTADUAL DR ROBERTO SANTOS/POÇÕES/BAHIA.</p><p>Ao trazer tais discussões, observa-se que o Colégio</p><p>Estadual Roberto Santos se tem um grande avanço</p><p>pedagógico a os se tratar das pedagogias trans-</p><p>gressoras, pois há diversas atividades que visam a</p><p>promoção de inclusão destes sujeitos sociais den-</p><p>tro da proposta pedagógica da escola. Porém, para</p><p>essa reflexão por ora iremos tratar apenas da imple-</p><p>mentação do Novo Ensino Médio Integral com as</p><p>Oficinas sobre a Estações do Saberes que adentram</p><p>no currículo como Itinerário Formativo, ou melhor,</p><p>parte diversificada. Como observar imagem 1.</p><p>Imagem 1¬ Matriz Curricular do Ensino Médio Tem-</p><p>po Integral, 2023.</p><p>Fonte: DCRB, 2023.</p><p>Dentro do tempo formativo integral cabe o profes-</p><p>sor, ou melhor, a equipo docente formar suas ofic-</p><p>inas pedagógicas, ou, escolher dentro do catálogo</p><p>da Documento Curricular Referencial da Bahia - Eta-</p><p>pa Ensino Médio2 . No caso do CERS, os professores</p><p>da área das Ciências Humanas durante a semana</p><p>pedagógica do ano de 2023 optou-se em montar</p><p>oficinas referente às necessidades dos debates,</p><p>sendo inseridos na pauta escolar. Nesse sentido, os</p><p>professores criaram as seguintes atividades: Gêne-</p><p>ro e Sexualidade na escola; Negros fazendo história;</p><p>Mulheres rendeiras; Quero um Conselho; Diásporas</p><p>africanas; Sou um Negão de tirar um chapéu, den-</p><p>tre outras oficinas pedagógicas ou Oficinas sobre as</p><p>Estações do Saberes.</p><p>Nesta mesma Semana Pedagógicas teve-se a oficina</p><p>sobre gênero sexualidade nas atividades escolares</p><p>para todos os professores de diversas áreas, então,</p><p>através da aplicação da oficina sobre gêneros e sexu-</p><p>alidades na jornada pedagógica do Colégio Estadual</p><p>Dr. Roberto Santos, do ano letivo de 2023, consta-</p><p>tou-se que em um universo de 40 professores, houve</p><p>a participação entorno de 86% do corpo docente.</p><p>Tratar de tema com este no espaço escolar é algo</p><p>muito delicado, pois ainda predomina concepções</p><p>intrinsicamente ligada ao conservadorismo. Vale</p><p>salientar que a proposta da oficina foi provocar o</p><p>questionamento destes conceitos tradicionais, pois,</p><p>esses corpos conservadores não é mais do que a re-</p><p>alidade da educação brasileira.</p><p>Durante a aplicação da oficina, percebemos que</p><p>houve uma boa adesão entre os participantes, pois</p><p>estavam presentes professores de diversas áreas</p><p>do conhecimento: Ciências Humanas, Matemática,</p><p>Linguagens e Ciências da Natureza. Nesse sentido,</p><p>o corpo docente demostrou inquietações sobre a</p><p>temática, pois não havia um conhecimento prévio</p><p>sobre gênero e sexualidade. Logo, ficou evidente o</p><p>quanto os docentes não sentiam perceptibilidade</p><p>sobre esses marcadores sociais que atravessam os</p><p>corpos dos alunos e alunas daquela instituição.</p><p>Nesse sentido, o corpo docente da referida escola</p><p>demostrou inquietações sobre a temática, pois não</p><p>havia um conhecimento prévio sobre gênero e sex-</p><p>ualidade. Logo, ficou evidente o quanto os docentes</p><p>não sentiam perceptibilidade sobre esses marca-</p><p>dores sociais que atravessam os corpos dos alunos</p><p>e alunas daquela instituição, como podemos obser-</p><p>var trecho de fala de um professor de Biologia:</p><p>2. Disponível em: http://dcrb.educacao.ba.gov.br/wp-content/uploads/2022/08/DCRB-09_08_22_COM-MATRIZES.pdf</p><p>[...] isso é importante a gente saber, pois, temos</p><p>um universo de alunos, sendo cada um com suas</p><p>particularidades, gostos e desgosto. E muitas das</p><p>vezes a gente assume o papel de professor con-</p><p>teudista e só que aplicar conteúdo e esquecemos</p><p>que aquele sujeito é muito mais que apenas alu-</p><p>no, pois tem anseios e dificuldades de se entend-</p><p>er. A gente sabendo o mínimo sobre a diversidade</p><p>podemos auxiliar nossos alunos sem agredi-los</p><p>(DEPOIMENTO DO PROFESSOR DE BIOLOGIA,</p><p>03/02/2023).</p><p>A observação do professor sobre a importância de</p><p>despertar discussões sobre a necessidade de uma</p><p>formação mais abrangente no corpo docente é cru-</p><p>cial. Durante o processo de formação acadêmica dos</p><p>professores, muitas vezes, questões emergentes da</p><p>sociedade não recebem a devida atenção, como re-</p><p>latado por muitos educadores. É fundamental lem-</p><p>brar que a função da escola vai além de simples-</p><p>mente</p><p>de professores (as) e gestores (as) edu-</p><p>cacionais sem que haja uma formação inicial pauta-</p><p>da nessa temática e uma formação continuada dos</p><p>(as) docentes, sempre. É no chão da escola que se</p><p>aprende todos os dias a necessidade de aprender e</p><p>apreender novamente.</p><p>Sendo assim é papel dos (as) docentes construírem</p><p>ações pedagógicas que contemplem a ação-re-</p><p>flexão-ação, como aponta a Professora Doutora</p><p>em Desenvolvimento, Sociedade e Cooperação</p><p>Internacional Urânia Cruz Freitas, em seu artigo</p><p>“Ação-reflexão-ação: trabalho, formação docente e</p><p>aprendizagens”, discorre sobre a importância dessa</p><p>ação-reflexão e ação para o efetivo compromisso</p><p>pedagógico, social e político do docente. Segundo</p><p>Freitas (2018):</p><p>Conhecer a teoria; refletir sobre a teoria e prática</p><p>para, novamente, agir com uma nova prática. Assim, a</p><p>aprendizagem é dialógica. Essa forma de abordagem</p><p>é indissociável do estudo focado nas problematizações</p><p>advindas da realidade do trabalho da escola e da so-</p><p>ciedade em que vivemos. A concepção metodológica</p><p>na tríade ação-reflexão- ação é de que todo o fazer</p><p>implica uma reflexão, e toda reflexão implica um fazer,</p><p>uma ação. Dentro disso, parte-se da articulação teóri-</p><p>co-prática para construir o conhecimento. Ou seja, o</p><p>primeiro movimento, antes explicitado de ação-reflex-</p><p>ão, junta-se agora a um segundo movimento: nova-</p><p>mente a ação, mas uma ação diferente da primeira,</p><p>como uma espiral do saber e sempre em processos de</p><p>avaliação dos avanços e/ou retrocessos na reflexão so-</p><p>bre a prática. (Freitas, 2018 )</p><p>A construção desse processo engloba não somente</p><p>a reflexão sobre a prática, mas o pensar das de-</p><p>cisões no cotidiano a serem tomadas pelos (as)</p><p>docentes e que irão refletir diretamente no proces-</p><p>so de aprendizagem das crianças. Na construção e</p><p>desconstrução de gênero na educação, aqui traze-</p><p>mos a educação infantil para a pesquisa. O fazer</p><p>pedagógico nos faz pensar a educação como me-</p><p>canismo de transformação social, como ação políti-</p><p>ca e de aprendizagem e nesse caso específico das</p><p>crianças LGBTQI+ devem ser também de grande</p><p>acolhimento, defesa de direitos e cuidado. Não se</p><p>pode desconsiderar as pluralidades de corpos, aqui</p><p>enfatizo a de gênero.</p><p>Observa-se que as justificativas sobre as diferenças</p><p>de gênero percebidas nas crianças são atribuídas</p><p>à influência da família e a reprodução de padrões</p><p>hegemônicos, supostamente uma determinação</p><p>biológica natural de gênero. Observa-se que en-</p><p>quanto a escola se abstém da responsabilidade em</p><p>relação às questões de gênero, evidenciando entre</p><p>outras necessidades, a precária formação que nós,</p><p>professores (as), tivemos para atuar no trato deste</p><p>tema com as crianças. Os (as) professores (as), em</p><p>sua maioria, tiveram uma formação com foco na</p><p>binaridade não estando aptos (as), por assim dizer</p><p>preparados (as) para a acolher toda a pluralidade de</p><p>corpos que uma criança traz. Essa é uma questão</p><p>que está em pauta nacional toda criança necessi-</p><p>ta ser acolhida, reconhecida e promovida para que</p><p>possa aprender e crescer segura de quem ela é.</p><p>FORMAÇÃO DE PROFESSORES COMO ESTRATÉGIA PARA TRANSFORMAÇÃO DA</p><p>PRÁTICA PEDAGÓGICA QUE VALORIZE A PLURALIDADE DE CORPOS DE GÊNERO</p><p>Uma formação inicial, continuada, adequada e</p><p>diária, no ambiente escolar e fora dele, é alicerce</p><p>para construir escolas inclusivas de fato, e profis-</p><p>sionais mais competentes, éticos e comprometidos</p><p>com educação libertadora, acolhedora e que valo-</p><p>rize toda a pluralidade de corpos humanos. A for-</p><p>mação de professores (as) é um termo muito amplo</p><p>e que pode se referir tanto à formação básica inicial</p><p>quanto à formação complementar ou continuada.</p><p>Para o educador Moacir Gadotti, “a educação é um</p><p>lugar onde toda a nossa sociedade se interroga a</p><p>respeito dela mesma – ela se debate e se busca”.</p><p>Então precisamos refletir sobre a importância da</p><p>escola na formação global humana tanto dos do-</p><p>centes como dos discentes. É necessário mais do</p><p>que afinidade com a educação para ser um bom do-</p><p>cente. É preciso conhecimento e disposição para se</p><p>construir e desconstruir, cotidianamente. Docentes</p><p>precisam desenvolver habilidades cognitivas, so-</p><p>ciais, emocionais e acima de tudo, humanas, que</p><p>o leve a implementar ações e respostas criativas,</p><p>acolhedoras e respeitosas às demandas do dia a dia</p><p>trazido pelas crianças.</p><p>Uma breve contextualização faz necessário aqui. No</p><p>período anterior, a delimitação proposta para este</p><p>estudo (2020-2023), tivemos retrocessos políticos</p><p>do Governo Federal eleito em 2018, com os ataques</p><p>à educação, sobretudo à educação que respeita a</p><p>criança como protagonista da sua aprendizagem.</p><p>I S I M P Ó S I O D I V E R S I D A D E E R E S I S T Ê N C I A</p><p>B R A S Í L I A / D F 2 0 2 3</p><p>Entre tantos ataques e retrocessos na educação</p><p>pública como um todo, com o intuito de precarizar</p><p>esse serviço essencial e vital para muitas famílias,</p><p>tendo aqui a educação como um meio de transfor-</p><p>mação social, não deixariam de tentar desqualificar</p><p>a vida e a obra de Paulo Freire, o patrono da edu-</p><p>cação brasileira. Assim para retomar uma educação</p><p>libertadora e emancipatória torna-se imprescindível</p><p>trazer para o centro do debate o legado freiriano: “É</p><p>fundamental diminuir a distância entre o que se diz</p><p>e o que se faz, de tal maneira que num dado mo-</p><p>mento a tua fala seja a tua prática (Freire, 2003, p.</p><p>61). O patrono da educação brasileira nos faz refle-</p><p>tir sobre a tomada de consciência e a importância</p><p>disso para transformação da sociedade. Para refletir</p><p>sobre a necessidade do docente pesquisador e em</p><p>constante formação Freire diz:</p><p>Educação não transforma o mundo. Educação muda</p><p>as pessoas. Pessoas transformam o mundo. Ensinar</p><p>não é transferir conhecimento, mas criar as possibili-</p><p>dades para a sua produção ou sua construção. Quem</p><p>ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina ao</p><p>aprender (Freire, 2023 )</p><p>Essa contribuição de fala nos traz a necessidade</p><p>de refletir sobre a coerência entre o que se realiza</p><p>praticamente e o que se fala. Assim, o docente deve</p><p>se colocar como um mediador que não fica só no</p><p>campo das ideias, mas sim que toma atitudes, em</p><p>ações concretas, não só individual, mas principal-</p><p>mente, junto à coletividade. Para que isso ocorra</p><p>efetivamente, precisamos pensar na formação con-</p><p>tinuada do docente usando principalmente, o es-</p><p>paço de coordenação pedagógica, que pode e deve</p><p>ser usada para esse fim.</p><p>Ao dizer isso, Paulo Freire nos convida a refletir so-</p><p>bre nossa postura enquanto docentes diante dos</p><p>saberes de experiência e dos saberes socialmente</p><p>e culturalmente construídos nas relações culturais</p><p>e históricas dos discentes. Outro pensador que traz</p><p>reflexões a respeito da importância dessa formação</p><p>é Gramsci que conceitua os intelectuais, como sen-</p><p>do não apenas aqueles tradicionalmente chamados</p><p>de intelectuais, mas também aquelas pessoas que</p><p>se acham no campo da produção, da cultura, da ad-</p><p>ministração pública e exercem funções de organi-</p><p>zação. Acredita ainda que “seria possível dizer que</p><p>todos os homens são intelectuais, mas nem todos</p><p>os homens têm na sociedade a função de intelec-</p><p>tuais” (Gramsci, 2000, p.18). O autor ainda defende</p><p>que o proletariado era protagonista consciente da</p><p>revolução. É nesse contexto que aparece o profes-</p><p>sor como intelectual dentro do contexto históri-</p><p>co-social da escola.</p><p>Para ele, o professor como intelectual deve discutir</p><p>com seus colegas as verdades únicas das coisas e</p><p>levá-los a contestar a própria verdade. Esse movi-</p><p>mento faz com que o professor reveja sua própria</p><p>maneira de ensinar, pois ao fazê-lo o professor es-</p><p>taria se constituindo enquanto sujeito. Assim, sen-</p><p>do o mais importante é construir a relação entre</p><p>professoras, professores e as crianças, ou seja, se</p><p>deveria pensar no como ensinar e não o que en-</p><p>sinar (Gramsci, 2000, p.18).</p><p>Esse movimento oportuniza à criança a possibili-</p><p>dade real por ela vivida para nela atuar, transformar,</p><p>se expressar, argumentar, ouvir e tomar consciência</p><p>da necessidade de compreender melhor a própria</p><p>vida.</p><p>Para propiciar essas possibilidades e precis-</p><p>amos entender que cada docente precisa buscar</p><p>boas formações para que assim tenha instrumentos</p><p>para mediar e desconstruir mitos e preconceitos,</p><p>tornando a escola mais atrativa, acolhedora e res-</p><p>peitando toda a pluralidade de corpos.</p><p>FORMAÇÃO CONTINUADA DOS DOCENTES NA COORDENAÇÃO PEDAGÓGICA</p><p>Investir na formação continuada de professores é</p><p>essencial para a construção de uma educação inclu-</p><p>siva, libertadora, laica, libertadora, emancipadora e</p><p>de qualidade. A Política Nacional de Formação de</p><p>Profissionais do Magistério da Educação Básica, at-</p><p>ravés do decreto nº 6.755, ampara a formação con-</p><p>tinuada quando estabelece sua função em seu art. 1:</p><p>“A finalidade de organizar, em regime de colabo-</p><p>ração entre a União, os Estados e o Distrito Federal,</p><p>os municípios a formação iniciada e continuada dos</p><p>professores do magistério para a rede pública da</p><p>Educação Básica.” (Brasil, 2009 p. 1). Placco e Silva</p><p>(2003) entende a formação como:</p><p>Processo complexo e multideterminado, que ganha ma-</p><p>terialidade em múltiplos espaços/atividades, não se re-</p><p>stringindo a cursos e/ou treinamentos, e que favorece</p><p>a apropriação de conhecimentos, estimula a busca de</p><p>outros saberes e introduz uma fecunda inquietação con-</p><p>tínua com o já conhecido, motivando viver a docência</p><p>em toda a sua imponderabilidade, surpresa, criação e</p><p>dialética com o novo (Placco; Silva, 2003, p. 26-27).</p><p>A coordenação pedagógica nas escolas públicas do</p><p>Distrito Federal é fruto de muita luta e uma con-</p><p>quista dos professores. Esse espaço de construção</p><p>do conhecimento deve ser utilizado em benefício</p><p>de uma educação de qualidade, mas até pouco</p><p>tempo não estava garantido no arcabouço jurídico</p><p>da educação pública do DF. A formação continua-</p><p>da centrada na escola possibilita compartilhar e</p><p>planejar momentos na escola com as crianças que</p><p>atenda às necessidades de educação inclusiva, acol-</p><p>hedora, respeitosa, emancipadora, inovadora e de</p><p>qualidade A formação continuada no espaço esco-</p><p>lar possibilita a sistematização da própria prática</p><p>pedagógica característica daquele contexto com re-</p><p>speito à identidade da escola.</p><p>É por meio dos encontros na coordenação ped-</p><p>agógica como espaço de formação continuada que</p><p>o professor poderá compreender os problemas do</p><p>cotidiano escolar, refleti-los e, assim, planejar práti-</p><p>cas educativas que visem o pleno desenvolvimento</p><p>da criança. Daí a importância desta formação ser</p><p>fundamentada e sistematizada no Projeto Político</p><p>Pedagógico (PPP).</p><p>A educação continuada faz parte do processo de</p><p>desenvolvimento pessoal e profissional dos tra-</p><p>balhadores. A formação centrada na escola visa</p><p>atender às necessidades de um grupo específico.</p><p>Para tanto é necessário definir os conteúdos, es-</p><p>tratégias, o propósito da formação com o objetivo de</p><p>transformar a ação do professor por meio da reflexão</p><p>ação reflexão (Freitas, 2018), das metodologias ati-</p><p>vas, da pesquisa do trabalho pedagógico e de novas</p><p>tecnologias. Para isso, faz-se necessário romper com</p><p>propostas de formação que apenas transmitem in-</p><p>formações, geralmente com foco nas dificuldades,</p><p>onde todos os participantes permanecem sentados</p><p>e ouvindo (Canário, 2003; Imbernón, 2010).</p><p>O conceito de formação continuada entrou em vig-</p><p>or no Brasil em 1996, com a implementação da Lei</p><p>de Diretrizes e Bases da Educação (Lei nº 9.394, de</p><p>20 de dezembro de 1996). Destaco o que a LDB traz</p><p>em seu artigo:</p><p>Art. 13 A Formação Continuada em Serviço deve ofere-</p><p>cer aos docentes a oportunidade de aprender, junto</p><p>com seus colegas de trabalho, com suporte de um for-</p><p>mador experiente (mentoria ou tutoria), compartilhan-</p><p>do aprendizagens já desenvolvidas (Brasil, 1996).</p><p>Atendendo ao disposto no Parágrafo único do artigo</p><p>61 da LDB:</p><p>A formação continuada tem o objetivo de gerar trans-</p><p>formações nos contextos profissional e escolar do ed-</p><p>ucador. Para que os docentes consigam acompanhar</p><p>o ritmo das transformações e da aprendizagem dos</p><p>estudantes, é essencial ter um momento de renovação</p><p>de conhecimentos e reflexão sobre práticas pedagógi-</p><p>cas (Brasil, 1996).</p><p>O coordenador pedagógico exerce o papel de artic-</p><p>ulador nesse processo de formação. Mas, para que</p><p>possa mediar e contribuir deve reconhecer que “a</p><p>sabedoria do grupo lhe dá sustentação – e que deve</p><p>confiar nela; aprender que o grupo tem respostas e</p><p>recursos, mas espera sua liderança pedagógica para</p><p>articular seus saberes e seus esforços.” (Almeida;</p><p>Placco, 2018, p. 33).</p><p>Reconhece-se que a escola como espaço privilegiado</p><p>na formação de seus profissionais, tornando-se um</p><p>local no qual os saberes podem ser produzidos e par-</p><p>tilhados, num processo formativo permanente e inte-</p><p>grado à prática docente (Nóvoa, 1995). As discussões</p><p>sobre os saberes docentes, sobre a necessidade de</p><p>desenvolver uma postura reflexiva sobre a prática,</p><p>a fim de transformá-la, quando julgado necessário,</p><p>serviram para salientar a necessidade de dar voz aos</p><p>professores, reconhecendo-os como sujeitos de sua</p><p>própria formação e portadores de um saber-fazer con-</p><p>struído na docência. Nesse sentido, defendem que:</p><p>Torna-se necessário pensar em percursos de for-</p><p>mação nos quais as decisões sejam realmente par-</p><p>tilhadas e o controle das ações não esteja nas mãos</p><p>de universidades e secretarias de educação, mas</p><p>nos quais as escolas e professores participem das</p><p>decisões, tornando-se protagonistas de sua própria</p><p>formação. (Ambrosetti; Ribeiro, 2005, p. 4)</p><p>Nessa perspectiva, os processos formativos precisam</p><p>se constituir como momentos de diálogos em que</p><p>formadores e docentes em formação se percebam</p><p>como parceiros possuidores de conhecimentos e sa-</p><p>beres. Na perspectiva de Santos (2002), tendo essa</p><p>percepção, não é possível aceitar programas que se</p><p>sustentam sem instaurar uma reflexão coletiva sobre</p><p>o seu planejamento, desenvolvimento e avaliação</p><p>I S I M P Ó S I O D I V E R S I D A D E E R E S I S T Ê N C I A</p><p>B R A S Í L I A / D F 2 0 2 3</p><p>com os docentes participantes. Considerando que se</p><p>o interesse é formar um ser multidimensional, com</p><p>identidade, histórias, desejos, necessidades, sonhos</p><p>para democratizar a cultura e desenvolver indivídu-</p><p>os autônomos em sociedades mais justas e plurais,</p><p>os programas não podem estruturar-se de forma</p><p>a negar essa finalidade. Dessa maneira, torna-se</p><p>necessário romper com os modelos padronizados de</p><p>formação, caracterizado pela fragmentação, o aligei-</p><p>ramento, por uma preocupação apenas de ordem in-</p><p>strumental e que não valoriza o saber docente.</p><p>Faz-se necessário utilizar esse espaço para refletir,</p><p>dialogar, atualizar sobre a pluralidade de corpos, pois</p><p>a escola deve ser um espaço de convivência com a</p><p>pluralidade de corpos. Em uma sociedade cada dia</p><p>mais plural, nós profissionais da educação devemos</p><p>procurar formação continuada que nos ajude a ter</p><p>um olhar mais sensível e acolhedor que também nos</p><p>auxilia a desconstruir equívocos e visões preconcei-</p><p>tuosas relativos à identidade de gênero, orientação</p><p>sexual, raça, etnia, religião, inclusão e outros.</p><p>A Secretaria de Estado de Educação do Distrito Fed-</p><p>eral, conta ainda com EAPE, fundada em agosto de</p><p>1.986, tendo como função promover a formação</p><p>continuada dos profissionais da Educação em con-</p><p>sonância com as demandas da Rede Pública de Ensi-</p><p>no do DF, contribuindo para a educação de qualidade</p><p>social e a valorização profissional dos professores. No</p><p>entanto, cabe à categoria dos profissionais da Edu-</p><p>cação instaurar um processo de reflexão coletiva so-</p><p>bre seu planejamento, desenvolvimento e avaliação</p><p>de formadores e profissionais da educação cursistas.</p><p>Em se tratando do centro de Educação Infantil, esco-</p><p>la qual pesquiso, a Lei nº 9.394 de 20 de dezembro</p><p>de 1996 (LDB), estabelece QUE:</p><p>Art. 29. A educação infantil, primeira etapa da educação</p><p>básica, tem como finalidade o desenvolvimento integral</p><p>da criança até seis anos de idade, em seus aspectos</p><p>físico, psicológico, intelectual e social, completando</p><p>a ação da família e da comunidade. Nessa etapa da</p><p>educação</p><p>integra-se o educar e o cuidar e para que a</p><p>criança tenha seu desenvolvimento integral garantido</p><p>é preciso que foque em como contribuir positivamente</p><p>na formação de pessoas críticas e conscientes desde os</p><p>primeiros anos de escolaridade. A escola recebeu da so-</p><p>ciedade conhecimentos, convicções e valores, e em meio</p><p>a tantos debates sobre as relações de gênero é papel</p><p>da escola tratar essa temática acolhendo, valorizando</p><p>e respeitando as pluralidade de corposs, promovendo a</p><p>igualdade de todos, o respeito e o combate a qualquer</p><p>tipo de preconceito. Só assim teremos uma sociedade</p><p>mais igualitária e menos excludente.</p><p>PERCEPÇÃO DOS PROFESSORES DA EDUCAÇÃO INFANTIL SOBRE A PLURALIDADE</p><p>DE CORPOS DE GÊNERO</p><p>O Centro de Educação Infantil 01 do Paranoá é a única</p><p>Instituição de Ensino da Rede Pública que atende exclu-</p><p>sivamente a Educação Infantil e Educação Precoce no</p><p>Paranoá. A nossa comunidade escolar é formada pela</p><p>população do Paranoá, Itapoã, Paranoá Parque, con-</p><p>domínios e zona rural, população esta, que apresenta</p><p>um número de aproximadamente 126.463 habitantes.</p><p>O Centro de Educação Infantil 01 do Paranoá foi</p><p>autorizado a funcionar no início do ano letivo de</p><p>1999. Com planta estrutural elaborada com insta-</p><p>lações físicas para atender a modalidade creche e</p><p>educação infantil, a escola foi instalada à Quadra 16</p><p>conjunto E lote 01, Paranoá, Distrito Federal.</p><p>Iniciando suas atividades em fevereiro de 1999, a es-</p><p>cola oferecia apenas a Educação Infantil (cinco e seis</p><p>anos, ou seja, 2º e 3º Períodos, respectivamente) e</p><p>a então Educação Precoce, destinado a atendimen-</p><p>to educacional especializado às crianças de zero a</p><p>três anos e 11 meses, em dois turnos: matutino e</p><p>vespertino. No ano de 2007 com a mudança do En-</p><p>sino Fundamental para nove anos, a escola atendeu</p><p>crianças de quatro e cinco anos na Educação Infantil</p><p>(1º e 2º Períodos) e Educação Precoce.</p><p>Em 2016 a escola passou por reformas alterando</p><p>sua estrutura física para aumentar a quantidade de</p><p>vagas. Atualmente estão matriculados aproximada-</p><p>mente 523 (quinhentos e vinte e três) alunos no En-</p><p>sino Regular e 136 (cento e trinta e seis) estudantes</p><p>da Educação Precoce e Classe Especial. O CEI 01</p><p>do Paranoá possui hoje, 95 (noventa e cinco) tra-</p><p>balhadores divididos em equipe gestora (que não foi</p><p>eleita por gestão democrática), corpo docente, auxil-</p><p>iares administrativos, agente de portaria, monitores,</p><p>terceirizados e educadores sociais voluntários.</p><p>Para a pesquisa foi elaborada uma entrevista semi-</p><p>estruturada ao iniciar com a fase de pré-análise, as</p><p>perguntas foram organizadas previamente, sendo</p><p>agrupadas, com o intuito de encontrar similari-</p><p>dades. Após esse agrupamento, foi realizada a lei-</p><p>tura flutuante de todos os dados, ou seja, as entrev-</p><p>istas e as observações. Para Bardin (2005), por meio</p><p>da leitura flutuante, o texto torna-se mais claro e</p><p>o leitor deixa-se invadir pelas palavras, até que al-</p><p>gumas impressões saltam-lhe aos olhos - Como os</p><p>professores do Centro de Educação Infantil 01 do</p><p>Paranoá percebem a sua formação inicial quanto</p><p>ao acolhimento da pluralidade de corpos de gênero</p><p>na educação infantil ?- Como os professores per-</p><p>cebem a sua formação continuada na coordenação</p><p>pedagógica da escola em relação ao acolhimento</p><p>da pluralidade de corpos e de gênero na infância?-</p><p>Como se articula a formação continuada na coor-</p><p>denação pedagógica da escola com o trabalho do-</p><p>cente quanto ao respeito à pluralidade de corpos</p><p>de gênero?- Qual a diferença os professores sentem</p><p>em relação aos estudantes quando são acolhidos</p><p>com respeito à pluralidade de corpos de gênero na</p><p>escola? As questões foram feitas num universo de 3</p><p>professores da educação infantil.</p><p>Ao analisar as respostas das entrevistadas sobre a</p><p>contribuição do projeto para a formação docente</p><p>percebe-se uma forte ligação entre as respostas em</p><p>relação à falta dessa temática para a qualificação</p><p>inicial da prática pedagógica e o entendimento que</p><p>o professor precisa continuar se formando sempre,</p><p>uma angústia por essa necessidade.</p><p>[...] Eh sendo bem sincera na minha formação inicial mes-</p><p>mo e aí eu vou remeter aqui ao antigo magistério a nível</p><p>médio nem sequer foi abordado esse tema sobre plurali-</p><p>dade de corpos de gênero, acolhimento. (Professor 1).</p><p>[...]Então eu estou até reflexiva ao ouvir essa pergun-</p><p>ta porque eu fiquei pensando nossa será que há vinte</p><p>anos atrás não se falava de pluralidade de corpos de</p><p>gênero, entendeu? É esse o meu mau questionamen-</p><p>to então na minha formação inicial não tive sequer</p><p>noção dessa temática pluralidade de corpos de gênero</p><p>É esse o meu maior questionamento… então na minha</p><p>formação inicial não tive sequer noção dessa temática</p><p>pluralidade de corpos de gênero? (Professor 2).</p><p>[...] Sinceramente, em minha formação inicial (Pedago-</p><p>gia), não tive acesso a essa abordagem, a não ser por</p><p>pequenas referências presentes na LDB. (Professor 3).</p><p>As narrativas dos professores que participaram</p><p>da pesquisa demonstram que a formação inicial e</p><p>continuada não proporcionou nem contribuiu para</p><p>acrescentar ferramentas de melhoria do trabalho</p><p>docente em relação a essa temática, mesmo sendo</p><p>lei e estando no currículo em movimento da SEEDF.</p><p>Em seus relatos, apontam, ainda, a necessidade de</p><p>abordar a pluralidade de corpos de gênero na for-</p><p>mação continuada.</p><p>Sobre a percepção dos professores em relação aos</p><p>formação continuada na coordenação pedagógica</p><p>da escola, vivências, os professores apresentaram</p><p>as seguintes respostas</p><p>[...] A pluralidade de corpos de gênero, apesar de</p><p>sua importância, ainda não foi apresentada a fundo</p><p>em nossa instituição de ensino, nem mesmo nas for-</p><p>mações continuadas realizadas em momentos de co-</p><p>ordenação pedagógica (Professor 1).</p><p>[...] Essa articulação com a coordenação pedagógica</p><p>da escola com o trabalho docente quanto ao respeito</p><p>à pluralidade de corpos de gênero Eh eu não vou men-</p><p>tir pra você não. Eu também me sinto lá em dois mil.</p><p>Sabe? No meu magistério, na minha formação inicial.</p><p>Eu acho que é uma temática que ainda não é tão abor-</p><p>dada na educação infantil, na nossa sala de profes-</p><p>sores mesmo, sala e que os colegas até diria que evita.</p><p>(Professor 2).</p><p>[...] Eh desafiador. Então por ser uma temática tam-</p><p>bém desafiadora hoje em pleno século vinte e um, dois</p><p>mil e vinte e três, vinte após minha formação inicial</p><p>eu continuo fazendo a leitura de que a ainda é uma</p><p>temática que falamos pouco e até sabemos pouco não</p><p>vou mentir pra não, até sabemos pouco. Principal-</p><p>mente quem está na educação infantil externalizada,</p><p>entendeu visível. Já na educação infantil acredito que</p><p>tem que ter uma sensibilidade muito grande para li-</p><p>dar com esse acolhimento da pluralidade de corpos de</p><p>gênero. Então eh estamos buscando, acho que é uma</p><p>busca constante e que a gente ainda está muito longe</p><p>do ideal. Professor 3).</p><p>A construção da identidade de gênero é um pro-</p><p>cesso social e respeitá-lo, acolher tem importância</p><p>fundamental para o desenvolvimento das crianças,</p><p>pois determina interesses, atitudes e comporta-</p><p>mentos que o acompanharão ao longo de toda vida.</p><p>Pessoas com identidade e orientação “fora do pa-</p><p>drão” hetero cis normativo desfrutaram os piores</p><p>momentos de suas vidas na escola, onde prevalece</p><p>um espaço de discriminação e preconceito, deve-</p><p>mos ser um espaço de amor e acolhimento. A com-</p><p>plexidade do conhecimento associada à realidade</p><p>sobre a pluralidade de corpos de gênero embasa</p><p>I S I M P Ó S I O D I V E R S I D A D E E R E S I S T Ê N C I A</p><p>B R A S Í L I A / D F 2 0 2 3</p><p>um dos alicerces para uma educação acolhedora,</p><p>que promova aplicabilidade na íntegra que significa</p><p>a palavra respeito. Para tanto é necessário investir</p><p>na formação docente inicial e continuada. A falta, a</p><p>complexidade e pluralidade de corpos de estudos</p><p>sobre gênero vive assombrada pelo desconheci-</p><p>mento, preconceito, interesses político-partidários</p><p>e crenças religiosas que querem se sobrepor aos</p><p>direitos humanos, o que nos faz refletir sobre as</p><p>contribuições científicas para contrapor</p><p>a heter-</p><p>onormatividade. O (des) conhecimento prévio dos</p><p>docentes sobre o tema, a ausência de informações</p><p>se mostra numa escola cheia de casos de evasão e</p><p>exclusão escolar por homofobia.</p><p>Porém existem setores da sociedade que fizeram essa</p><p>reflexão assim sendo capazes de alterar inclusive a BNCC.</p><p>A Base Nacional Curricular Comum apresenta na</p><p>Educação Infantil direitos de aprendizagem e desen-</p><p>volvimento embasada nos parâmetros das Diretrizes</p><p>Curriculares Nacionais (2010) procura; “Consolidar</p><p>as conquistas das Diretrizes, enfocando direitos fun-</p><p>damentais de aprendizagem e desenvolvimento, ten-</p><p>do em vista a equidade entre as crianças brasileiras e</p><p>a garantia de direito à cidadania” (Brasil, 2016, p. 58).</p><p>A BCNN reafirma os direitos estabelecidos para as</p><p>crianças nos espaços de Educação Infantil, respeit-</p><p>ando a concepção de educar e cuidar na integral-</p><p>idade da criança. É a brincadeira e a interação na</p><p>Educação Infantil, que permitem à criança construir</p><p>a capacidade de conviver, de estar junto, de com-</p><p>partilhar, de lidar com os conflitos e as diferenças e</p><p>semelhanças, de dialogar e participar. Acreditando</p><p>que é nesse partilhar que as crianças aprendem a</p><p>produzir e reproduzir costumes, valores e modos de</p><p>vida da sociedade, e assim os estereótipos sociais</p><p>na configuração da relação entre meninas e meni-</p><p>nos são configurados, entre as crianças e entre as</p><p>crianças com os adultos.</p><p>Assim a BNCC diz que na Educação Infantil a criança</p><p>precisa aprender a “Conviver com crianças e adultos</p><p>em pequenos e grandes grupos, reconhecer e respeit-</p><p>ar as diferentes identidades e pertencimento étnico-</p><p>racial, de gênero e de religião” (Brasil, 2016, p. 69).</p><p>Em relação a articulação da formação continuada</p><p>na coordenação pedagógica da escola observou-se:</p><p>[...] Ainda não houve essa articulação. Mas é urgen-</p><p>te, seja pluralidade de corpos racial, seja pluralidade</p><p>de corpos de gênero, seja pluralidade de corpos das</p><p>famílias, qualquer tipo de pluralidade de corpos que</p><p>nos leva a ampliar nossa lente, nossa visão é desafia-</p><p>dora, porque ela vai nos mostrar que não existe um ou</p><p>dois existem vários não existe um ou dois modos pro</p><p>diverso né? (Professor 1).</p><p>[...] Na escola com o trabalho docente quanto ao res-</p><p>peito à pluralidade de corpos de gênero Eh eu não vou</p><p>mentir pra você não. Eu também me sinto lá em dois</p><p>mil. Sabe? (Professor 2).</p><p>[...] Os professores não discutem de forma clara e ob-</p><p>jetiva, pois, a complexidade do assunto, pluralidade de</p><p>corpos de gênero não é visto no CEI 01 como, um ponto</p><p>de chegada, acolhimento, aceitação e acima de tudo</p><p>respeito (Professor 3).</p><p>Os profissionais de educação demonstram precisar</p><p>vivenciar nesses momentos de coordenação na es-</p><p>cola formação continuada sobre pluralidade de cor-</p><p>pos de gênero, Ilma. Passos Veiga diz, no PPP, “que</p><p>não importa o ponto de partida, o que importa é o</p><p>ponto de chegada”. O ambiente escolar.</p><p>Também se percebe que a equipe gestora da esco-</p><p>la não tem articulado momentos de diálogos sobre</p><p>pluralidade de corpos de gênero como forma do</p><p>aluno ser um indivíduo, com iguais liberdades, dire-</p><p>itos e oportunidades na vida e na sociedade. Freire</p><p>(1996, p. 39) ressalta que: “[...] na formação per-</p><p>manente dos professores, o momento fundamental</p><p>é o da reflexão crítica sobre a prática. É pensando</p><p>criticamente a prática de hoje ou de ontem que se</p><p>pode melhorar a próxima prática”.</p><p>O patrono da educação brasileira também nos</p><p>traz a seguinte reflexão: “[...] por isso é que na for-</p><p>mação permanente dos professores, o momento</p><p>fundamental é o da reflexão crítica sobre a prática”</p><p>(Freire, 2001 p. 43).</p><p>Ao refletir esses fragmentos é possível dizer que</p><p>para Freire, a reflexão é o movimento realizado en-</p><p>tre o fazer e o pensar, entre o pensar e o fazer, ou</p><p>seja, no “pensar para o fazer” e no “pensar sobre</p><p>o fazer”. Assim vamos trazer a reflexão como parte</p><p>de curiosidade sobre a prática docente. O exercício</p><p>constante da curiosidade vai se transformando em</p><p>crítica. E reflexão crítica permanente deve constitu-</p><p>ir-se como orientação prioritária para a formação</p><p>continuada dos professores que buscam a transfor-</p><p>mação através de sua prática educativa.</p><p>Quanto a questão professores sentirem diferenças</p><p>quando estudantes são acolhidos com respeito à</p><p>pluralidade de corpos de gênero a percepção dos</p><p>professores apresentaram as seguintes respostas;</p><p>[...] Até o momento, ainda não nos deparamos com</p><p>uma situação assim na escola, mas caso aconteça,</p><p>acredito que acolher e respeitar são a base para pro-</p><p>mover uma educação com equidade (Professor 1).</p><p>[...] Quando se tem diálogo em tempos, espaços e</p><p>oportunidades pela busca ativa da transformação</p><p>social, é notório que esses alunos tornam o ambiente</p><p>mais tranquilo, situações que não são vivenciadas no</p><p>dia a dia dos professores do CEI 01 do Paranoá. (Pro-</p><p>fessor 2).</p><p>[...] Pensando num todo eu tenho certeza que quando</p><p>esse estudante é acolhido essa é com respeito a essa</p><p>pluralidade de corpos de gênero na escola com certeza</p><p>ele vai se sentir bem, porque ele vai se sentir respeit-</p><p>ado, valorizado e não estamos falando mais de favor,</p><p>né? Márcia, a gente tá falando de lei. Nós estamos</p><p>falando de direitos, então nós estamos falando de su-</p><p>jeitos de direito e nós estamos falando de um espaço</p><p>que a escola quer de garantir direitos, é de proteção</p><p>integral. Então esse é o acolher essa pluralidade de</p><p>corpos, seja ela de gênero, seja ela racial, seja ela da</p><p>pluralidade de corpos dos tipos de famílias que temos</p><p>hoje em qualquer pluralidade de corpos que a escola</p><p>é múltipla e que bom que é toda e nós sabemos que</p><p>quando acolhida essa pluralidade de corpos a gente</p><p>não busca os padrões na caixinha o tornar todo mundo</p><p>igual né? (Professor 3).</p><p>Considerando que a escola é um espaço de um per-</p><p>manente pensar de modo reflexivo e reinventado.</p><p>Para que esse processo aconteça é preciso que exis-</p><p>tam condições que o viabilizem. Para Oliveira:</p><p>[...] A prática reflexiva é adquirida desde a formação</p><p>inicial, torna-se parte da identidade profissional do</p><p>professor. Assim, o processo reflexivo entendido como</p><p>característica do fazer docente, logo se aproxima mes-</p><p>mo da identidade profissional. O que demonstra seu</p><p>caráter dinâmico dentro de um tempo específico, mas</p><p>não linear ou unilateral” (Oliveira, 2006, p. 10).</p><p>O papel do professor torna-se cada vez mais desa-</p><p>fiador. E na Educação Infantil, as relações de gênero</p><p>e o gênero devem fazer parte das discussões num</p><p>sentido de desnaturalizar as crenças e funções des-</p><p>tinadas aos homens e mulheres, desmistificando</p><p>papéis e lugares sociais. As identidades, múltiplas</p><p>e inacabadas, devem ser uma forma privilegiada de</p><p>questionar valores e preconceitos.</p><p>CONSIDERAÇÕES FINAIS</p><p>A pesquisa evidencia que a escola é um espaço</p><p>rico para refletir sobre a pluralidade de corpos de</p><p>gênero. Por outro lado, revela que para falarmos de</p><p>pluralidade de corpos de gênero há de se construir</p><p>novas perspectivas educacionais no que concerne</p><p>à educação infantil, uma vez que os professores,</p><p>em sua maioria, se mostraram sem dialogar ou sem</p><p>pesquisar sobre o assunto.</p><p>Algumas ações podem contribuir para o debate da</p><p>igualdade de gênero na escola. Tendo como principal</p><p>marca a velocidade das mudanças, o século XXI colo-</p><p>ca a escola diante de um grande desafio: repensar a</p><p>forma de ensinar e de se relacionar com crianças e a</p><p>pluralidade de corpos. A escola, por ser um espaço</p><p>público e democrático, precisa acolher as diferenças.</p><p>É certo que vamos receber, no espaço escolar, uma</p><p>pluralidade de corpos enormes de crianças e isso</p><p>é que enriquece e torna lindo o mundo. O espaço</p><p>da Educação Infantil apresenta um campo de nor-</p><p>matização da infância onde são impostos, através</p><p>de símbolos e códigos padrões sociais que cada su-</p><p>jeito deve seguir. É um processo de diferenciação</p><p>que leva a desvalorização de características plurais,</p><p>debater esse tema é um passo para repensarmos</p><p>as diversas situações de ensino, o discurso educa-</p><p>cional tradicional que</p><p>desvaloriza e menospreza a</p><p>pluralidade de corpos humanos.</p><p>Por fim, desenvolver esse projeto mostrou-nos um</p><p>possível caminho de acolhimento à pluralidade de</p><p>corpos de gênero, assentado na emergência de</p><p>propostas pedagógicas que busquem mediações</p><p>possíveis entre as novas perspectivas acerca do</p><p>tema gênero na educação infantil. Sinalizando, as-</p><p>sim, uma educação que possa realmente contribuir</p><p>para a construção de uma sociedade mais ética e</p><p>tolerante às diferenças.</p><p>I S I M P Ó S I O D I V E R S I D A D E E R E S I S T Ê N C I A</p><p>B R A S Í L I A / D F 2 0 2 3</p><p>REFERÊNCIAS</p><p>ALMEIDA, L. R.; PLACCO, V. M. N. S. O papel do Coordenador</p><p>Pedagógico. Revista Educação, São Paulo, ano 12, n. 142, p.</p><p>38-39, fev. 2009.</p><p>AMBROSSETI, N. B.; RIBEIRO, M. T. de M. Universidades e For-</p><p>mação Continuada de professores: algumas reflexões. In: RE-</p><p>UNIÃO ANUAL DA ANPED, 28., 2005, Caxambu/MG. Anais [...].</p><p>BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição [da] Repúbli-</p><p>ca Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. Di-</p><p>sponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/consti-</p><p>tuicao/constituicaocompilado.htm. Acesso em: 10 fev. 2023.</p><p>BRASIL. Decreto nº 6.755, de 29 de janeiro de 2009. Institui a</p><p>Política Nacional de Formação de Profissionais do Magistério</p><p>da Educação Básica, disciplina a atuação da Coordenação de</p><p>Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior -CAPES no fo-</p><p>mento a programas de formação inicial e continuada, e dá</p><p>outras providências. Diário Oficial da União: seção 1. Brasília,</p><p>DF, p. 1, 30 jan. 2009. Disponível em: https://www.planalto.</p><p>gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/decreto/d6755.htm</p><p>Acesso em: 7 abr. 2023.</p><p>BRASIL. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o</p><p>Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providên-</p><p>cias. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, p. 13563,</p><p>16 jul. 1990. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/cciv-</p><p>il_03/leis/l8069.htm. Acesso em: 7 abr. 2023.</p><p>BRASIL. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Lei de Dire-</p><p>trizes e Bases da Educação Nacional. Estabelece as diretrizes</p><p>e bases da educação nacional. Diário Oficial da União: seção</p><p>1, Brasília, p. 27833, 23 dez. 1996. Disponível em: https://</p><p>www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9394.htm. Acesso em:</p><p>15 maio 2023</p><p>BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Cur-</p><p>ricular. Brasília, DF: MEC, 2016.</p><p>BRASIL. Secretaria de Educação Básica. Diretrizes Curriculares</p><p>Nacionais para a Educação Infantil. Brasília: MEC/ SEB, 2010.</p><p>BUTLER, J. Problemas de gênero: feminismo e subversão da</p><p>identidade. Tradução de Renato Aguiar. Rio de Janeiro, Civili-</p><p>zação Brasileira, 2018.</p><p>FARIAS. F. da C. Pode entrar a casa é sua! O acolhimento na</p><p>Educação Infantil e a relação família- escola. In: EDITORA POIS-</p><p>SON. Série Educar – v. 5: Educação Especial e Inclusiva. Belo</p><p>Horizonte, MG: Poisson, 2020. p. 80-87.</p><p>GADOTTI, M.; ROMAO, J. E. Paulo Freire e Amilcar Cabral: a</p><p>descolonização das mentes. São Paulo: Instituto Paulo Freire,</p><p>2012.</p><p>LOURO, G. L. (org.). O corpo educado: pedagogia da sexuali-</p><p>dade. Petrópolis. Editora Vozes, 2003.</p><p>LOURO, G. L. Gênero e sexualidade: pedagogias contem-</p><p>porâneas. Revista Pró-Posições, v. 19, n. 2(56), p. 17-23,</p><p>maio/ago. 2008.</p><p>MACHADO, M. L.de A. Desafios iminentes para projetos de</p><p>formação de profissionais para educação infantil. Cadernos</p><p>de Pesquisa, n. 110, p. 191-202, jul./2000.</p><p>PLACCO, V. M. N. S.; SOUZA, V. L. T. O trabalho do coordenador</p><p>pedagógico na visão de professores e diretores: Contribuições</p><p>à compreensão de sua identidade profissional. In: PLACCO, V.</p><p>M. N. S.; ALMEIDA, L. R. O Coordenador Pedagógico: provo-</p><p>cações e possibilidades de atuação. São Paulo: Edições Loyola,</p><p>2012. p. 09-20.</p><p>SAITO, H. T. I.; LUCAS, M. A. O. F.; MIRANDA, M. J. C.; CHI-</p><p>CARELLE, R. J. O lugar das interações das crianças e do brin-</p><p>car na educação infantil: contribuições da pesquisa para a</p><p>prática educativa. In: EVENTO DO CONGRESSO PAULISTA DE</p><p>EDUCAÇÃO INFANTIL E III SIMPÓSIO DE EDUCAÇÃO INFANTIL,</p><p>Anais [...]. São Carlos, SP, Brasil, 7, 3. 2015.</p><p>SOUZA, J. F. Gênero e sexualidade nas pedagogias Culturais:</p><p>implicações para a Educação infantil. In: REUNIÃO ANUAL DA</p><p>ANPEd, 22., 1999, Caxambu, MG. Anais [...]. ANPEd, 1999. Di-</p><p>sponível em: Acesso em: 23 ago. 2023.</p><p>SOUZA, L. D’Arc. Crianças e adolescentes trans e LGBTI+ ex-</p><p>istem. A escola sabe? In: MACIEL, C.; DUARTE, N.; SIQUEIRA,</p><p>R. (org.). Políticas educacionais: Resistência e retomada da</p><p>democracia e do Estado. Brasília, DF: Anpae, 2023. (no prelo).</p><p>Graduado em História e Geografia (UNICeub). Especialista em</p><p>Educação Ambiental; Direitos Humanos e Cidadania, Patrimônio,</p><p>Direitos Culturais e Cidadania e História e Cultura Afro Brasileira e</p><p>Africana; Garantia dos Direitos e Política de Cuidados à Criança e ao</p><p>Adolescente e Educação Básica e Direitos Humanos na Perspectiva</p><p>Internacional. É militante dos Direitos Humanos; Condecorado com</p><p>o Prêmio Religare por sua luta contra a Violência Religiosa a Casas</p><p>de Matriz Africana, em 2017, pela Policia Civil do DF - PC-DF. Autor</p><p>do Livro: “FELIZ POR APRENDER ENSINANDO...” Uma Coletânea</p><p>Acadêmica. (no prelo)</p><p>MARCUS MACIEL</p><p>“O PAJUBÁ ME ACUENDOU</p><p>DA ESCOLA” – REFLEXÕES</p><p>SOBRE A EXCLUSÃO</p><p>ESCOLAR E ÊXITO DE</p><p>ESTUDANTES TRANS E</p><p>TRAVESTIS</p><p>I S I M P Ó S I O D I V E R S I D A D E E R E S I S T Ê N C I A</p><p>B R A S Í L I A / D F 2 0 2 3</p><p>“O PAJUBÁ ME ACUENDOU DA ESCOLA” – REFLEXÕES</p><p>SOBRE A EXCLUSÃO ESCOLAR E ÊXITO DE ESTUDANTES</p><p>TRANS E TRAVESTIS</p><p>Autoria:</p><p>Marcus Maciel</p><p>A PESQUISA E A EXTENSÃO OU RELATOS DE EXPERIÊNCIA COMO AÇÕES DE COMBATE</p><p>À LGBTFOBIA E/OU DE FORTALECIMENTO DA IDENTIDADE DE PESSOAS LGBTQIAPN+.</p><p>RESUMO</p><p>O artigo foi adaptado do TCC da Especialização em</p><p>Educação Básica, Direitos Humanos com Ênfase</p><p>do SINPRO-DF e UnB, orientado pelo professor</p><p>Léo Café traz para a academia as violências e</p><p>resistências exitosas de Travestis, Transexuais e</p><p>Transgêneros que, por uma série de motivos e</p><p>preconceitos de cunho ideológico e/ou dogmas</p><p>das religiões hebraico cristãs são</p><p>abandonados pelas políticas públicas e acabam</p><p>evadidos/expulsos da escola, e não se beneficiam</p><p>do direito à educação, conforme garante a Carta</p><p>Magma. O estudo metodologicamente traz</p><p>uma revisão da literatura e a análise do</p><p>conteúdo de relatos disponíveis na mídia impressa</p><p>e digital de Travestis, Transexuais e Transgêneros</p><p>que, apesar de todas as dificuldades, alçaram</p><p>posição de destaque dentro e fora da Academia,</p><p>o que nos permitiu vagar pelo imaterial, pelo não</p><p>palpável e intangível, para apresentar</p><p>conclusões ancoradas dentro do viés das</p><p>perspectivas travestigêneres e transfeministas.</p><p>Assim, traz-se como cabedal o seguinte ‘Objetivo</p><p>Geral’: Analisar quais são as estratégias e os</p><p>mecanismos que provocam a exclusão de estudantes</p><p>Travestis, Transexuais da Escola. Evidencia-se nos</p><p>cinco casos exitosos protagonizados por: Jaqueline</p><p>Gomes de Jesus, João Walter Nery, Luma Nogueira</p><p>de Andrade, Megg Rayara Gomes de Oliveira e</p><p>Vivian Miranda, Travestis, Transexuais e</p><p>Transgêneros que conseguiram burlar o</p><p>preconceito estrutural imposto pela rígida</p><p>disciplina cisheteronormativiidade, “dentro</p><p>dos muros escolares” alcançando êxitos sendo</p><p>hoje referências nacionais e internacionais na</p><p>suas áreas laborais.</p><p>estudiosos e pesquisadores da área de Educação, Di-</p><p>reitos Humanos e Gênero, possibilitando uma amiúde</p><p>análise da legislação em vigor na esfera federal estadu-</p><p>al e distrital, contemplando, em especial, o “Currículo</p><p>em Movimento” construído por gestoras/es, professo-</p><p>ras/es e orientadoras/es e implantado no magistério</p><p>da capital federal através da Secretaria de Estado de</p><p>Educação do DF. A negação às Travestis, Transexuais e</p><p>Transgêneros de espaço no “chão da escola” resulta na</p><p>evasão/exclusão desses indivíduos, faz com que ten-</p><p>ham a “pista” como única forma de sobreviverem ao</p><p>descaso e a falta de fiscalização de um Estado elitista,</p><p>machista, racista, misógino, homofóbico e transfóbi-</p><p>co, fazendo a sociedade acreditar que o abandono/</p><p>expulsão das salas de aula tenha sido escolha própria.</p><p>Os casos trazidos à baila, sem sombras de dúvidas,</p><p>ilustram que esses seres humanos utilizaram-se de</p><p>uma força hercúlea para não se desviarem de seus</p><p>propósitos pessoais e atingirem cada uma/um o al-</p><p>mejado sucesso individual. Ficou também demonstra-</p><p>do que carece ao Estado não só legislar, mas, princi-</p><p>palmente, proceder a devida fiscalização para que a</p><p>nossa legislação, vista como de vanguarda e inclusive</p><p>inspiradora para outras nações, seja efetivamente re-</p><p>speitada. Temos consciência que os “trabalhos” foram</p><p>apenas “abertos” e que outros estudos nesse viés,</p><p>destacando temática tão sensível, hão de existir. Vale</p><p>destacar que, embora alguns achem redundante, a</p><p>EDUCAÇÃO é capaz de transformar as pessoas e con-</p><p>sequentemente a sociedade pós contemporânea.</p><p>PALAVRAS-CHAVE: Diversidade Sexual. Educação em</p><p>Direitos Humanos. Exclusão e Êxito escolar. Gênero</p><p>Social. Travestilidades.</p><p>Ventos favoráveis sopram no rumo de uma certa lib-</p><p>eralização do quadro nacional: em ano eleitoral, a</p><p>imprensa noticia promessas de um Executivo menos</p><p>rígido, fala-se na criação de novos partidos, de anistia,</p><p>uma investigação das alternativas propostas faz até</p><p>com que se fareje uma “abertura” do discurso brasile-</p><p>iro. Mas, um jornal homossexual, para quê?</p><p>A resposta mais fácil é aquela que nos mostrará em-</p><p>punhando uma bandeira exótica ou “compreensível”,</p><p>cavando mais fundo as muralhas do gueto, endossan-</p><p>do - ao “assumir” - a posição isolada que a Grande</p><p>Consciência Homossexual reservou aos que não rezam</p><p>pela sua cartilha, e que convém à sua perpetuação e</p><p>ao seu funcionamento.</p><p>Nossa resposta, no entanto, é esta: é preciso dizer</p><p>não ao gueto e, em consequência, sair dele. O que</p><p>nos interessa é destruir a imagem-padrão que se faz</p><p>do homossexual, segundo a qual ele é um ser que vive</p><p>nas sombras, que prefere a noite, que encara a sua</p><p>preferência sexual como uma espécie de maldição,</p><p>que dado aos ademanes e nem sempre esbarra, em</p><p>qualquer tentativa de se realizar mais amplamente en-</p><p>quanto ser humano, neste fator capital: seu sexo não é</p><p>aquele que ele desejaria ter.</p><p>Para acabar com essa imagem-padrão, LAMPIÃO não</p><p>pretende soluçar a opressão nossa de cada dia, nem</p><p>pressionar válvulas de escape. Apenas lembrará que</p><p>uma parte estatisticamente definível da população</p><p>brasileira, por carregar nas costas o estigma da não</p><p>reprodutividade numa sociedade petrificada na mi-</p><p>tologia hebraico-cristã, deve ser caracterizada como</p><p>uma minoria oprimida. E uma minoria, é elementar</p><p>nos dias de hoje, precisa de voz.</p><p>Mostrando que o homossexual recusa para si e para</p><p>as demais minorias a pecha de casta, acima ou abaixo</p><p>das camadas sociais, que ele não quer viver em gue-</p><p>tos, nem erguer bandeiras que o estigmatizem; que ele</p><p>não é um eleito nem um maldito; e que sua preferência</p><p>sexual deve ser vista dentro do contexto psicossocial</p><p>da humanidade como um dos muitos traços que um</p><p>caráter pode ter, LAMPIÃO deixa bem claro o que vai</p><p>orientar a sua luta: nós empenharemos em desmor-</p><p>alizar esse conceito que alguns nos querem impor --</p><p>que a nossa preferência sexual possa interferir neg-</p><p>ativamente em nossa atuação dentro do mundo em</p><p>que vivemos. Conselho Editorial (LAMPIÃO DA ESQUI-</p><p>NA, 1978, grifos nossos).</p><p>Com esses fragmentos do Editorial Saindo do Gue-</p><p>to do jornal “Lampião da Esquina”, lançado em abril</p><p>de 1978, produziam ali algo com, sobre e para sua</p><p>comunidade ainda em processo de organização.</p><p>Carece destacar que a luta por direitos da popu-</p><p>lação LGBT1 no Brasil é recente, e entendemos que</p><p>talvez o maior marco originário do movimento so-</p><p>cial LGBT esteja ancorado no surgimento do jornal</p><p>“Lampião da Esquina” (1978), ou seja: dez anos an-</p><p>tes da atual Constituição (BRASIL, 1988), durante o</p><p>governo do General Geisel (1974-1979), que iniciou</p><p>a “abertura” nos últimos anos da “Ditadura Escan-</p><p>DEDICATÓRIA</p><p>Dedico à aquelas pessoas que estiveram aqui antes</p><p>de mim e que foram fonte de inspiração e força</p><p>para a produção deste presente trabalho de</p><p>conclusão de curso, TCC. Reconheço a</p><p>importância da contribuição de to-das/es/os</p><p>que defenderam e militam pelos Direit-os</p><p>Humanos, e em particular pelo reconhecimento</p><p>das “Diversas Diversidades Humanas”, para a</p><p>con-strução de uma sociedade mais humana,</p><p>igual-itária, plural e que também pavimentaram a</p><p>minha trajetória acadêmica.</p><p>INTRODUÇÃO</p><p>Para situarmos a presente pesquisa no tempo e no</p><p>espaço identitário, vamos mergulhar em uma</p><p>ráp-ida viagem à bruma da ditadura militar</p><p>brasileira, quando surge dentro da “imprensa</p><p>alternativa” um jornalismo praticado por</p><p>pequenas empresas de-sassociadas dos grandes</p><p>monopólios empresariais midiáticos e familiares</p><p>formados no coronelismo nacional:</p><p>Agradeço a resiliência, sabedoria e cultura transmiti-</p><p>das ao longo das gerações, que enriquecem nosso con-</p><p>hecimento e promovem a valorização da diversidade.</p><p>Que este singelo trabalho seja um pequeno tribu-</p><p>to à luta e às conquistas daquelas/es que</p><p>vieram antes de nós! Muito obrigado à</p><p>ancestralidade afro indígena e a todas as</p><p>Travestis, Transexuais e Transgêneros, inclusive,</p><p>as/es/os Baitolas, Bibas, Bichas, Bofes,</p><p>Bonecas, Entendidos, Frescos, Ga-zelas,</p><p>Pervertidos, Qualiras, Sapatões, Transviados,</p><p>Travecos e Viados que devido à continentalidade</p><p>e regionalidade pátria, assim, foram chamadas/es/</p><p>os por ignorância ou como forma pejorativa, mas</p><p>que na verdade são Guerreiras/es/os merecendo</p><p>serem lembradas/es/os e exaltadas/es/os.</p><p>I S I M P Ó S I O D I V E R S I D A D E E R E S I S T Ê N C I A</p><p>B R A S Í L I A / D F 2 0 2 3</p><p>carada”, como assim chamou Gaspari (2002b). Com</p><p>a derrocada de mais de 21 anos do período de ex-</p><p>ceção e com a chamada “redemocratização”, foi</p><p>possível construir políticas públicas mínimas para</p><p>essa camada da população que, ao longo da história</p><p>colonial e republicana, esteve mantida à margem</p><p>por uma elite ariana, patriarcal, hebraico-cristã, eu-</p><p>rocentrista, machista, racista, misógina, preconcei-</p><p>tuosa e homotransfóbica.</p><p>Nesse sentido, a proposta da pesquisa é realizar</p><p>uma análise da possível “exclusão” de estudantes</p><p>Travestis, Transexuais e Transgêneros da escola,</p><p>procurando revelar os porquês que estudantes</p><p>LGBT passam por grandes dificuldades para se man-</p><p>terem e viverem dignamente quando são evadidos</p><p>pela escola, haja vista as incontáveis adversidades</p><p>que enfrentam diuturnamente. Todavia, é sabido</p><p>que esses desafios se iniciam no ambiente familiar,</p><p>onde imperam padrões patriarcais, heteronormati-</p><p>vos e com forte influência de origem religiosa he-</p><p>braico-cristã.</p><p>Infelizmente, o Brasil ostenta o primeiro lugar no</p><p>ranking internacional como o país que mais mata</p><p>Lésbicas, Travestis, Transexuais e Homossexuais.</p><p>Este número faz parte do resultado da pesqui-</p><p>sa do Observatório do Grupo Gay da Bahia - GGB,</p><p>“Mortes violentas de LGBT+ Brasil: 2022”, trazendo</p><p>como resultado o óbito de 256 pessoas LGBT (Lés-</p><p>bicas, Gays, Bissexuais, Transgêneros), sendo 242</p><p>homicídios (94,5%) e 14 suicídios (5,4%). Assim,</p><p>o Brasil continua sendo o país onde mais pessoas</p><p>LGBT são assassinados no mundo: uma morte a</p><p>cada 34 horas. (GGB, 2022).</p><p>Chegou também, ao MDHC o dossiê: “Assassinatos</p><p>e violências contra Travestis e Transexuais brasilei-</p><p>ras”, da Associação Nacional de Travestis e Transex-</p><p>uais – ANTRA (2022), cujos dados informam que o</p><p>Brasil, pelo décimo quarto (14º) ano consecutivo,</p><p>coloca-se na primeira posição do ranking de assas-</p><p>sinatos de Travestis, Transexuais e Transgêneros,</p><p>estando na frente do México e dos Estados Unidos</p><p>da América respectivamente.</p><p>É nesta seara ainda obscura, apesar do grande</p><p>número de estudos e pesquisas realizadas nos úl-</p><p>timos anos por entidades como a Organização das</p><p>Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultu-</p><p>ra - UNESCO, (2004); Fundação Instituto de Pesqui-</p><p>sas Econômicas – FIPE, (2010); Associação Brasileira</p><p>de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais</p><p>– ABGLT, (2015), que essa pesquisa foi construída</p><p>além</p><p>de inúmeras títulos de pesquisadoras/es, cu-</p><p>jos resultados irão colaborar com a análise pontual</p><p>da exclusão de estudantes Travestis, Transexuais e</p><p>Transgêneros da escola.</p><p>Trar-se-á à baila que estudantes Travestis, Transexu-</p><p>ais e Transgêneros se veem forçados a viverem em</p><p>condições sub-humanas, sofrendo discriminação,</p><p>preconceito e ódio dentro da sociedade brasilei-</p><p>ra alicerçados na forte influência religiosa hebra-</p><p>ico-cristã.</p><p>Nesse viés, têm-se como cabedal o seguinte ‘Objeti-</p><p>vo Geral’: Analisar quais são as estratégias e os me-</p><p>canismos que provocam a exclusão de estudantes</p><p>Travestis, Transexuais da Escola. Ainda, na intenção</p><p>de evidenciar esse complexo imbróglio educacional,</p><p>social e de gênero, foram eleitos os seguintes ‘Ob-</p><p>jetivos Específicos’: a) Compreender os dispositivos</p><p>(valores, crenças e representações) presentes na es-</p><p>cola que possibilitam que a discriminação e o ódio</p><p>sejam banalizados dentro dos ‘muros escolares’; b)</p><p>Revelar como o universo de alguns escolares que</p><p>compõem a Travestilidade e a Trans masculinidade</p><p>superaram a discriminação, o preconceito e o ódio</p><p>nos bancos escolares, conseguindo atingir elevados</p><p>graus acadêmicos.</p><p>1. Optou-se neste estudo pela utilização dessa sigla em vez de outras configurações que circulam, as quais fazem crescer a chamada “sopa</p><p>de letrinhas”. Para isso, levou-se em consideração que essa sigla tem sido adotada oficialmente nos movimentos sociais, nas organizações</p><p>da sociedade civil, nas políticas públicas e nos equipamentos públicos de promoção e defesa dos direitos dessa população, como o Con-</p><p>selho Nacional de Combate à Discriminação e Promoção dos Direitos de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (CNCD/LGBT),</p><p>de outras siglas nos movimentos sociais, nas políticas públicas e mesmo nas produções acadêmicas. Da mesma forma, como faculta o</p><p>Novo Acordo Ortográfico (1990) que entrou em vigor em 2016, ao citarmos cada uma dessas comunidades, utilizaremos a palavra com</p><p>a inicial maiúscula para trazer visibilidade e dar destaque.</p><p>HÁ UMA ESCOLA ACOLHEDORA NO BRASIL?</p><p>Cabe antes de adentrarmos na nossa discussão so-</p><p>bre a violência contra Travestis, Transexuais e Trans-</p><p>gêneros dentro dos muros das Unidades Escolares,</p><p>um comentário en passant. Devido ao machismo</p><p>estrutural, às estruturas patriarcais herdadas do</p><p>colonialismo eurocêntrico, aqui representado pelos</p><p>portugueses que junto aos paradigmas religiosos</p><p>nos fazem uma sociedade bastante preconceituosa</p><p>onde “ainda” prevalecem o racismo, a misoginia, a</p><p>homofobia, a gordofobia, a transfobia e outros tan-</p><p>tos adjetivos que causam violência aos indivíduos,</p><p>percebemos a dificuldade dessas pessoas encontra-</p><p>rem “um porto seguro” no seu próprio LAR!</p><p>Além disso, o que é mais absurdo nesse “machismo</p><p>velado” é que os próprios pais, tios, avós e vizin-</p><p>hos são aqueles que mais violentam os indivíduos</p><p>LGBTs, já que dentro da heteronormatividade não</p><p>são discutidas as posições “ativo ou passivo”, elas</p><p>são impostas, como bem escreveu Kulick (2008):</p><p>[...] “as violências praticadas em casa”, em sua maio-</p><p>ria, são produzidas por familiares ou vizinhos das</p><p>Travestis, pois os papéis sexuais não são negociados,</p><p>não é dada à criança uma escolha sobre uma posição</p><p>“ativa ou passiva”; além disso, não há preocupação</p><p>com o prazer do passivo. “Não acontece a troca de</p><p>carinhos, nenhuma preocupação com o outro; há ape-</p><p>nas o uso (ou abuso) do corpo do passivo, parecendo</p><p>ser este apenas um objeto de prazer” (KULICK, 2008. p.</p><p>76, grifos nossos).</p><p>Dito isso, passemos para o que mais importa nesse</p><p>estudo, é de conhecimento público que as bases</p><p>para o funcionamento da estrutura educacional</p><p>pátria regida pelo Ministério da Educação - MEC</p><p>encontram guarida na “Constituição Cidadã3” (BRA-</p><p>SIL, 1988), por ser considerada a Carta Magma com</p><p>os maiores avanços sociais e por trazer, no teor de</p><p>seus artigos, uma visão de vanguarda.</p><p>Em outro momento da Carta Magna, a sociedade</p><p>brasileira tem a garantia da Educação pública, laica,</p><p>3. Termo cunhado pelo Presidente da Assembleia Nacional Constituinte Ulysses Guimarães na sua promulgação.</p><p>CAMINHOS METODOLÓGICOS</p><p>A pesquisa se desenvolveu de janeiro a agosto de</p><p>2023, com a leitura de algumas dezenas de artigos,</p><p>monografias, dissertações, teses e livros digitais e</p><p>físicos, objetivando construir o arcabouço teórico e</p><p>responder de forma pontual e explicativa o Objeti-</p><p>vo Geral e Específicos eleitos para poder trazer às</p><p>leitoras e leitores um ancoradouro robusto e sólido.</p><p>O método descritivo procura descrever um deter-</p><p>minado fenômeno ou objeto mais conhecido. Fato</p><p>é que essa metodologia objetiva sistematizar dados</p><p>provenientes de questionários ou de observações</p><p>dirigidas sobre fatos e fenômenos já estudados. É</p><p>o tipo de pesquisa mais comum no trato de temas</p><p>de ordem social, como, por exemplo, os fenômenos</p><p>ligados à educação (BERNARDO & ROCHA, 2011).</p><p>Em relação à abordagem qualitativa do presente es-</p><p>tudo, fomos buscar respaldo em Triviños (1987), que</p><p>destaca seu uso para a investigação do tipo fenome-</p><p>nológico e de natureza histórico-estrutural e dialética.</p><p>Por derradeiro, mesmo compreendendo o valor de</p><p>uma pesquisa científica e o rigor que deve ser dado</p><p>a linguagem formal, extrapolamos e trouxemos al-</p><p>guns trechos em primeira pessoa. Isso se justifica</p><p>uma vez, que o autor se identifica com o presente</p><p>trabalho de pesquisa, pois, é um Homem Gay, Edu-</p><p>cador, Militante dos Direitos Humanos em toda sua</p><p>amplitude, não escondendo sua orientação sexual</p><p>na sua vida pessoal, laboral e acadêmica.</p><p>Para justificar tal atitude, chamamos Bagno (2002)</p><p>que defende</p><p>[...] o uso da norma padrão nas escolas de-</p><p>veria ser informado apenas aos alunos como</p><p>outra opção da Língua. A exigência de o ed-</p><p>ucando ter que seguir uma norma padrão é</p><p>considerar o que fora disso, seja errado e é</p><p>criticado (2002, p. 78).</p><p>O linguista preconiza que “se jornalistas, publicitários</p><p>e até os escritores por muitas décadas foram consider-</p><p>ados referência quanto à Língua Portuguesa e fugiam</p><p>sem medo à norma padrão. Por que os estudantes</p><p>não podem fazer o mesmo?” (BAGNO, 2002, p. 79).</p><p>I S I M P Ó S I O D I V E R S I D A D E E R E S I S T Ê N C I A</p><p>B R A S Í L I A / D F 2 0 2 3</p><p>gratuita, democrática e de qualidade referenciada</p><p>pelo social, já que seu arcabouço se encontra dentro</p><p>das quatro linhas da sétima norma constitucional da</p><p>República. Conforme consta exarado no Artigo 205.</p><p>Nesse sentido, há discursos, valores e práticas que</p><p>ostensivamente regulam a cisheteronormatividade</p><p>em um movimento incansável de controle, discipli-</p><p>na, punição e vigilância por parte de todos os atores</p><p>sociais localizados na escola.</p><p>Sayão em informação verbal, on-line, (2023), difunde</p><p>que: “a violência na escola não é um fenômeno esco-</p><p>lar é um fenômeno da sociedade e a escola represen-</p><p>ta a sociedade, representa uma parte do mundo para</p><p>seus escolares, então o que acontece na sociedade</p><p>acontece também na escola” já que os discursos que</p><p>são produzidos fora de seus muros também estão</p><p>presentes em seus corredores a partir de uma rede</p><p>de práticas sociais que se retroalimentam.</p><p>No que tange ao espaço escolar, Ribeiro (2009) rela-</p><p>ta que, na escola, as Travestis, Transexuais e Trans-</p><p>gêneros também sofrem violência (principalmente</p><p>psicológica), sendo excluídas, gradativamente, do</p><p>convívio escolar, o que termina levando-as à “evasão</p><p>escolar” bem cedo em suas vidas (geralmente no</p><p>primeiro ou segundo ano do antigo ginásio, hoje</p><p>Ensino Médio).</p><p>Esta violência ocorrida nas escolas foi por algum</p><p>tempo denominada bullying, termo que surgiu na</p><p>década de 1990, na Europa, com os trabalhos do</p><p>professor Dan Olweus na Noruega (Neto, 2004). No</p><p>Brasil, há algumas pesquisas sobre o tema, a As-</p><p>sociação Brasileira Multiprofissional de Proteção à</p><p>Infância e à Adolescência – ABRAPIA, fez uma em</p><p>2002, a qual revelou que 40,5% dessas/es estu-</p><p>dantes admitiram ter estado diretamente envolvi-</p><p>das/es/os em atos de bullying naquele ano.</p><p>No primeiro mandato do Presidente</p><p>Lula, foi lança-</p><p>do o programa “Brasil sem Homofobia – BSH”, – Pro-</p><p>grama de Combate à Violência e à Discriminação</p><p>contra LGBT e Promoção da Cidadania Homossexual,</p><p>elaborado em estreita articulação com o movimen-</p><p>to social LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e</p><p>Transexuais) e outras forças sociais e políticas.</p><p>De repente, surge no dia a dia, nas conversas de bar,</p><p>na mídia tradicional e nas redes sociais, no ambi-</p><p>ente escolar em todos os níveis o verbete homo-</p><p>fobia, mas o que é homofobia? Esclarece Borrillo</p><p>(2010) que é a atitude de hostilidade contra a co-</p><p>munidade LGBT; o termo foi utilizado pela primeira</p><p>vez em 1971 nos Estados Unidos e tem sua origem</p><p>no grego: homós, que significa “semelhante”.</p><p>Para Maciel (2020, p. 550), o MEC, ao término</p><p>da implantação do Programa “Brasil Sem Homo-</p><p>fobia”, pretendia provocar entre as/es/os estu-</p><p>dantes “a reflexão para aceitarem as diferenças e</p><p>evitar agressões e perseguições a colegas/es que</p><p>assumem sua homossexualidade, ajudando a di-</p><p>minuir a forte evasão escolar observada na parcela</p><p>LGBT da população.”</p><p>Nesse aspecto, a homofobia reflete a mesma lógica</p><p>violenta de outras formas de inferiorização, como a</p><p>misoginia, o racismo e o sexismo, cujo objetivo é</p><p>sempre o de desumanizar o outro.</p><p>No entanto, observa-se aqui uma diferença funda-</p><p>mental: enquanto uma vítima de racismo é acol-</p><p>hida e confortada por sua família, a vítima de ho-</p><p>mofobia, com raras exceções, não encontra em sua</p><p>própria casa a compreensão e o apoio necessários</p><p>para seu conforto. Depreende-se daí o papel fun-</p><p>damental que uma escola verdadeiramente cidadã</p><p>tem de desnaturalizar a homofobia para além de</p><p>seus muros.</p><p>O magistério da Capital Federal carrega até hoje</p><p>o seu fenótipo vanguardista que teve seu nasce-</p><p>douro na Comissão de Administração do Sistema</p><p>Educacional de Brasília - CASEB, ainda em 1959, no</p><p>Ministério da Educação e Saúde, sob a égide de Aní-</p><p>sio Teixeira, responsável pela elaboração do docu-</p><p>mento intitulado “Plano de Construções Escolares</p><p>de Brasília”, que acreditava ser Brasília um locus</p><p>ideal para a implantação da escola renovada.</p><p>No governo Agnelo Queiroz, se inicia a construção</p><p>do que hoje se conhece como “Currículo em Movi-</p><p>mento”; por algumas vezes já atualizado e melhora-</p><p>do. Para tanto, é necessário que gestoras, gestores,</p><p>professoras e professores saibam diferenciar o pú-</p><p>blico do privado, conheçam o “Currículo em Movi-</p><p>mento” e seus “Eixos Transversais”, além de enten-</p><p>derem que são servidoras/es públicas/os, e que suas</p><p>crenças não podem estar à frente de seu trabalho</p><p>para o bem comum de todas/es/os estudantes, in-</p><p>clusive aquelas/es que tenham uma identidade de</p><p>gênero que extrapole a cisheteronormatividade.</p><p>A produção e publicação literária das Professoras e</p><p>Professores da Secretaria de Estado da Educação do</p><p>Distrito Federal é bastante intensa no que diz re-</p><p>speito ao viés das diversas Diversidades Humanas;</p><p>exemplo disso, é o Curso Gênero e Diversidade na</p><p>Escola Formação de Professoras/es em Gênero, Sex-</p><p>ualidade, Orientação Sexual e Relações Étnico-Raci-</p><p>ais – GDE na versão brasiliense, ofertada pela UnB,</p><p>gerou a publicação de dois livros.</p><p>Seguindo os ditames de Bagno (2002), cabe aqui</p><p>um parênteses, pois passo a relatar uma experiên-</p><p>cia própria, vivenciada há quase 15 anos – enquan-</p><p>to gestor legitimamente eleito pela comunidade</p><p>escolar, dentro do “Programa Gestão Compartil-</p><p>hada” do governo Arruda (2007-2010) – no Centro</p><p>de Ensino Fundamental Mestre D’Armas – CEF Me-</p><p>stre D’Armas, ao inaugurar a “Sala de Leitura Gra-</p><p>ciliano Ramos”, em parceria com várias empresas</p><p>aproveitou-se o momento para o lançamento de</p><p>três livros escritos por professoras/es que atuavam</p><p>na unidade escolar: “Pedacinhos de Papel”, que</p><p>versava sobre “Dobraduras” da Professora de Ativ-</p><p>idades, Élida Teles; “Primeiro Livro das Diferenças,</p><p>de famílias e bandos”, de autoria do Professor Flávio</p><p>Brebis, e, de autoria da Pedagoga e “Vaidade não</p><p>tem vez – uma fábula das relações interpessoais”</p><p>da professora de Atividades, Kátia Malaquias (MA-</p><p>CIEL, 2023). Merece destacarmos o “Primeiro Liv-</p><p>ro das Diferenças, de famílias e bandos”, um livro,</p><p>paradidático e que trazia a temática LGBT; que de</p><p>forma lúdica, conta a história de um leãozinho que</p><p>é expulso de seu bando por ter despertado um sen-</p><p>timento homoafetivo por um de seus primos.</p><p>No mês do Orgulho LGBT/2023 foi lançado o livro</p><p>paradidático: “Meu menino Colorido”, pela pro-</p><p>fessora e pedagoga aposentada da SEE-DF, Zenilda</p><p>Vilarins Cardozo em formato de “Cordel”, que nos</p><p>conta a história e saga do seu sobrinho, que foi dis-</p><p>criminado e violentado em uma escola particular no</p><p>Ensino Médio até criar coragem de assumir sua ori-</p><p>entação sexual para a família como última atitude</p><p>para não desistir de estudar em uma família de vári-</p><p>os mestras/es, pedagogas/es/os e professoras/es.</p><p>As violências sofridas por Guilherme não são um</p><p>episódio único da Capital Federal, que está próxima</p><p>dos três poderes da República, abrigando-os. Brasil</p><p>afora, nos mais longínquos rincões, há incontáveis</p><p>“Marias” e “Gulhermes”, conforme assevera Souza</p><p>(2017, p. 310):</p><p>A escola é uma das instituições mais incapazes de</p><p>lidar com a pluralidade de gênero e sexualidade,</p><p>funcionando como uma verdadeira guardiã da repro-</p><p>dução reiterada da heterossexualidade compulsória.</p><p>Diz-se que a escola é um espaço de evasão para trav-</p><p>estis e transexuais, mas na verdade, se configura</p><p>como um espaço de expulsão, tendo em vista que o</p><p>cotidiano escolar é um local de intolerância alimenta-</p><p>da pela homofobia (grifos nossos).</p><p>Por esse motivo, resolvemos trazer no presente es-</p><p>tudo o viés que registra os casos em que esse públi-</p><p>co escolar foi exitoso. Ainda há muito o que camin-</p><p>har, pois, são poucos os estudos sobre o êxito, e não</p><p>o fracasso dessas pessoas.</p><p>Nessa perspectiva, as pessoas Trans e Travestis são</p><p>também parte dessa subalternidade, uma vez que</p><p>seus corpos são deslegitimados e suas vozes silen-</p><p>ciadas dentro e fora da escola, como bem questiona</p><p>Leticia Carolina Pereira do Nascimento (2021); que</p><p>teve a ousadia de fazer uma releitura do celebre</p><p>discurso da estadunidense, pregadora pentecos-</p><p>tal, militante abolicionista e defensora dos direitos</p><p>das mulheres, Sojourner Truth (1851): “E não sou</p><p>uma mulher?” assevera “E não posso eu ser uma</p><p>Mulher?” (2021, p. 20). Nascimento procurou des-</p><p>sa forma combater o discurso que circula, inclusive,</p><p>dentro das “alas feministas” determinando quem</p><p>pode e quem não pode ser Mulher.</p><p>É certo que nos governos do Partido dos Trabalhadores</p><p>- PT entre 2003 a 2016, várias foram as políticas públi-</p><p>cas implementadas visando a comunidade LGBT,</p><p>como por exemplo a adoção do “nome social” para as</p><p>Travestis, Transsexuais e Transgêneros (BRASIL, 2016).</p><p>Como contraponto, Garcia (2022) acredita que</p><p>haverá um dia em que, por meio do modelo de</p><p>aprendizagem transgressora, muito bem explicado</p><p>por BRITZMAN (2002), será possível perceber que</p><p>[...] a sala de aula pode transformar-se em um espaço</p><p>que favoreça a mudança social se a prática docente</p><p>fizer uma revisão na estrutura autoritária que costuma</p><p>I S I M P Ó S I O D I V E R S I D A D E E R E S I S T Ê N C I A</p><p>B R A S Í L I A / D F 2 0 2 3</p><p>definir suas estratégias e, sobretudo, com o question-</p><p>amento cotidiano da heterossexualidade normativa</p><p>(GARCIA, 2022, apud BRITZMAN, 2002, p. 12).</p><p>Abramovay (2004, p. 280) há quase 20 anos em</p><p>seu estudo “Juventudes e Sexualidades”, ao en-</p><p>trevistar 853 estudantes do Ensino Fundamental e</p><p>do Ensino Médio, 193 Pais ou responsáveis e 137</p><p>profissionais que formavam o Corpo Técnico de 15</p><p>Escolas Públicas do magistério brasiliense, registrou</p><p>alguns apontamentos interessantes sobre a violên-</p><p>cia a Travestis, Transexuais e Transgêneros: “Os Pais</p><p>e Responsáveis ao serem indagados sobre quais</p><p>pessoas estes não gostariam que fossem colegas de</p><p>seus filhos, 17,4% dos Pais e 26,9% das Mães dos</p><p>estudantes indicaram que não gostariam que seus</p><p>filhos tivessem um colega homossexual.”</p><p>Esses números</p><p>mostram que a existência de ho-</p><p>mossexuais (a pesquisa se ateve a homofobia, não</p><p>tecendo especificidades a “aquarela colorida” ou a</p><p>“sopa de letrinhas” das diversas diversidades sexu-</p><p>ais e de gênero) é consciente. No entanto, na época</p><p>havia ainda grande resistência à aceitação dos es-</p><p>colares homossexuais pelos seus pares, gestores,</p><p>professores, funcionários, mães e pais.</p><p>Carece refletirmos que não bastam “as salas de au-</p><p>las serem diversas e plurais”, em instalações, mo-</p><p>biliário e escolares, se aquelas/es que desempen-</p><p>ham o papel de “mediador/ra”, professoras/es, não</p><p>estarem preparadas/es/os em conhecimento ou</p><p>não tiverem a atualização desse conhecimento para</p><p>exercerem seus papeis de “forma condizente com</p><p>os Direitos Humanos e Currículo em Movimento”,</p><p>não trazendo para a “sala de aula” sua intolerância</p><p>fomentada por suas ideologias e de seus superiores</p><p>com base nas “verdades” sustentadas nas doutrinas</p><p>hebraico-cristã e também no cunho político.</p><p>Na “Norma” há citação especifica que menciona</p><p>o combate a todo tipo de violência à comunidade</p><p>LGBT como é possível ver a seguir:</p><p>Ainda nesse sentido, conforme a Constituição Federal</p><p>de 1988, em seu artigo 5º, que trata da “inviolabili-</p><p>dade do direito à vida, à liberdade, à igualdade”, não</p><p>se podem menosprezar os atos de agressões, de neg-</p><p>ligência ou de omissão em violências dirigidas à pes-</p><p>soas LGBTQI+, considerando que qualquer comporta-</p><p>mento diferente do que se convenciona como normal,</p><p>em especial quando se trata da sexualidade, acrescen-</p><p>ta maiores empecilhos para a permanência e o alca-</p><p>nce do sucesso escolar (DISTRITO FEDERAL, 2014a, p.</p><p>24, grifos nossos).</p><p>“A ação sobre o corpo, o adestramento do gesto, a</p><p>regulação do comportamento (...) faz(em) com que</p><p>apareça (...) essa figura singular, individualizada – o</p><p>homem – como produção do poder (...) e ao mesmo</p><p>tempo como objeto de saber”, (FOUCAULT, 2009, p.</p><p>20). Com essa colocação, Foucault evidencia a fac-</p><p>eta positiva do poder, refere-se ao “biopoder” que</p><p>na sua teoria seria aquele que se exerce “sobre os</p><p>corpos, os prazeres e o sexo”, numa gestão eficiente</p><p>da vida e suas potências, postas a serviço de uma</p><p>dada ordem.</p><p>Quando resolvemos colocar o título desse estu-</p><p>do no dialeto Pajubá/Bajubá, queríamos chamar</p><p>a atenção para a realidade que vivem as Travestis,</p><p>Transexuais e Transgêneros, as/es/os muitas vezes</p><p>usam desse artificio para se manterem incógnitas/</p><p>es/os. O Pajubá ou Bajubá é um dialeto “vivo” mui-</p><p>to comum entre a comunidade de culto aos Orixás</p><p>de matriz africana, adaptado para a comunidade</p><p>LGBT, em especial as Travestis, com o objetivo de as</p><p>pessoas não saberem do que estavam falando no</p><p>seu dia a dia, no ônibus, na rua ou na pista (COSTA</p><p>NETO, 2006).</p><p>Essa linguagem veio ao conhecimento da população</p><p>em geral devido uma questão do Exame Nacional</p><p>do Ensino Médio – ENEM, em 2018, na ocasião na</p><p>prova de Linguagens, Códigos e suas Tecnologias</p><p>em que uma questão utilizou o dialeto Pajubá. A</p><p>situação provocou diversas críticas nos meios de</p><p>comunicação.</p><p>ANALISANDO PARA DESCONSTRUIR</p><p>Inicialmente pretendíamos entrevistar algumas</p><p>Travestis e demais pessoas Trans para apresentar-</p><p>em suas histórias exitosas na Academia e realizar a</p><p>análise desses discursos. Entretanto, precisávamos</p><p>submeter o presente estudo ao Comitê de Ética da</p><p>UnB, uma vez que nosso público alvo, considerada</p><p>sensível. Chegou-se à conclusão não haver tempo</p><p>suficiente para que fossem cumpridos todos os pra-</p><p>zos. Optou-se por colher informações de entrevis-</p><p>tas já realizadas, trabalho que foi facilitado pelo fato</p><p>de todas serem pessoas públicas com diversas en-</p><p>trevistas dadas à grande mídia, e em diversas redes</p><p>sociais, com podcasts e lives.</p><p>Para fazer uma contextualização histórico desses cor-</p><p>pos travestigêneres, nos reportamos a Maciel (2023):</p><p>Vivíamos as brumas derradeiras da ditadura militar,</p><p>sob o comando do último dos generais, que prometia</p><p>uma “abertura, gradual e irrestrita”, quando o império</p><p>Bloch com a sua “pérola de sua coroa”; a Revista Man-</p><p>chete, deixou o Brasil perplexo estampando em um</p><p>ensaio fotográfico com a modelo Roberta Close na</p><p>sua edição nº 1698, em novembro de 1984, com let-</p><p>ras garrafais: “A mulher mais bonita do Brasil é um</p><p>homem”, um grande “burburinho” se instalou no Plan-</p><p>alto, os mais conservadores queriam a todo custo cen-</p><p>surar e decretar o recolhimento da revista, ideia que</p><p>encontrou resistência do próprio Presidente Figueiredo</p><p>(p. 59/60, grifos nossos).</p><p>Assim, de forma pouco convencional, caia no colo do</p><p>patriarcado, misógino, machista e homofóbico, em</p><p>rede nacional, a temática sobre gênero e sexualidade</p><p>para desespero de muitos...Vê-se então, que o Brasil</p><p>fala sobre identidade de gênero há quase quatro dé-</p><p>cadas, salve melhor juízo, mas não se tinha dado a</p><p>importância que o tema carece devido aos dogmas</p><p>e à resistência da virilidade eurocêntrica que se man-</p><p>tém arraigada na cultura machista nacional.</p><p>O quão terá sido desgastante e confuso toda a série</p><p>de violências que vivenciaram, muitas vezes não</p><p>de forma velada, mas sim, escancarada, nesse pro-</p><p>cesso educativo em que, na maioria das vezes, o</p><p>ambiente escolar não se faz acolhedor para Traves-</p><p>tis, Transexuais e Transgêneros, resultando na “de-</p><p>sistência dos estudos”?</p><p>O trabalho primeiro sobre a temática Travestilidade</p><p>na Academia ocorreu em 1993, quando o Professor</p><p>da Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC,</p><p>Hélio Raymundo Santos Silva, defendeu sua Disser-</p><p>tação de Mestrado na UFRJ: “Lapa dos Travestis” -</p><p>Travesti, a Invenção do Feminino.</p><p>Santos (2023, on-line) trouxe um levantamento da</p><p>Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições</p><p>de Ensino Superior (Andifes, 2018) registrando que</p><p>entre os mais de 1,2 milhão de estudantes das Uni-</p><p>versidades Federais do Brasil, 3.379 se declararam</p><p>transgênero naquele ano.</p><p>Ao nos debruçarmos e analisarmos os dados da</p><p>pesquisa, concluímos que a participação de Trav-</p><p>estis, Transexuais e Transgêneros representa o ín-</p><p>fimo percentual de apenas 0,2% das vagas nas In-</p><p>stituições Federais de Ensino Superior (IFES). Certo</p><p>é que esses dados refletem quão dificultoso é o</p><p>caminho dessa parcela da população até obterem</p><p>uma vaga na universidade no Brasil, assim como</p><p>em todo o mundo, pelo simples fato de elas não se</p><p>identificarem com o gênero que lhes foi atribuído</p><p>no nascimento pela biologia. Difícil, sabe-se que</p><p>é, entretanto, não impossível! (ANDIFES, 2023, on-</p><p>line, grifos nossos).</p><p>Para Toneli (et al., 2015), a escola falha no acolhi-</p><p>mento e na oferta de condições mínimas para a per-</p><p>manência das pessoas Trans por meio do uso do nome</p><p>social, acesso ao banheiro adequado à sua expressão</p><p>de gênero e o combate da violência cotidiana por out-</p><p>ras/es/os estudantes, docentes e funcionárias/es/os</p><p>do espaço escolar, dentre outras ações.</p><p>O resultado materializa-se quando “[...] ratifica-se a</p><p>prostituição como saída para a sobrevivência, uma</p><p>vez que restam poucas chances de qualificação</p><p>para o trabalho e outras formas de sustento” para</p><p>aquelas que foram evadidas da escola e, na maioria</p><p>das vezes, do convívio e segurança familiar (TONELI,</p><p>et al., 2015, p. 94).</p><p>Recentemente os bons ventos sopram para essa</p><p>parcela da população, fazendo, inclusive, que algu-</p><p>mas pessoas Travestis, Transexuais e Transgêneros</p><p>venham alcançando êxito em eleições para cargos</p><p>executivos e legislativos em nível municipal, estad-</p><p>ual e federal. Nas Eleições de 2022 foram eleitas</p><p>pela primeira vez duas Travestis como Deputadas</p><p>Federais, Erika Hilton (PSOL - SP) e Duda Salabert</p><p>(PDT - MG) e além delas, as Assembleias Legislativas</p><p>de Sergipe e do Rio de Janeiro também elegeram</p><p>pela primeira vez, duas mulheres Trans: Linda Brasil</p><p>(PSOL-SE) e Dani Balbi (PCdoB - RJ). (TSE, 2023).</p><p>A seguir, trar-se-á à baila alguns casos onde suas</p><p>protagonistas Travestis, Transexuais e Transgêneros</p><p>conseguiram em dura batalha romperem a “bolha”</p><p>da violência, do preconceito, do machismo, da mi-</p><p>I S I M P Ó S I O D I V E R S I D A D E E</p><p>R E S I S T Ê N C I A</p><p>B R A S Í L I A / D F 2 0 2 3</p><p>soginia, da discriminação homofóbica e transfóbica</p><p>no viés acadêmico. Entretanto, existem outros tan-</p><p>tos episódios nas artes, na música e no entretimen-</p><p>to, que por razões dispares são aceitos com maior</p><p>facilidade.</p><p>Jaqueline Gomes de Jesus nasceu em Brasília em</p><p>1987. É uma mulher Transexual brasileira que cres-</p><p>ceu no Setor “O” da Ceilândia, Região Administrati-</p><p>va – RA periférica da Capital Federal que concentra</p><p>muitos problemas sociais. Para falar dos dessabores</p><p>na Educação Básica e depois no Ensino Médio,</p><p>recorremos a uma entrevista concedida pela própria</p><p>Jaqueline durante o confinamento da pandemia do</p><p>Covid-19, publicada na “Albuquerque: revista de</p><p>história” pela Universidade Federal de Mato Grosso</p><p>do Sul -UFMS em julho de 2021:</p><p>Eu sempre tive muito apoio da minha família para os</p><p>estudos - minha mãe era professora e meu pai opera-</p><p>dor de computadores - minha mãe foi a primeira pes-</p><p>soa [da família] a ter acesso ao Ensino Superior, ela se</p><p>formou em Pedagogia no mesmo ano em que eu nasci,</p><p>pela Universidade de Brasília; meu pai se tornou op-</p><p>erador de computadores nesta mesma Universidade,</p><p>então como uma família negra que teve uma origem...</p><p>uma ascensão a partir da educação fui muito estimula-</p><p>da desde pequena. Grandes desafios sempre por ser</p><p>uma criança e adolescente negra, sempre tive muita</p><p>experiência... contato com a subestimação do meu</p><p>conhecimento, da minha capacidade, apesar de meu</p><p>alto desempenho educacional. Enfrentei muitos desa-</p><p>fios na escola por ser uma criança não-conforme de</p><p>gênero, no caso conhecida como uma criança gay na</p><p>época, uma criança viada - vamos falar assim -, e eu</p><p>sofria muito bullying na minha escola, onde eu estu-</p><p>dava, mas eu consegui terminar o Ensino Fundamen-</p><p>tal, apesar de sofrer discriminação, violências todos</p><p>os dias com a anuência dos professores, brincadeiras</p><p>mais agressivas dos outros alunos. No Ensino Médio</p><p>eu mudei para uma escola em que eu tive muito mais</p><p>mobilidade. No acesso à universidade, apesar de ser</p><p>uma das pouquíssimas pessoas negras estudando no</p><p>curso de Química e depois Psicologia e estou na Psico-</p><p>logia desde então e tenho desenvolvido meus trabalhos</p><p>nesta área (LION e URSO, 2020, p. 188, grifos nossos).</p><p>Esse robusto depoimento da entrevistada traz, logo</p><p>nas primeiras linhas, a declaração do apoio que ela</p><p>teve da família, se colocando sempre ao seu lado.</p><p>Talvez, especialmente por ter sido uma criança negra</p><p>e “viada”, tenha sido justamente esse apoio familiar a</p><p>“chave” para o seu sucesso acadêmico e profissional.</p><p>Além de ser uma grande guerreira, Jaqueline NÃO foi</p><p>expulsa de casa, e o fato de seus pais serem letrados</p><p>certamente colaborou para que entendessem sua</p><p>“orientação sexual e o seu gênero”, o que concorreu</p><p>para que NÃO desistisse de estudar.</p><p>Não restam dúvidas de que seu sucesso acadêmico</p><p>e profissional fez Jaqueline enveredar e dirigir suas</p><p>pesquisas para uma vertente pouco estudada, e até</p><p>desconhecida, as Travestilidades e o Transfeminismo,</p><p>temática onde hoje ela figura como grande baluarte.</p><p>João Walter Nery reporta em seus livros: “Erro</p><p>de Pessoa – Joana ou João?” (1984) e “Viagem</p><p>Solitária - memórias de um transexual 30 anos de-</p><p>pois.” (2011) que:</p><p>Nasci no Rio de Janeiro em 1950 e vivi até os 27 anos</p><p>com um corpo de anatomia feminina e até os 34 “no</p><p>armário”4 até que pudesse aparecer na mídia, e quan-</p><p>do isso aconteceu, essa o considerou o primeiro Trans</p><p>Homem do Brasil. Me submeti a algumas intervenções</p><p>cirúrgicas no meu corpo. Formei em Psicologia pela</p><p>Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e fiz es-</p><p>pecialização em Sexologia pelo Instituto Estadual de</p><p>Diabetes e Endocrinologia (IEDE). Fui mestrando em</p><p>Psicologia da Educação pela Universidade Gama Filho</p><p>(UGF) e lecionei em três universidades (Gama Filho,</p><p>Hélio Alonso e Celso Lisboa), além de ter mantido um</p><p>consultório de psicoterapia, ainda com uma identidade</p><p>social feminina. Ao fazer a mamoplastia masculiniza-</p><p>dora e a pan histerectomia durante a ditadura militar</p><p>em 1977, vinte anos antes das cirurgias serem legaliza-</p><p>das5. Aos 37 anos, assumiu a paternidade da gravidez</p><p>de minha mulher e, quando ele tinha 13 anos, contei a</p><p>minha história, o que nos aproximou ainda mais. Hoje,</p><p>meu filho está com 28 anos, casado e formado em En-</p><p>genharia Mecânica (NERY, et. al, 2006, p. 169).</p><p>João Nery realizou de forma clandestina em pleno</p><p>“anos de chumbo” a sua cirurgia por falta de uma</p><p>legislação própria para sua condição Transexual.</p><p>No Brasil, “viver no armário” ou “sair do armário” são expressões que dizem respeito, respectivamente, a ocultar ou revelar a orientação</p><p>sexual e/ou identidade de gênero.</p><p>A legalização desses procedimentos no Brasil, para as pessoas transexuais, ocorreu inicialmente no sistema privado, em 1997, através</p><p>da Resolução do Conselho Federal de Medicina nº 1.482. No SUS, isso se deu em 2008, através das Portarias 1.707 e 457, que instituiu e</p><p>regulamentou, respectivamente, o Processo Transexualizador no SUS (BRASIL, 2008).</p><p>Também, por iniciativa própria, tirou uma nova cer-</p><p>tidão de nascimento, como se nunca a tivera antes,</p><p>mas no gênero masculino, o que o fez perder todas</p><p>suas conquistas e todos os seus direitos anteriores,</p><p>inclusive o currículo escolar e profissional, tornan-</p><p>do-se um “analfabeto”.</p><p>O relato de João Nery confirma a argumentação de</p><p>Rogério Junqueira (2009) que evidenciou a ausência</p><p>de ações de enfrentamento do estigma, do precon-</p><p>ceito e de políticas públicas destinadas às necessi-</p><p>dades básicas de pessoas Trans no ambiente escolar.</p><p>No dia primeiro de março de 2018, as Travestis,</p><p>Transexuais e Transgêneros obtiveram uma grande</p><p>vitória; o Supremo Tribunal Federal – STF, em jul-</p><p>gamento histórico, nas pessoas dos ministros da</p><p>Corte, reconheceu o direito da mudança do nome</p><p>e gênero na documentação civil, e a maioria enten-</p><p>deu que, não é necessária autorização judicial. Esta</p><p>decisão de vanguarda deve vigorar até que o poder</p><p>Legislativo aprove ou não a “Lei João Nery”.</p><p>Nery foi inspiração para o personagem Ivan, inter-</p><p>pretado pela atriz Carol Duarte, na novela de Glo-</p><p>ria Perez, “A força do querer”. Na trama, a jovem</p><p>Ivana enfrenta o preconceito e oposição familiar</p><p>ao decidir fazer a transição de gênero para Ivan, no</p><p>horário nobre da Vênus platinada.</p><p>A brasileira Luma Nogueira de Andrade cresceu em</p><p>Morada Nova, no Ceará. Ela é doutora em Educação</p><p>pela Universidade Federal do Ceará - UFC, mestre</p><p>em Desenvolvimento e Meio Ambiente pela Univer-</p><p>sidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN) e</p><p>graduada em Ciências Biológicas pela Universidade</p><p>Estadual do Ceará (UECE).</p><p>Em 2012, ela se tornou a primeira Travesti no Brasil</p><p>com título de doutora, concedido pela Faculdade de</p><p>Educação da Universidade Federal do Ceará - UFC,</p><p>ao produzir uma tese inspirada nas experiências</p><p>que viveu ao longo dos anos no ambiente escolar</p><p>(RECIIS, Fiocruz, 2019). Luma buscou na educação</p><p>e no engajamento social formas de superar as difi-</p><p>culdades sociais, principalmente, o preconceito por</p><p>ser uma pessoa LGBT.</p><p>Luma foi professora de escolas estaduais e partic-</p><p>ulares. Tomou posse como professora da Universi-</p><p>dade da Integração Internacional da Lusofonia Af-</p><p>ro-Brasileira (UNILAB) em 2013, com isso, passou</p><p>a ser também a primeira Travesti a fazer parte do</p><p>corpo docente efetivo de uma Universidade Pública</p><p>Federal do Brasil. Atualmente, é diretora do Institu-</p><p>to de Humanidades da UNILAB.</p><p>Temos de considerar o contexto histórico. Muitos ho-</p><p>mossexuais não tinham oportunidade de ir à escola,</p><p>principalmente na década de 1980, quando surgiu o</p><p>surto da Aids e havia a ideia de que a homossexual-</p><p>idade era contagiosa. Foram criados decretos que</p><p>impediam a presença de homossexuais nas escolas,</p><p>ou seja, havia um preconceito institucionalizado.</p><p>Consequentemente, as vítimas de preconceito não</p><p>tinham acesso ao trabalho, eram totalmente excluí-</p><p>das. Então, elas iam para as ruas e utilizavam o recur-</p><p>so que lhes restava: a</p><p>transmitir conteúdos; ela desempenha um</p><p>papel fundamental na transformação de estudantes</p><p>em sujeitos capazes de lidar com a diversidade pre-</p><p>sente na sociedade, seja ela de natureza cultural,</p><p>política, econômica ou de qualquer outro tipo.</p><p>O currículo escolar deve ser concebido de modo a</p><p>incorporar essas discussões relevantes sobre a di-</p><p>versidade e as mudanças na sociedade. A formação</p><p>de professores deve incluir a sensibilização para as</p><p>questões emergentes e o desenvolvimento de com-</p><p>petências necessárias para abordá-las em sala de</p><p>aula. Isso não apenas enriquecerá a experiência edu-</p><p>cacional dos alunos, mas também os capacitará para</p><p>se tornarem cidadãos conscientes e ativos em uma</p><p>sociedade cada vez mais complexa e diversificada.</p><p>Portanto, a reflexão do professor é um chamado</p><p>para uma revisão e aprimoramento das aborda-</p><p>gens de formação docente, a fim de garantir que a</p><p>educação esteja preparando os alunos não apenas</p><p>para o conhecimento acadêmico, mas também para</p><p>enfrentar e compreender o mundo em constante</p><p>evolução ao seu redor.</p><p>A oficina proporcionou uma valiosa oportunidade</p><p>para desmistificar os conceitos de gênero e sexual-</p><p>idade, destacando que essas noções vão além das</p><p>explicações biológicas. Compreender que gênero</p><p>e sexualidade são construções sociais complexas e</p><p>multifacetadas é fundamental para uma educação</p><p>mais inclusiva e abrangente. Esses conceitos não</p><p>podem ser reduzidos apenas aos aspectos biológi-</p><p>cos, uma vez que envolvem uma interseção de fa-</p><p>tores culturais, sociais e psicológicos.</p><p>Além disso, a oficina demonstrou a importância de</p><p>abordar essas questões em várias disciplinas, indo</p><p>além das áreas tradicionalmente associadas, como</p><p>Biologia. Disciplinas como Geografia, História, So-</p><p>ciologia e muitas outras têm um papel significativo</p><p>na discussão envolvendo gênero e sexualidade, uma</p><p>vez que esses temas estão intrinsecamente ligados à</p><p>cultura, à evolução histórica e à dinâmica social. In-</p><p>troduzir essas conversas em diversas áreas do conhe-</p><p>cimento enriquece a educação e promove uma com-</p><p>preensão mais completa desses temas complexos.</p><p>Dessa forma, a oficina não apenas ajudou a des-</p><p>construir estereótipos e preconceitos, mas também</p><p>incentivou a interdisciplinaridade e a abordagem</p><p>holística no tratamento das questões de gênero e</p><p>sexualidade, proporcionando aos educadores ferra-</p><p>mentas valiosas para promover uma educação mais</p><p>inclusiva e informada.</p><p>Sobre a avaliação desta atividade pedagógica, ob-</p><p>servamos que houve uma conscientização dentro</p><p>do corpo docente, mesmo que minimamente, ao</p><p>se tratar destas questões que tange os conceitos</p><p>de gênero e sexualidade. Assim, sugerimos aos</p><p>docentes levar a práxis da oficina para dentro das</p><p>atividades que ora serão realizadas com educandos,</p><p>bem como na construção das Estações do Saberes,</p><p>pensando em oficinas que toquem na realidade dos</p><p>alunos. Desta forma, faremos com que estes corpos</p><p>se sintam representados e/ou reconhecidos dentro</p><p>do espaço escolar.</p><p>As questões levantadas apontam para desafios sig-</p><p>nificativos no contexto escolar e abrem espaço para</p><p>abordagens de pesquisa importantes e necessárias.</p><p>Vamos analisar cada uma delas: (i) O fato de mui-</p><p>tos professores e professoras evitarem abordar</p><p>questões de gênero e sexualidade devido às suas</p><p>crenças religiosas é um dilema complexo. Isso desta-</p><p>ca a necessidade de equilibrar a liberdade religiosa</p><p>com a promoção de um ambiente escolar inclusivo</p><p>I S I M P Ó S I O D I V E R S I D A D E E R E S I S T Ê N C I A</p><p>B R A S Í L I A / D F 2 0 2 3</p><p>e respeitoso. Pesquisas podem investigar como as</p><p>escolas podem abordar esse desafio, respeitando as</p><p>crenças religiosas dos educadores, ao mesmo tempo</p><p>em que garantem que questões de gênero e sexuali-</p><p>dade sejam tratadas de maneira adequada. (ii) A pre-</p><p>sença de homofobia, lesbofobia e transfobia entre os</p><p>educadores é outra questão crítica que impacta neg-</p><p>ativamente o ambiente escolar. A recusa em abordar</p><p>essas questões devido a preconceitos pessoais é</p><p>prejudicial para os estudantes LGBTQ+ e cria um</p><p>ambiente hostil. A pesquisa pode explorar estraté-</p><p>gias para combater esses preconceitos, promover a</p><p>conscientização e fornecer treinamento para educa-</p><p>dores que ajude a criar um ambiente escolar mais</p><p>seguro e acolhedor para todos.</p><p>Além disso, esses desafios também podem abrir</p><p>caminho para investigar a eficácia de políticas de in-</p><p>clusão, currículos educacionais mais inclusivos e pro-</p><p>gramas de sensibilização que promovam o respeito</p><p>pela diversidade. A pesquisa no campo da educação</p><p>deve continuar a evoluir para abordar essas questões</p><p>complexas e ajudar a criar ambientes escolares mais</p><p>equitativos, onde todos os estudantes se sintam re-</p><p>speitados e valorizados, independentemente de sua</p><p>identidade de gênero ou orientação sexual.</p><p>CONSIDERAÇÕES FINAIS</p><p>Neste texto, buscou-se refletir sobre como a falta de</p><p>conhecimento acerca da temática de gênero e sexu-</p><p>alidade, advinda desde formação acadêmica do pro-</p><p>fessor, contribui para a proliferação da LGBTfobia tão</p><p>latente no chão da escola. A ausência das informações</p><p>e do preparo acadêmico são os maiores causadores da</p><p>evasão escolar, uma vez que o docente não se encon-</p><p>tra preparado para lidar com os corpos ininteligíveis,</p><p>ou não quer, por questões diversas, conversar, discutir</p><p>sobre a temática em questão neste texto.</p><p>O referido texto oferece uma reflexão sobre a in-</p><p>fluência da falta de conhecimento sobre gênero e</p><p>sexualidade, decorrente da formação acadêmica</p><p>dos professores, e seu impacto na disseminação</p><p>da LGBTfobia no ambiente escolar. Essa lacuna de</p><p>informações e preparo acadêmico representa uma</p><p>preocupação fundamental, pois contribui para a</p><p>evasão escolar, à medida que os educadores não</p><p>estão devidamente capacitados para lidar com a</p><p>diversidade de identidades e orientações sexuais,</p><p>ou simplesmente optam por evitar o diálogo sobre</p><p>essa temática, muitas vezes devido a preconceitos</p><p>pessoais ou outras razões.</p><p>A proposta do texto é de lançar luz e remover as</p><p>“escamas” dos olhos dos professores é muito signif-</p><p>icativa. Isso implica em uma chamada à ação para</p><p>sensibilizar e educar os educadores sobre a im-</p><p>portância de compreender e abordar a diversidade</p><p>de identidades e orientações sexuais de maneira</p><p>respeitosa e inclusiva. É no ambiente escolar que</p><p>todos os estudantes, independentemente de sua</p><p>identidade de gênero ou orientação sexual, devem</p><p>ser acolhidos, compreendidos e valorizados como</p><p>sujeitos sociais.</p><p>A educação desempenha um papel crucial na con-</p><p>strução de sociedades mais justas e equânime,</p><p>destaca a necessidade de abordar ativamente a</p><p>LGBTfobia no contexto escolar. Isso requer esforços</p><p>contínuos para promover a formação de profes-</p><p>sores, o desenvolvimento de currículos inclusivos</p><p>e programas de conscientização, a fim de criar um</p><p>ambiente educacional que celebre a diversidade e</p><p>combata o preconceito.</p><p>Por fim, fica aqui a nossa inquietação de que ain-</p><p>da é pouco. É necessário que haja mais discussões,</p><p>mais incômodos, mais provocações para que o</p><p>‘cis’tema sofra um terremoto e que a sua estrutura</p><p>seja abalada. Somente dessa forma a cis-heteronor-</p><p>matividade entenderá que ela não passa de uma</p><p>construção social propagada diariamente por uma</p><p>ideologia dominante.</p><p>I S I M P Ó S I O D I V E R S I D A D E E R E S I S T Ê N C I A</p><p>B R A S Í L I A / D F 2 0 2 3</p><p>REFERÊNCIAS</p><p>ANDRADE, L. Travestis na escola: assujeitamento e resistência à</p><p>ordem normativa. Rio de Janeiro: Metanóia, 2015.</p><p>ARAUJO, D. B; COLLING, L. Por uma escola que aprenda com as</p><p>diferenças. In: MACEDO, E.; RANNIERY, T. (orgs). Currículo, sexu-</p><p>alidade e ação docente. Petrópolis, RJ: DP et Alii, 2017, pp. 131</p><p>a 156.</p><p>BERGSON, H. O Riso. Rio de janeiro: Zahar, 1983.</p><p>BOURDIEU, P. A dominação Masculina. Rio de Janeiro: Bertrand</p><p>Brasil, 2002.</p><p>BRITZMAN, D. O que é esta coisa chamada amor: identidade ho-</p><p>mossexual, educação e currículo. Revista Educação & Realidade,</p><p>Porto Alegre, v. 21, n. 1, pp. 71-76, 1996. Disponível em https://</p><p>seer.ufrgs.br/</p><p>comercialização do corpo para</p><p>sobreviver e existia demanda de muitos homens que as</p><p>procuravam (ANDRADE, 2014, p. 02).</p><p>Sua fala corrobora com Bento (2011) quando assevera que</p><p>[...] não existem indicadores para medir a homofobia</p><p>de uma sociedade e, quando se fala em escola, tudo</p><p>aparece sob o manto invisibilizante da evasão. Na</p><p>verdade, há um desejo de eliminar e excluir aqueles</p><p>que contaminam o espaço escolar. Há um processo</p><p>de expulsão, e não de evasão. É importante diferen-</p><p>ciar evasão de expulsão, pois, ao apontar com maior</p><p>precisão as causas que levam crianças a não frequen-</p><p>tarem o espaço escolar, se terá como enfrentar com</p><p>eficácia os dilemas que constituem o cotidiano escolar,</p><p>entre eles, a intolerância alimentada pela homofobia</p><p>(2011, p. 555, grifos nossos).</p><p>A colocação de Bento acima grifada é quase uma</p><p>unanimidade, as/es/os estudantes LGBT, e em es-</p><p>pecial as Travestis, Transexuais e Transgêneros, na</p><p>verdade são EXULSOS pela ineficácia do Estado.</p><p>Para traçar o perfil da Travesti, Negra, Professora e</p><p>Doutora Megg Rayara Gomes de Oliveira, recor-</p><p>remos aos diversos materiais disponibilizados na</p><p>Web, como: lives, podcast, blog, aqui trazemos al-</p><p>guns fragmentos de uma entrevista concedida ao</p><p>Caderno de Gênero e Tecnologia – CGT, produzido e</p><p>mantido pela Universidade Tecnológica Federal do</p><p>Paraná, em Curitiba, em julho de 2019. Em 2017 a</p><p>Universidade Federal do Paraná – UFPR concedeu,</p><p>pela primeira vez no Brasil, o título de Doutora a</p><p>uma Travesti Negra. Este pioneirismo é de Megg</p><p>Rayara Gomes de Oliveira, Doutora em Educação. E</p><p>ela não deixou por menos, pois sua tese de Douto-</p><p>rado versava justamente sobre racismo e homofo-</p><p>bia na Educação.</p><p>Não restam dúvidas que a professora Megg é um</p><p>exemplo de como a educação pode mudar a vida</p><p>I S I M P Ó S I O D I V E R S I D A D E E R E S I S T Ê N C I A</p><p>B R A S Í L I A / D F 2 0 2 3</p><p>das pessoas, pois “a sua persistência, que muitos/</p><p>as chamariam de teimosia, em se manter na escola</p><p>apesar das adversidades, dos preconceitos e dis-</p><p>criminações que se apresentaram durante toda sua</p><p>trajetória escolar” fez com que alcançasse uma tra-</p><p>jetória acadêmica muito simbólica e representativa</p><p>(CGT, 2019, p. 01).</p><p>A professora Megg compõe um grupo que sofre múl-</p><p>tiplas formas de manifestações de preconceito e de</p><p>violências: primeiro por ser Negra e depois como</p><p>Travesti. Essas duas condições a colocam no protago-</p><p>nismo de dois universos muito perigosos atualmente</p><p>no Brasil, o que torna impossível serem analisados</p><p>de forma distinta. Principalmente, quando se trata</p><p>de políticas públicas, ativismos e produção de con-</p><p>hecimento, se faz necessário termos “um olhar inter-</p><p>seccional, em uma perspectiva critica direcionada na</p><p>justiça social” (MACEDO, 2023, p. 16).</p><p>No primeiro questionamento feito a professora</p><p>Megg, o CGT pediu que contasse um pouco da sua</p><p>história familiar, acadêmica e profissional:</p><p>Não me lembro de sofrer retaliações por conta dis-</p><p>so. Foi na escola que fui apresentada às normas de</p><p>gênero de maneira violenta: filas para meninos e</p><p>meninas; banheiro pra meninas e meninos... o con-</p><p>trole sobre meu corpo se materializava e aumentava</p><p>à medida que eu ficava mais velha. Entre os 12 e 13</p><p>anos era uma pessoa assustada, que não confiava em</p><p>ninguém. O desenho apareceu na minha vida como</p><p>possibilidade de fuga e comunicação. Tinha medo de</p><p>falar em público, não olhava para frente, vivia cabis-</p><p>baixa com medo de tudo. Não tinha amigos. (OLIVEI-</p><p>RA, 2019, p. 06, grifos nossos).</p><p>Coincidência ou não, novamente o “banheiro” apa-</p><p>rece com destaque na fala da professora Megg. Essa</p><p>“coincidência” nos leva a Judith Butler (2004, p. 32)</p><p>em seu livro “Linguagem, poder e identidade” onde</p><p>teoriza que o banheiro, sobretudo em instituições</p><p>públicas, “torna-se uma estrutura física dotada de</p><p>uma linguagem não verbalizada, mas determinante</p><p>do lugar social que cada sujeito pode ocupar na so-</p><p>ciedade” o que vem a desencadear a aceitação ou</p><p>recusa das variadas formas de existência humana.</p><p>Para reforçar, trazemos também as teorias de Bento,</p><p>(2008, p. 129) “[...] a escola, que se apresenta como</p><p>uma instituição incapaz de lidar com a diferença</p><p>e pluralidade, funciona como uma das principais</p><p>instituições guardiãs das normas de gênero e pro-</p><p>dutora da heteronormatividade.” (grifos nossos)</p><p>No que tange a interseccionalidade, que sejam</p><p>elas/eles jovens, idosas, mulheres ou homens (Cis-</p><p>gênero ou Transgênero) Lésbicas, Gays Bissexuais,</p><p>Travestis e Transexuais Transgêneros e Intersexuais</p><p>LGBTI, negros, brancos, indígenas, das periferias, do</p><p>campo e dos centros urbanos entre outros, devem</p><p>ter suas especificidades levadas em conta, para</p><p>que haja a queda dos índices classificados como</p><p>EVASÃO, mas que é sabido serem EXPULSÃO!</p><p>Na entrevista ao jornal “O Globo”, a Doutora em</p><p>Cosmologia Viviam Miranda relata mais detalhes da</p><p>sua vida escolar no Ensino Médio: “Estudava à noite</p><p>no Pedro II para passar o dia no planetário, pois lá</p><p>existe uma biblioteca bem legal. Isso mostra a im-</p><p>portância de planetários. Devia ter mais no Rio, pois</p><p>foi fundamental na minha educação. O investimen-</p><p>to é grande, mas dá resultado” (MIRANDA, 2023,</p><p>on-line).</p><p>Vivian Miranda é uma mulher Transexual que se</p><p>graduou em Física na Universidade Federal do Rio</p><p>de Janeiro (UFRJ) em 2008, onde também fez me-</p><p>strado em Física em 2015, concluiu o doutorado em</p><p>cosmologia na Universidade de Chicago nos Estados</p><p>Unidos. Por lá, também fez dois pós-doutorados:</p><p>um na Universidade da Pensilvânia e outro na Uni-</p><p>versidade do Arizona.</p><p>Em janeiro de 2022, a carioca Vivian Miranda, de</p><p>35 anos, chegou a Stony Brook, em Nova York, para</p><p>ocupar o cargo de professora-adjunta de astrofísi-</p><p>ca. O feito é simbólico, já que Vivian é uma mulher</p><p>em meio a uma área majoritariamente masculina,</p><p>numa das mais prestigiadas universidades do mun-</p><p>do, e tem detalhe, ela é uma mulher Trans.</p><p>Vivian Miranda é a única brasileira a integrar um</p><p>projeto com a Nasa que desenvolve um satélite</p><p>avaliado em US$ 3,5 bilhões (R$ 13 bilhões). Ao lon-</p><p>go de sua trajetória, recebeu alguns prêmios impor-</p><p>tantes por sua atuação científica, entre eles estão o</p><p>Nathan Sugarman Award, o Schramm Fellowship e</p><p>o Leona Woods Lectureship Award.</p><p>6. Pronunciamento verbal da Parlamentar na sessão da Comissão de Previdência, Assistência Social, Infância, Adolescência e Família, em</p><p>19 de setembro de 2023, na Câmara Federal, quando estava sendo analisado o Projeto de Lei – PL 580/2007 de autoria do Deputado</p><p>Federal Clodovil Hernandez (PTC-SP) que altera a Lei 10.406/2002, (Código Civil), para dispor sobre o contrato civil de união homoafetiva.</p><p>DA ESCOLA PARA A PISTA OU ALÉM?</p><p>No senso comum, o conhecimento empírico, como gos-</p><p>tam de dizer na Academia, é aquele adquirido através da</p><p>observação, das vivências pessoais e coletivas e é passa-</p><p>do de geração em geração se concretizando por meio da</p><p>sabedoria popular, através da repetição cultural.</p><p>A série “Segunda Chamada”, colocou o “dedo na</p><p>ferida”, fazendo nossa a fala da professora fictí-</p><p>cia Lúcia Marques, muito bem interpretada pela</p><p>atriz Débora Bloch, “Educar é sobre resistir, sobre</p><p>acreditar que as coisas podem mudar.”</p><p>Decerto, os futuros escolares Travestis, Transexu-</p><p>ais e Transgêneros não passarão imunes ao legado</p><p>deixado pelos cinco exemplos exitosos trazidos no</p><p>decorrer desse estudo, bem como as professoras/es,</p><p>orientadoras/es gestoras/es e quaisquer membros</p><p>da Equipe Técnica que tomarem conhecimento dele.</p><p>Há uma movimentação global, capitaneada pela</p><p>Organização das Nações Unidas para a Educação, a</p><p>Ciência e a Cultura – UNESCO, para que, cada vez</p><p>mais, a inclusão de estudantes Travestis, Transex-</p><p>uais e Transgêneros seja uma realidade, e que se</p><p>derrubem todos os muros, tal qual o “Muro de Ber-</p><p>lim” (1989), e que a pós modernidade abra espaço</p><p>para uma sociedade mais justa, humana, igualitária</p><p>e equânime.</p><p>O “estourar da bolha” por parte de algumas Traves-</p><p>tis, Transexuais e Transgêneros com suas lições de</p><p>vida, quando foram “resistência”</p><p>educacaoerealidade/article/view/71644 - Acesso</p><p>em: 12 fev. 2023.</p><p>CRUZ, I. Educação sexual na Bahia nas primeiras décadas do</p><p>século XX. 2017. 184 f. Tese (Doutorado em Ensino, Filosofia e</p><p>História das Ciências) – Universidade Federal da Bahia e Universi-</p><p>dade Estadual de Feira de Santana, Salvador e Feira de Santana.</p><p>FOUCAULT, M. Vigiar e punir: nascimento da prisão. Petrópolis,</p><p>RJ: Vozes, 2009.</p><p>FRANÇA, E. S. da C. “Saindo do armário”, portas se abrem/ fe-</p><p>cham? As sexualidades na escola e na formação docente. 2011.</p><p>120 f. Dissertação (Mestrado em Crítica Cultural) – Faculdade</p><p>de Educação, Universidade do Estado da Bahia, Alagoinhas. Di-</p><p>sponível em http://www. poscritica.uneb.br/wp-content/up-</p><p>loads/2017/07/elisete-santana.pdf - Acesso em: 12 fev. 2023.</p><p>FRY, P. e MACRAE, E. O que é homossexualidade. São Paulo: Abril</p><p>Cultural, 1985.</p><p>GIDDENS, A. A Transformação da intimidade: sexualidade,</p><p>amor & erotismo nas sociedades modernas. São Paulo: Editora</p><p>da UNESP, 1993.</p><p>KELLNER, D. Lendo imagens criticamente: em direção a uma ped-</p><p>agogia pós-moderna. In: SILVA, Tomaz Tadeu da (Org.). Alieníge-</p><p>nas na sala de aula: uma introdução aos estudos culturais em</p><p>educação. Petrópolis, RJ: Vozes, 1995.</p><p>LEITE, J. J. Nossos corpos também mudam: Sexo, gênero e a</p><p>invenção das categorias “travesti” e “transexual” no discurso ci-</p><p>entifico. São Paulo-PUC-SP, 2008, Tese (Doutorado em ciências</p><p>sociais).</p><p>LOURO, G. L. (Org.). O corpo educado. Belo Horizonte: Autêntica,</p><p>2001.</p><p>______. Currículo, Género e Sexualidade. Porto Editora: Porto,</p><p>2000.</p><p>______. Corpo, gênero e sexualidade: um debate contemporâ-</p><p>neo na educação. Petrópolis: Vozes, 2003, pp 41-52.</p><p>MIRANDA, A. C. de S. Gênero/sexo/sexualidade: representações</p><p>e práticas elaboradas por professoras/es da educação infantil na</p><p>rede municipal de ensino em Salvador. 2014. 166 f. Dissertação</p><p>(Mestrado em Gênero, Alteridade(s) e Desigualdades) – Universi-</p><p>dade Federal da Bahia, Salvador.</p><p>MISKOLCI, R. Teoria Queer: Um aprendizado pelas diferenças.</p><p>Belo Horizonte: Autêntica Editora: UFOP-Universidade Federal de</p><p>Ouro Preto, 2012.</p><p>REIS, C. F. Crianças dissidentes e as milícias de gênero e sexu-</p><p>alidade: um estudo de caso de uma escola pró-diversidade de</p><p>Salvador – Ba. 2017. Dissertação (Mestrado em Cultura e Socie-</p><p>dade) –Universidade Federal da Bahia, Salvador.</p><p>SILVA, T. T. Documentos de identidade: uma introdução às teo-</p><p>rias do currículo. Belo Horizonte: Autêntica, 1999.</p><p>THÜRLER, D. Sexualidade e políticas de subjetivação no cam-</p><p>po das artes. - Salvador: UFBA, Instituto de Humanidades, Artes</p><p>e Ciências; Superintendência de Educação a Distância, 2019.55</p><p>p. : il.</p><p>Doutoranda em Humanidades, Direitos e Outras Legitimidades pela</p><p>Universidade de São Paulo/Usp, Mestre em Educação e assistente</p><p>social do Centro de Referência Especializado de Assistência Social -</p><p>Creas de São Bernardo do Campo/SP</p><p>DANIELA ALVES</p><p>DE LIMA BARBOSA</p><p>e T A L</p><p>GRUPO SUZY DA CRUZ:</p><p>TRANSCENDENDO O SUAS NO</p><p>CENTRO DE REFERÊNCIA</p><p>ESPECIALIZADO DE</p><p>ASSISTÊNCIA SOCIAL DO</p><p>MUNICÍPIO DE SÃO</p><p>BERNARDO DO CAMPO – SP</p><p>I S I M P Ó S I O D I V E R S I D A D E E R E S I S T Ê N C I A</p><p>B R A S Í L I A / D F 2 0 2 3</p><p>GRUPO SUZY DA CRUZ: TRANSCENDENDO O SUAS NO CENTRO</p><p>DE REFERÊNCIA ESPECIALIZADO DE ASSISTÊNCIA SOCIAL DO</p><p>MUNICÍPIO DE SÃO BERNARDO DO CAMPO – SP</p><p>Autoria:</p><p>Daniela Alves de Lima Barbosa</p><p>Aldrey Lee Jacobs Vieira de Souza Fernandes</p><p>Alexandra Menezes</p><p>Marcia Aparecida da Silva</p><p>Rosimeire Nogueira Barbosa</p><p>A PESQUISA E A EXTENSÃO OU RELATOS DE EXPERIÊNCIA COMO AÇÕES DE FORTA-</p><p>LECIMENTO DAS RELAÇÕES FAMILIARES E/OU MATERNAGEM, EM NÚCLEOS QUE IN-</p><p>CLUEM PESSOAS LGBTQIAPN+;</p><p>RESUMO</p><p>Este resumo apresenta um relato de experiência a</p><p>partir de um trabalho desenvolvido com um grupo</p><p>de adolescentes trans e suas famílias, realizado no</p><p>Centro de Referência Especializado de Assistência So-</p><p>cial - CREAS do município de São Bernardo do Cam-</p><p>po - São Paulo. O CREAS atua por meio da oferta do</p><p>Serviço de Atendimento Especializado a Famílias e</p><p>Indivíduos-PAEFI e de outros serviços especializados,</p><p>e é referência para o trabalho social especializado no</p><p>Sistema Único de Assistência Social - SUAS, direciona-</p><p>do às famílias e indivíduos que estão em situação de</p><p>risco social e tiveram seus direitos violados. Faz par-</p><p>te da natureza de atuação o atendimento às pessoas</p><p>discriminadas em razão da deficiência, raça/etnia, ori-</p><p>entação sexual e/ou gênero. Durante o percurso de</p><p>nossa atuação técnica neste equipamento, notamos,</p><p>através do Registro Mensal de Atendimentos (RMA)</p><p>que é um sistema onde são registradas mensalmente</p><p>as informações relativas aos serviços ofertados e o vol-</p><p>ume de atendimentos, que era quase nula a atuação</p><p>com pessoas transgêneras. A Associação Nacional de</p><p>Travestis e Transexuais - ANTRA elaborou um dossiê</p><p>no ano de 2023, com dados de 2022 sobre assassina-</p><p>tos no Brasil de pessoas transgêneras, onde a nação</p><p>desponta como o país que mais assassina pessoas</p><p>transexuais e travestis no mundo (pelo 15º ano con-</p><p>secutivo) e, a cada 10 pessoas assassinadas em nível</p><p>global, quatro desses crimes decorreram no Brasil.</p><p>Diante de todos esses dados, em outubro de 2022</p><p>passamos a realizar mensalmente encontros com ad-</p><p>olescentes transexuais e suas famílias no âmbito do</p><p>PAEFI , utilizando a metodologia de grupo no trabalho</p><p>social especializado, tendo em vista a construção de</p><p>novas possibilidades de interação, projetos de vida e</p><p>superação das situações vivenciadas, com o objetivo</p><p>de promover direitos, preservação dos vínculos famil-</p><p>iares, comunitários e sociais, no sentido de romper</p><p>com as vivências das violações de direitos. O grupo</p><p>atua na perspectiva da segurança de acolhida, segu-</p><p>rança de convívio ou vivência familiar, comunitária e</p><p>social e segurança de desenvolvimento de autonomia</p><p>individual, familiar e social. Além disso, o objetivo do</p><p>grupo também é descortinar esses corpos transexuais</p><p>dissidentes, analisando sob o viés da política de as-</p><p>sistência social como é enviesada a passabilidade pela</p><p>qual esses corpos transitam na sociedade cisheternor-</p><p>mativa. Durante os encontros atuamos na perspectiva</p><p>da orientação psicossocial na busca pela garantia de</p><p>direitos, pela função protetiva da família e principal-</p><p>mente pelo fortalecimento dos vínculos familiares e</p><p>na prevenção da reincidência da violação de direitos.</p><p>Os encontros são temáticos: direitos sociais, saúde</p><p>mental, fortalecimento de vínculos, atenção psicosso-</p><p>cial, dentre outros. Diante do que foi apresentado, o</p><p>grupo conquistou como garantia de direitos: fortalec-</p><p>imento dos vínculos familiares e comunitários, nome</p><p>social (inserção RG) encaminhamento para retificação</p><p>do nome, hormonioterapia pela Unidade Básica de</p><p>Saúde e inserção em Programas de Transferência de</p><p>Renda. O nome do grupo foi escolhido coletivamente</p><p>por todos os participantes em homenagem à Suzy,</p><p>uma pessoa preta travesti que era atendida pelo Cen-</p><p>tro de Referência Especializado para População em</p><p>Situação de Rua - Centro Pop, e que foi brutalmente</p><p>assassinada no ano de 2022.</p><p>PALAVRAS - CHAVE: CREAS. Direitos Sociais. Grupo.</p><p>Fortalecimento de Vínculos. Transexuais.</p><p>This summary presents an experience report based</p><p>on work developed with a group of transgender ad-</p><p>olescents and their families, carried out at the Spe-</p><p>cialized Reference Center for Social Assistance - CRE-</p><p>AS in the municipality of São Bernardo do Campo</p><p>- São Paulo. CREAS operates through the provision</p><p>of the Specialized Assistance Service for Families</p><p>and Individuals - PAEFI and other specialized ser-</p><p>vices, and is a reference for specialized social work in</p><p>the Unified Social Assistance System - SUAS, aimed</p><p>at families and individuals who are in a situation of</p><p>social risk and had their rights violated. It is part of</p><p>the nature of our work to provide assistance to peo-</p><p>ple discriminated against due to disability, race/eth-</p><p>nicity, sexual orientation and/or gender. During the</p><p>course of our technical work on this equipment, we</p><p>noticed, through the</p><p>Monthly Service Record (RMA)</p><p>which is a system where information regarding the</p><p>services offered and the volume of services are</p><p>recorded monthly, that there was almost no work</p><p>with transgender people. The National Association</p><p>of Transvestites and Transsexuals - ANTRA prepared</p><p>a dossier in 2023, with data from 2022 on murders</p><p>of transgender people in Brazil, where the nation</p><p>stands out as the country that murders the most</p><p>transgender people and transvestites in the world</p><p>(for the 15th consecutive year ) and, for every 10</p><p>people murdered globally, four of these crimes took</p><p>place in Brazil. Given all this data, in October 2022</p><p>we began holding monthly meetings with transgen-</p><p>der adolescents and their families within the scope</p><p>of PAEFI, using the group methodology in special-</p><p>ized social work, with a view to building new possi-</p><p>bilities for interaction, life projects and overcoming</p><p>situations experienced, with the aim of promoting</p><p>rights, preserving family, community and social ties,</p><p>in order to break with the experiences of rights vi-</p><p>olations. The group operates from the perspective</p><p>of security of reception, security of coexistence or</p><p>family, community and social experience and secu-</p><p>rity of development of individual, family and social</p><p>autonomy. Furthermore, the group’s objective is</p><p>also to uncover these dissident transsexual bodies,</p><p>analyzing from the perspective of social assistance</p><p>policy how the passability through which these bod-</p><p>ies transit in cisheternormative society is biased.</p><p>During the meetings, we act from the perspective</p><p>of psychosocial guidance in the search for guaran-</p><p>teeing rights, the protective function of the family</p><p>and mainly the strengthening of family bonds and</p><p>preventing the recurrence of rights violations. The</p><p>meetings are themed: social rights, mental health,</p><p>strengthening bonds, psychosocial care, among oth-</p><p>ers. Given what was presented, the group achieved</p><p>as a guarantee of rights: strengthening of family and</p><p>community ties, social name (RG insertion) referral</p><p>for name rectification, hormone therapy by the Ba-</p><p>sic Health Unit and inclusion in Income Transfer Pro-</p><p>grams. The group’s name was chosen collectively by</p><p>all participants in honor of Suzy, a black transvestite</p><p>person who was served by the Specialized Refer-</p><p>ence Center for Homeless Populations - Centro Pop,</p><p>and who was brutally murdered in 2022.</p><p>KEYWORDS: CREAS. Social rights. Group. Strength-</p><p>ening Bonds. Transsexuals.</p><p>ABSTRACT</p><p>INTRODUÇÃO</p><p>Antes de abordarmos a materialização do Sistema Úni-</p><p>co de Assistência Social-SUAS no Brasil e sua relação</p><p>com este relato de experiência, é necessário explicitar</p><p>o nascimento do Serviço social e seus impactos en-</p><p>quanto profissão. O Serviço Social brasileiro surgiu em</p><p>1930 e as primeiras ações profissionais estiveram vin-</p><p>culadas à Igreja Católica. Nesse momento da história o</p><p>país vivenciava um momento muito turbulento, com</p><p>pressão da classe trabalhadora contra a burguesia por</p><p>melhores condições de trabalho e políticas públicas</p><p>que atendessem as suas necessidades.</p><p>Iamamoto e Carvalho (2013) pontuam que, diante</p><p>da situação, o Estado passou a assumir um papel or-</p><p>ganizacional, canalizando os interesses da classe tra-</p><p>balhadora para que não se rebelassem, em nome de</p><p>uma harmonia social disciplinadora, a favor do capi-</p><p>talismo. Na história da profissão tem-se que as bases</p><p>ideológicas estiveram relacionadas com os interesses</p><p>da classe trabalhadora e também com o interesse da</p><p>classe dominante visando um ajustamento social.</p><p>A implantação do Serviço Social se dá no decorrer</p><p>desse processo histórico. Não se baseará, no entanto,</p><p>em medidas coercitivas emanadas do Estado. Surge</p><p>da iniciativa participar de grupos e frações de classe,</p><p>que se manifestam, principalmente, por intermédio da</p><p>Igreja Católica. Possui em seu inicio uma base social</p><p>bem delimitada e fontes de recrutamento e formação</p><p>I S I M P Ó S I O D I V E R S I D A D E E R E S I S T Ê N C I A</p><p>B R A S Í L I A / D F 2 0 2 3</p><p>de agentes sociais informados por uma ideologia ig-</p><p>ualmente determinada. A especificidade maior que</p><p>reveste o Serviço Social desde sua implementação não</p><p>está, no entanto, no âmbito das características que</p><p>mais evidentemente o marcam. Historicamente se lo-</p><p>caliza na demanda social que legitima o empreendi-</p><p>mento (Iamamoto e Carvalho, 2013, p.135).</p><p>Diante desse processo social, a classe dominante,</p><p>naquele momento, preocupa-se em manter a ex-</p><p>ploração da força de trabalho, e aliou-se ao Estado. Foi</p><p>a partir dai que a Igreja Católica passou a ofertar for-</p><p>mação para moças nascidas em famílias tradicionais,</p><p>para quem assim realizassem ações de cunho social.</p><p>No Brasil, o ano de 1960, bem como a década se-</p><p>guinte foram marcados por um movimento dentro</p><p>da profissão, denominado movimento de Recon-</p><p>ceituação, o qual objetivava a ruptura com práticas</p><p>conservadoras no bojo profissional. Foi a partir de</p><p>tal movimento que a profissão passou a ter um per-</p><p>fil mais critico frente aos desafios sociopolíticos.</p><p>No final da década de 70 ocorreu no país o Con-</p><p>gresso da Virada, o qual foi considero um marco da</p><p>profissão, pois foi a partir dele que o Serviço Social</p><p>rompeu definitivamente com práticas conservadoras</p><p>e se laicizou. Assim como as primeiras práticas profis-</p><p>sionais foram balizadas por princípios disciplinadores</p><p>e de ordem moral, os primeiros Códigos de Ética tin-</p><p>ham esse perfil, expressando a defesa de um projeto</p><p>societário conservador. A partir do Código de Ética de</p><p>1986 e o mais recente, o de 1993, marca-se um posi-</p><p>cionamento ético-politico na defesa intransigente</p><p>dos direitos sociais, em defesa dos interesses classe</p><p>trabalhadora na luta contra o capitalismo.</p><p>O Serviço Social experimentou, no Brasil, um profun-</p><p>do processo de renovação. Na intercorrência de mu-</p><p>danças ocorridas na sociedade brasileira com o próprio</p><p>acúmulo profissional, o Serviço Social se desenvolveu</p><p>teórica e praticamente, laicizou-se, diferenciou-se e, na</p><p>entrada dos anos noventa, apresenta-se como profis-</p><p>são reconhecida academicamente e legitimada social-</p><p>mente. A dinâmica deste processo que conduziu à con-</p><p>solidação profissional do Serviço Social materializou-se</p><p>em conquistas teóricas e ganhos práticos que se reve-</p><p>laram diversamente no universo profissional. No pla-</p><p>no da reflexão e da normatização ética, o Código de</p><p>Ética Profissional de 1986 foi uma expressão daquelas</p><p>conquistas e ganhos, através de dois procedimentos:</p><p>negação da base filosófica tradicional, nitidamente</p><p>conservadora, que norteava a “ética da neutralidade”,</p><p>e afirmação de um novo perfil do/a técnico/a, não</p><p>mais um/a agente subalterno/a e apenas executivo/a,</p><p>mas um/a profissional competente teórica, técnica e</p><p>politicamente (CFESS, 2012).</p><p>É válido lembrar que os Códigos de Ética da profis-</p><p>são do assistente social não tratam apenas de as-</p><p>pectos normativos que regem os direitos e deveres</p><p>dos assistentes sociais, mas são determinados por</p><p>convicções que defendem o projeto societário.</p><p>Desse modo, temos na profissão dois momentos</p><p>distintos: defesa de uma sociedade conservadora e</p><p>o mais recente, balizado por uma perspectiva critica</p><p>da sociedade capitalista.</p><p>A Politica de Assistência Social no Brasil</p><p>A nossa Constituição Federativa do Brasil de 1988 re-</p><p>verberou em avanços importantes em relação aos dire-</p><p>itos civis, políticos e sociais. A assistência social faz parte</p><p>do que chamamos de tripé da Seguridade Social, junta-</p><p>mente com a saúde e a previdência social. A assistência</p><p>social é uma politica pública não contributiva e é presta-</p><p>da a quem dela necessitar e apresenta norte:</p><p>• A Constituição Federal de 1988 trouxe</p><p>avanços significativos ao estabelecer os direit-</p><p>os civis, políticos e sociais. A assistência social</p><p>tornou-se o resultado da luta contra a pobreza,</p><p>miséria, desemprego, falta de acesso a bens so-</p><p>ciais e culturais.</p><p>• A Constituição Federal faz saber que a as-</p><p>sistência social será prestada a quem dela ne-</p><p>cessitar, independentemente de contribuição à</p><p>seguridade social,</p><p>e tem por objetivos:</p><p>I - a proteção social, que visa à garantia da vida, à</p><p>redução de danos e à prevenção da incidência de</p><p>riscos, especialmente:</p><p>a) a proteção à família, à maternidade, à infância, à</p><p>adolescência e à velhice;</p><p>b) o amparo às crianças e aos adolescentes carentes;</p><p>c) a promoção da integração ao mercado de trabalho;</p><p>d) a habilitação e reabilitação das pessoas com defi-</p><p>ciência e a promoção de sua integração à vida co-</p><p>munitária; e</p><p>e) a garantia de 1 (um) salário-mínimo de benefício</p><p>mensal à pessoa com deficiência e ao idoso que</p><p>comprovem não possuir meios de prover a própria</p><p>manutenção ou de tê-la provida por sua família</p><p>(Brasil, 1993).</p><p>Além disso, abarca a vigilância socioassistencial,</p><p>que visa a analisar territorialmente a capacidade</p><p>protetiva das famílias e nela a ocorrência de vulner-</p><p>abilidades, de ameaças, de vitimizações e danos,</p><p>bem como a defesa de direitos, que visa a garantir o</p><p>pleno acesso aos direitos no conjunto das provisões</p><p>socioassistenciais.</p><p>Observa-se, neste contexto, que a assistência social</p><p>no Brasil passa a ser uma política social não con-</p><p>tributiva, de cunho redistributiva por intermédio de</p><p>serviços e benefícios e provedora dos direitos soci-</p><p>ais. Cabe destacar ainda que isso só foi possível em</p><p>decorrência da luta da sociedade civil organizada,</p><p>através dos movimentos sociais, tornando então a</p><p>assistência social como política pública, dever do</p><p>Estado e direito de quem dela necessitar.</p><p>Nesse contexto a Lei Orgânica de Assistência Social</p><p>(LOAS) - Lei 8.742 de 1993 assevera que o amparo a</p><p>quem dela necessitar está ancorado em dois tipos</p><p>de proteção: a Proteção Social Básica e a Proteção</p><p>Social Especial.</p><p>A Proteção Social Básica, de acordo com referida</p><p>lei, é denominada como um conjunto de serviços,</p><p>programas, projetos e benefícios da assistência so-</p><p>cial que visa a prevenir situações de vulnerabilidade</p><p>e risco social por meio do desenvolvimento de po-</p><p>tencialidades e aquisições e do fortalecimento de</p><p>vínculos familiares e comunitários.</p><p>Já a Proteção Social Especial configura-se como um</p><p>conjunto de serviços, programas e projetos que tem</p><p>por objetivo contribuir para a reconstrução de víncu-</p><p>los familiares e comunitários, a defesa de direito, o</p><p>fortalecimento das potencialidades e aquisições e a</p><p>proteção de famílias e indivíduos para o enfrentamen-</p><p>to das situações de violação de direitos (Brasil, 1993).</p><p>Desse modo, em 2005 consolida-se o Sistema Único de</p><p>Assistência Social - SUAS, tornando-se um sistema públi-</p><p>co que tem por objetivo organizar de forma descentral-</p><p>izada os serviços socioassistenciais no país, possuindo</p><p>como eixo norteador o foco prioritário a atenção às</p><p>famílias, aos seus membros e aos indivíduos.</p><p>Diante desse contexto o CREAS - Centro de Referên-</p><p>cia Especializado de Assistência Social, por meio da</p><p>oferta do PAEFI e de outros serviços especializados,</p><p>é referência para o trabalho social especializado no</p><p>SUAS, nosso local de atuação técnica atualmente.</p><p>É neste local que a equipe de referência presta</p><p>apoio, orientações e acompanha os indivíduos</p><p>e famílias em situações de risco pessoal e social</p><p>por ameaça ou violação de direitos. A equipe do</p><p>Serviço de Atendimento Especializado a Famílias e</p><p>Indivíduos - PAEFI é a referência de proteção para</p><p>essa população. Por meio do trabalho social real-</p><p>izado em conjunto com a articulação intersetorial é</p><p>assegurada a proteção, as seguranças de acolhida,</p><p>convivência familiar e comunitária, desenvolvimen-</p><p>to de autonomia e acesso aos direitos (Brasil, 2011).</p><p>O PAEFI tem o sentido de contribuir para aumen-</p><p>tar a capacidade protetiva da família, na proteção</p><p>de seus membros, sobretudo os mais vulneráveis.</p><p>Compreendemos, enquanto equipe técnica, que</p><p>a família ao mesmo tempo que é um núcleo pro-</p><p>tetivo, em muitas situações pode se constituir um</p><p>espaço violador de direitos. O trabalho social com</p><p>famílias consiste, dentre outros, em:</p><p>• Atendimento psicossocial (individual, familiar</p><p>e em grupo);</p><p>• Ações de mobilização e enfrentamento;</p><p>• Acompanhamento dos encaminhamentos;</p><p>• Visita domiciliar;</p><p>• Articulação com a rede;</p><p>• Acolhida; escuta qualificada; acompanham-</p><p>ento especializado e oferta de informações e</p><p>orientações;</p><p>• Realização de acompanhamento especializa-</p><p>do, por meio de atendimentos familiar, individ-</p><p>uais e em grupo;</p><p>• Realização de encaminhamentos monitorados</p><p>para a rede socioassistencial, demais políticas</p><p>públicas setoriais e órgãos de defesa de direito;</p><p>• Trabalho em equipe interdisciplinar;</p><p>• Participação de reuniões para avaliação das</p><p>ações e resultados atingidos e para planejamen-</p><p>to das ações a serem desenvolvidas; definição</p><p>de fluxos; instituição de rotina de atendimento</p><p>e acompanhamento dos usuários; organização</p><p>dos encaminhamentos, fluxos de informações</p><p>e procedimentos.</p><p>I S I M P Ó S I O D I V E R S I D A D E E R E S I S T Ê N C I A</p><p>B R A S Í L I A / D F 2 0 2 3</p><p>O Caderno de Orientações do Centro Especializado</p><p>de Assistência Social - CREAS (2011) assinala que:</p><p>As singularidades de cada situação deverão, inclu-</p><p>sive, orientar a decisão conjunta, com cada família/</p><p>indivíduo, das metodologias a serem utilizadas no tra-</p><p>balho social especializado, para a adoção das estraté-</p><p>gias mais adequadas em cada caso, tendo em vista a</p><p>construção de novas possibilidades de interação, pro-</p><p>jetos de vida e superação das situações vivenciadas.</p><p>Nessa direção, algumas situações poderão requerer</p><p>atendimentos mais individualizados, enquanto outras</p><p>demandarão intervenções mais coletivas, com a par-</p><p>ticipação de todos os familiares implicados na situação</p><p>ou até mesmo a inclusão em atendimentos em grupo</p><p>(Brasil, 2011, p.27).</p><p>De tal modo, a psicologia tem um papel tão quan-</p><p>to importante no âmbito do SUAS, em especial</p><p>no CREAS, lócus deste relato de experiência. Este</p><p>profissional atua de maneira psicossocial, ofertando</p><p>atenção especializada, pois os riscos estão compro-</p><p>vados, como violência doméstica e/ou de gênero,</p><p>negligência, violência sexual, dentre outras.</p><p>Ao longo das últimas décadas, houve um avanço ex-</p><p>pressivo, mas ainda insuficiente, do número de Centros</p><p>de Referência de Assistência Social (CRAS) e Centros de</p><p>Referência Especializados de Assistência Social (CREAS)</p><p>no país (BRASIL, 2016c). Também uma série de profis-</p><p>sionais, (muitos recém-formados), encontram nesses</p><p>espaços disposição para atuação profissional que co-</p><p>loca em destaque uma ação que possui, entre outros</p><p>elementos, um caráter comunitário, para amenizar</p><p>os efeitos da questão social, que, mais do que nunca,</p><p>é profunda em sua complexidade e adquire extensas</p><p>proporções. Além de desempenharem atividades que</p><p>garantem a constituição e o acesso a uma rede de</p><p>serviços no território em que as populações atendidas</p><p>vivem e constroem suas experiências como sujeitos</p><p>políticos (Conselho Federal de Psicologia, 2021, p.39).</p><p>Assim, de modo a materializar as especificidades</p><p>do SUAS, em outubro de 2022 ocorreu o primeiro</p><p>encontro com adolescentes transgêneros e suas</p><p>famílias no CREAS do município de São Bernardo do</p><p>Campo, estado de São Paulo.</p><p>GRUPO SUZY DA CRUZ: TRANSCENDENDO O SUAS: UM RELATO DE EXPERIÊNCIA</p><p>Nós, enquanto equipe psicossocial do CREAS, no-</p><p>tamos, ao longo dos atendimentos e do perfil da</p><p>população que chegava até o equipamento que não</p><p>havia situações de violação de direitos impulsiona-</p><p>das por transfobia, homofobia em decorrência da</p><p>identidade de gênero e de orientação sexual. Cau-</p><p>sou-nos espanto, pois o país, pelo 15º ano consecu-</p><p>tivo carrega a marca de ser a nação que mais mata</p><p>pessoas travestis e transexuais no mundo.</p><p>Diante dessa inquietação observamos, nas famílias</p><p>as quais atendíamos, que havia entre seus mem-</p><p>bros adolescentes em processo de transição social</p><p>e, mesmo que esse processo não tenha sido direta-</p><p>mente o que levou a família a ser atendida no equi-</p><p>pamento, as famílias estavam desprotegendo suas</p><p>adolescentes em relação à identidade de gênero a</p><p>qual estavam se identificando naquele momento.</p><p>Realizamos um breve levantamento e observamos,</p><p>inicialmente, três núcleos familiares com adoles-</p><p>centes em processo de transição social, e prontam-</p><p>ente iniciamos a leitura de documentos norteadores</p><p>e realizamos uma reunião de planejamento. Cabe</p><p>destacar que atualmente as adolescentes que par-</p><p>ticipam do grupo já atingiram maioridade, ainda as-</p><p>sim continuam participando atividades das desen-</p><p>volvidas neste grupo de cunho socioeducativo.</p><p>Foto 1: Primeira reunião de planejamento</p><p>Fonte: arquivo pessoal das autoras</p><p>Após a reunião, optamos por realizar o grupo men-</p><p>salmente, toda a última sexta-feira de cada mês, no</p><p>período vespertino. As reuniões ocorrem nas de-</p><p>pendências do CREAS e tanto as adolescentes quan-</p><p>to suas famílias participam.</p><p>Em determinados encontros, alguns trabalhadores</p><p>do SUAS atuantes no CREAS envolveram-se com a</p><p>temática do grupo, participando dos encontros e</p><p>tecendo discussões em torno de temáticas como a</p><p>transfobia e a homofobia.</p><p>Foto 2: Técnicas do CREAS e meninas trans</p><p>Fonte: arquivo pessoal das autoras.</p><p>Ao longo da realização do grupo planejamos diversas</p><p>atividades as quais pudessem atingir a especificidade</p><p>de natureza de atuação de grupos do CREAS: recon-</p><p>strução de vínculos familiares e comunitários, a defe-</p><p>sa de direito, o fortalecimento das potencialidades e</p><p>aquisições e a proteção de famílias e indivíduos para o</p><p>enfrentamento das situações de violação de direitos.</p><p>A cada encontro pensávamos em estratégias potentes as</p><p>quais dialogassem com o perfil das famílias atendidas, e</p><p>sobretudo no sentido de propiciar às adolescentes um</p><p>espaço de proteção, vínculo e garantia de direitos.</p><p>Foto 3: Adolescentes trans realizando a atividade</p><p>roda da vida</p><p>Fonte: arquivo pessoal das autoras.</p><p>Foto 4: Encontro mensal do grupo</p><p>Fonte: arquivo pessoal das autoras</p><p>Na foto anterior estávamos projetando trechos do</p><p>filme Orações para Bobby. Este filme, lançado no</p><p>ano de 2009, retrata um enredo baseado em uma</p><p>história real de uma família conservadora cristã,</p><p>onde um dos filhos se identifica como pessoa gay, o</p><p>que causa grande impacto na dinâmica familiar. Al-</p><p>guns membros da família passam a “aceitar” Bobby,</p><p>porém sua mãe acredita que a homossexualidade é</p><p>uma doença e que Deus poderia curá-lo. Ao fim, o</p><p>jovem não aguenta a pressão da família e da socie-</p><p>dade e atenta contra própria vida.</p><p>O objetivo do grupo em reproduzir trechos desse</p><p>filme foi fazer com que as famílias refletissem o</p><p>quanto a sociedade impõe regras e que é natural</p><p>sentir medo ainda pelo o que é desconhecido ou</p><p>que se está descobrindo, mas o importante é o est-</p><p>reitamento do dos vínculos e a função protetiva da</p><p>família, para cessar as violações de direitos.</p><p>I S I M P Ó S I O D I V E R S I D A D E E R E S I S T Ê N C I A</p><p>B R A S Í L I A / D F 2 0 2 3</p><p>A Proteção Social no Brasil, executada pelos tra-</p><p>balhadores atuantes no SUAS é de quem dela ne-</p><p>cessitar, como preconiza a Política de Assistência</p><p>Social - PNAS (2004). Nesse sentido ela opera na ga-</p><p>rantia de direitos sociais, com foco nas populações</p><p>que foram historicamente colocadas em espaços de</p><p>abjeção e invisibilidade, seja qual for o marcador</p><p>social da diferença: orientação sexual, identidade</p><p>de gênero, pobreza, raça, dentre outros.</p><p>Tal local de abjeção leva a essa parcela da popu-</p><p>lação a vivenciar situações de violação de direitos e</p><p>violência, levando a PNAS no Brasil a desempenhar</p><p>sua função protetiva.</p><p>Levando em consideração que a PNAS tem como</p><p>principio basilar a igualdade de direitos sem dis-</p><p>criminação de qualquer natureza, a rede socioas-</p><p>sistencial deverá desempenhar seu trabalho tanto</p><p>na prevenção, por meio da proteção social básica,</p><p>quanto à defesa dos direitos violados, através da</p><p>proteção social especial, representado pelo CREAS,</p><p>local onde desenvolvemos ações com o grupo de</p><p>adolescentes trans e suas famílias.</p><p>Nesse sentido, torna-se indispensável que a ofer-</p><p>ta do SUAS possa abarcar de forma não discrimi-</p><p>natória toda a população a quem dele necessitar,</p><p>sobretudo a população LGBTQIAPN+.</p><p>CONSIDERAÇÕES FINAIS</p><p>REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS</p><p>BRASIL. Código de ética do assistente social. Lei no</p><p>8.662/1993. Legislação Brasileira para o Serviço Social.</p><p>Brasília: CRESS. SP, 2006.</p><p>BRASIL, Lei nº 8.742. Lei Orgânica de Assistência Social</p><p>(LOAS). Brasília: DF, 7 de dezembro de 1993. BRASIL, Lei nº</p><p>1074/2003.</p><p>BRASIL. Norma Operacional Básica do SUAS (NOB/SUAS) –</p><p>Construindo as bases para a implementação do Sistema Único</p><p>de Assistência Social. Brasília: Ministério do Desenvolvimento</p><p>Social e Combate à Fome/Secretaria Nacional de Assistência</p><p>Social, 2005.</p><p>BRASIL. Orientações Técnicas sobre o PAIF - O Serviço de</p><p>Proteção e Atendimento Integral à Família – PAIF, segundo a</p><p>Tipificação Nacional de Serviços Socioassistenciais. Brasília:</p><p>MDS, v.1, 2012.</p><p>BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à</p><p>Fome. Tipificação Nacional de Serviços Socioassistenciais.</p><p>Reimpressão 2014. Secretaria Nacional de Assistência Social.</p><p>Brasília, 2014.</p><p>BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à</p><p>Fome. Política Nacional da Assistência Social – PNAS/2004</p><p>e Norma Operacional Básica da Assistência Social – NOB/</p><p>SUAS - Brasília, DF: MDS, 2005.</p><p>Referências técnicas para atuação de psicólogas (os) no</p><p>CRAS/SUAS / Conselho Federal de Psicologia, Conselhos Re-</p><p>gionais de Psicologia, Centro de Referência Técnica em Psi-</p><p>cologia e Políticas Públicas. — 3. ed. — Brasília : CFP , 2O21.</p><p>IAMAMOTO, M. V.; CARVALHO, R. de. Relações sociais e</p><p>Serviço Social no Brasil: esboço de uma interpretação históri-</p><p>co-metodológica. 38 ed. São Paulo: Cortez, Lima, 2013.</p><p>Doutoranda em Humanidades, Direitos e Outras Legitimidades pela</p><p>Universidade de São Paulo/Usp, Mestre em Educação e assistente</p><p>social do Centro de Referência Especializado de Assistência Social -</p><p>Creas de São Bernardo do Campo/SP</p><p>DANIELA ALVES</p><p>DE LIMA BARBOSA</p><p>NARRATIVAS, GÊNERO,</p><p>CORPOS, SEXO E</p><p>SEXUALIDADE DAS</p><p>MULHERES TRANSEXUAIS</p><p>E TRAVESTIS COM</p><p>DEFICIÊNCIA</p><p>I S I M P Ó S I O D I V E R S I D A D E E R E S I S T Ê N C I A</p><p>B R A S Í L I A / D F 2 0 2 3</p><p>NARRATIVAS, GÊNERO, CORPOS, SEXO E SEXUALIDADE DAS</p><p>MULHERES TRANSEXUAIS E TRAVESTIS COM DEFICIÊNCIA</p><p>Autoria:</p><p>Daniela Alves de Lima Barbosa</p><p>GÊNERO E DIVERSIDADE E INTERSECCIONALIDADE(S) (RAÇA-ETNIA E LUTA ANTIRRAC-</p><p>ISTA, PESSOA COM DEFICIÊNCIA E LUTA ANTICAPACITISTA.</p><p>RESUMO</p><p>Este trabalho constitui-se como um recorte da</p><p>pesquisa da tese de doutorado, ainda em anda-</p><p>mento, vinculada ao Programa de Pós-Graduação</p><p>de Humanidades, Direitos e Outras Legitimidades</p><p>da Universidade de São Paulo-USP, e que apresenta</p><p>como objetivo compreender como as narrativas de</p><p>mulheres transexuais e pessoas travestis com defi-</p><p>ciência em suas mídias sociais podem contribuir para</p><p>a desconstrução de padrões hegemônicos baseados</p><p>na cisheteronormatividade, na necropolitica e no</p><p>capacitismo estrutural. Utilizaremos como método</p><p>de pesquisa a História Oral, de modo a amplificar</p><p>a voz dessas pessoas e suas histórias de vida. Para</p><p>tanto, busca-se analisar a interseccionalidade narra-</p><p>tivas, sexo, sexualidade, corpo, gênero, necropolítica,</p><p>biopoder, capacitismo e deficiência. Tal interseccio-</p><p>nalidade é intencionamente ignorada em nossa so-</p><p>ciedade pela cultura opressora que é capacitista e</p><p>cisheteronormativa, desnudando a necropopolítica e</p><p>o biopoder sobre os quais esses corpos dissidentes</p><p>estão expostos. Tal situação revela a necropolítica</p><p>de Estado, pois esses corpos, como afirma Achille</p><p>Mbembe (2018) estão submetidos a uma política de</p><p>morte, manifestada pelo biopoder (Foucault, 2012)</p><p>na direção da disciplina dos corpos. Assim, levando</p><p>em consideração que essa intersecção é invisibilizada</p><p>e, apesar disso, ao mesmo tempo mexe com estru-</p><p>turas LGBTfobicas e capacitistas, muito pouco se dia-</p><p>loga a respeito desse recorte interseccional. Não há</p><p>dados oficiais sobre esta intersecção, não há politicas</p><p>ou ações governamentais especificas para a comu-</p><p>nidade LGBTQIAPN+ com deficiência, bem como há</p><p>poucos estudos acadêmicos que se debruçam</p>
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